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A inconstitucionalidade do Precedente Administrativo nº 65 do Ministério do Trabalho e Emprego - MTE

11/03/2010 às 00:00
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Sumário: Introdução. 1 – Histórico Legislativo. 2 – Empregado Safrista. 3 – Fundo de Garantia do Tempo de Serviço – FGTS. 4. Divergência Doutrinária Quanto à Matéria. 4.1. O FGTS não Substituiu a Indenização ao Empregado Safrista. 4.2. O FGTS Substituiu a Indenização ao Empregado Safrista. 4.3. A Vertente mais Consentânea à Ordem Jus Trabalhista – Constitucional. 5. Conclusão. Bibliografia


INTRODUÇÃO

Em 27 de maio de 2005, foi publicado no Diário Oficial da União, na seção 1, página 119, o Ato Declaratório SIT/MTE n.º 9, que alterou o Precedente Administrativo n.º 45 e aprovou os Precedentes Administrativos de n.º 61 a 70.

Em relação ao meio rural, a grande alteração trazida com esta publicação refere-se ao Precedente n.º 65, que prevê a necessidade de o empregador rural que contrata trabalhador safrista indenizá-lo ao término do contrato: 1) com 1/12 avos do salário percebido mensalmente ou por fração superior a 14 (quatorze) dias; e 2) com o FGTS (8% do salário mensal).

De acordo com esse entendimento, o depósito do FGTS seria apenas um plus à indenização já prevista em lei especial e não um substituto desta.

PRECEDENTE ADMINISTRATIVO N.º 65 RURÍCULA. CONTRATO DE SAFRA. INDENIZAÇÃO AO TÉRMINO DO CONTRATO. FGTS. COMPATIBILIDADE. O art. 14 da Lei n.º 5.889, de 8 de junho de 1973, foi recepcionado pela Constituição Federal de 1988, devendo tal indenização ser cumulada com o percentual do FGTS devido na dispensa. No contrato de safra se permite a dualidade de regimes, onde o acúmulo de direitos corresponde a um plus concedido ao safrista. Não há de se falar, portanto, em bis in idem ao empregador rural.

REFERÊNCIA NORMATIVA: art. 14 da Lei n.º 5.889, de 8 de junho de 1973 e art. 13, inciso IX da Instrução Normativa/SIT n.º 25, de 20 de dezembro de 2001.

Com amparo neste precedente, Auditores Fiscais do Ministério do Trabalho e Emprego passaram a autuar intensamente os empregadores rurais que deixam de indenizar o empregado, nas rescisões do contrato por safra, mesmo que os empregadores tenham recolhido o FGTS correspondente.

No entanto, em 1988 houve a equiparação dos direitos dos trabalhadores rurais aos urbanos pelo poder constituinte originário, elevando o FGTS à condição de preceito constitucional.

Com isso, duas correntes surgiram acerca do tema. A primeira delas sustenta que o FGTS não afetou as indenizações inerentes ao contrato de safra, devendo-se aplicar, concomitantemente, ambas as formas indenizatórias. Já a segunda vertente sustenta que o FGTS substituiu a indenização ao empregado safrista.

Assim, pelo que se passa a demonstrar, a segunda vertente é a que parece encontrar maior guarida em nosso atual ordenamento jurídico.


1. HISTÓRICO LEGISLATIVO

As relações de trabalho eram disciplinadas por legislação esparsa e, a partir de 1916, pelo código civil, que regulava a locação de serviços, a empreitada e a parceria rural.

Com o advento da Consolidação das Leis do Trabalho - CLT, em 1º de maio de 1943, foi instituído o regime jurídico da relação de emprego urbana, excluindo-se de sua esfera normativa o trabalho rural, nos termos do art. 7º, "b", da CLT.

Nesse diploma, encontram-se regulados a definição de empregado e empregador, jornada de trabalho, intervalos, hora extra, férias, direito a indenização por tempo de serviço, estabilidade decenal, estes dois últimos devidos somente aos empregados contratados por prazo indeterminado, entre outros.

Art. 478 - A indenização devida pela rescisão de contrato por prazo indeterminado será de 1 (um) mês de remuneração por ano de serviço efetivo, ou por ano e fração igual ou superior a 6 (seis) meses.

§ 1º - O primeiro ano de duração do contrato por prazo indeterminado é considerado como período de experiência, e, antes que se complete, nenhuma indenização será devida.

§ 2º - Se o salário for pago por dia, o cálculo da indenização terá por base 25 (vinte e cinco) dias.

§ 3º - Se pago por hora, a indenização apurar-se-á na base de 200 (duzentas) horas por mês.

§ 4º - Para os empregados que trabalhem a comissão ou que tenham direito a percentagens, a indenização será calculada pela média das comissões ou percentagens percebidas nos últimos 12 (doze) meses de serviço. (Redação dada pelo Decreto-lei nº 229, de 28.2.1967)

§ 5º - Para os empregados que trabalhem por tarefa ou serviço feito, a indenização será calculada na base média do tempo costumeiramente gasto pelo interessado para realização de seu serviço, calculando-se o valor do que seria feito durante 30 (trinta) dias. (Art. 478 da CLT)

Na década de 60, a Lei 5.107/66 instituiu, inicialmente de forma optativa, o regime jurídico do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço.

Já na década de 70, com o advento da Lei 5.889/73, foi instituído o regime jurídico da relação de trabalho rural.

Art. 1º As relações de trabalho rural serão reguladas por esta Lei e, no que com ela não colidirem, pelas normas da Consolidação das Leis do Trabalho, aprovada pelo Decreto-lei nº 5.452, de 01/05/1943.

Parágrafo único. Observadas as peculiaridades do trabalho rural, a ele também se aplicam as leis nºs 605, de 05/01/1949, 4090, de 13/07/1962; 4725, de 13/07/1965, com as alterações da Lei nº 4903, de 16/12/1965 e os Decretos-Leis nºs 15, de 29/07/1966; 17, de 22/08/1966 e 368, de 19/12/1968. (Art. 1º, da Lei 5.889/73)

Nesse diploma legal restou consignado que lei especial iria dispor sobre a aplicação ao trabalhador rural do regime do FGTS.

Art. 20. Lei especial disporá sobre a aplicação ao trabalhador rural, no que couber, do regime do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço. (Art. 20 da Lei 5.889/73)

No ano de 1974, a lei do trabalho rural foi regulamentada pelo Decreto 73.626/74, que em seu artigo 4º trouxe de forma expressa uma lista de artigos da CLT aplicáveis ao regime jurídico do rural.

Art. 4º Nas relações de trabalho rural aplicam-se os artigos 4º a 6º; 8º a 10; 13 a 19; 21; 25 a 29; 31 a 34; 36 a 44; 48 a 50; 62 alínea b; 67 a 70; 74; 76; 78 e 79; 83; 84; 86; 116 a 118; 124; 126; 129 a 133; 134 alíneas a, c, d, e, e f; 135 a 142; parágrafo único do artigo 143; 144; 147; 359; 366; 372; 377; 379; 387 a 396; 399; 402; 403; 405 caput e § 5º; 407 a 410; 414 a 427; 437; 439; 441 a 457; 458 caput e § 2º; 459 a 479; 480 caput e § 1º; 481 a 487; 489 a 504; 511 a 535; 537 a 552; 553 caput e alíneas b, c, d, e e, e §§ 1º e 2º; 554 a 562; 564 a 566; 570 caput; 601 a 603; 605 a 629; 630 caput e §§ 1º, 2º, 3º, 4º, 5º, 7º e 8º; 631 a 685; 687 a 690; 693; 694; 696; 697; 699 a 702; 707 a 721; 722 caput, alíneas b e c e §§ 1º, 2º e 3º; 723 a 725; 727 a 733; 735 a 754; 763 a 914; da Consolidação das Leis do Trabalho, aprovada pelo Decreto-lei nº 5.452, de 1º de maio de 1943; com suas alterações. (Art. 4º, Decreto 73.626/74, taxa os artigos da CLT aplicáveis ao regime jurídico do empregado rural)

Na década de 80, com o advento da Constituição de 1988, o regime jurídico do FGTS foi elevado à condição de preceito constitucional, tornando-se obrigatório para todos os empregados urbanos e rurais, à exceção da empregada doméstica, independentemente do contrato de trabalho ser a termo ou não.

Art. 7º. São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social:

[...]

III. Fundo de garantia por tempo de serviço;

[...]. (CF/88).

Atualmente, a lei 8.036/90 regulamenta o FGTS.


2. EMPREGADO SAFRISTA

A Lei 5.889/73 teve por objetivo a instituição do regime jurídico do trabalhador rural. Nesse diploma, encontram-se regulados a definição de empregado e empregador rural, jornada de trabalho, intervalos entre jornadas, entre outros.

Foi por meio desse diploma que se estabeleceu o regime jurídico da relação empregatícia rural, sendo que as normas contidas na Consolidação das Leis do Trabalho – CLT serão, pois, aplicadas tão somente quando expressamente determinada.

Art. 7º Os preceitos constantes da presente Consolidação salvo quando fôr em cada caso, expressamente determinado em contrário, não se aplicam: a) aos empregados domésticos, assim considerados, de um modo geral, os que prestam serviços de natureza não-econômica à pessoa ou à família, no âmbito residencial destas;

b) aos trabalhadores rurais, assim considerados aqueles que, exercendo funções diretamente ligadas à agricultura e à pecuária, não sejam empregados em atividades que, pelos métodos de execução dos respectivos trabalhos ou pela finalidade de suas operações, se classifiquem como industriais ou comerciais;

[...] (Art. 7º da CLT)

Em seu artigo 14, o legislador estabeleceu um regime jurídico especial para uma determinada categoria de empregado rural, o safrista, cuja duração do contrato de trabalho depende das variações estacionais das atividades agrárias, assim entendidas as tarefas normalmente executadas no período compreendido entre o preparo do solo para o cultivo e a colheita.

Art. 14. Expirado normalmente o contrato, a empresa pagará ao safrista, a título de indenização do tempo de serviço, importância correspondente a 1/12 (um doze avos) do salário mensal, por mês de serviço ou fração superior a 14 (quatorze) dias.

Parágrafo único. Considera-se contrato de safra o que tenha sua duração dependente de variações estacionais da atividade agrária. (Art. 14, Lei 5.889/73)

Trata-se, pois, de um contrato a termo, que dada a suas particularidades à época, o legislador pátrio instituiu uma indenização pelo tempo de serviço correspondente a 1/12 do salário mensal, por mês ou fração superior a 14 dias.


3. FUNDO DE GARANTIA DO TEMPO DE SERVIÇO - FGTS

O regime jurídico do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço - FGTS foi criado no ano de 1966, através da Lei nº 5.107. Inicialmente, o mesmo era optativo e devido somente aos empregados regidos pela CLT e contratados por prazo indeterminado.

Art. 1º Para garantia do tempo de serviço ficam mantidos os Capítulos V e VII do Título IV da Consolidação das Leis do Trabalho, assegurado, porém, aos empregados o direito de optarem pelo regime instituído na presente Lei.

[...] (Art. 1º, da Lei 5.107/66, texto original publicado no ano de 1966)

Art. 2º Para os fins previstos nesta Lei, tôdas as emprêsas sujeitas à Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) ficam obrigadas a depositar, até o dia 20 (vinte) de cada mês, em conta bancária vinculada, importância correspondente a 8% (oito por cento) da remuneração paga no mês anterior a cada empregado, optante ou não, excluídas as parcelas não mencionadas nos arts. 457 e 458 da CLT.

Parágrafo único. As contas bancárias vinculadas aludidas neste artigo serão abertas em nome do empregado que houver optado pelo regime desta Lei, ou em nome da emprêsa, mas em conta individualizada, com relação ao empregado não optante. (Art. 2º, da Lei 5.107/66, texto original publicado no ano de 1966)

Este novo regime jurídico surgido na década de 60 tinha por objetivo extinguir a estabilidade decenal dos empregados regidos pela CLT e, consequentemente, a indenização por tempo de serviço contemplada, sobretudo, no artigo 478 da CLT.

Com a opção pelo FGTS, o empregador era obrigado a efetuar depósito mensal em conta vinculada, no importe de 8% da remuneração mensal, inclusive sobre o décimo terceiro salário, resgatáveis pelo empregado ao final do contrato de trabalho.

Em uma análise sistemática dos dois regimes verifica-se uma só natureza jurídica, a de indenizar os empregados pelo tempo de serviço, inclusive guardando uma simetria entre o "quanto" indenizatório.

Contudo, o regime jurídico do FGTS não se aplicava aos empregados rurais, que continuavam a ser indenizados pelo tempo de serviço de acordo com a previsão do art. 478 da CLT.

Art. 4º Nas relações de trabalho rural aplicam-se os artigos 4º a 6º; 8º a 10; 13 a 19; 21; 25 a 29; 31 a 34; 36 a 44; 48 a 50; 62 alínea b; 67 a 70; 74; 76; 78 e 79; 83; 84; 86; 116 a 118; 124; 126; 129 a 133; 134 alíneas a, c, d, e, e f; 135 a 142; parágrafo único do artigo 143; 144; 147; 359; 366; 372; 377; 379; 387 a 396; 399; 402; 403; 405 caput e § 5º; 407 a 410; 414 a 427; 437; 439; 441 a 457; 458 caput e § 2º; 459 a 479; 480 caput e § 1º; 481 a 487; 489 a 504; 511 a 535; 537 a 552; 553 caput e alíneas b, c, d, e e, e §§ 1º e 2º; 554 a 562; 564 a 566; 570 caput; 601 a 603; 605 a 629; 630 caput e §§ 1º, 2º, 3º, 4º, 5º, 7º e 8º; 631 a 685; 687 a 690; 693; 694; 696; 697; 699 a 702; 707 a 721; 722 caput, alíneas b e c e §§ 1º, 2º e 3º; 723 a 725; 727 a 733; 735 a 754; 763 a 914; da Consolidação das Leis do Trabalho, aprovada pelo Decreto-lei nº 5.452, de 1º de maio de 1943; com suas alterações. (Art. 4º, Decreto 73.626/74, taxa os artigos da CLT aplicáveis ao regime jurídico do empregado rural – original sem grifo)

Com a Carta Magna de 1988, o regime jurídico do FGTS foi elevado à condição de preceito constitucional, tornando-se obrigatório para todos os empregados rurais e urbanos, independentemente do tipo de contrato, se a termo ou não.

Art. 7º. São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social:

[...]

III. Fundo de garantia por tempo de serviço;

[...]. (CF/88).

Atualmente, o FGTS encontra-se regulado pela Lei 8.036/90.

Art. 1º O Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS), instituído pela Lei nº 5.107, de 13 de setembro de 1966, passa a reger-se por esta lei.

Art. 15. Para os fins previstos nesta lei, todos os empregadores ficam obrigados a depositar, até o dia 7 (sete) de cada mês, em conta bancária vinculada, a importância correspondente a 8 (oito) por cento da remuneração paga ou devida, no mês anterior, a cada trabalhador, incluídas na remuneração as parcelas de que tratam os arts. 457 e 458 da CLT e a gratificação de Natal a que se refere a Lei nº 4.090, de 13 de julho de 1962, com as modificações da Lei nº 4.749, de 12 de agosto de 1965.

§ 1º Entende-se por empregador a pessoa física ou a pessoa jurídica de direito privado ou de direito público, da administração pública direta, indireta ou fundacional de qualquer dos Poderes, da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, que admitir trabalhadores a seu serviço, bem assim aquele que, regido por legislação especial, encontrar-se nessa condição ou figurar como fornecedor ou tomador de mão-de-obra, independente da responsabilidade solidária e/ou subsidiária a que eventualmente venha obrigar-se.

§ 2º Considera-se trabalhador toda pessoa física que prestar serviços a empregador, a locador ou tomador de mão-de-obra, excluídos os eventuais, os autônomos e os servidores públicos civis e militares sujeitos a regime jurídico próprio.

§ 3º Os trabalhadores domésticos poderão ter acesso ao regime do FGTS, na forma que vier a ser prevista em lei.

[...] (Original sem grifo)

Art. 20. A conta vinculada do trabalhador no FGTS poderá ser movimentada nas seguintes situações:

I - despedida sem justa causa, inclusive a indireta, de culpa recíproca e de força maior; (Redação dada pela Medida Provisória nº 2.197-43, de 2001)

[...]

IX - extinção normal do contrato a termo, inclusive o dos trabalhadores temporários regidos pela Lei nº 6.019, de 3 de janeiro de 1974;

[...] (Original sem grifo)

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4. DIVERGÊNCIA DOUTRINÁRIA QUANTO À MATÉRIA

Pelo inciso III do art. 7º da Constituição Federal, o trabalhador rural e o urbano foram equiparados, sendo que aquele passou a ter direito ao FGTS. A partir daí, surgiu um questionamento: teria ou não o art. 14, da Lei 5.889/73, sido recepcionado pela atual constituição?

Duas correntes surgiram a esse respeito. A primeira delas sustenta que o FGTS não afetou as indenizações inerentes ao contrato de safra, devendo-se aplicar, concomitantemente, ambas as formas indenizatórias. Já a segunda vertente sustenta que o FGTS substituiu a indenização ao empregado safrista.

4.1. O FTGS NÃO SUBSTITUIU A INDENIZAÇÃO AO EMPREGADO SAFRISTA

A primeira vertente defende que o inciso III do art. 7º da CF/88 veio revogar apenas a indenização por tempo de serviço dos contratos de trabalho por prazo indeterminado (art. 478 da CLT), não afetando a indenização inerente ao contrato de safra.

Segundo esta corrente, o contrato de safra permite a dualidade de regimes, onde o acúmulo de indenizações corresponderia a um plus concedido ao empregado rural safrista. Não há que se falar, portanto, em bis in idem ao empregador rural.

A esta corrente se filia o Ilustre Doutrinador Mauricio Godinho Delgado que em sua obra, Curso de Direito do Trabalho, sustenta serem devidas ambas as indenizações por tempo de serviço, a do art. 14 da Lei 5.889/73 e o FGTS.

2. Contrato de Safra

(...)

Há uma parcela especial, porém, aventada pelo art. 14, da Lei n. 5.889/73: a indenização por tempo de serviço. Prevê a Lei de Trabalho Rural que, expirado o contrato em seu termo final, o empregador pagará ao safrista "a título de indenização do tempo de serviço", valor correspondente a 1/12 do salário mensal obreiro, por mês de serviço ou fração acima de 14 dias.

A partir da Carta Constitucional de 1988, uma nova polêmica surgiu. À medida em que a Constituição estendeu o FGTS a todo empregado (exceto ao doméstico), também o safrista passou a ter direito a essa parcela trabalhista (art. 7º, III, da CF/88). Terá sido revogada, tacitamente, a norma concessora da indenização especial do tempo de serviço (art. 7º, I, da CF/88 versus art. 14, parágrafo único, Lei n. 5.889/73)?

Duas posições existem a esse respeito. A primeira, sustentando que a norma constitucional citada teria revogado todas as indenizações por tempo de serviço existentes, desde a do art. 477, caput, da CLT, até a do empregado safrista.

A segunda posição entende que a indenização do contrato de safra (que é contrato a termo) não se confunde com a indenização tradicional da CLT, que era inerente apenas a contratos sem prazo fixo. Esta última é que teria sido revogada pela Constituição, que previa, em seu art. 7º, I, "relação de emprego protegida contra despedida arbitrária ou sem justa causa..." Ora, o texto constitucional dirigir-se-ia apenas aos contratos por tempo indeterminado, por não se cogitar, em regra, de garantia de emprego em contrato a termo. O comando constitucional não estaria dirigido, pois às regras dos contratos a termo existentes no Direito brasileiro.

Para esta segunda posição interpretativa, a discussão proposta seria semelhante àquela já enfrentada com respeito aos contratos a termo em geral, no tocante à indenização do art. 479 da CLT – não havendo por que não se estender a mesma conduta interpretativa (En. 125, TST). Neste quadro, seria bastante lógico aferir-se que não teria havido tal revogação, por inexistir incompatibilidade de institutos. É que o FGTS tornou-se direito geral dos empregados, devido em contratos meramente indeterminados ou com duração prefixada. Nestes últimos, seu saque é autorizado desde que se extinga o contrato em seu termo final ou seja ele rompido por decisão unilateral antecipatória do empregador. A compensação que poderia ser ventilada, no máximo, seria aquela envolvente apenas aos 40% do Fundo (dado que o art. 10, I, do ADCT constitucional equipara os 40% mencionados à indenização compensatória pela dispensa que menciona no art. 7º, I) – se ocorrida, obviamente, dispensa antecipada do safrista. O mesmo fundamento não permitiria, contudo, a compensação relativa aos próprios depósitos do Fundo, já que estes passaram a se constituir em parcela autônoma à eventual indenização.

Na direção da segunda corrente interpretativa já se encaminhava o texto do Enunciado 125, TST (embora este seja anterior a 1988). Por fim, o decreto regulamentador do FGTS especificou que inexiste compensação ou supressão sequer dos 40% de acréscimo sobre o Fundo de Garantia em situações de ruptura antecipada por ato empresarial (art. 14, Decreto n. 99.684/90). Embora o efetivo bis in idem deva ser repelido (indenização rescisória mais os 40% sobre o Fundo), não pode haver dúvida de que a indenização especial safrista não se prejudica pelo saque dos simples depósitos de FGTS. (DELGADO, Maurício Godinho; Curso de Direito do Trabalho. Editora LTr, São Paulo, 4ª ed., 2005, pág. 548/50).

4.2. O FGTS SUBSTITUIU A INDENIZAÇÃO AO EMPREGADO SAFRISTA

Esta corrente defende que a referida norma constitucional veio revogar todas as indenizações por tempo de serviço existentes, inclusive a indenização prevista no art. 14 da Lei 5.889/73.

A fundamentação deste entendimento esteia-se no argumento de que a nova Carta Magna veio equiparar os empregados, urbanos e rurais, estendendo a ambos o direito ao FGTS, substituindo a indenização de que tratava a Lei N.º 5.889/73.

Equiparado o empregado rural ao urbano, com a Constituição Federal de 1988, inclusive no direito ao FGTS (art. 7º, III), não mais haveria razão para que o empregador continuasse a pagar a indenização do art. 14 da Lei 5.889/73, já que o FGTS possui o mesmo caráter de garantia da aludida indenização.

Para esta vertente, exigir ambas as indenizações é pagar duas vezes a mesma verba, o que caracteriza o bis in idem, inadmissível em nosso ordenamento jurídico.

A esta corrente se Alice Monteiro de Barros onde sustenta que a Constituição Federal de 1988, ao conceder ao safrista o direito do FGTS retirou-lhe a indenização do art. 14 da Lei 5.889/73. Diz mais que, em se dando a rescisão do contrato de trabalho de safra, antes do prazo, o empregador terá de pagar ao empregado a multa de 40% do FGTS e a indenização do art. 479 da CLT.

Contrato de safra

(...)

A legislação em questão estabelece que a indenização do safrista ao término do contrato será de 1/12 do salário mensal, por mês de serviço ou fração igual ou superior a 15 dias. Ocorre que a Constituição da República de 1988, ao assegurar ao safrista o FGTS, retirou-lhe a indenização por duodécimos em período concomitante. Logo, terminado contrato de safra, defere-se o levantamento da conta vinculada, e não a indenização em duodécimos.

Na hipótese de ruptura pelo empregador, sem justa causa, antes do término final do contato de safra, autoriza-se o levantamento do FGTS, acrescido de 40%, nos termos do art. 14 do Decreto n. 99.684, de 1990, sem prejuízo do disposto no art. 479 da CLT, isto é, asseguram-se, ainda, os salários do tempo restante do contrato pela metade.

Vejamos o preceito em questão:

"Art. 14: No caso de contrato a termo, a rescisão antecipada, sem justa causa ou com culpa recíproca, equipara-se às hipóteses previstas nos parágrafos 1º e 2º do art. 9º, respectivamente, sem prejuízo do disposto no art. 479 da CLT" (grifou-se).

A hipótese prevista no § 1º do art. 9º, citado no preceito legal acima, autoriza o levantamento do FGTS acrescido de 40% e o art. 479 da CLT prevê a indenização correspondente aos salários do tempo restante do contrato pela metade. (BARROS, Alice Monteiro; Curso de Direito do Trabalho. Editora LTr, São Paulo, 2ª ed., 2006, pág. 413/4).

O jurista Luiz Carlos Cândido Martins Sotero Silva, por sua vez também defende que a indenização do art. 14 da Lei 5.889/73 não mais existe, ante a Constituição Federal de 1988 (art. 7º, III), em razão de norma constitucional se sobrepor hierarquicamente à norma ordinária. Corroborando o entendimento, em seu texto cita Maria Helena Diniz. Na transcrição abaixo, omitimos os textos de doutrinadores terceiros, pois eles já estão transcritos nos itens respectivos (Ministro Maurício Godinho e Desembargadora Alice Monteiro de Barros).

Sustenta, ainda, que se ocorrer a rescisão do contrato de trabalho antes do término, o empregado ainda faz jus à indenização do art. 479 da CLT.

Do confronto da indenização em debate com o direito constitucional ao FGTS, surgiram duas correntes a cerca do tema, como salienta Maurício Godinho Delgado, in verbis:

"Duas posições existem (...)

Alice Monteiro de Barros salienta que "A Constituição Federal de 1988, "ao assegurar (...)". Entretanto, o Colendo Tribunal Superior do Trabalho, apreciando a questão, já se pronunciou, por intermédio da sua Segunda Câmara, pela compatibilidade da indenização do art. 14 da Lei 5.889/73 com o regime do FGTS, consoante ilustrativa ementa decisória, in verbis:

(...)

Quer nos parecer, contudo, que a indenização ao safrista, estampada na Lei do Trabalho Rural, não encontra mais guarida no ordenamento jurídico pátrio. A bem da verdade, privilegiou-se no caso em exame, o critério hierárquico sobre o especial, uma vez que se fez prevalecer a norma constitucional sobre a lei específica (Lei 5.889/73).

Nesse contexto, oportuna a referências lições de Maria Helena Diniz, que assim ressalta:

Com a implantação da nova Carta, ante sua supremacia, ter-se-á a subordinação da ordem jurídica aos novos preceitos. Deve haver compatibilidade de um dispositivo legal com a norma constitucional. Havendo contradição entre qualquer norma preexistente e preceito constitucional, esta deve, dentro do sistema, ser aferida com rigor, pois é indubitável o efeito ab-rogativo da Constituição Federal sobre todas as normas e atos normativos que com ela conflitarem. As normas conflitantes ficam imediatamente revogadas na data da promulgação da nova Carta, não sendo nem mesmo necessárias quaisquer cláusulas expressas de revogação. Tal ocorre porque, com a promulgação da Lei Maior, cria-se uma nova ordem jurídica, à qual devem ajustar-se todas as normas, sejam elas gerais ou individuais.

Considerando-se que anteriormente à Carta Republicana de 12/10/88 não era conferido aos trabalhadores rurais o direito ao FGTS (nada obstante o art. 20 da Lei do Rural dispusesse sobre o assunto, jamais tendo sido ele efetivado mediante lei específica), justificava-se a indenização do art. 14 da lei 5.889/73. Com o atual sistema, porém, não mais o porquê de seu recebimento. Assim, não subsiste, hodiernamente, o direito do trabalhador safrista ao recebimento da indenização rescisória em comento.

Nesse passo, expirado normalmente o contrato de safra, o empregado fará jus: salário/saldo de salário; 13º salário proporcional e férias proporcionais acrescidas de um terço, sendo autorizado a levantar os depósitos do FGTS.

Na hipótese do contrato ser rescindido antes do seu termo final, por iniciativa do empregador, sem justa causa, receberá ainda uma indenização equivalente à metade do valor a que teria direito até o fim do contrato de safra, por inteligência do art. 479 da CLT. (SILVA, Luiz Carlos Cândido Martins Sotero; Direito do Trabalho Rural – homenagem a Irany Ferrari/ Coordenado por Francisco Alberto da Motta Peixoto Gioordani, Melchíades Rodrigues Martins e Tarcio José Vidotti. Editora LTr, São Paulo, 2ª ed., 2005, pág. 364/7).

O jurista Wilson Pocidônio Da Silva, na mesma linha dos anteriores, porém de forma mais sintética reconhece que a indenização do art. 14 da Lei 5.889/73 não mais é devida, em razão da substituição pelos depósitos do FGTS.

O período de cada safra é considerado como um contrato distinto e independente e por esta razão se rixou a obrigação de indenizar o safrista a cada término do contrato de safra (art. 14 da lei n. 5.889/73), embora, hoje, essa indenização seja substituída pelo levantamento dos depósitos do FGTS. (SILVA, Wilson Pocidônio; Direito do Trabalho Rural – homenagem a Irany Ferrari/ Coordenado por Francsico Alberto da Motta Peixoto Gioordani, Melchíades Rodrigues Martins e Tarcio José Vidotti. Editora LTr, São Paulo, 2ª ed., 2005, pág. 5577).

Da mesma forma manifesta-se Sérgio Pinto Martins:

No contrato de safra, expirado normalmente o contrato, a empresa pagará ao safrista, a título de indenização do tempo de serviço, a importância de 1/12 do salário mensal, por mês de serviço ou fração superior a 14 dias (art. 14 da Lei nº 5.889/73). O empregado rural passou a ter direito ao FGTS em 05-10-88, sendo que este substitui a referida indenização. (MARTINS, Sérgio Pinto; in Comentários à CLT. Editora Atlas, São Paulo, 12ª ed., 2008, pág. 361).

Amauri Mascaro Nascimento, um dos mais tradicionais dos doutrinadores em Direito do Trabalho, também está na mesma esteira dos doutrinadores mencionados acima:

"No contrato de safra, expirado normalmente o contrato a empresa, a título de indenização do tempo de serviço, a importância de 1/12 do salário mensal, por mês de serviço ou fração superior a 14 dias (art. 14 da Lei 5.889/73). O empregado rural passou a ter direito ao FGTS, em 5.10.88, sendo que substitui a antiga indenização por tempo de serviço (...)" (NASCIMENTO, Amauri Mascaro. O trabalho rural na Constituição de 1988. Regulamentação e realidade. Revista LTr, São Paulo, 59-10/1308).

De forma não divergente, Valentin Carrion, ao comentar o art. 479 da CLT, assim expressa:

O safrista, com contrato dependente das variações agrárias, pelo regime anterior à Constituição, tinha direito a: a) indenização pela expiração normal do contrato (1/12 de salário mensal por mês de serviço ou fração superior a 14 dias, Lei 5.889/73, art. 14); ou b) FGTS, se optante, o que só era possível se industriário. Pelo atual regime atualizado do FGTS, conclui-se que, quando da extinção natural de seu contrato a termo, faz jus não só ao saldo da conta vinculada, com ao acréscimo percentual da Constituição, pois o crédito legal tem a natureza de salário diferido pelo tempo transcorrido e não reparatório pelo futuro incumprido, com ocorre nas rupturas antecipadas. (CARRION, Valentin. Comentário à Consolidação das Leis do Trabalho. Editora Saraiva, São Paulo, 31ª Edição, 2006, pág. 377).

Iara Alves Cordeiro Pacheco também sustenta que o art. 14 da Lei 5.889/73 somente foi aplicado ao safrista até a Constituição de 1988.

O art. 14 da Lei 5.889/73 prevê o pagamento, a título de indenização do tempo de serviço, da importância correspondente a 1/12 (um doze avos) do salário normal, por mês de serviço ou fração superior a 14 (quatorze) dias. Tendo em vista que a Constituição Federal atual, estendeu aos rurais o FGTS, tal indenização deve ser substituída pelo levantamento dos depósitos, com pagamento direto da diferença. (PACHECO, Iara Alves Cordeiro; Trabalhador Rural, Revista do Tribunal da 15ª Região nº 4, jan-jul, Editora LTr).

4.3. A VERTENTE MAIS CONSENTÂNEA À ORDEM JUS TRABALHISTA - CONSTITUCIONAL

Com o advento do novo diploma constitucional em 1988 foi estabelecida a obrigatoriedade do regime jurídico do FGTS para todos os empregados urbanos e rurais.

Assim, o regime do FGTS substituiu compulsoriamente qualquer regime jurídico indenizatório por tempo de serviço previsto na legislação ordinária, não havendo sido, por exemplo, recepcionado o art. 478 da CLT.

Na mesma linha, o artigo 14, da Lei 5.889/73, que à época havia instituído um regime jurídico de indenização por tempo de serviço, também não foi recepcionado pela Carta Magna de 88, visto que esta instituiu expressamente um regime jurídico único para as indenizações por tempo de serviço.

Assim sendo, a interpretação constante do Precedente Normativo nº 65, do MTE é inconstitucional, vez que não encontra mais amparo em nosso ordenamento jurídico, face ao art. 14, da Lei 5.889/73, não ter sido recepcionado pela CF/88.

Vale ressaltar que a mera alteração do regime jurídico, no que tange as indenizações por tempo de serviço, não garante direitos futuros, resguardando tão somente o direito adquirido aos empregados rurais safristas da época.

Em outros dizeres, a norma constitucional que estabelece a compulsoriedade de regimes jurídicos tem eficácia imediata, ou seja, passa a produzir efeitos desde logo. Isto porque o poder constituinte originário é quem configura as bases do ordenamento jurídico, não podendo, dada a sua natureza, sujeitar-se às limitações normativas anteriores, ainda mais, de normas infraconstitucionais.

Ainda, ao contrário da interpretação constante do Precedente Administrativo nº 65 do MTE, corroborado pela primeira corrente doutrinária, de que o FGTS seria um plus concedido aos empregados safristas, é certo de que tal vertente é insustentável.

Tal interpretação não se sustenta, vez que não se extrai da norma constitucional nada mais do que a obrigatoriedade do regime do FGTS. Não há nenhum elemento textual que sustente a assertiva do citado precendete.

Somente uma nova lei poderia criar um adicional de indenização por tempo de serviço, mas não parece ser esta a intenção do legislador, visto que a recente Lei 11.708/08, que adicionou o art. 14-A à Lei 5.889/73, ao regulamentar a atividade do empregado rural temporário, não incluiu nenhum indenização adicional, similar a existente ao empregado safrista.

Art. 14-A. O produtor rural pessoa física poderá realizar contratação de trabalhador rural por pequeno prazo para o exercício de atividades de natureza temporária. (Incluído pela Lei nº 11.718, de 2008)

§ 1o A contratação de trabalhador rural por pequeno prazo que, dentro do período de 1 (um) ano, superar 2 (dois) meses fica convertida em contrato de trabalho por prazo indeterminado, observando-se os termos da legislação aplicável. (Incluído pela Lei nº 11.718, de 2008)

§ 2o A filiação e a inscrição do trabalhador de que trata este artigo na Previdência Social decorrem, automaticamente, da sua inclusão pelo empregador na Guia de Recolhimento do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço e Informações à Previdência Social – GFIP, cabendo à Previdência Social instituir mecanismo que permita a sua identificação. (Incluído pela Lei nº 11.718, de 2008)

§ 3o O contrato de trabalho por pequeno prazo deverá ser formalizado mediante a inclusão do trabalhador na GFIP, na forma do disposto no § 2o deste artigo, e: (Incluído pela Lei nº 11.718, de 2008)

I – mediante a anotação na Carteira de Trabalho e Previdência Social e em Livro ou Ficha de Registro de Empregados; ou 

II – mediante contrato escrito, em 2 (duas) vias, uma para cada parte, onde conste, no mínimo: (Incluído pela Lei nº 11.718, de 2008)

a) expressa autorização em acordo coletivo ou convenção coletiva; (Incluído pela Lei nº 11.718, de 2008)

b) identificação do produtor rural e do imóvel rural onde o trabalho será realizado e indicação da respectiva matrícula; (Incluído pela Lei nº 11.718, de 2008)

c) identificação do trabalhador, com indicação do respectivo Número de Inscrição do Trabalhador – NIT. (Incluído pela Lei nº 11.718, de 2008)

§ 4o A contratação de trabalhador rural por pequeno prazo só poderá ser realizada por produtor rural pessoa física, proprietário ou não, que explore diretamente atividade agroeconômica. (Incluído pela Lei nº 11.718, de 2008)

§ 5o A contribuição do segurado trabalhador rural contratado para prestar serviço na forma deste artigo é de 8% (oito por cento) sobre o respectivo salário-de-contribuição definido no inciso I do caput do art. 28 da Lei no 8.212, de 24 de julho de 1991. (Incluído pela Lei nº 11.718, de 2008)

§ 6o A não inclusão do trabalhador na GFIP pressupõe a inexistência de contratação na forma deste artigo, sem prejuízo de comprovação, por qualquer meio admitido em direito, da existência de relação jurídica diversa. (Incluído pela Lei nº 11.718, de 2008)

§ 7o Compete ao empregador fazer o recolhimento das contribuições previdenciárias nos termos da legislação vigente, cabendo à Previdência Social e à Receita Federal do Brasil instituir mecanismos que facilitem o acesso do trabalhador e da entidade sindical que o representa às informações sobre as contribuições recolhidas. (Incluído pela Lei nº 11.718, de 2008)

§ 8o São assegurados ao trabalhador rural contratado por pequeno prazo, além de remuneração equivalente à do trabalhador rural permanente, os demais direitos de natureza trabalhista. (Incluído pela Lei nº 11.718, de 2008)

§ 9o Todas as parcelas devidas ao trabalhador de que trata este artigo serão calculadas dia a dia e pagas diretamente a ele mediante recibo. (Incluído pela Lei nº 11.718, de 2008)

§ 10. O Fundo de Garantia do Tempo de Serviço – FGTS deverá ser recolhido e poderá ser levantado nos termos da Lei no 8.036, de 11 de maio de 1990. (Incluído pela Lei nº 11.718, de 2008)

Ao contrário, no caso o legislador pátrio foi expresso ao dizer que aos empregados rurais temporários aplicam-se o regime do FGTS o que corrobora ainda mais a segunda corrente de doutrinadores que defende a não recepção da indenização do art. 14, da Lei 5.889/73 aos empregados rurais safristas.


5. CONCLUSÃO

Este tema tornou-se tormentoso, pois a orientação administrativa do Ministério do Trabalho e do Emprego, com a edição do Precedente Administrativo nº 65, veio, com o máximo respeito, na contramão da prática nos contratos de safra e do entendimento jurisprudencial.

Durante muitos anos, restou pacificado o entendimento que o art. 14, da Lei 5.889/73, não teria sido recepcionado pelo artigo 7º da Constituição Federal.

Com a publicação desse precedente, os Auditores Fiscais do Ministério do Trabalho e Emprego e os Trabalhadores Rurais passaram a exigir que a indenização do safrista fosse paga à época da rescisão contratual, causando um enorme transtorno para o setor patronal rural.

Ponto de grande relevância encontra-se no fato de que as duas verbas possuem a mesma natureza, pois têm por fim indenizar o tempo de serviço do trabalhador rural.

Exigir ambas as indenizações é pagar duas vezes a mesma verba, o que caracteriza o bis in idem, inadmissível em nosso ordenamento jurídico, repete-se.

Assim, por tais razões, conclui-se que o Precedente Normativo nº 65 é inconstitucional, pois ao prescrever a cumulação da indenização prevista no art. 14 da Lei 5.889/73 com o regime jurídico do FGTS, inovou na ordem jurídica, criando obrigação inexistente no arcabouço legislativo, visto que aquele não foi recepcionado pela CF/88.


BIBLIOGRAFIA

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Sobre o autor
Henrique Schaper

Advogado. Assessor Jurídico da Federação da Agricultura e Pecuária do Estado de Minas Gerais – FAEMG. Pós-Graduando em Direito Material e Processual do Trabalho pela Faculdade Pitágoras

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

SCHAPER, Henrique. A inconstitucionalidade do Precedente Administrativo nº 65 do Ministério do Trabalho e Emprego - MTE. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 15, n. 2444, 11 mar. 2010. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/14479. Acesso em: 18 nov. 2024.

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