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Princípio da inafastabilidade do controle jurisdicional (direito de ação)

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03/05/2010 às 00:00

Resumo:


  • O princípio da inafastabilidade do controle jurisdicional é uma garantia constitucional que assegura a todos o acesso ao Judiciário para a proteção de direitos, sendo uma manifestação do Estado de Direito e um elemento da separação dos poderes.

  • Esse princípio significa que o legislador infraconstitucional não pode mitigar o direito de ação, nem mesmo por emenda à Constituição, visto se tratar de cláusula pétrea, com exceções apenas previstas pelo próprio Poder Constituinte originário.

  • O direito de ação implica também o direito ao devido processo constitucional, garantindo não apenas o acesso aos tribunais, mas também a utilização do processo como instrumento para a atuação da atividade jurisdicional, assegurando a tutela jurisdicional adequada.

Resumo criado por JUSTICIA, o assistente de inteligência artificial do Jus.

V – Questões polêmicas

A aplicação do princípio da inafastabilidade do controle jurisdicional suscita calorosos debates na doutrina e na jurisprudência nacionais. Veremos, a seguir, algumas das questões mais polemicas sobre o tema.

5.1. Convenção de arbitragem

Não vislumbramos ofensa ao direito constitucional de ação na instituição da convenção de arbitragem, pois além desta decorrer de uma livre escolha das partes, apenas pode versar sobre direitos disponíveis.

Não há no ordenamento jurídico brasileiro norma legal que obrigue o indivíduo a buscar a solução dos conflitos de interesses na via arbitral, como requisito de acesso ao Judiciário. Se houvesse regra desse jaez, aí, sim, poder-se-ia falar em lesão ao princípio esculpido no art. 5º, XXXV, da CF.

5.2. Fungibilidade dos recursos

Havendo dúvida objetiva sobre qual o recurso adequado, sendo tempestiva a sua interposição e inexistindo erro grosseiro, deve ser aplicado o princípio da fungibilidade, substituindo-se o recurso erroneamente interposto pelo que seria correto, como medida de garantia do direito de ação.

Entender-se de modo diverso é o mesmo que impedir a parte de exercer a sua defesa no processo civil, o que configura violação ao principio a inafastabilidade do acesso ao Judiciário.

5.3. Taxas judiciárias excessivas

Malgrado inexista garantia de gratuidade do processo, a fixação das taxas judiciárias em valores excessivos representa obstáculo ao acesso à Justiça, daí emanando a sua inconstitucionalidade.

A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal é firme nesse sentido, declarando inconstitucionais tanto as taxas judiciárias calculadas sem limite (Súmula n. 667: "Viola a garantia constitucional de acesso à jurisdição a taxa judiciária calculada sem limite sobre o valor da causa"), quanto a estipulação de alíquotas excessivas ou a omissão de um limite, desde que desproporcionais ao custo do serviço que remuneram, conforme se verifica do aresto abaixo:

"EMENTA: I. Taxa Judiciária: sua legitimidade constitucional, admitindo-se que tome por base de cálculo o valor da causa ou da condenação, o que não basta para subtrair-lhe a natureza de taxa e convertê-la em imposto: precedentes (ADIn 948-GO, 9.11.95, Rezek; ADIn MC 1.772-MG, 15.4.98, Velloso). II. Legítimas em princípio a taxa judiciária e as custas ad valorem afrontam, contudo, a garantia constitucional de acesso à jurisdição (CF, art. 5º, XXXV) se a alíquota excessiva ou a omissão de um limite absoluto as tornam desproporcionadas ao custo do serviço que remuneraram: precedentes (Rp 1.077-RJ, 28.3.84, Moreira, RTJ 112/34; Rp 1.074-, 15.8.84, Falcão, RTJ 112/499; ADIn 948-GO, 9.11.95, Rezek; ADIn MC 1.378-5, 30.11.95, Celso, DJ 30.5.97; ADIn MC 1.651-PB, Sanches, DJ 11.9.98; ADIn MC 1.772-MG, 15.4.98, Velloso). III. ADIn: medida cautelar: não se defere, embora plausível a argüição, quando - dado o conseqüentes restabelecimento da eficácia da legislação anterior - agravaria a inconstitucionalidade denunciada: é o caso em que, se se suspende, por aparentemente desarrazoada, a limitação das custas judiciais a 5% do valor da causa, seria restabelecida a lei anterior que as tolerava até 20%. IV. Custas dos serviços forenses: matéria de competência concorrente da União e dos Estados (CF 24, IV), donde restringir-se o âmbito da legislação federal ao estabelecimento de normas gerais, cuja omissão não inibe os Estados, enquanto perdure, de exercer competência plena a respeito (CF, art. 24, §§ 3º e 4º). V. Custas judiciais são taxas, do que resulta - ao contrário do que sucede aos impostos (CF, art. 167, IV) - a alocação do produto de sua arrecadação ao Poder Judiciário, cuja atividade remunera; e nada impede a afetação dos recursos correspondentes a determinado tipo de despesas - no caso, as de capital, investimento e treinamento de pessoal da Justiça - cuja finalidade tem inequívoco liame instrumental com o serviço judiciário" (ADI 1926 MC/PE, Tribunal Pleno, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, DJ 10-09-1999).

5.4. Restrições legais à concessão de liminares

A imposição de restrições legais à concessão de liminares ofende o princípio do direito de ação, pois obstrui o acesso à Justiça e atenta contra a separação de poderes.

Nessa senda, considerando-se que o direito de ação assegura a obtenção pelo cidadão da tutela jurisdicional adequada, de nada valeria referida garantia constitucional se a liminar fosse necessária como tutela jurisdicional adequada e o órgão judiciário estivesse impedido de concedê-la.

Portanto, mesmo que haja proibição expressa em lei, se a concessão da liminar apresentar-se como a única tutela jurisdicional adequada, o juiz deverá entregar tal prestação, sob pena de restar malferido o indigitado direito constitucional.

5.5. Jurisdição condicionada ou instância administrativa de curso forçado

Como afirmamos supra, tirante as exceções de sede constitucional (art. 227, §1º, CF – Justiça Desportiva), nenhuma lei (em sentido lato, conforme art. 59, da CF) pode impor limitações ao direito de ação.

São, destarte, inconstitucionais medidas que obriguem o esgotamento das vias administrativas para a obtenção do provimento que se deseja em juízo, como era previsto na Constituição de 1967 (art. 153, §4º), que autorizava lei infraconstitucional a instituir condições de procedibilidade da ação civil.

Atualmente, a Lei Fundamental não mais permite a instância administrativa de curso forçado ou a jurisdição condicionada.

No âmbito do processo trabalhista, dois importantes assuntos, relacionados ao vertente tema, merecem uma detida análise: a criação das Comissões de Conciliação Prévia pela Lei n. 9.958/00, que introduziu os arts. 625-A a 625-H na CLT; e a necessidade de "comum acordo" para a instauração do Dissídio Coletivo, instituída pela Emenda Constitucional n. 45/04.

Acerca dos tópicos relevados, argumentava-se, e ainda se argumenta, que tanto uma quanto outra circunstância malferem o direito constitucional de ação, pelo fato de estabelecerem óbices de acesso ao Judiciário.

Examinemos cada uma das situações de per si.

A Lei n. 9.958/00, que introduziu em nosso ordenamento as chamadas comissões de conciliação prévia, determina que, existindo na localidade do conflito comissões de conciliação prévia em funcionamento, qualquer demanda de natureza trabalhista somente será levada à Justiça do Trabalho depois de submetida à respectiva comissão, encarecendo-se seja anexada à petição inicial a declaração da tentativa conciliatória frustrada.

Em nosso sentir, o dispositivo legal constitui pressuposto processual que não importa obstáculo ao direito de ação, uma vez que o legislador ordinário pode estabelecer pressupostos processuais, desde que não impeditivos do direito de ação. De mais a mais, as citadas comissões constituem-se apenas em instâncias prévias conciliatórias, estando obrigadas a designar a sessão de tentativa de conciliação em dez dias a contar da provocação do interessado, ficando suspenso, a partir desta provocação, o prazo prescricional.

O Tribunal Superior do Trabalho, em diversas oportunidades, expressou manifestação sobre a matéria, afastando a alegação de ofensa ao princípio do direito de ação. A vexata quaestio que persiste na mais alta Corte Trabalhista cinge-se à natureza de tal exigência, se pressuposto processual ou condição da ação, como demonstram as decisões a seguir:

"RECURSO DE REVISTA. OBRIGATORIEDADE DA SUBMISSÃO DA DEMANDA À COMISSÃO DE CONCILIAÇÃO PRÉVIA. A submissão da demanda à Comissão Prévia de Conciliação, estabelecida no art. 625-D, da CLT, é obrigatória e, assim, constitui pressuposto para a constituição e desenvolvimento válido e regular do processo. Recurso de revista a que se nega provimento" (TST-RR-662/2002-058-15-00, 5ª T., Rel. Min. Gelson de Azevedo, DJ 11/11/2005);

"COMISSÃO DE CONCILIAÇÃO PRÉVIA. DEMANDA TRABALHISTA. SUBMISSÃO. OBRIGATORIEDADE. CARÊNCIA DE AÇÃO. 1. A Lei 9.958/00 introduziu na CLT o artigo 625-D, que elevou a submissão de demanda trabalhista às Comissões de Conciliação Prévia como condição necessária para o ajuizamento de ação trabalhista. 2. Assim, a ausência de provocação da Comissão de Conciliação existente, anteriormente à propositura da reclamatória, enseja a extinção do processo sem julgamento do mérito" (TST-RR-75517/2003-900-02-00.6, 1ª T., Rel. Min. João Oreste Dalazen, DJ - 11/11/2005).

De relação aos dissídios coletivos, exigia-se, antes da Emenda n. 45/04, que, tão-somente, fossem esgotadas as tentativas de negociação entre as partes. Após a promulgação da Emenda da Reforma do Judiciário, jazeu alterado o §2º, do art. 114, da Constituição Federal, que passou a incluir a expressão "comum acordo" como condição para o ajuizamento do dissídio coletivo de natureza econômica, in verbis:

"Recusando-se qualquer das partes à negociação ou á arbitragem, é facultado às mesmas, de comum acordo, ajuizar dissídio coletivo de natureza econômica, podendo a Justiça do Trabalho decidir o conflito, respeitadas as disposições mínimas legais de proteção ao trabalho, bem como as convencionadas anteriormente".

Dada a incipiência da modificação, os momentosos debates doutrinários e jurisprudenciais se avolumam, polarizando a celeuma. Tramitam, no Supremo Tribunal Federal, pelo menos três ações diretas de inconstitucionalidade [55], questionando a validade do termo "comum acordo". Não obstante, os Tribunais Regionais do Trabalho começam a se manifestar a esse respeito, plasmando o entendimento de que nada foi modificado, vale dizer, que a instauração do dissídio coletivo prescinde da anuência da parte contrária [56]. Não é assim que pensamos. A evidente alteração do texto constitucional não pode desprezada, como se nada tivesse acontecido. A vontade do Legislador foi no sentido de incluir a exigência do comum acordo para o aforamento dos dissídios de natureza econômica, e essa atitude tem uma razão de ser: o estímulo às negociações coletivas. Aderimos, portanto, ao posicionamento do Ministro Castilho, ipsis litteris:

"Agora, como já fixado acima, o Dissídio Coletivo somente terá curso normal se ambas as partes estiverem de acordo com tal caminho judicial.

Os empregados, querem um aumento salarial e a manutenção de cláusulas sociais, os empregadores não concordam com os pedidos e vedam o Dissídio Coletivo.

Nesta hipótese, se o Sindicato obreiro tiver força estará aberta para ele a única via possível para a conquista de suas reivindicações: a greve.

Logo, embora não tenha sido este o desejo dos reformadores da Constituição Federal, este é o caminho que restará aos trabalhadores" [57].

Doutro tanto, inexiste, em nossa opinião, a alegada inconstitucionalidade proclamada, haja vista que o ajuizamento de dissídio de natureza econômica tem como efeito o exercício do denominado poder normativo pelos tribunais do trabalho, e esta atividade, como é cediço, nada tem de jurisdicional. Cuida-se, a rigor, de atividade legiferante, uma vez que cria normas e condições de trabalho para todos os integrantes das categorias profissionais e econômicas envolvidas no litígio.

Corolariamente, não se há falar em violação ao direito constitucional de acesso à jurisdição: o direito de ação é direito público subjetivo, cujo conteúdo é a prestação da tutela jurisdicional pelo Estado, ou seja, pelo direito de ação, o titular do direito material visa a obtenção da prestação jurisdicional, que constitui obrigação do Estado, inexistindo, por conseguinte, direito a prestação de atividade legislativa a cargo do Judiciário.

Toda decisão resultante de dissídio coletivo de natureza econômica consubstancia atividade legislativa, e não jurisdicional, vale dizer, o Judiciário trabalhista, ao decidir um dissídio coletivo de natureza econômica, exerce o denominado poder normativo, por meio do qual cria normas jurídicas e estabelece condições de trabalho, proferindo sentença normativa.

O poder normativo não é expressão do poder jurisdicional, tratando-se, na verdade, de atuação de índole legislativa. Ao Judiciário cabe o exercício da função jurisdicional, que consiste naquela atividade substitutiva da vontade das partes em conflito pela vontade do Estado, que faz atuar a vontade do direito objetivo válida para o caso concreto.

O desempenho de atividade legislativa pela Justiça do Trabalho, através do poder normativo, deve ser vista como de caráter excepcional, porque desbordante da função típica desse Poder de Estado, que é a jurisdicional - aliás, importa sublinhar que o poder normativo somente existia porque a Constituição Federal assim o previa; agora, com a modificação propiciada pela Emenda n. 45/2004, desapareceu a regra que a previa, o que, consequentemente, tem o condão de fazer desaparecer o próprio poder normativo.

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Portanto, não havendo manifestação de jurisdição no exercício do poder normativo, não se pode falar em ofensa ao direito de ação ou em vedação de acesso à jurisdição.

A propósito, na esteira do art. 5º, XXXV, da Carta de 1988, nenhuma lesão ou ameaça a direito pode deixar de receber a devida tutela jurisdicional. Isso significa que, havendo lesão ou ameaça a direito, o titular do direito material pode exigir que o Estado, através do Judiciário, preste atividade jurisdicional.

Destarte, não se cuidando o julgamento de dissídios coletivos de natureza econômica de resultado do exercício de atividade jurisdicional pelo Estado, falece razão àqueles que sustentam que a exigência de "comum acordo" para a sua instauração representa ofensa ao princípio constitucional da inafastabilidade de acesso à jurisdição.

Ad argumentandum, mesmo que o poder normativo se inserisse na atividade jurisdicional, ainda assim não se poderia falar em inconstitucionalidade na exigência de "comum acordo" para a sua instauração, por ofensa a cláusula pétrea (art. 60, §4º, IV, da CF), tendo em vista que o ajuizamento de dissídio coletivo de natureza econômica e a consequente obtenção de sentença normativa possui cariz de direito coletivo – nesse sentido, também as convenções e acordos coletivos, institutos mais próximos da sentença normativa, estão inseridos no Capítulo dos direitos sociais (art. 7º, XXVI, CF) -, ao passo que a proibição do art. 60, §4º, IV, da CF, diz respeito apenas aos direitos e garantias individuais.

O "comum acordo" é, portanto, condição da ação (ou pressuposto processual para alguns), sem a qual não se estabelece a relação jurídica inerente ao dissídio. O dissídio somente será suscitado se as partes, de "comum acordo", o quiserem. Caso contrário, dissídio inexistirá. Disso resulta que a atividade da Justiça do Trabalho nesses dissídios terá natureza de uma arbitragem pública, não sujeita a recurso.

5.6. Depósito de 5% sobre o valor da causa como condição de procedibilidade da ação rescisória

No tocante à exigência de deposito de 5% sobre o valor da causa como condição de procedibilidade da ação rescisória, contida no art. 488, II, do CPC, entendemos que tal expediente não fere o princípio do direito de ação, tendo em vista que a lide já foi apreciada e sobre ela pesa a autoridade da coisa julgada.

A desconstituição da sentença pela via da rescisória afigura-se como medida excepcional, justificando-se, desse modo, a imposição do depósito, que, ao final, reverterá, a título de multa, em favor do réu, na hipótese de inadmissibilidade ou improcedência da demanda, por unanimidade de votos. Gize-se que no processo do trabalho esse depósito é dispensado, na esteira do art. 836, da CLT.

5.7. Exigência de depósito na ação declaratória ou anulatória de débito fiscal

É inelutável que a exigência de depósito prévio do valor do débito, monetariamente corrigido, acrescido de juros, multa de mora e demais encargos, nos termos do art. 38, da Lei de Execuções Fiscais (Lei n. 6.830/80), para as ações declaratória ou anulatória de débito fiscal, vulneram o direito de ação.

Somente faz sentido impor-se o sobredito depósito quando o contribuinte pretenda inibir a ação de execução fiscal, pois, nesse caso, a execução fiscal sequer pode ser ajuizada e, se já o foi, não pode prosseguir (art. 151, II, CTN).

5.8. Prazo para impetração de mandado de segurança

Dissente a doutrina em derredor da constitucionalidade da fixação, pelo art. 18, da Lei n. 1.533/51, do prazo de 120 dias para impetração de mandado de segurança. São duas as posições: os adeptos da primeira corrente seguem a linha consolidada na Súmula 632/STF ("É constitucional lei que fixa o prazo de decadência para a impetração de mandado de segurança"); os prosélitos da segunda entendem que é incompatível com a norma constitucional a fixação de tal prazo pelo legislador ordinário.

Fazemos coro aos sequazes da segunda posição [58]. O legislador ordinário não tem legitimidade para restringir garantia constitucional. Se a Lei Maior determina que basta a existência de direito líquido e certo ameaçado ou lesado por ato ilegal ou abusivo de autoridade, não há nenhuma razão que justifique a criação de novos requisitos pela lei infraconstitucional.

5.9. Prova pré-constituída em habeas data

Quanto à necessidade da produção de prova pré-constituída em habeas data, estabelecida pelo art. 8º, da Lei n. 9.507/97, subsiste, também, dicotomia doutrinária: duas correntes se debatem em torno da constitucionalidade da exigência. A primeira defende que referida imposição não pode estar contida em lei, à mingua de previsão constitucional nesse sentido. A segunda sustenta a ausência de interesse de agir acaso não demonstrada a recusa de informação por parte da autoridade administrativa, sendo esta a posição da jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça (Súmula 2: "Não cabe o habeas data (CF, art. 5., LXXII, letra ‘a’) se não houve recusa de informações por parte da autoridade administrativa").

Mais uma vez, nos colocamos ao lado dos que comungam com a tese da inconstitucionalidade da determinação legal suscitada. Aqui, diferentemente do que sucede com o mandado de segurança, a Constituição Federal não exigiu direito líquido e certo, quedando-se, pois, excessiva a regra que ordena a apresentação de prova pré-constituída, porque desbordante da prescrição constitucional. Entendemos que, de acordo com a Constituição, a parte impetrante poderá, sempre, valer-se da dilação probatória, colimando demonstrar a existência do seu direito.

5.10. Prequestionamento

Em relação ao prequestionamento da matéria objeto do recurso, requerido pelos tribunais superiores como pressuposto de admissibilidade do próprio recurso, somos da opinião de que referida exigência não representa ofensa ao direito de ação, pois os recursos especial e extraordinário só terão cabimento nas causas já decididas, conforme disciplinado pelos arts. 102, III, e 105, III, da CF/88. Valem, nessa quadra, as mesmas observações feitas acima no que tange à ação rescisória.

5.11. Existência de lacunas

A função jurisdicional é indeclinável, o que significa que o juiz não pode deixar de sentenciar alegando que a hipótese não está contemplada na lei. O ordenamento jurídico brasileiro contém dispositivo expresso vedando o non liquet (art. 126, do CPC).

Por isso, existindo lacuna na lei, o magistrado deverá socorrer-se dos institutos existentes no ordenamento jurídico, utilizando-se da analogia, dos costumes e dos princípios gerais de direito. A recusa em proferir sentença implica, desse modo, ofensa ao direito de ação

5.12. Competência de órgão colegiado e decisão de magistrado singular (confronto dos arts. 102, III, e 105, III, CF, com os art. 544, §3º, e 557, caput e §1ª-A, CPC)

Em que pese o preceptivo constitucional (arts. 102, III, e 105, III, CF), no sentido de que as causas submetidas ao Supremo Tribunal Federal e ao Superior Tribunal de Justiça sejam julgadas pelo órgão (colegiado, portanto), a lei processual autoriza o relator (órgão singular) a: conhecer do agravo para dar provimento ao próprio recurso especial, se o acórdão recorrido estiver em confronto com a súmula ou jurisprudência dominante do Superior Tribunal de Justiça (art. 544, §3º); negar seguimento a recurso manifestamente intempestivo, improcedente, prejudicado ou em confronto com súmula ou com jurisprudência dominante do respectivo tribunal, do Supremo Tribunal Federal, ou de Tribunal Superior (art. 557, caput, CPC); ou dar provimento ao recurso se a decisão recorrida estiver em manifesto confronto com súmula ou com jurisprudência dominante do Supremo Tribunal Federal, ou de Tribunal Superior (art. 557, §1º-A, CPC).

Considerando que da decisões acima cabe agravo para o órgão competente para o julgamento do recurso (colegiado, portanto), nos termos dos artigos 545 e 557, §1º, do CPC, não se vislumbra ofensa ao direito de ação, pois, além desses dispositivos atenderem a medidas de economia e celeridade processuais, o interessado poderá recorrer da decisão monocrática encaminhando o seu inconformismo ao órgão colegiado competente para julgar o mérito do recurso.

5.13. Súmula vinculante e efeito vinculante

É consabido que o tema em epígrafe, polêmico e apaixonante, suscita as mais variegadas opiniões.

Vale à pena trazer à baila as percucientes e favoráveis observações de Mancuso a respeito da súmula vinculante em face do acesso à Justiça:

"Espera-se que o efeito vinculante venha somar ao objetivo maior de facilitar o acesso à ordem jurídica verdadeiramente justa, a qual não se confunde e não pode ser assimilada ao singelo e genérico direito de demandar, o qual, fora dos contornos da razoabilidade, acaba por nivelar um direito que é específico e altamente condicionado – o de ação – a um outro que é genérico e incondicionado – o de petição. A mera facilitação (= banalização) do acesso à Justiça, sem o contrapeso das cautelas e exigências formais, torna-se injusta e onerosa para a contraparte e sobrecarrega os juízes e tribunais, que, de outro modo, teriam mais tempo para se dedicar aos casos mais complexos e singulares" [60].

Lançando considerações em defesa da súmula vinculante, mas imbuído da preocupação de advertir para que a sua aplicação não fira o direito de ação, é o magistério de Shimura:

"Se a parte ajuizar ação contra o Poder Público (...), com base na recusa em implementar determinado benefício ou gratificação salarial, e o juiz verificar que o caso concreto se encaixa, à perfeição, ao enunciado da súmula de efeito vinculante, qual deverá ser a sua atitude?

Há quem entenda que o caminho seria a extinção do processo pela carência da ação. Cremos que o correto será o juiz, após perfectibilizar o contraditório e a instrução probatória, analisar o pedido, decretando a improcedência do pedido, portanto, com julgamento do mérito.

Dito de outra forma, no concernente à subordinação aos efeitos da súmula, é necessário que a questão de fundo seja apreciada, com amplitude probatória, justamente para se ter a certeza da hipótese de incidência. Com isso, evitar-se-á o prenúncio, de que a súmula vinculante está a ferir o princípio constitucional do acesso à justiça" [61].

Acreditamos que, se forem adotadas as precauções enunciadas por Shimura, conforme escólio suso transcrito, não há como restar vilipendiado o direito constitucional de ação. Do contrário, é óbvio que qualquer instituto, quando mal-empregado, culmina por gerar inafastáveis prejuízos à sociedade.

5.14. Remissão pelo Ministério Público no Estatuto da Criança e do Adolescente

De acordo com o art. 126, do Estatuto da Criança e do Adolescente, cabe ao Ministério Público o mister institucional de conceder remissão, como forma de exclusão do processo, antes de iniciado o procedimento judicial para apuração de ato infracional.

Não vemos inconstitucionalidade alguma nesse dispositivo, pois se trata de ato administrativo, semelhante ao arquivamento do inquérito policial, e, por isso, sujeito ao controle judicial, incumbindo ao juiz homologar ou não o ato de remissão, nos termos do art. 181, do mesmo Estatuto.

5.15. Atos interna corporis do legislativo, questões meramente políticas e atos discricionários da administração pública

Os atos interna corporis do legislativo, as questões meramente políticas e os atos discricionários da administração pública fogem da apreciação do Judiciário. Porém, sempre que o ato, embora exclusivamente político, implique a prática de outros, com repercussão sobre direitos individuais, pode-se provocar o pronunciamento jurisdicional, tendo em vista que a questão suscitada não mais será meramente política.

5.16. Exigência de caução

Não se afigura inconstitucional a exigência de caução, desde que sempre ressalvada a via comum ou ordinária de acesso ao Judiciário.

5.17. Procedimentos que estimulem a fuga ao Poder Judiciário

São inconstitucionais todas as medidas que criem premiação ou punição para o apelo judicial (ex.: multa administrativa com desconto de 50% caso o contribuinte abra mão do seu direito de ir a juízo [62]).

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Sobre a autora
Andréa Presas Rocha

Juíza do Trabalho Auxiliar da 16ª Vara de Salvador/Ba, mestre em Direito do Trabalho pela PUC-SP, doutoranda em Direito do Trabalho pela PUC-SP, doutoranda em Direito Social pela Universidad Castilla La Mancha na Espanha e professora universitária.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

ROCHA, Andréa Presas. Princípio da inafastabilidade do controle jurisdicional (direito de ação). Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 15, n. 2497, 3 mai. 2010. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/14788. Acesso em: 23 dez. 2024.

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