A Constituição Federal de 1988 primitivamente somente permitia a instituição, por lei ordinária, de contribuições sociais destinadas a financiar a seguridade social que incidissem sobre a folha de salário, o lucro e o faturamento dos contribuintes. Qualquer que fosse a nova fonte de contribuição social deveria ser conceituada por Lei Complementar, que difere daquela por exigir um quorum privilegiado para a sua aprovação.
Nesta esteira de entendimento é que a contribuição social denominada previdenciária, incidente sobre as remunerações dos autônomos e dos administradores, criada pelo art.3º da Lei nº 7787/89, foi extirpada do mundo jurídico, após o Poder Judiciário ter sido afogado por ações judiciais.
Justiça feita! Sim, porque não existe fundamento que consiga conceituar aquelas remunerações como se salários fossem, muito menos faturamento ou lucro.
Diante desse fato, o Governo Federal editou a Lei Complementar de nº 84, publicada em 19/01/1996, obrigando às empresas a recolherem aos cofres públicos um total de 15% sobre a remuneração de qualquer trabalho avulso, inclusive de administradores e autônomos. Essa Lei incumbiu, também, obrigação às cooperativas, pessoa jurídica que muito nos interessa, de recolherem uma contribuição incidente sobre as importâncias pagas, distribuídas ou creditadas aos seus cooperados.
Aqui, abriremos um parêntese para analisarmos a natureza dessa estranha pessoa jurídica.
A cooperativa foi criada para prestar serviços aos sócios cooperados, no sentido de melhorar a remuneração do trabalho destes, ou seja, de proporcionar um crescimento do capital dos próprios sócios. Assim, não se pode afirmar que as cooperativas têm o escopo de fazer riqueza para depois distribuir aos seus cooperados.
Neste prisma é que o grande doutrinador jurídico Pontes de Miranda afirma que: "...o fim econômico, nas sociedades cooperativas, é atingido diretamente pelos sócios, em seus contactos com a sociedade."
Quanto à prestação de serviço, é esta a realidade da atividade cooperativista, independente do objeto da atuação da sociedade. Esta afirmação explica-se: a cooperativa sempre será um meio para uma melhoria da situação pessoal do associado, que se beneficiará imediatamente em suas atividades que motivaram sua participação na entidade. O cooperado visa, com a sociedade, diminuir seus custos ou obter melhores preços para seus produtos, etc.
Não obstante, temos que a cooperativa é pessoa de natureza jurídica, legalmente determinada, porém com conceitos peculiares.
Compreendida a natureza e a função das cooperativas, podemos continuar a analisar as contribuições sociais destinadas a financiar a seguridade social.
Em 15 de dezembro de 1998, o Poder Constituinte derivado, escolhido dentre os representantes do povo e dos estados brasileiro no Congresso Nacional, editou a Emenda Constitucional de nº 20, onde ampliou-se as possibilidades para a chamada base de cálculo na instituição de contribuição social destinada a financiar a seguridade social. A partir de então, o Congresso Nacional está livre para editar lei ordinária criando contribuição social incidente sobre os demais rendimentos do trabalho pagou ou creditados, às pessoas físicas, a qualquer título mesmo sem vínculo empregatício.
Aproveitando o novo permissivo constitucional, em 26 de novembro de 1.999, foi editada a Lei nº 9.876, no qual a contribuição social previdenciária foi alterada substancialmente, bem como foram criadas outras novas contribuições.
Por se tratar de matéria que, agora, pode ser veiculada por lei ordinária, como pacificou a nossa Corte Maior, a nova Lei citada revogou expressamente as obrigações contidas na Lei Complementar nº 84/96. Por outro lado, criou novas contribuições a financiar a seguridade social.
Acrescentando o inciso IV ao art.22 da Lei Orgânica do INSS de nº 8.212/91, a nova Lei nº 9.876/99 impôs às empresas a obrigação de recolherem uma contribuição incidente, a uma alíquota de 15%, sobre as notas fiscais ou faturas de serviços prestados por cooperados através de cooperativas de trabalho.
Na tentativa de substituir a antiga obrigação das cooperativas contida na Lei Complementar nº 84/96, já declarada legal pelo STF,o legislador ordinário impôs uma nova obrigação às empresas, completamente desprovida de fundamentação. É verdade, trocaram uma fonte segura por outra ilegal e por essa o contribuinte não esperava!
A contribuição incidente sobre a fatura ou nota fiscal emitida pelas cooperativas de trabalho não tem cabimento, pois como já vimos, a receita de uma terceira pessoa jurídica, como é o caso das cooperativas, ainda, não é fonte permitida para incidência de contribuição previdenciária criada por lei ordinária. Nesse sentido, é que estão sendo deferidos os pedidos liminares, feitos pelos clientes da Abdalla Associados, para suspender a exigibilidade dessa contribuição.
Por outro lado, temos que as cooperativas de trabalho não estão obrigadas a recolherem a contribuição previdenciária dos seus cooperados, pois como vimos, eles não prestam serviços às cooperativas, muito pelo contrário, tomam serviços destas.