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Atividade sindical e abuso do direito sindical

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20/05/2010 às 00:00
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4. Abuso do Direito Sindical

Os atos abusivos podem aparecer sob a forma de cláusulas abusivas ou de práticas abusivas. A distinção entre essas duas modalidades de atos jurídicos reside em que naquelas há manifestação bilateral de vontade, enquanto nestas últimas o ato é unilateral.

Em ambas, contudo, excedem-se os limites impostos pela boa-fé, pelos bons costumes ou pelos fins econômicos ou sociais, causando manifesta desproporção na relação mantida entre os sujeitos.

4.1. Abuso do direito sindical

No direito sindical, os atos abusivos aparecem quando há extrapolamento da atividade sindical, ou seja, ocorre o abuso quando a atividade sindical, embora aparentemente conforme aos cânones legais, excede os limites impostos pela boa-fé, pelos bons costumes ou pelos fins sociais ou econômicos.

É amplo o espectro do abuso no Direito Sindical, podendo suceder em todos os setores onde as organizações sindicais sejam dotadas de direitos ou prerrogativas que, indevidamente, são extrapoladas.

A consequência do abuso, nesse ramo do Direito, pode ensejar a nulidade do ato, a, ainda, gerar direito a indenização, sem prejuízo de outros efeitos nas esferas trabalhista, cível e criminal.

4.2. Casuística

Considerando-se a amplitude da matéria ora tratada, analisaremos, em seguida, algumas hipóteses em que pode restar configurado o abuso do direito sindical, à vista de tudo o quanto foi visto acima.

4.2.1. Cláusulas anti-sindicais

As cláusulas anti-sindicais, quando não são ilícitas, podem ser consideradas abusivas, a exemplo das seguintes:

  • a) cláusula closed shop, pela qual o empregador somente pode contratar empregado sindicalizado;

  • b) cláusula union shop, mercê da qual o empregador se compromete a manter apenas empregados, que, após prazo razoável de sua admissão, se filiem ao respectivo sindicato operário;

  • c) cláusula preferencial shop, que favorece a contratação de obreiros filiados ao respectivo sindicato;

  • d) cláusula maintenance of membership, pela qual o empregado inscrito em certo sindicato deve preservar sua filiação durante o prazo de vigência da respectiva convenção coletiva, sob pena de perda do emprego;

  • e) cláusula agency shop, pela qual impõe-se aos empregados não sindicalizados o pagamento de contribuições sindicais;

  • f) cláusula yellow dog contract, em face da qual o trabalhador firma como seu empregador um compromisso de não filiação ao seu sindicato como critério de admissão e manutenção do emprego;

  • g) cláusula company unions, em que o próprio empregador estimula a criação de sindicatos artificiais pelos seus empregados.

4.2.2. Cláusulas coletivas abusivas

Aqui duas são as hipóteses de abusividade da cláusula inserida em instrumento normativo.

Na primeira hipótese, o abuso decorre de cláusula firmada pelos sindicatos além do permitido pelos representados. Nesta situação, há abuso de representação, que se resolve com a responsabilidade civil da entidade sindical. É o caso, por exemplo, da entidade sindical patronal que, embora autorizada a negociar até o percentual acordado pela assembleia geral, extrapola os limites da representação e entabula convenção coletiva prevendo reajuste salarial superior. Gize-se, todavia, que, se a parte contrária, firmatária do instrumento negocial, agiu com boa-fé, a cláusula não pode ser tida como abusiva em face das partes contratantes.

Diversa é a circunstância quando o conteúdo da cláusula em si é tido como abusivo. Esta é a nossa segunda hipótese, e um exemplo prático sucede quando uma empresa é impelida a firmar acordo coletivo prevendo reajuste salarial superior à sua capacidade econômica, por pressão dos empregados, que ameaçam com um movimento paredista. Aqui, estar-se-á diante de flagrante abuso, se evidenciada a desproporção entre as prestação ajustadas, contrariando a função econômica do pacto, e levando à ruína a empresa contratante.

Outro exemplo desta segunda hipótese pode ser vislumbrado quando na norma coletiva é pactuada a possibilidade de revistas pessoais dos empregados, em detrimento de direito fundamental dos trabalhadores.

4.2.3. Desconto de contribuições sindicais

Existem cláusulas coletivas que estabelecem o desconto de contribuição sindical, sem que haja prévia autorização do empregado, fixando-se, tão-somente, prazo para oposição do desconto.

Quanto a estas cláusulas, se o desconto foi previamente autorizado por assembleia da categoria, não há falar em abusividade, mas, sim, em ilicitude, haja vista o disposto no art. 545, da CLT, que reza que os descontos devem ser devidamente autorizados pelos empregados. Afinal, o fato de a assembleia da categoria aprovar o desconto, não significa que todos os empregados o tenham autorizado.

Porém, a se entender pela licitude dos descontos, deve-se ter em mente o limite fixado pela jurisprudência do TST, através da edição da O.J. n. 18, da SDC, caso contrário, as subtrações quedar-se-ão abusivas.

4.2.4. Abuso do direito de greve

A Lei n. 7.783/99 elenca, em seus diversos artigos, as hipóteses que considera como abusivas do direito de greve.

Entretanto, cumpre diferenciar a abusividade da ilegalidade. A greve será abusiva quando exceder manifestamente a boa-fé, os bons costumes, as funções sociais ou econômicas. De outro giro, será ilícita quando descumprida disciplina legal estabelecida.

No sistema da lei brasileira, por exemplo, a greve será ilegal quando apresentadas irregularidades no processo de deflagração (não concessão de aviso prévio, ausência de tentativa de negociação etc.), quando ocorrida na vigência de norma coletiva, dentre outras. E, ao revés, será abusiva, se o movimento paredista for destituído de qualquer sentido, por violar a função social, ou se for demasiado prolongado, conduzindo a empresa à ruína, por vilipendiar a função econômica.

4.2.5. Atividades sindicais abusivas durante a greve

Durante a greve, diversas formas de pressão podem ser utilizadas, sendo algumas consideradas verdadeiros ilícitos, enquanto outras podem enquadrar-se no conceito de ato abusivo.

Os piquetes informativos e persuasivos mostram-se legítimos, pois visam apenas informar e persuadir os trabalhadores a aderirem à greve. Já os piquetes coativos, podem ser reputados ilícitos se utilizada violência.

O rattening (supressão dos instrumentos de trabalho) e a ocupação do estabelecimento são ilegais, porque violam o direito de propriedade.

O incentivo ao boicote de produtos da empresa mostra-se abusivo, pois vulnera o princípio da boa-fé (da colaboração) e da função econômica.

A sabotagem é ato ilegal e criminoso, o mesmo sucedendo em relação à extorsão sindical (exigência de uma vantagem pelo sindicato para que não seja deflagrada a greve).

4.2.6. Abuso na organização sindical

O art. 522, da CLT, fixa o número máximo de dirigentes sindicais, estabelecendo que não pode ser superior a sete.

Em que pese a jurisprudência dos Tribunais Superiores admita a recepção do citado artigo pela atual Carta Magna, a celeuma persiste.

Assim, se reconhecida a recepção do art. 522. consolidado pela Constituição Federal, tem-se como ilícita a fixação, em estatuto da entidade sindical, de número de dirigentes superior a sete.

Por outro lado, se acatada a tese da impossibilidade de recepção, pela CF/88, do art. 522, em face da expressa vedação de interferência do Poder Público na organização sindical (art. 8º, I), então a teoria do abuso do direito terá ampla aplicação, sempre que o sindicato ultrapassar os limites impostos pela boa-fé, pelos bons costumes e pelas funções econômicas e sociais.

4.3. Efeitos da abusividade

Considerando-se que as normas trabalhistas são de ordem pública, exatamente como aquelas referentes ao sistema de proteção ao consumidor, entendemos que devem incidir em relação a ambas os mesmos efeitos. Portanto, tendo em vista a previsão legal emanada do art. 51, do Código de Defesa do Consumidor, que reputa nulas de pleno direito as cláusulas abusivas, temos que em relação do Direito do Trabalho a hipótese é, também, de nulidade de pleno direito, com efeitos ex tunc, portanto, e não de anulabilidade.

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As soluções apresentada pelo Direito para a nulidade dos atos jurídicos abusivos dividem-se entre sanção direita e sanção indireta. Naquela, concretiza-se a reparação in natura, restituindo-se as partes ao status quo ante, sem prejuízo da reparação civil pertinente. Nesta (sanção indireta), ante a impossibilidade de retorno à situação anterior, mantém-se o ato abusivo, assegurando-se o pagamento de indenização reparatória material e moral, quando houver.

4.4. Controles da abusividade

Há duas espécies de controle dos atos abusivos: interno (ou voluntário) e externo. Aparece o controle interno, quando realizado pelas própria partes interessadas, voluntariamente, mediante pactos individuais e coletivos. O controle externo, como o próprio nome indica, é aquele operado por meio da intervenção de atos de terceiros: pelo Poder Público, administrativa ou judicialmente, pelo Poder Legislativo ou mesmo por terceiros legitimados para tal finalidade.

Segundo ensinamento de Edilton Meireles, a doutrina fala, ainda, em: controle abstrato, que ocorre antes da cláusula abusiva ser inserida ou do ato abusivo ser praticado; controle concreto, que se realiza na apreciação concreta de um caso específico numa relação jurídica já consumada; controle antecipado (prévio), que se refere àquele efetuado antes da celebração do contrato; e o controle posterior, que ocorre quando se busca a invalidade da cláusula ou do ato abusivo efetivado no curso do contrato (Cf. MEIRELES, 2005, p. 219).


5. Conclusão

Os misteres desenvolvidos pelas organizações sindicais são muito amplos, abarcando questões relativas à organização sindical, à atuação das entidades sindicais, às funções sindicais, dentre as quais se situa a mais importante tarefa entregue aos sindicatos, qual seja o poder negocial, que envolve as atividades ligadas à instauração e composição de conflitos (negociação coletiva, contratos coletivos de trabalho, conflitos coletivos, formas de composição e greve).

Essas atividades sindicais, como visto, podem sofrer extrapolações. Com efeito, embora o ato seja praticado em aparente conformidade com os cânones legais, dele pode resultar abuso de direito, se excedidos os limites impostos pela boa-fé, pelos bons costumes e pelas funções econômica e social.

O abuso do direito sindical pode levar à nulidade do ato e ensejar, ainda, direito a indenização, sem prejuízo de outras cominações nas esferas cível, penal e trabalhista, haja vista a condição de espécie de ato antijurídico do ato abusivo.

Deve-se frisar, contudo, que abuso somente haverá onde não existir disposição legal proibindo ou obrigando conduta humana, ou seja, somente haverá abuso no vazio da lei. Afinal, na hipótese de ser praticado ato contrário à lei, estar-se-á diante de autêntico ato ilícito, e não de mero abuso.

Disso concluímos que, malgrado teoricamente seja possível vislumbramos uma variedade de situações abusivas, é fato que, na prática, dada a pletora de leis (em sentido amplo) no ordenamento jurídico pátrio, queda-se difícil imaginar acontecimentos que sejam abusivos apenas, sem que, ao mesmo tempo, configurem ilícitos. De todo modo, o resultado será sempre igual: a nulidade de pleno direito da cláusula ou prática abusiva.


Bibliografia (citada e/ou consultada)

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SÁ, Fernando Augusto Cunha de. Abuso do direito. Coimbra: Almedina, 1997.

SOUZA, Mauro Cesar Martins de. Abuso do direito sindical. In: Revista do Tribunal Superior do Trabalho. Porto Alegre: Síntese, 68 vol., n. 3, pp. 196-220, 2002.

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Sobre a autora
Andréa Presas Rocha

Juíza do Trabalho Auxiliar da 16ª Vara de Salvador/Ba, mestre em Direito do Trabalho pela PUC-SP, doutoranda em Direito do Trabalho pela PUC-SP, doutoranda em Direito Social pela Universidad Castilla La Mancha na Espanha e professora universitária.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

ROCHA, Andréa Presas. Atividade sindical e abuso do direito sindical. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 15, n. 2514, 20 mai. 2010. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/14905. Acesso em: 22 dez. 2024.

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