III. O DANO MORAL NA JUSTIÇA DO TRABALHO
Assédio moral é o termo pelo qual ficou conhecido um problema de degeneração na relação entre empregado e empregador, quando este avança sobre aquele, espezinhando-o. Na maioria dos casos, funda-se no desejo do empregador em livrar-se do empregado, levando-o a desistir do emprego, e com isso safando-se do custo do desligamento por sua iniciativa, que gera pagamentos de várias indenizações, ou até mesmo quando a demissão está impedida por alguma causa preventiva (estabilidade legal ou convencional, por exemplo).
Para lograr seu intento, o empregador coloca o empregado em situações as mais humilhantes, na intenção de que ele afugente-se do emprego. Assim, progressivamente, o empregador vai criando situações em que o empregado acaba se sentindo cada vez mais desconfortável, até que lhe sejam minadas as resistências. Chega-se, até mesmo, a lhe serem retiradas suas tarefas e responsabilidades, fazendo com que o empregado se sinta inútil, frustrado em sua dignidade (conduta do empregador que vem sendo conhecida pelo termo "inação compulsória").
Esta é apenas uma das causas que, em geral, dão azo ao assédio moral, de resto já suficientemente identificada. Basta ver, por exemplo, matéria apresentada no site do Tribunal Superior do Trabalho, cujo teor é bastante esclarecedor. [16]
3.1.2. Desenvolvimento
Alguns acontecimentos não muito remotos podem ter contribuído para que o assédio moral adquirisse a notoriedade que ostenta nos dias atuais.
As relações trabalhistas têm se modificado ao longo dos últimos tempos, ao passo que sofre interferências das modificações ocorridas na ordem política, econômica e social. O mercado de trabalho, naturalmente, reage às pressões externas, incorporando mudanças. Tal tem sido em relação ao açodamento do desemprego que se verificou em meados dos anos 90 do século passado. Aquele momento (marcado por uma mudança de rumos na gestão da economia, quando adotou-se o neoliberalismo como dogma) inaugurou uma valorização extraordinária do emprego. Por conta disso, o Estado tentou impor mudanças, algumas que degradavam vergonhosamente o Direito do Trabalho. Felizmente o ímpeto abrandou-se, mas a estocada deixou seqüelas. Parte do empresariado viu naquilo o incentivo necessário para avançar sobre os direitos de trabalhadores. Parte do movimento sindical, senão todo, enfraquecido pela conjuntura adversa, passou a aceitar certos acordos, certas práticas empresariais prejudiciais ao trabalhador, como normais. E a mídia, alegremente, cedeu voz e imagem para aqueles que falavam em "flexibilização da CLT", e outros eufemismos oportunistas, fazendo crer que tudo aquilo era normal.
Importa reconhecer que aquele conjunto de impropriedades refletiu duramente nas relações trabalhistas, dissipando o clima de relativa estabilidade em que vinham se equilibrando, após anos de lutas e conquistas. Avançou-se sobre o emprego e o ataque, algo mais requintado, perdura; de tal modo que o crescimento de condenações a título de dano moral na Justiça do Trabalho pode estar por representar, em certa medida, até mesmo uma reação natural àquele movimento hostil.
3.1.3. Estágio atual
Há uma atualização no cenário em que se desenvolvem as relações trabalhistas, onde um conjunto de práticas administrativas se destacam, notabilizando-se pela busca desenfreada por resultados. A questão de fundo é a pressão da nova conjuntura econômica, cujo paradigma é a competitividade, cada vez mais rigorosa, pela conquista e manutenção de mercado.
Essa atualização vem agregando um conjunto de práticas, onde o respeito por preceitos éticos não tem muito destaque. Favorecidas pelo excesso de mão-de-obra (desemprego) disputando um número cada vez menor de empregos (automação), constituem um movimento de causa e efeito, que alternam-se de posição, ora um, ora outro, dando causa ao efeito. Daí surgirem o que parecem ser paradoxos: empregos cada vez mais exigentes em requisitos de formação, especializações, idade, etc., mas cada vez pior remunerados – porque não lhe faltam candidatos. Exige-se o máximo de experiência e o mínimo de idade; exige-se o máximo de responsabilidades em contrapartida de menores salários; exige-se o máximo de conhecimentos, que nem mesmo serão utilizados; etc. (enfim, a mais-valia levada ao extremo).
Uma das espécies de praxes administrativas, que não se constitui propriamente em novidade, é a de copiar práticas estrangeiras de gestão, sobretudo os modismos estadunidenses. O mercado literário de gestão empresarial é eternamente inundado de livros que são, quando muito, apenas traduzidos literalmente, sem levar em conta diferenças culturais. Aquelas novidades acabam sendo aceitas por alguns como capazes de fornecer as mais milagrosas soluções empresariais. Acontece que por trás de toda a ostentação teórica, a necessidade imperiosa de resultados imediatos acaba por não prever conseqüências. Num ambiente assim é até natural que surjam problemas.
Outra espécie é a administração das empresas marcada pela busca selvagem de resultados, comuns em determinados segmentos, altamente competitivos (fabricantes de bens de consumo, por exemplo). Ora, frente à necessidade de vender os produtos sempre e mais intensamente, para auferir os resultados vitais, o ambiente tensiona-se, pois o interesse econômico imediato passa a ocupar todo o espaço na relação com os trabalhadores. Não sobrando espaço para os demais valores do trabalho (ética, respeito, etc.), há a deterioração, o desgaste, dessas relações.
O conjunto dessas práticas, em maior ou menor grau, é capaz de levar ao esgarçamento do tecido das relações trabalhistas, podendo dar causa, inclusive, às barbaridades que chegam aos tribunais: seres humanos sendo obrigados a imitar animais, pais de família tendo de dançar uma tal dança da "boquinha da garrafa", etc., eis que usados como um exemplo negativo para que outros do grupo possam se motivar, produzindo mais, melhorando o desempenho, pois do contrário também poderão ser tratados daquela forma.
O empregador que aceita esse tipo de deterioração no ambiente do trabalho, certamente não há de surpreender-se com condenações por dano moral. Afinal, ao permitir que seres humanos sejam tratados como objetos, sejam ridicularizados à custa de tolices do gênero, não deve mesmo estranhar-se com mais nada. Por todo o óbvio da situação, tampouco poderá alegar que não agiu com culpa.
Esse tipo de modernização, se assim aceitarmos, das relações trabalhistas, traz em seu bojo o assédio moral como uma de suas conseqüências naturais.
3.2. Acidente de trabalho e Doença profissional
3.2.1. Enquadramento legal
A Lei 8.213/91, em seu art. 19, define acidente do trabalho aquele que ocorre pelo exercício do trabalho a serviço da empresa, provocando lesão corporal ou perturbação funcional que cause a morte ou a perda ou a redução da capacidade para o trabalho, permanente ou temporária. Equiparam-se ao acidente do trabalho as doenças profissionais e doenças do trabalho, constantes do Anexo II do Decreto 3.048/99 (Regulamento da Previdência Social).
Equipara-se também ao acidente do trabalho o acidente ligado ao trabalho que, mesmo não tendo sido a causa única, contribua diretamente para a lesão que produza a morte, redução ou perda da capacidade para o trabalho. É a chamada teoria da concausa (art. 21, I, da Lei 8.213/91). Nessas condições incluem-se as doenças adquiridas no trabalho que, embora não sejam capazes de incapacitar, aliadas a uma condição qualquer de saúde do trabalhador, agravam a situação do indivíduo. [17]
Também são considerados acidentes do trabalho os acidentes sofridos pelo empregado em conseqüência de atos de terceiros, casos fortuitos ou força maior, doenças por contaminação acidental, os acidentes de trajeto (na ida ou vinda da residência para o trabalho e vice-versa), os acidentes ocorridos em trabalho externo e os acidentes ocorridos nos intervalos de refeição e repouso, estando o empregado nas dependências da empresa. Assim, podem os acidentes ser classificados em três tipos: tipo 1, acidentes típicos; tipo 2, doença profissional ou do trabalho; tipo 3, acidente de trajeto.
A lei exclui do conceito de acidente do trabalho as doenças degenerativas, as inerentes ao grupo etário, as que não produzam incapacidade laborativa e as doenças endêmicas, próprias de determinadas regiões geográficas ou eventuais.
3.2.2. Comunicação do acidente do trabalho e efeitos
O empregador é obrigado a informar à Previdência Social sobre a ocorrência de acidentes do trabalho através da emissão de documento oficial, "CAT – Comunicação de Acidente do Trabalho", até o primeiro dia útil seguinte ao da ocorrência, ainda que o acidente não cause afastamento do trabalho ou incapacidade. A falta de comunicação, ou a comunicação fora do prazo, sujeita o empregador a multas.
O acidente do trabalho será caracterizado tecnicamente pela perícia médica do INSS, segundo as disposições do Decreto 6.042/2007.
O empregado que foi vítima de acidente do trabalho e afastou-se do emprego por mais de 15 dias, gozando o auxílio doença ou acidentário, tem garantia de estabilidade no emprego por 12 meses (art. 118 da Lei 8.213/91), a contar da data de retorno ao trabalho (alta médica).
3.2.3. Da prevenção dos riscos de acidente – obrigações legais
As empresas devem atuar na eliminação e prevenção de riscos de acidente de trabalho e doenças profissionais ou do trabalho.
Segundo o disposto na Norma Regulamentadora (NR) 9 da Portaria 3.214/78, a empresa deve implantar e manter o Programa de Prevenção de Riscos Ambientais ("PPRA"), "visando a preservação da saúde e da integridade dos trabalhadores através da antecipação, reconhecimento, avaliação e conseqüente controle da ocorrência de riscos ambientais existentes ou que venham a existir no ambiente de trabalho."
No plano individual, devem ser concedidos aos trabalhadores equipamentos de proteção individual ("EPI´s"), que proporcionem segurança à integridade física no exercício de suas tarefas. Esses equipamentos devem cumprir o objetivo de manter o trabalhador a salvo da ação de agentes agressivos à saúde, porventura existentes no meio ambiente do trabalho. Assim, para protegê-lo da ação de agentes físicos (calor, ruído, umidade, etc) e químicos (poeiras, gazes, etc), a empresa deve equipá-lo de luvas, calçados próprios, protetores auriculares, respiradores e outros equipamentos apropriados ao desempenho seguro das atividades do cargo. Além de fornecer os equipamentos, compete à empresa treinar e fiscalizar o uso correto desses equipamentos pelo empregado.
No plano coletivo, compete à empresa investir em medidas de proteção coletiva visando neutralizar a ação de agentes prejudiciais à saúde, segundo uma hierarquia de providências exigidas pela lei: em primeiro lugar deve eliminar riscos; quando não for possível eliminá-los, deve prevenir; e quando isto também não for possível, deve reduzir riscos existentes no ambiente do trabalho.
Concomitante ao PPRA, deve também o empregador manter programa sistemático com o objetivo da promoção e prevenção da saúde do conjunto de trabalhadores. Trata-se do Programa de Controle Médico de Saúde Ocupacional ("PCMSO"), objeto da NR 7 da Portaria 3.214/78.
Tal programa prevê a realização obrigatória de exames médicos e laboratorias nos eventos: admissional, periódico, de retorno ao trabalho (após afastamentos e férias), de mudança de função e demissional. O programa tem a coordenação do médico do trabalho, integrante dos Serviços Especializados em Engenharia de Segurança e Medicina do Trabalho – SESMT – das empresas, conforme enquadramento legal em função do número de trabalhadores e grau de risco da atividade empresarial (NR 4, da Portaria 3.214/78, que prevê a necessidade da contratação de pessoal especializado).
Interessante ressaltar que esses programas se interagem, e, junto aos demais dispositivos que a lei impõe ao empregador na área de segurança do trabalho (tal como a exigência de manter Comissões Internas de Prevenção de Acidentes – CIPA), representam um importante instrumento à disposição do empregador para a própria prevenção de problemas na esfera judicial, desde que utilizados segundo o seu real significado, cujos parâmetros e objetivos a lei oferece. Basta seguí-los e registrá-los, haja visto que o encargo de provar a ausência de culpa (pelos problemas que porventura venham a ser discutidos judicialmente) pode recair ao empregador, que somente poderá fazê-lo através dos registros que possua. [18]
3.2.4. O dano moral no acidente do trabalho
O evento acidente do trabalho (e doenças que a ele eqüivalem-se) suscita questionamentos judiciais em potencial. Daí a necessidade de documentar as providências todas que o empregador toma na área, a fim de comprovar o que for preciso. É certo que, a rigor, o ônus da prova deveria ser do empregado nesse tipo de postulação. Senão vejamos.
Tratando da responsabilidade do empregador no acidente do trabalho, Humberto Theodoro Junior assevera que "o ressarcimento de dano material e moral, na espécie, somente será imputado ao empregador se o autor da ação indenizatória cumprir, adequadamente, o ônus da prova quanto à infração praticada pelo réu, no fato configurador da causa do acidente." [19] Outro não deveria ser o entendimento, tendo em vista, até mesmo, a origem e a natureza do instituto responsabilidade civil de direito comum (cf. art. 186, Código Civil). Contudo, verifica-se a tendência em reconhecer a culpa presumida do empregador, decerto submetendo o novo direito ao princípio protecionista, já que incorporado ao Direito do Trabalho. Caminham nesse sentido alguns julgados recentes, o que quase nos permite concluir, inclusive, que, em alguns casos, o dano em si nem mesmo carece de prova. O ato ilícito e o nexo causal é que merecem ser caracterizados [20], ao que anda transparecendo.
O caminho tomado pela jurisprudência aponta em direção na qual a natureza processual de determinada lei se dá em função do seu objeto, e não do seu aspecto formal. Pouco importa se o objeto a que nos reportamos – dano moral – encontre suas fundamentações no ordenamento civil. Importa mesmo é que o assunto, agora, encontra-se nas cercanias do Direito do Trabalho, e por assim deve ser manobrado, mas sob todos os seus aspectos, ressalte-se. [21]
O ônus da produção de provas, no Direito do Trabalho, está previsto no art. 818 da CLT, que trata o assunto de forma insuficiente, rasa, requerendo a aplicação suplementar das regras do artigo 333, CPC. Aliás, comentando o artigo 818, Valentin Carrion constata: "a regra de que o ônus pesa sobre quem alega é incompleta, simplista em excesso." [22] Por esta razão, aceita-se a regra geral de que ao autor cabe provar o fato constitutivo de seu direito, e ao réu incumbe provar a existência de fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito do autor. Em realidade, porém, o autor apenas alega seu direito, cabendo ao empregador a produção de provas, até mesmo pela facilidade de obtê-las, já que os documentos todos do contrato de trabalho ficam em seu poder. Fato é que esse sistema produz uma outra realidade, e a culpa do empregador, na prática, passa a ser como que presumida, como se tornou regra no Direito do Trabalho. [23]
Já há tempos, ao tratar do conceito de culpa presumida, Orlando Gomes observava: "um dos processos técnicos utilizados para dar maior plasticidade à concepção subjetiva da responsabilidade é o reconhecimento de presunções de culpa". E completava o raciocínio apresentando a razão principal para se alargar o conceito de culpa: "através desse recurso, facilita-se a prova, sem se deslocar o fundamento da responsabilidade." E o que vem ocorrendo atualmente na jurisprudência acerca do tema, quando ganha força e se impõe tal conceito, demonstra exatamente aquilo que o eminente jurista baiano vaticinava, em conclusão: "aceitando-se a idéia de culpa presumida, pode-se justificar a aplicação dos preceitos reguladores da responsabilidade extracontratual usando a noção de culpa, mas dispensando sua prova. Admitidas algumas presunções, a ação da vítima para obter a indenização é extremamente facilitada." [24]
Essa noção de culpa presumida, vigente no Direito do Trabalho, por óbvio, trata-se de presunção juris tantum, aceitando prova em contrário, sobretudo no caso de acidente do trabalho, [25] conforme temos tratado. Daí porque, em tópico anterior, reputamos da maior importância a providência de se manter registros de tudo aquilo que a empresa realiza, em termos de prevenção da segurança e saúde do trabalhador.
Postula-se verba indenizatória por danos morais aqueles que se acidentam, ou alegam ter desenvolvido alguma doença profissional, e que, por conta disso, se vêem reduzidos em sua capacidade laboral, com dificuldades de reempregarem-se, etc.
Nesse ponto, convém associar cada um dos elementos formadores da responsabilidade civil ao evento, ligando-os aos caracteres da culpa, vistos anteriormente. Vejamos. O ato ilícito deve ter a presença de culpa, causar dano, e entre eles deve haver uma relação de causalidade.
Ato ilícito. O acidente de trabalho ou a doença profissional, em si, não representam propriamente um ilícito (quanto menos ainda a mera ocorrência do afastamento do trabalho, como alguns imaginam), capaz de caracterizar um dano passível de indenização. Mas podem vir a caracterizar-se, se a causa se der por culpa exclusiva do empregador, gerando um dano real ao empregado, cujo alcance vá além dos prejuízos materiais. É assim, por exemplo, quando o patrão não lhe fornece equipamento de proteção adequado à realização de suas tarefas, ou o descuido com o meio ambiente é tal, que o empregado venha a desenvolver uma doença respiratória, uma perda auditiva, etc. A omissão do empregador é o elemento subjetivo, a culpa, que gerou – ou potencializou – o dano, a tal ponto de expressar-se em seu patrimônio moral, estético, etc. Por outro lado, se o acidente ocorreu por culpa exclusiva do empregado, responsabilidade alguma poderá ser atribuída ao empregador. [26]
Nexo causal. O dano alegado pelo empregado deve guardar relação entre o ato e a culpa do empregador. De nada adianta apresentar um dano de saúde, comprová-lo, mas que não guarde relação alguma com as atividades que o empregado exercia no emprego. [27] É o caso, por exemplo, do empregado que alega perda auditiva, mas não há a constatação de ruído expressivo em seu ambiente de trabalho; e mais tarde vêm-se a saber que, nas horas vagas, era guitarrista de conjunto musical que animava bailes.
Dano. O dano deve ser comprovado. A simples alegação ou a impossibilidade de comprovação, não são suficientes para compor uma obrigação de reparação civil. É preciso ter existência real e que não seja apenas presumido, para que lhe seja reconhecido o mérito.
3.3. O dano moral nas obrigações contratuais
Temos visto que o contrato individual de trabalho se desenvolve de maneira em que as partes cumprem com suas obrigações, satisfazendo o direito da outra, para manter o equilíbrio regular do pacto. Danos podem ocorrer, portanto, advindos do descumprimento das obrigações contratuais.
Inicialmente, porém, rejeitamos a idéia de que todo e qualquer dano sofrido pelo empregado possa resolver-se em obrigação de indenizar por danos morais, quando haja o descumprimento de uma obrigação pelo empregador. Não acreditamos que todas sejam capazes – ou tenham a potencialidade automática – de gerar o efeito de dano moral.
O abuso no exercício do direito, contudo, traz em si a potencialidade suficiente para causar danos de ordem moral ao empregado porque, o empregador, ao agir além dos limites do razoável, acaba por expor aquele a constrangimentos, ao ridículo, etc., que de outra feita poderiam ser evitados. A pretexto de exercer um direito que lhe parece legítimo, pode acontecer que determinadas práticas empresariais acabem por se configurar em abuso de direito, gerando danos. Às vezes, o resultado visado por algumas dessas práticas não justificam-nas, tornando-as inaceitáveis. É o que acontece, por exemplo, quando o empregador põe-se a revistar empregados, e o faz de forma humilhante, ferindo a intimidade do empregado (obrigando à nudez, contatos físicos, etc.). [28]
Por outra via, casos muito comuns, e que podem desvirtuar a idéia da causação de danos de ordem moral, dizem respeito às dispensas por justa causa. Ora, ao dispensar um empregado por justa causa, à luz do art. 482 da CLT, por exemplo, o empregador está exercendo um direito potestativo garantido pela lei. Se para o exercício dessa faculdade não agiu com abuso de direito, nada haverá para justificar uma condenação por danos morais. [29] Ainda que o mérito da dispensa não venha a se confirmar, não se poderá afirmar que o empregador agiu com culpa quando promoveu a dispensa, baseado nos elementos de que dispunha para tomar a decisão. Mais tarde, levada à juízo, o conjunto de provas que serão produzidas pode não confirmar o motivo da dispensa, levando o empregador a ser condenado nas indenizações que seriam devidas por uma dispensa imotivada, nada mais.
De maneira geral, os danos causados ao empregado pelo empregador quando descumpre alguma obrigação legal, já encontram na própria lei a forma pela qual irão ser penalizados. Quando o empregador promove certa alteração contratual que venha causar prejuízo ao trabalhador, essa alteração não terá validade jurídica, obrigando o empregador a restabelecer a situação anterior e reparar os prejuízos causados ao empregado. Se o empregado realiza horas extras habituais, estas não podem ser simplesmente abolidas sem antes o pagamento de uma indenização correspondente [30]. O atraso no pagamento de verbas rescisórias, por outro exemplo, dá ao empregado o direito de receber a multa prevista no art. 477, da CLT, e ainda a tutela do art. 467, se for o caso.
De modo que, a todo momento, é possível encontrar na lei, e mesmo na jurisprudência, as formas de reparação dos danos causados pelo patrão ao empregado, até pelo espírito protecionista em que é inspirado o ordenamento jurídico trabalhista.
Dessas considerações, podemos estabelecer, de plano, que são inconcebíveis as tentativas de fazer com que até mesmo os pequenos deslizes do empregador, no cumprimento de uma obrigação legal qualquer, possam se expressar, automaticamente, na obrigação de indenizar por danos morais. Dano moral é dano extraordinário, capaz de causar um considerável abalo psicológico na pessoa, e somente por essa razão é que deve levar à necessidade de indenizar, caso configure-se a responsabilidade civil. Significa reconhecer a real existência do dano, sua extensão e sua relação de causalidade com o ato ou a omissão do empregador.
Ainda o exemplo do atraso no pagamento das verbas rescisórias. Esta falta do empregador tanto pode dar causa à ocorrência de danos morais quanto não. Imagine-se que por conta daquele atraso, o empregado se viu obrigado ao pagamento de multa por atraso na dívida que iria saldar com o dinheiro da rescisão contratual. Mas não só isso. Por conta do atraso, teve também seu nome incluído no SPC (serviço de proteção ao crédito) pelo credor. Ora, é evidente que o empregado sofreu danos significativos não apenas materiais (pagamento de multa pelo atraso da dívida) como também morais (perda do crédito, que é um valor imaterial), e por eles deve ser ressarcido.
Destarte, não cabe apenas argumentar-se com a "possibilidade de sofrer danos", o "risco potencial" de sua ocorrência, etc. Logo, é necessário que o dano se comprove, seja clara a sua existência real, para que possa existir a responsabilidade civil pela reparação.