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Jurisprudência do Supremo Tribunal Federal em matéria tributária.

A progressividade do Imposto sobre a Propriedade Predial e Territorial Urbana

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29/04/2010 às 00:00
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1. INTRODUÇÃO

O IPTU, imposto sobre a propriedade predial e territorial urbana, segundo o disposto no artigo 156, inciso I, da Constituição Federal, pode ser instituído pelos Municípios. Prevê a Constituição, também, a possibilidade de progressividade do IPTU, quando presentes as hipóteses delineadas nos seus art. 156, parágrafo 1o e art. 182, parágrafo 4º.

Conforme a redação original do art. 156, parágrafo 1º, da Constituição Federal, o IPTU poderia ser progressivo, nos termos de lei municipal, para assegurar o cumprimento da função social da propriedade. Estava estabelecida a progressividade extrafiscal do imposto, pois baseada em parâmetro externo ao direito tributário, com a finalidade de alcançar um objetivo social.

O art. 182, parágrafo 4º, por sua vez, facultava ao Poder Público municipal, mediante lei específica para área incluída no plano diretor, exigir, nos termos de lei federal, do proprietário do solo urbano não edificado, subutilizado ou não utilizado, a promoção do seu adequado aproveitamento, sob pena de o imposto sobre a propriedade predial e territorial urbana ser progressivo no tempo. Nesse caso, portanto, somente poderia ser instituído o IPTU progressivo no tempo se houvesse a edição de lei federal, além da previsão da hipótese no plano diretor e da edição de lei específica municipal. A Lei Federal exigida pelo mencionado dispositivo veio a lume apenas em 2001 (Lei nº 10.257, de 2001: "Estatuto da Cidade").

Dessa forma, aos municípios, antes do advento da Lei nº 10.257/2001, que no seu art. 7º disciplinou a progressividade no tempo do IPTU [01], era vedado instituir a progressividade extrafiscal do IPTU prevista no art. 182, parágrafo 4º, da Constituição Federal.

A par dessas hipóteses, muitos municípios estabeleceram a progressividade fiscal das alíquotas do IPTU, fundados exclusivamente no princípio da capacidade contributiva, insculpido no art. 145, parágrafo 1º, da Constituição [02], ou conjugando-o com o mencionado art. 156, parágrafo 1º.

A questão era tormentosa na doutrina e na jurisprudência, tendo em vista que o princípio da capacidade contributiva, para muitos, não podia ser aplicado ao IPTU, um imposto real e não pessoal.

A Emenda Constitucional 29/2000 alterou o texto constitucional e admitiu expressamente a progressividade desse imposto também em razão do valor do imóvel, além de admitir a instituição de alíquotas diferenciadas conforme sua localização e seu uso. Criou-se expressamente, assim, a possibilidade de instituição da progressividade fiscal em função da base de cálculo do tributo.

O debate sobre a constitucionalidade da instituição da progressividade das alíquotas em função do valor do imóvel, todavia, permaneceu, eis que muitos sustentavam ser incompatível com os princípios da igualdade e da capacidade contributiva, pelo fato de o IPTU ter como base de cálculo o valor do bem, sem considerar as condições do sujeito passivo da obrigação tributária.

O propósito deste trabalho é analisar a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal sobre a questão, antes e após a promulgação da Emenda 29/2000.


2. O TEXTO ORIGINAL DO ART. 156 DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL E O PRINCÍPIO CAPACIDADE CONTRIBUTIVA

O princípio da capacidade contributiva (art. 145, parágrafo 1º, da Constituição Federal) é desdobramento do princípio da igualdade, previsto no art. 5º da Constituição Federal. Informa ele que cada pessoa deve contribuir para as despesas da coletividade conforme a sua aptidão econômica, porque, segundo ensina Roque Antônio Carrazza, "realmente, é justo é jurídico que quem, em termos econômicos, tem muito pague, proporcionalmente, mais imposto do que quem tem pouco" (1998,p.65). Busca-se alcançar, dessa forma, a justiça tributária.

Do princípio da capacidade contributiva deriva, ainda, o princípio do não-confisco, previsto no art. 150, inc. IV, da Constituição Federal, porque impede que o legislador obrigue os contribuintes a colaborar com os gastos públicos além de suas possibilidades, esgotando a riqueza tributável das pessoas.

O legislador comumente utiliza duas técnicas para graduar os impostos conforme a capacidade contributiva. Uma é a autorização de dedução de despesas pessoais essenciais da base de cálculo do imposto, como saúde, educação e moradia. A outra técnica é denominada progressividade fiscal, consubstanciada no aumento das alíquotas em função do valor da base de cálculo do imposto (Paulo e Alexandrino, 2006, p.21).

O princípio da contributiva está assim inscrito na Constituição Federal:

"Art. 145 - A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios poderão instituir os seguintes tributos:

....

parágrafo 1º: sempre que possível, os impostos terão caráter pessoal e serão graduados segundo a capacidade econômica do contribuinte, facultado à administração tributária, especialmente para conferir efetividade a esses objetivos, identificar, respeitados os direitos individuais e nos termos da lei, o patrimônio, os rendimentos e as atividades econômicas do contribuinte

...." (g.n)

Duas interpretações foram emprestadas à expressão "sempre que possível" contida no dispositivo.

Conforme a primeira, por ser o princípio da capacidade contributiva corolário lógico do princípio da igualdade, sua aplicação seria imperativa para todos os impostos. A capacidade contributiva seria, nesse caso, objetiva, pois teriam relevância apenas as manifestações objetivas de riqueza do contribuinte, como possuir um imóvel, um automóvel, (Carrazza, 1998). Sempre que possível, ou seja, apenas quando o arquétipo tributário permitisse (Carraza, 1998), os impostos teriam caráter pessoal, pois há impostos cuja estrutura é incompatível com a pessoalidade, como aqueles classificados como indiretos, nos quais a carga tributária não é suportada pelo sujeito passivo da obrigação, mas transferida para um terceiro (ICMS e o IOF, por exemplo).

A outra interpretação, de forma diversa, indica que a expressão "sempre que possível" restringe a aplicação do princípio da capacidade contributiva apenas aos casos em que é factível aferir a capacidade econômica do contribuinte. Dessa forma, o princípio incide apenas sobre os impostos classificados como pessoais, quais sejam, aqueles que levam em conta as condições pessoais do sujeito passivo para suportar a carga econômica do imposto, enquanto os impostos reais, que recaem objetivamente sobre determinado bem, receita ou operação, independentemente da situação econômica ou condição social do proprietário, devem ser necessariamente proporcionais [03].

O Supremo Tribunal Federal, em várias oportunidades, assentou que a Constituição refere-se, no art. 145, parágrafo 1º, à capacidade contributiva subjetiva, pois afirmou que não se aplicam aos impostos de caráter real a progressividade fiscal, apenas a progressividade extrafiscal quando expressamente admitida. A ementa que se transcreve ilustra bem essa assertiva:

"IPTU. Não se admite a progressividade fiscal decorrente da capacidade econômica do contribuinte, dada a natureza real do imposto. A progressividade da alíquota do IPTU, com base no valor venal do imóvel, só é admissível para o fim extrafiscal de assegurar o cumprimento da função social da propriedade urbana (art. 156, I, § 1º e art. 182, § 4º, II, CF)." (AI 468.801-AgR, Rel. Min. Eros Grau, DJ 15/10/04)

No mesmo sentido, citamos a ementa:

"CONSTITUCIONAL. TRIBUTÁRIO. IMPOSTO DE TRANSMISSÃO DE IMÓVEIS, INTER VIVOS - ITBI. ALÍQUOTAS PROGRESSIVAS. C.F., art. 156, II, § 2º. Lei nº 11.154, de 30.12.91, do Município de São Paulo, SP. I. - Imposto de transmissão de imóveis, inter vivos - ITBI: alíquotas progressivas: a Constituição Federal não autoriza a progressividade das alíquotas, realizando-se o princípio da capacidade contributiva proporcionalmente ao preço da venda. II. - R.E. conhecido e provido" (RE 234105 / SP - SÃO PAULO

RECURSO EXTRAORDINÁRIO, Relator(a): Min. CARLOS VELLOSO, Julgamento: 08/04/1999,Órgão Julgador: Tribunal Pleno, Publicação DJ 31-03-2000 PP-00061EMENT VOL-1985-04 PP-00823)".

Conforme o Supremo Tribunal Federal, não seria aplicável ao IPTU, portanto, a progressividade fiscal instituída para atender ao princípio da capacidade contributiva (art. 145, § 1.º, da Constituição), por ser um imposto de caráter real.

Por essa razão, foi editada, em 2003, a súmula 668 do Supremo Tribunal Federal: "É inconstitucional a lei municipal que tenha estabelecido, antes da emenda constitucional 29/2000, alíquotas progressivas para o IPTU, salvo se destinada a assegurar o cumprimento da função social da propriedade urbana".


3. PROGRESSIVIDADE EXTRAFISCAL DO IPTU

Antes da edição da Emenda Constitucional nº 29/2000, a Constituição previa, no caso do IPTU, a possibilidade de sua aplicação extrafiscal, para disciplinar comportamentos dos contribuintes em nada relacionados com a finalidade de arrecadação de recursos.

Determinava-se que as alíquotas do IPTU seriam progressivas para assegurar o cumprimento da função social da propriedade (art.156, parágrafo 1º) e o seu adequado aproveitamento, quando o solo urbano for não edificado, subutilizado ou não utilizado (art. 182, parágrafo 4º).

A função social da propriedade estava revelada pelo plano diretor do Município, conforme disposto no art. 182, § 2.º, da Constituição Federal, segundo o qual "a propriedade urbana cumpre sua função social quando atende às exigências fundamentais da ordenação da cidade expressas no plano diretor".

Determinava o parágrafo 1º do art.156, na sua redação original:

"Art. 156. Compete aos Municípios instituir impostos sobre:

I - propriedade predial e territorial urbana;

...

...

...

...

§ 1º - O imposto previsto no inciso I poderá ser progressivo, nos termos de lei municipal, de forma a assegurar o cumprimento da função social da propriedade"

O art. 182, que não sofreu alterações, por sua vez, dispõe que:

"Art. 182. A política de desenvolvimento urbano, executada pelo Poder Público municipal, conforme diretrizes gerais fixadas em lei, tem por objetivo ordenar o pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade e garantir o bem- estar de seus habitantes.

§ 1º - O plano diretor, aprovado pela Câmara Municipal, obrigatório para cidades com mais de vinte mil habitantes, é o instrumento básico da política de desenvolvimento e de expansão urbana.

§ 2º - A propriedade urbana cumpre sua função social quando atende às exigências fundamentais de ordenação da cidade expressas no plano diretor.

§ 3º - As desapropriações de imóveis urbanos serão feitas com prévia e justa indenização em dinheiro.

§ 4º - É facultado ao Poder Público municipal, mediante lei específica para área incluída no plano diretor, exigir, nos termos da lei federal, do proprietário do solo urbano não edificado, subutilizado ou não utilizado, que promova seu adequado aproveitamento, sob pena, sucessivamente, de:

I - parcelamento ou edificação compulsórios;

II - imposto sobre a propriedade predial e territorial urbana progressivo no tempo;

III - desapropriação com pagamento mediante títulos da dívida pública de emissão previamente aprovada pelo Senado Federal, com prazo de resgate de até dez anos, em parcelas anuais, iguais e sucessivas, assegurados o valor real da indenização e os juros legais." (g.n.)

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Parte da doutrina diferenciava a progressividade fiscal, imposta pela Constituição para atender ao princípio da capacidade contributiva (art. 145, parágrafo 1º), de duas espécies de progressividade extrafiscal do IPTU.

A primeira das modalidades de progressividade do IPTU, cujo objetivo era atender a função social da propriedade (art. 156, parágrafo 1º), dependia, para sua implementação, apenas da edição de lei municipal.

A segunda espécie, denominada também de progressividade-sanção ou progressividade no tempo (art. 182, parágrafo 4º), teria por fim garantir o adequado aproveitamento do solo urbano e somente poderia ser criada pelos municípios após edição de lei federal estabelecendo, de forma uniforme para o território nacional, os requisitos para a aplicação das sanções previstas no art. 182, parágrafo 4º da Constituição Federal.

Não obstante a previsão da progressividade extrafiscal em dois dispositivos distintos da Constituição Federal, o Supremo Tribunal Federal decidiu, no Recurso Especial 153.771-0/MG, que a função social da propriedade urbana, por se tratar de limitação ao exercício do direito de propriedade constitucionalmente garantido (art. 5º, inc. XXIII), somente poderia ser estabelecida na própria Carta Magna, ou em lei federal, posto que não se poderia admitir a variação desse conceito conforme as concepções políticas dos mais de 5.000 municípios do país:

" IPTU. Progressividade.

- No sistema tributário nacional é o IPTU inequivocamente um imposto real. - Sob o império da atual Constituição, não é admitida a progressividade fiscal do IPTU, quer com base exclusivamente no seu artigo 145, § 1º, porque esse imposto tem caráter real que é incompatível com a progressividade decorrente da capacidade econômica do contribuinte, quer com arrimo na conjugação desse dispositivo constitucional (genérico) com o artigo 156, § 1º (específico).

- A interpretação sistemática da Constituição conduz inequivocamente à conclusão de que o IPTU com finalidade extrafiscal a que alude o inciso II do § 4º do artigo 182 é a explicitação especificada, inclusive com limitação temporal, do IPTU com finalidade extrafiscal aludido no artigo 156, I, § 1º.

- Portanto, é inconstitucional qualquer progressividade, em se tratando de IPTU, que não atenda exclusivamente ao disposto no artigo 156, § 1º, aplicado com as limitações expressamente constantes dos §§ 2º e 4º do artigo 182, ambos da Constituição Federal.

Recurso extraordinário conhecido e provido, declarando-se inconstitucional o sub-item 2.2.3 do setor II da Tabela III da Lei 5.641, de 22.12.89, no município de Belo Horizonte.

Decisão

- Por maioria de votos, o Tribunal conheceu do recurso e lhe deu provimento para deferir o mandado de segurança e declarar a inconstitucionalidade do sub-item 2.2.3 do Setor II da Tabela III, da Lei nº 5.641, de 22.12.89, do Município de Belo Horizonte, vencido o Ministro Carlos Velloso (Relator), que não conhecia do recurso. Votou o Presidente. Relator para o acórdão o Ministro Moreira Alves. Ausente, justificadamente, o Ministro Marco Aurélio. Plenário, 20.11.96".(g.n.)

(RE 153771 / MG - MINAS GERAIS- RECURSO EXTRAORDINÁRIO, Relator: Min. MOREIRA ALVES, Julgamento: 05/09/1997, Órgão Julgador: Tribunal Pleno, Publicação DJ 05-09-1997 PP-41892, EMENT VOL-01881-03 PP-0049, RTJ VOL-00162-02 PP-00726)

O Ministro Moreira Alves, autor do voto condutor do acórdão, esclareceu que:

"... A interpretação sistemática da Constituição conduz inequivocamente à conclusão de que o IPTU com finalidade extrafiscal a que alude o inciso II do § 4º do artigo 182 é a explicitação especificada, inclusive com limitação temporal, do IPTU com finalidade extrafiscal aludido no artigo 156, I, § 1º, até porque não tem sentido que se admitam, no mesmo texto constitucional, com a finalidade extrafiscal de atender à mesma função social da propriedade, um IPTU sem limitações que não as decorrentes da vontade de cada município e outro IPTU com as limitações expressamente estabelecidas na Carta Magna, podendo um excluir o outro, ou ser instituídos cumulativamente. Por outro lado, essa exegese não é infirmada pela circunstância de a Constituição, no parágrafo 4º do artigo 182, haver limitado a finalidade extrafiscal do IPTU ao solo urbano não edificado, seja ele subutilizado, seja ele não utilizado, porque foi essa a opção adotada pelo constituinte, como o foi também a de estabelecer a progressividade extrafiscal, em se tratando de IPTU, como progressividade temporal."

Estabeleceu-se, assim, que o IPTU somente admitia uma forma de progressividade, a extrafiscal, derivada da interpretação conjugada dos arts.156, parágrafo 1º e 182, parágrafo 4º, da Constituição Federal.

Por essa razão, a exemplo da lei do Município de Santo André, as leis municipais impugnadas pela via do controle difuso, que instituíram a progressividade extrafiscal do IPTU fundadas apenas no art. 156 da Constituição, foram declaradas inconstitucionais:

"MUNICÍPIO DE SANTO ANDRÉ. TRIBUTÁRIO. ARTIGOS 2 E 3º DA LEI Nº 6.747, DE 21.12.90. IPTU CALCULADO COM BASE EM ALÍQUOTA PROGRESSIVA, EM RAZÃO DA ÁREA DO TERRENO E DO VALOR VENAL DO IMÓVEL E DAS EDIFICAÇÕES. Ilegitimidade da exigência, nos moldes explicitados, por ofensa ao art. 182, § 4º, II, da Constituição Federal, que limita a faculdade contida no art. 156, § 1º, à observância do disposto em lei federal e à utilização do fator tempo para a graduação do tributo. Recurso conhecido e provido, declarando-se a inconstitucionalidade dos arts. 2º e 3º da Lei Municipal nº 6.747, de 1990" (RE 194036 / SP - SÃO PAULO, RECURSO EXTRAORDINÁRIO, Relator(a): Min. ILMAR GALVÃO, Julgamento: 24/04/1997, Órgão Julgador: TRIBUNAL PLENO, Publicação DJ 20-06-1997 PP-28490 EMENT VOL-01874-08 PP-01627)


4. A DIVERSIDADE DE ALÍQUOTAS EM RAZÃO DA EDIFICAÇÃO OU NÃO – NÃO CARACTERIZAÇÃO DA PROGRESSIVIDADE

Conforme o exposto, o Supremo Tribunal Federal, diante da redação original da Constituição Federal, afirmou que apenas se admitia a progressividade extrafiscal do IPTU na hipótese do seu art. 156, parágrafo 1º (assegurar o cumprimento da função social da propriedade), cujos requisitos estavam relacionados no art. 182, parágrafo 4º, do próprio texto constitucional.

Não se pode perder de vista, todavia, que o IPTU poderia ser instituído de forma não progressiva, tanto para atender a sua função primordial, de arrecadação de recursos para as despesas ordinárias do ente federativo, como para alcançar finalidades extrafiscais. Muitos municípios, de fato, assim o fizeram, criando alíquotas diferenciadas para imóveis residenciais e não residenciais, ou para imóveis edificados e não edificados.

Não obstante nesses casos muitos sustentassem tratar-se de progressividade de alíquotas não permitida, enquanto não cumpridos os requisitos do art. 182, parágrafo 4º, da Constituição Federal, o Supremo Tribunal Federal esclareceu que as alíquotas diferenciadas não se confundiam com a progressividade:

"TRIBUTÁRIO. IPTU. MUNICÍPIO DE SÃO JOSÉ DO RIO PRETO. LEI Nº 5.447/93, ART. 25, REDAÇÃO DA LEI Nº 5.722/94. ALEGADA OFENSA AO ART. 156 DA CONSTITUIÇÃO. Simples duplicidade de alíquotas, em razão de encontrar-se, ou não, edificado o imóvel urbano, que não se confunde com a progressividade do tributo, que o STF tem por inconstitucional quando não atendido o disposto no art. 156, § 1º, aplicado com as limitações expressamente constantes dos §§ 2º e 4º do art. 182 da Carta de 1988. Recurso não conhecido." (RE 229233 / SP - SÃO PAULO, RECURSO EXTRAORDINÁRIO, Relator(a): Min. ILMAR GALVÃO, Julgamento: 26/03/1999, Órgão Julgador: Primeira Turma, Publicação DJ 25-06-1999 PP-00033, EMENT VOL-01956-09 PP-01895)

O Ministro Ilmar Galvão, ao votar no RE nº 229.233-7/SP, cuja ementa foi transcrita a cima, explanou sobre a diferença, asseverando:

"Com efeito, não há confundir a existência de alíquotas diversas, em razão de encontrar-se, ou não, o imóvel edificado, caso sob exame, com a progressividade, que se caracteriza pelo cálculo do tributo com base em índices que aumentam ou diminuem, gradualmente, ora em atenção à pessoa do proprietário – vedada pela Constituição – ora em face do imóvel, hipótese em que o STF declarou inconstitucional, quando não atendido o disposto no art. 156, parágrafo 1º, aplicado com as limitações expressamente constantes dos parágrafos 2º e 4º do art. 182 da Carta Federal."

A mesma solução foi adotada, pelo Supremo Tribunal Federal, para as alíquotas diversas fixadas para imóveis residenciais e não residenciais:

"IPTU: L. 691/84 do Município do Rio de Janeiro. 1.O não recebimento do art. 67 da L. 691/84 do Município do Rio de Janeiro foi declarado expressamente no julgamento do RE 248.892, Maurício Corrêa, RTJ 175/37, atingindo apenas a progressividade do IPTU, na forma da jurisprudência do STF, que só a admite na hipótese do art. 182, § 4º, II, da Constituição, quando destinada a assegurar o cumprimento da função social da propriedade urbana. 2. A criação de alíquotas diferentes para imóveis residenciais e não-residenciais não fere a Constituição Federal (v.g. RE 229.233, 26.3.1999, Ilmar Galvão, DJ 25.6.1999)". (AI-AgR 541221 / RJ - RIO DE JANEIRO, AG.REG.NO AGRAVO DE INSTRUMENTO, Relator(a): Min. SEPÚLVEDA PERTENCE, Julgamento: 09/08/2005, Órgão Julgador: Primeira Turma, Publicação DJ 02-09-2005 PP-00022 EMENT VOL-02203-08 PP-01674)

Dessa forma, a duplicidade de alíquotas, instituída com a finalidade de assegurar a função social da propriedade, não era vedada pela redação original do texto da Carta Magna, por não se tratar de progressividade.

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Sobre a autora
Lilian Fernandes Gibilini

Procuradora do Banco Central do Brasil, especializanda em em Direito Público pela Escola Paulista de Direito - EPD

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

GIBILINI, Lilian Fernandes. Jurisprudência do Supremo Tribunal Federal em matéria tributária.: A progressividade do Imposto sobre a Propriedade Predial e Territorial Urbana. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 15, n. 2493, 29 abr. 2010. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/14771. Acesso em: 26 abr. 2024.

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