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Princípio da legalidade e da proporcionalidade como limites à discricionariedade administrativa.

Ordenamento jurídico brasileiro e português

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24/02/2010 às 00:00
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CONSIDERAÇÕES FINAIS

O ordenamento jurídico brasileiro, português e alemão aceitam a aplicação dos princípios da legalidade e da proporcionalidade como limites à discricionariedade administrativa, seja durante a atividade da Administração Pública, seja depois, no processo de controle realizado pelos Tribunais.

O princípio da legalidade limita a atuação do Administrador no sentido de que este deve respeitar as diretrizes do ordenamento jurídico e, o princípio da proporcionalidade que exige a utilização dos conceitos de adequação, exigibilidade/necessidade e equilíbrio/proporcionalidade em sentido estrito, para que atue da melhor forma e de acordo com o interesse público.

No controle da legalidade que é permitido a todo o ato discricionário, os juízes estão mais amparados pelo ordenamento jurídico, pois podem analisar se a atuação administrativa está ou não de acordo com a Lei. Contudo, no controle do mérito, inicialmente proibido de ser realizado pelos Tribunais, o juízo anulatório pode ser fundado no princípio da proporcionalidade em suas três modalidades ou em uma delas, nos casos em que há aplicação de conceitos jurídicos indeterminados.

Então, o Tribunal que analisa os limites externos do mérito do ato administrativo discricionário é mais ousado do que o pautado apenas no princípio da legalidade. Esta ousadia está se intensificando, pois a doutrina e a jurisprudência vem estreitando o mérito administrativo no intuito de limitar as decisões extremamente desequilibradas, desarrazoadas e que configurem um possível abuso de poder: desvio/excesso de poder ou desvio de finalidade.

Assim, a margem de livre decisão da Administração surge hoje rodeada de limites muito além do que era permitido há décadas atrás. Estes limites possuem diferentes graus de operatividade, pois variam conforme sua densidade normativa, assim, o ato administrativo ilegal em sentido estrito pode ser melhor controlado pelos Tribunais(apenas tem a reserva de lei como fundamento, ou seja, o princípio da legalidade).

Fato que não ocorre com o ato desarrazoado e desequilibrado praticado no poder discricionário da Administração, pois deverá ser analisado os motivos de fato e as circunstâncias as quais levaram o agente público a agir daquela forma, assim como ser aplicado os princípios gerais do direito e, especificamente, o princípio da proporcionalidade para resolução da questão. Este, por sua vez de opratividade reduzida, em virtude de seu elevado grau de subjetividade, mas intensamente aplicável nos dias atuais.

Em respeito ao Estado Democrático de Direito, à Dignidade da Pessoa Humana e à Administração Pública como meio essencial para a construção do bem comum, torna-se necessária a margem de liberdade concedida ao agente público no exercício do Poder Discricionário, em razão da impossibilidade do Legislador prevê todas as situações da vida real. Contudo, os limites apresentados pelos princípios da legalidade e da proporcionalidade e o consequente controle jurisdicional desses atos são imprescindíveis ao interesse público, no intuito de evitar o possível abuso de poder e a violação de direitos e garantias fundamentais.


REFERÊNCIAS

BARROSO, Luis Roberto. O direito constitucional e a efetividade de suas normas: limites e possibilidades da constituição brasileira. 3. ed. Rio de Janeiro: Renovar, 1993.

BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF: Senado, 1988.

MENDES, Gilmar Ferreira. Direitos fundamentais e controle de constitucionalidade. 2. ed. São Paulo: Celso Bastos, 1999. 518 p.

MEIRELLES, Hely Lopes. Direito municipal brasileiro. 6. ed. São Paulo: Malheiros, 1993.

MONTEIRO, Ruy Carlos de Barros. O argumento de inconstitucionalidade e o repúdio da lei pelo poder executivo. Revista Forense, Rio de Janeiro: Revista dos Tribunais, v. 79, n. 284, p. 101, out./dez. 1983.

MORAES, Alexandre de. Direito constitucional. 12. ed. São Paulo: Atlas, 2001. 804 p.

PALU, Oswaldo Luiz. Controle de constitucionalidade: conceitos, sistemas e efeitos. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1999.

POLETTI, Ronaldo R. de Britto. Controle da constitucionalidade das leis. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2000.

SOARES, Lucéia Martins. Poder executivo e inconstitucionalidade de leis. Revista de Direito Constitucional e Internacional, São Paulo: Revista dos Tribunais, ano 10, p. 225-250, abr.-jun. 2002.

VELOSO, Zeno. Controle jurisdicional de constitucionalidade. 3. ed. Belo Horizonte: Del Rey, 1999.

ZIMMERMANN, Augusto. Princípios fundamentais e interpretação constitucional. Achegas.net, Rio de Janeiro, n. 9, jul. 2003. Disponível em: <http://www.achegas.net/numero/nove/augusto_zimmermann_09.htm>. Acesso em: 15 set. 2005.


Notas

  1. ALEXY, Robert. Teoria de Los Derechos Fundamentales. Centro de Estudios Constitucionales. Madrid, 1997, p. 81 e ss.
  2. Análise de Ronald Dworkin das normas jurídicas pode ser encontrado em BONAVIDES, Paulo, Curso de Direito Constitucional, Malheiros, 9ª ed., 2000, p. 256-265).
  3. CARVALHO FILHO, José dos Santos, Manual de Direito Administrativo, 17ª edição, rev, am e atual, Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2007.
  4. KELSEN, Hans. Apud, TOURINHO, Rita, Discricionariedade Administrativa: Ação de Improbidade e Controle Principiológico. Curitiba: Juruá, 2004, p. 26.
  5. TOURINHO, Rita, ob. Cit. p. 29.
  6. FRANCA FILHO, Marcílio Toscano, A Alemanha e o Estado de Direito: apontamentos de teoria constitucional comparada. Revista de Informação Legislativa, Brasília a. 34 n. 133 jan./mar. 1997, p.109-118.
  7. BANDEIRA DE MELLO, Celso Antônio, RDP nº 90, p. 57-58. Apud CARVALHO FILHO, José dos Santos, 2007, p. 17.
  8. MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro, 33ª ed., São Paulo: Malheiros, 2008.
  9. MENDES, Gilmar Ferreira; COELHO, Mártires Inocêncio e BRANCO, Paulo Gustavo Gonet, Curso de Direito Constitucional, 2ª ed. Rev. E atual, São Paulo: Saraiva, 2008, p. 829.
  10. Importante salientar resumidamente que a atividade administrativa vinculada é aquela em que o agente público só poderá atuar nos limites em que a lei definir. Entretanto, a atividade administrativa discricionária é aquela em que o agente poderá avaliar a oportunidade e a conveniência para prática de um ato em prol da coletividade.
  11. MORAES, Germana de Oliveria, Controle Jurisdicional da Administração Pública, p. 76-79. Apud CARVALHO FILHO, José dos Santos, 2007, p. 32.
  12. O artigo 272/2 CRP dispõe sobre o princípio da proporcionalidade em sede de atividade policial, visto que as medidas policiais não devem ser usadas para além do estritamente necessário.
  13. CARVALHO FILHO, José dos Santos, 2007, p. 32-33.
  14. COLAÇO ANTUNES, Luís Filipe, Interesse Público, Proporcionalidade e Mérito: Relevância e Autonomia Processual do Princípio da Proporcionalidade, separata de Estudos em Homenagem à Professora Doutora Isabel de Magalhães Collaço, vol. II, Editora Almedina, p. 540.Vale ressaltar que o princípio da razoabilidade é utilizado na Administração Pública dos diferentes ordenamentos jurídicos. No Brasil, alguns doutrinadores o aplicam como subprincípio da proporcionalidade.
  15. Importante salientar, que no Brasil não há controle jurisdicional do mérito administrativo (oportunidade e conveniência) quando não há violação da legalidade em sentido estrito, há apenas o controle dos limites legais da discricionariedade administrativa. Assim como nos Tribunais Administrativos (contencioso administrativo) há controle de legalidade e dos limites ao mérito, como por exemplo, no sistema jurídico português, alemão e espanhol.
  16. COLAÇO ANTUNES, Luís Filipe, ob. cit p. 542-546.
  17. COLAÇO ANTUNES, Luís Filipe, ob. cit p. 542-546.
  18. A. SANDULLI, La proporzionalità dell''azione amministrativa, ob. Cit. p. 364. Apud COLAÇO ANTUNES, Luís Filipe, ob. cit p. 545.
  19. CANOTILHO, J. J. Gomes. Direito Constitucional e Teoria da Constituição, Almedina, 1999, p. 264. Apud LEÃO. Anabela. Separata de Estudos em comemoração dos cinco anos da Faculdade de Direito da Universidade do Porto, ed. Coimbra, 2001, p. 1004.
  20. Idem.
  21. A doutrina brasileira denomina "poder de polícia" qualquer ação restritiva do Estado em relação aos direitos individuais, assim como a atuação da Administração no poder de restringir e condicionar a liberdade e a propriedade do administrado.
  22. CANAS, Vitalino. Apud LEÃO, Anabela. ob. Cit. p. 1008.
  23. CORREIA, Alves. Apud LEÃO. Anabela, ob. Cit. p. 1009.
  24. Maria Sylvia Zanella di Pietro, Hely Lopes Meirelles, Celso Antônio Bandeira de Mello, dentre outros.
  25. STF, Intervenção Federal nº 2.915-5, SP, Tribunal Pleno, rel. p/ o acórdão min. Gilmar Mendes, j. 03/02/2003 e publicado no DJU de 28/11/2003. Apud MALULY, Jorge Assaf. A Federalização da Competência para Julgamento dos Crimes Praticados Contra os Direitos Humanos. Boletim IBCCRIM. N° 148, março de 2005.
  26. GUERRA FILHO, Willis Santiago. Ensaios de Teoria Constitucional. Fortaleza: UFC, 1989.
  27. DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella, Direito Administrativo, 16ª ed. Rev. Atual. São Paulo: Atlas, 2003, p. 200-205.
  28. KELSEN, Hans, 1881-1973, Teoria Pura do Direito. Tradução João Baptista Machado, 7ª ed., São Paulo: Martins Fontes, 2006, p.246-249.
  29. DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella, 2003 ob. Cit. p. 200 e ss.
  30. AYALA, Bernardo Diniz de, O (Défice de) Controlo Judicial da Margem de Livre Decisão Administrativa, Lisboa: Editora Lex, p. 108.
  31. MEIRELLES, Hely Lopes, ob. Cit. p. 120 e ss.
  32. CARVALHO FILHO, José dos Santos, ob. Cit., p. 42.
  33. CAETANO, Marcello, Manual de Direito Administrativo, Lisboa 1937, p. 240 e ss. Apud SOUSA, António Francisco de, A Discricionariedade Administrativa: Origem e Evolução histórica no Sistema Continental Europeu. Estado actual dos reconhecimentos científicos. Considerações para o estreitamento e classificação do conceito de discricionariedade administrativa. Lisboa: Editora Danúbio, 1987, p. 272.
  34. CORREIA, Sérvulo, Legalidade e Autonomia Administrativa, p.471-475. Apud AYALA, ob. Cit., p. 107.
  35. FORSTHOFF, Ernest, Apud SOUSA, António Francisco de, ob. Cit. p. 271-272.
  36. A exemplo de Marcello Caetano baseado na definição de G. Jéze e de Bonnard
  37. SCHEUNER, VerwArchiv 33, p. 68 e seg. Apud SOUSA, António Francisco de,, ob. Cit. p. 273
  38. SOUSA, António Francisco de,, ob. Cit., p. 276 e 277.
  39. JZ, Bullinger, 1984, p. 1001 e ss. Apud SOUSA, António Francisco de,, ob. Cit., p. 280 e 281.
  40. Idem.
  41. Rhinow. Apud SOUSA, António Francisco de,, ob. Cit.p. 328-329.
  42. Acredito que não há tipos de discricionariedade, mas sim, formas de classifícá-las.
  43. JZ, Bullinger, 1984, p. 1001 e ss. Apud SOUSA, António Francisco de,, ob. Cit., p.286-288.
  44. Idem.
  45. Denominação mencionada por Bernardo Diniz de Ayala.
  46. SOUSA, António Francisco de,, ob. Cit., p. 293.
  47. DI PIETRO, Maria Sylva Zanella, ob. Cit. 2003, p.205 e ss.
  48. SOUSA, António Francisco de,, ob. Cit., p. 312.
  49. Ibid, p.325-328.
  50. Segundo Carvalho Filho é a ponderação de interesses na análise dos motivos e do objeto do ato administrativo.
  51. MEIRELLES, Hely Lopes, ob. Cit. p. 125 e ss.
  52. Recurso Ordinário em sede de Mandado de Segurança nº 1288/91 – São Paulo, 4ª Turma, Ministro Cesar Asfor Rocha, publicado no DJ 1994, p. 9.964. Apud CARVALHO FILHO, José dos Santos, ob. Cit. p. 115.
  53. AYALA, Bernardo Diniz de, ob. Cit. p. 173-174.
  54. Ibid, ob. Cit. p. 176-181.
  55. OTERO, Paulo, Conceito e Fundamento..., 200. Apud AYALA, Bernardo Diniz de, ob. Cit. p. 145.
  56. AYALA, Bernardo Diniz de, ob. Cit. p. 181.
  57. Ibid, ob. Cit. p. 250-252.
  58. HEIN, Eckart, O controle judicial das decisões administrativas discricionárias. Artigo apresentado na Conferência proferida no Seminário Internacional "A Tutela Judicial no Sistema Multinível", realizado pelo Centro de Estudos Judiciários do Conselho da Justiça Federal, nos dias 20 e 21 de setembro de 2004, no auditório do Instituto Rio Branco, em Brasília-DF. Publicado na Revista do Conselho da Justiça Federal, Brasília, nº 27, p. 18-23, out./dez. 2004.
  59. COLAÇO ANTUNES, Luís Filipe, ob. Cit. p. 550.
  60. Ibid, p. 554-555.
  61. AYALA, Bernardo Diniz de, ob. Cit. p.146-147.
  62. AYALA, Bernardo Diniz de, ob. Cit. p. 161-162.
  63. COLAÇO ANTUNES, Luís Filipe, ob. Cit. p. 554-555.
  64. Ibid p. 552.
  65. AYALA, Bernardo Diniz de, ob. Cit. p. 228-229.
  66. Superior Tribunal de Justiça, Relator Min. Hélio Mosimenn, REsp 109.710/PR, 2ª Turma, DJ de 22 abr. 1997. Disponível em www.stj.gov.br. Acesso em 8/02/2009.
  67. AYALA, Bernardo Diniz de, ob. Cit. p. 242.
  68. Ibid, p.242-243.
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Sobre a autora
Natalia Mascarenhas Simões

Graduada em Direito pela Universidade Federal do Pará, Brasil. Advogada. Pós-graduada em Direito Público pela Universidade Católica Dom Bosco/ CPC Marcato (lato sensu), Goiânia, Goiás, Brasil. Mestranda em Direito na área de especialização jurídico-política pela Faculdade de Direito da Universidade do Porto, Portugal. Doutoranda na área de especialização de Direito Público pela Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

SIMÕES, Natalia Mascarenhas. Princípio da legalidade e da proporcionalidade como limites à discricionariedade administrativa.: Ordenamento jurídico brasileiro e português. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 15, n. 2429, 24 fev. 2010. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/14402. Acesso em: 26 abr. 2024.

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