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Homicídio simples praticado a partir de atividade de extermínio considerado como hediondo

17/04/2010 às 00:00

Resumo:

RESUMO:
- O artigo discute a impropriedade legislativa de considerar homicídios praticados por grupos de extermínio como "simples".
- Apresenta conceitos de homicídio simples e qualificado, destacando a diferença entre eles.
- Argumenta que a ação de extermínio, seja por grupo ou indivíduo, é qualificada por diversas circunstâncias, tornando-a hedionda e não simples.

Resumo criado por JUSTICIA, o assistente de inteligência artificial do Jus.

RESUMO: O presente artigo tem por objetivo ilustrar uma impropriedade legislativa latente, dispensável e redundante em nossos diplomas legais penais. A impossibilidade jurídica de, concretamente, operar uma adequação típica de um homicídio praticado por grupo de extermínio, mesmo que levado a efeito por um só indivíduo, a ser considerado, de per si, como "simples" do ponto de vista da hediondez e frente ao elemento volitivo do crime doloso.

Palavras-chave: Homicídio simples – homicídio qualificado – crime hediondo – adequação típica - circunstâncias qualificadoras subjetivas e objetivas – grupos de extermínio.


1. CONCEITO DE HOMICÍDIO SIMPLES

Segundo professa o eminente professor Rogério Greco [01], o homicídio simples possui a redação mais compacta de todos os tipos penais incriminadores, que diz: Matar alguém.

Segundo o conceito emitido por Mougenot [02], o homicídio simples é a destruição da vida humana extra-uterina praticada por outrem.

O Professor Eduardo Rios [03], por sua vez, preconiza, dentro de sua exposição doutrinária da parte geral do Direito Penal Brasileiro, que um crime é simples quando em sua redação o legislador enumera as elementares do crime em sua figura fundamental.

Neste mesmo diapasão, o professor Capez [04] ensina que homicídio simples é aquele que contém somente os elementos essenciais do tipo básico fundamental.

Sem embargo das doutas opiniões de outros pensadores jurídicos, cremos que os conceitos formais emitidos acima são a quase totalidade que encontramos nas principais doutrinas criminais do país.

Somente confrontando os elementos das circunstâncias do crime de homicídio qualificado, com o crime de homicídio simples, em sede de homicídio doloso, é que poderemos estabelecer a diferença jurídica entre ambos, abstratamente.

Portanto, podemos emitir o conceito de homicídio simples como sendo aquele que reúne os elementos básicos do caput do art. 121, sem nenhuma outra circunstância mais que o especialize ou o qualifique. Em suma, é o tipo básico fundamental do homicídio configurado em nosso Código Penal e outros diplomas legais.

É qualificado o homicídio simples animado ou circunstanciado pelas qualificadoras elencadas nos incisos I a V do § 2º do art. 121 do Código Penal. O crime de homicídio qualificado é considerado hediondo, como se infere da segunda parte do inciso I do art. 1º da Lei nº 8.072/90 (Lei dos Crimes Hediondos). Note-se que a primeira parte desse indigitado dispositivo reza que o homicídio simples também será considerado "hediondo" se praticado em atividade típica de grupo de extermínio.

Em sendo qualificado, tal tipo de homicídio recebe, abstratamente, uma outra pena em quantidade com patamar mínimo e máximo superiores ao crime de homicídio simples, justamente pela hediondez que o acompanha, pelo maior repúdio social, pela crueldade e maldade que são os seus rótulos.


3. CONCEITO DE ATIVIDADE DE EXTERMÍNIO

A atividade de extermínio pode se dar por grupos de extermínio ou por uma só pessoa. Vale lembrarmos do sanguinário "mão branca" dos anos oitenta no Brasil. Grupos de extermínio são comumente formados por "matadores de aluguel". Praticam atividades de extermínio. Dependendo da região, são popularmente conhecidos como jagunços, capangas ou cabras. Em outras partes do país, um grupo de extermínio pode ser também denominado de sindicato do crime. Não podemos olvidar que dentro dos objetivos de tais grupos, não só há o propósito de matar, como também de torturar, ameaçar, roubar, furtar, etc. Mormente, com um fito profissional.

Segundo o deputado Nilmário Miranda [05], Presidente da Comissão de Direitos Humanos da Câmara Federal,

a ação dos grupos de extermínio consiste numa das principais fontes de violação dos direitos humanos e de ameaça ao Estado de direito no país. Essas quadrilhas agem normalmente nas periferias dos grandes centros urbanos e têm seus correspondentes nos jagunços do interior. Usam estratégia de ocultar os corpos de suas vítimas para se furtar à ação da justiça, sendo que os mais ousados chegam a exibir publicamente sua crueldade. Surgem como decorrência da perda de credibilidade nas instituições da justiça e de segurança pública e da certeza da impunidade, resultante da incapacidade de organismos competentes em resolver o problema. Os embriões dos grupos de extermínio nascem quando comerciantes e outros empresários recrutam matadores de aluguel, freqüentemente policiais militares e civis, para o que chamam "limpar" o "seu bairro" ou " sua cidade".

Conforme se extrai do conteúdo do texto do nobre deputado, as principais características dos grupos de extermínio são a matança de pessoas, após aqueles serem recrutados ou contratados por pessoas do comércio e outras empresas. Claramente, por óbvio, que esses exterminadores não fazem esse "serviço sujo" sem ônus, não o fazem "de graça". Certamente são pagos pelos contratantes – os maiores interessados. Assim, são profissionais do crime que não possuem, em primeiro plano, uma relação de desafeto com as vítimas do extermínio.

De tudo isso, não podemos nos furtar em concluir com clareza e inquestionável lógica, que esses exterminadores, ao silenciar as suas vítimas, não estão animados por nenhum motivo de ordem pessoal em relação a elas (frieza e torpeza); são profissionais (recebem pelo que fazem, então alguém os paga); por serem frios e receberem por esse vil mister, agem com futilidade em relação à causa de agir; pelo profissionalismo e destreza que animam os seus perfis (bons atiradores, frios, experientes, treinados, profissionais, normalmente em bando), estão em grande condição de superioridade em relação à vítima ou às vítimas, as quais, na maioria das vezes, não têm possibilidade ou oportunidade de defesa.

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4. IMPOSSIBILIDADE CONCRETA DA QUALIDADE DE HOMICÍDIO PRATICADO POR GRUPO DE EXTERMÍNIO SER CONSIDERADO "SIMPLES"

Uma pergunta que não cala: O que pensava o legislador quando inseriu no artigo 1º da Lei de Crimes Hediondos o homicídio simples praticado por grupo de extermínio?

Após uma breve análise nos itens 1 e 2 acima e uma explanação do que caracteriza o chamado "grupo de extermínio", é impossível, jurídica e concretamente, vislumbrarmos que essa ação de exterminadores seja considerada como uma prática de homicídio simples. O modus operandi desses marginais, por si só, está mais do que circunstanciado pela grande maioria das qualificadoras elencadas nos incisos I a V do § 2º do art. 121.

Analisemos. Primeiro, sem entrar em outros tipos penais como o de formação de bando ou quadrilha, vamos visualizar os passos dos agentes criminosos dentro do modus operandi de um grupo de extermínio. Primeiramente, são contratados por alguém. Desse contrato surge um pagamento ou promessa de pagamento ou de recompensa (inciso I); segundo, após a contratação, é óbvio deduzir que os contratados não têm, em princípio, uma relação de desafeto com as vítimas, ou seja, falta de justo motivo ou motivo relevante do ponto de vista social ou moral – futilidade (motivo desproporcional – inciso II); terceiro, a desproporção do aparato dos exterminadores, a experiência em abordar as vítimas, a logística, os meios rápidos de locomoção, as ações de inteligência e a vantagem da surpresa, tudo isso faz com que a vítima não tenha nenhuma ou quase nenhuma oportunidade de se defender (inciso IV). E, quarto e por último, em alguns outros casos, além de tudo isso, o motivo que anima a iniciativa do contratante pode estar perfeitamente adequada ao descrito no inciso V do art. 121 do CP, como no caso de mandar matar uma testemunha ocular de um crime praticado pelo contratante ou por um familiar seu ou o assassinato de um promotor ou delegado de polícia. Por outra ótica, se não se trata de um grupo, mas somente de uma pessoa, a situação linear de relação dessa pessoa com o contratante não é diferente. Apenas não há um grupo de extermínio, mas um exterminador. Se esse indivíduo não estiver agindo dominado por relevante valor de ordem moral ou social, estará praticando o homicídio com as mesmas circunstâncias majorantes acima ilustradas e exemplificadas.


5. CONCLUSÃO

O dispositivo inserto no artigo 1º da Lei dos Crimes Hediondos mostra-se totalmente inaplicável em razão de que a ação de extermínio, por si só, praticada por um grupo ou por uma só pessoa, é revestida de várias circunstâncias que indubitavelmente qualificam o homicídio com o intento de extermínio. As razões que levam alguém a praticar tal ação certamente não são nobres ou morais. São ações cruentas, violentas, desproporcionais, fúteis, torpes e que praticamente são esboçadas em forma de surpresa contra a vítima. Em palavras mais singelas, a razão de tal afirmação, reside justamente no seguinte ponto: O agente ou agentes, antes mesmo de efetivarem o seu intento (a execução da vítima), já estarão animados pelas circunstâncias de ordens subjetiva e objetiva que tornarão o futuro homicídio qualificado e nunca simples.

Deste modo, no plano concreto, jamais poderá ocorrer uma adequação típica de extermínio de alguém como homicídio "simples".

É o nosso posicionamento.


REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de Direito Penal; Parte Especial 2; dos crimes contra a pessoa. 7ª Ed. São Paulo. Saraiva, 2007.

CAPEZ, Fernando. Curso de Direito Penal; Parte Especial. Vol. 2, 6ª Ed. São Paulo. Saraiva, 2006.

GONÇALVES, Victor Eduardo Rios. Direito Penal Parte Geral; Sinopses Jurídicas. 9ª Ed. São Paulo. Saraiva, 2004.

GRECO, Rogério. Curso de Direito Penal Parte Especial. Vol. II. 6ª Ed. Niterói, Impetus, 2009.

MOUGENOT BONFIM, Edilson. Direito Penal 2, Parte Especial. Coleção Curso & Concurso. 2ª Ed. São Paulo. Saraiva, 2005.

MIRANDA, Nilmário. A Ação dos Grupos de Extermínio no Brasil. DHnet. Disponível em : <HTTP://www.dhnet.org.br/direitos/militantes/nilmario/nilmario_dossieexterminio.html>. Acesso em 5 fev. 2010.


Notas

  1. GRECO, Rogério. Curso de Direito Penal Parte Especial. Pg. 141.
  2. BONFIM, Edilson Mougenot. Direito Penal 2, Parte Especial. Coleção Curso & Concurso. Pg. 4.
  3. GONÇALVES, Victor Eduardo Rios. Direito Penal. Parte Geral. Sinopses Jurídicas. Pg. 14.
  4. CAPEZ, Fernando. Curso de Direito Penal Parte Especial. Pg. 28.
  5. Fonte: Sítio www.dhnet.org.br. Consultado em 5/02/2010.
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Sobre o autor
Gerson Santana Arrais

Professor Universitário de Direito no Centro de Ensino Superior de Jataí (CESUT), especialista em Direito do Trabalho e em Direito Penal e Processual Militar e mestrando em Direito das Relações Internacionais e Integração da América Latina, na Universidad de La Empresa, Montevidéu, Uruguai.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

ARRAIS, Gerson Santana. Homicídio simples praticado a partir de atividade de extermínio considerado como hediondo. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 15, n. 2481, 17 abr. 2010. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/14711. Acesso em: 18 dez. 2024.

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