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Advocacia pública consultiva.

Aspectos do parecer enquanto ato administrativo e responsabilidade do parecerista

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4. ANÁLISE DO PARECER EMANADO DA ADVOCACIA PÚBLICA CONSULTIVA ENQUANTO ATO ADMINISTRATIVO

Em razão do então analisado, pode-se afirmar que o ato administrativo parecer não possui, por si só, a força vinculante e normativa necessária a determinar e/ou obrigar a atuação da Administração Pública, mas tão-somente orientar e coordenar a Administração no exercício de suas funções.

Contudo, se o ato administrativo parecer vier acompanhado de outro ato que o aprove, ou o complete em seus efeitos, então haverá a vinculação da atuação da Administração Pública em relação ao determinado no parecer, visto que este se aglutina, se compõe ao ato aprovador e, assim, se torna ato normativo.

O ato administrativo parecer emitido pelo Advogado-Geral da União, chefe da Advocacia Pública Consultiva no âmbito federal, deve sempre ser submetido à aprovação do Chefe do Executivo. Os efeitos do parecer emitido pelo Advogado-Geral da União, conforme anteriormente explanado, decorrem diretamente da lei, em virtude do atributo da tipicidade. Assim, previamente, pode-se conhecer dos efeitos gerados pelo parecer, em relação à Administração Pública.

O parecer do Advogado-Geral da União, se aprovado e publicado conjuntamente ao decreto presidencial (ato administrativo de completude do parecer), vincula a Administração Pública Federal, tanto a Administração Direta quanto a Indireta, em relação a seus órgãos e entidades, que ficam obrigados a dar fiel cumprimento ao determinado no parecer. Contudo, se o parecer do Advogado-Geral da União, embora aprovado, não tenha sido publicado, apenas gerará obrigação às repartições interessadas, a partir do momento em que estas tenham conhecimento do parecer emanado.

Assim, é o que determina o dispositivo contido na Lei Complementar nº 73, de 10 de fevereiro de 1993:

"Art. 40. Os pareceres do Advogado-Geral da União são por este submetidos à aprovação do Presidente da República.

§ 1º O parecer aprovado e publicado juntamente com o despacho presidencial vincula a Administração Federal, cujos órgãos e entidades ficam obrigados a lhe dar fiel cumprimento.

§ 2º O parecer aprovado, mas não publicado, obriga apenas as repartições interessadas, a partir do momento em que dele tenham ciência."

De igual modo, determina a Lei Complementar nº 73 que os pareceres emitidos pela Consultoria-Geral da União e aprovados pelo Presidente da República vincularão a Administração Pública Federal, tanto a Administração Direta quanto a Indireta, em relação a seus órgãos e entidades, que ficam obrigados a dar fiel cumprimento ao determinado no parecer. Contudo, se o parecer da Consultoria-Geral da União, embora aprovado, não tenha sido publicado, apenas gerará obrigação às repartições interessadas, a partir do momento em que estas tenham conhecimento do parecer emanado:

"Art. 41. Consideram-se, igualmente, pareceres do Advogado-Geral da União, para os efeitos do artigo anterior, aqueles que, emitidos pela Consultoria-Geral da União, sejam por ele aprovados e submetidos ao Presidente da República."

Conforme a estrutura organizacional da Advocacia-Geral da União, cabe às Consultorias Jurídicas a assessoria e consultoria jurídica no âmbito dos órgãos do Poder Executivo Federal, tais quais os Ministérios e as Secretarias, além das Forças Armadas. As Consultorias Jurídicas são encarregadas de assessorar e coordenar os órgãos jurídicos dos órgãos autônomos e entidades vinculadas aos Ministérios e às Secretarias. Os pareceres emitidos pelas Consultorias Jurídicas, então, quando aprovados pelo Ministro de Estado, pelo Secretário-Geral e pelos titulares das demais Secretarias da Presidência da República ou pelo Chefe do Estado-Maior das Forças Armadas, não somente obrigam tais entidades ou órgãos, como também os respectivos órgãos autônomos e entidades vinculadas, consoante determina o dispositivo legal da Lei Complementar nº 73:

Art. 42. Os pareceres das Consultorias Jurídicas, aprovados pelo Ministro de Estado, pelo Secretário-Geral e pelos titulares das demais Secretarias da Presidência da República ou pelo Chefe do Estado-Maior das Forças Armadas, obrigam, também, os respectivos órgãos autônomos e entidades vinculadas.

Cabe ainda ressaltar que os pareceres editados e/ou aprovados pelo Advogado-Geral da União serão inseridos em coletânea de pareceres, a ser editada e publicada pela Imprensa Nacional [22].

Logo, como se observa da própria normatização das atividades da Advocacia Pública Consultiva, inserta na Lei Orgânica da Advocacia-Geral da União (Lei Complementar nº 73, de 10 de fevereiro de 1993), o ato administrativo parecer, editado nos moldes explicitados acima, só terá efeito vinculante à Administração Pública como um todo quando aprovado e publicado juntamente ao decreto do Presidente da República, para ter efeito normativo. Contudo, se aprovado, mas não publicado, obrigará a atuação dos órgãos interessados, não só em relação aos pareceres emitidos pelo Advogado-Geral da União (e, por equiparação, a Consultoria-Geral da União), mas também os pareceres emitidos pelas Consultorias Jurídicas, em relação aos Ministérios e Secretarias.

Pelo exposto, pode-se concluir que o parecer emanado da Advocacia Pública Consultiva classifica-se, consoante classificação proposta acima [23], em parecer normativo, tendo em vista sua efetividade obrigatória e, em alguns casos, vinculante em relação aos órgãos da Administração Pública, tanto quando é aprovado e publicado juntamente ao decreto do Presidente da República, como nos casos em que não há tal publicação conjunta, em que obrigará a atuação dos órgãos interessados no parecer.


5. RESPONSABILIDADE DO PARECERISTA QUANTO AO ATO EMANADO

Certo é que as decisões dos Tribunais desde antanho são tomadas com altíssima relevância na construção do Direito pátrio. Contudo, em tempos recentes não há como tratar de qualquer tema jurídico relevante sem consultar a jurisprudência sobre tal, quando esta se fizer presente.

Quanto à responsabilidade do parecerista, em relação ao ato que emanou, sói trazer à balha a jurisprudência recente sobre o tema, que pacificou o conflito outrora gerado pela incerteza quanto ao assunto. Assim, em julgados do Supremo Tribunal Federal, pode-se analisar com clareza a questão sobre a responsabilidade da Advocacia Pública Consultiva. Em análise de específico julgado, qual seja, o Mandado de Segurança nº 24.631, do Distrito Federal, de relatoria do Ministro Joaquim Barbosa, observa-se a diferenciação dos tipos de pareceres, e a respectiva responsabilidade concernente a cada um:

"EMENTA: CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. CONTROLE EXTERNO. AUDITORIA PELO TCU. RESPONSABILIDADE DE PROCURADOR DE AUTARQUIA POR EMISSÃO DE PARECER TÉCNICO-JURÍDICO DE NATUREZA OPINATIVA. SEGURANÇA DEFERIDA. I. Repercussões da natureza jurídico-administrativa do parecer jurídico: (i) quando a consulta é facultativa, a autoridade não se vincula ao parecer proferido, sendo que seu poder de decisão não se altera pela manifestação do órgão consultivo; (ii) quando a consulta é obrigatória, a autoridade administrativa se vincula a emitir o ato tal como submetido à consultoria, com parecer favorável ou contrário, e se pretender praticar ato de forma diversa da apresentada à consultoria, deverá submetê-lo a novo parecer; (iii) quando a lei estabelece a obrigação de decidir à luz de parecer vinculante, essa manifestação de teor jurídica deixa de ser meramente opinativa e o administrador não poderá decidir senão nos termos da conclusão do parecer ou, então, não decidir. II. No caso de que cuidam os autos, o parecer emitido pelo impetrante não tinha caráter vinculante. Sua aprovação pelo superior hierárquico não desvirtua sua natureza opinativa, nem o torna parte de ato administrativo posterior do qual possa eventualmente decorrer dano ao erário, mas apenas incorpora sua fundamentação ao ato. III. Controle externo: É lícito concluir que é abusiva a responsabilização do parecerista à luz de uma alargada relação de causalidade entre seu parecer e o ato administrativo do qual tenha resultado dano ao erário. Salvo demonstração de culpa ou erro grosseiro, submetida às instâncias administrativo-disciplinares ou jurisdicionais próprias, não cabe a responsabilização do advogado público pelo conteúdo de seu parecer de natureza meramente opinativa. Mandado de segurança deferido." [24]

Em outro feito, o Ministro Joaquim Barbosa disserta sobre as três situações que advém do parecer, em brilhante voto sobre o tema, conforme sua classificação diante da normatização sobre o parecer, nos seguintes termos:

"A primeira situação é aquela em que a consulta é facultativa. Nesse caso, a autoridade não se vincula ao parecer proferido, sendo que seu poder de decisão não se altera pela manifestação do órgão consultivo; A segunda hipótese diz respeito àqueles casos em que a consulta é obrigatória, e a autoridade administrativa fica obrigada a emitir o ato tal como submetido à consultoria, com parecer favorável ou contrário. Caso pretenda praticar o ato com conteúdo e forma diversos do que foi submetido à consultoria, deverá submetê-lo a novo parecer. Isto porque, se submeter à consultoria a minuta ou esboço de um ato com um determinado conteúdo e, ao tomar a decisão, publicar ato de conteúdo diverso, estará burlando a obrigatoriedade do parecer prévio, que nada mais é do que um mecanismo adicional de controle da administração. Por fim, quando a lei estabelece a obrigação de ‘decidir à luz de parecer vinculante ou conforme’ (décider sura vis conforme), o administrador não poderá decidir senão nos termos da conclusão do parecer ou, então, não decidir." [25]

Logo, pode-se concluir que a responsabilidade do parecerista deverá ser analisada quanto a seu caráter, nos seguintes termos:

- Parecer facultativo: quando a consulta é facultativa, a autoridade não se vincula ao parecer proferido, sendo que seu poder de decisão não se altera pela manifestação do órgão consultivo. Logo, não haverá de nenhum modo responsabilização do parecerista, por ter conteúdo meramente opinativo.

- Parecer obrigatório: quando a consulta é obrigatória, a autoridade administrativa se vincula a emitir o ato tal como submetido à consultoria, com parecer favorável ou contrário, e se pretender praticar ato de forma diversa da apresentada à consultoria, deverá submetê-lo a novo parecer. Neste caso, a responsabilidade repousa toda sobre o agente administrativo, que poderá emitir o ato conforme o estabelecido no parecer, ou praticá-lo de forma diversa, necessitando de novo parecer, ou se responsabilizando integralmente pelo ato modificado.

- Parecer vinculante: quando a lei estabelece a obrigação de decidir à luz de parecer vinculante, essa manifestação de teor jurídica deixa de ser meramente opinativa e o administrador não poderá decidir senão nos termos da conclusão do parecer ou, então, não decidir. Nesta última hipótese, haveria efetivo compartilhamento do poder administrativo de decisão, razão pela qual, em princípio, o parecerista poderia vir a ter que responder conjuntamente com o administrador, pois seria também administrador nesse caso.

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O entendimento da Suprema Corte vem corroborar com a doutrina de alguns (pouquíssimos) doutrinadores que efetivamente aprofundam e descem à necessária sofisticação de detalhes sobre o parecer jurídico, emanando das Consultorias Públicas.

Neste passo, o que de relevante há na análise da responsabilidade do parecerista quanto ao ato emanado é justamente nos casos em que o parecer é vinculante, tendo em vista que, em tais situações, há efetiva partilha do poder decisório, e consequentemente a responsabilização do parecerista pelos atos administrativos decorrentes de seu parecer.

No tocante à Advocacia-Geral da União, o parecer emitido pelo Advogado-Geral da União, quando aprovado e publicado juntamente com o despacho do Presidente da República, vinculará a Administração Federal, tanto Direta quanto Indireta. Nestes termos, o art. 40 e seu § 1º da Lei Complementar nº 73, de 10 de fevereiro de 1993:

"Art. 40. Os pareceres do Advogado-Geral da União são por este submetidos à aprovação do Presidente da República.

§ 1º O parecer aprovado e publicado juntamente com o despacho presidencial vincula a Administração Federal, cujos órgãos e entidades ficam obrigados a lhe dar fiel cumprimento."

Cabe pontuar que a responsabilidade do parecerista será compartilhada com o administrador, ou seja, nos casos em que a lei estabelece que o parecer terá caráter vinculante, o parecerista pode vir a ter que responder conjuntamente com o administrador, pois ele é também administrador nesse caso e a lei estabelece efetivo compartilhamento do poder administrativo de decisão.


6. CONCLUSÕES

A Advocacia-Geral da União, analisada sob a perspectiva de sua atuação nas funções de assessoramento e consultoria, exerce distinto e meritório papel no desenvolvimento das funções públicas da Administração Federal, não somente auxiliando os órgãos e entidades da Administração Pública, como igualmente determinando conteúdos e normatizações a serem seguidas e executadas por estes, no exercício de suas atividades.

O ato administrativo emanado pela Advocacia Pública Consultiva, de suma importância para o desenvolvimento regular das atividades da Administração Pública, devidamente restou analisado no presente trabalho. O parecer oferece aspectos, ou melhor, atributos que o configuram como tal e fazem-no ser analisado na perspectiva correta, qual seja como ato administrativo.

Quanto à responsabilidade do parecerista em relação ao ato emanado, acorde à jurisprudência da Suprema Corte, entende-se que esta decorrerá ou não dependendo do caráter atribuído ao parecer. Assim, o parecer facultativo não gerará responsabilidade alguma para o parecerista, por ter conteúdo meramente opinativo, não havendo obrigatoriedade ou vinculação para o administrador em seguir as determinações ou o conteúdo inserto no parecer.

No caso de o parecer ser obrigatório, ou seja, é determinado por lei (ou outra normatização) que o processo administrativo ou a decisão a ser tomada pelo administrador seja obrigatoriamente precedida de um parecer, a responsabilidade repousa toda sobre o próprio administrador, pois este possui o poder de julgar diante do ato, e se resolver tomar decisão diversa da proposta no parecer, deverá arcar exclusivamente com as conseqüências do ato.

De modo diverso, o parecer vinculante, ou seja, o parecer que a lei (ou outra normatização) determina ser vinculante para a Administração Pública, trará responsabilidade para o parecerista, pois a responsabilidade deste será compartilhada com o administrador, ou seja, nos casos em que a lei estabelece que o parecer terá caráter vinculante, o parecerista pode vir a ter que responder conjuntamente com o administrador.

Na Advocacia-Geral da União, o parecer do Advogado-Geral da União, que for aprovado e publicado juntamente ao decreto do Presidente da República terá efeito vinculante para a Administração Federal, e consequentemente implicará em responsabilidade do Advogado-Geral da União, nos atos decorrentes do parecer deste, responsabilidade esta a ser compartilhada com o administrador, pois tanto este quanto aquele têm poder efetivo de decisão.

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Sobre o autor
Leonardo Jorge Queiroz Gonçalves

Advogado. Pós-Graduado em Direito Público. Advogado da SECTEL do Ministério das Comunicações.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

GONÇALVES, Leonardo Jorge Queiroz. Advocacia pública consultiva.: Aspectos do parecer enquanto ato administrativo e responsabilidade do parecerista. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 15, n. 2483, 19 abr. 2010. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/14695. Acesso em: 28 mar. 2024.

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