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Impacto do turismo sobre o patrimônio histórico-cultural de Ouro Preto e Mariana

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24/05/2010 às 00:00
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SUMÁRIO:I – INTRODUÇÃO. II – PATRIMÔNIO CULTURAL. 1 – Meio Ambiente e Patrimônio Cultural. 2 – Patrimônio Cultural Brasileiro. 3 – Proteção do Patrimônio Cultural.3.1 – Legislação Pertinente. 3.2 – Tombamento. 3.3 – Órgãos Administrativos de Proteção ao Patrimônio Cultural Brasileiro. III – O TURISMO. 1 – Antecedentes Históricos e Conceituação. 2 – O Turismo Cultural: Tipos. 2.1 – O Turismo Científico. 2.2 – O Turismo de Congressos. 3 – Legislação Pertinente. 4 – Órgãos Administrativos do Turismo. 5 – Programa Nacional de Municipalização do Turismo. IV – VOCAÇÃO TURÍSTICA DE OURO PRETO E MARIANA. 1 – Vocação Turística de Ouro Preto. 2 – Vocação Turística de Mariana. V – CONCLUSÃO. VI - BIBLIOGRAFIA


I – INTRODUÇÃO

Em síntese apertada, o estudo versa sobre uma questão paradoxal: o turismo, de forma relevante, alimenta a economia e vida de dois Municípios – Ouro Preto e Mariana – porque possuem um extraordinário acervo histórico-cultural e artístico que atrai milhares de turistas e deve ser preservado.

Entretanto, não raro, o turismo intenso, mal direcionado e planejado, ocasiona irreparáveis danos à riqueza que o atrai, quando não a exaure.

A pesquisa nos incita a buscar os fundamentos jurídicos da preservação do Patrimônio Cultural brasileiro e o regime jurídico da indústria turística, analisando a atuação do Poder Público, através dos vários órgãos envolvidos.

O crescimento do turismo merece análise acurada, pois configura uma das atividades mais importantes em todo o mundo, com enorme repercussão sobre os centros urbanos, especialmente aqueles detentores de considerável acervo cultural. O turismo divulga o Patrimônio Cultural, fá-lo conhecido e precisa mantê-lo.

Isto conduz à necessidade de buscar alternativas de gestão do território urbano que compatibilizem o crescimento econômico – considerando ser a atividade turística, hoje, uma dos maiores propulsores desse crescimento – com a preservação dos valores culturais, precipuamente, de conjuntos urbanos como Ouro Preto e Mariana.

Ouro Preto, declarada Patrimônio Cultural da Humanidade, revela, em seu cotidiano, as bonanças e os conflitos de uma vivência, quase secular, com o título de cidade protegida. A força com que a cidade se impõe no cenário nacional e a carga simbólica de identidade brasileira que carrega, credenciam-na como um excelente padrão a ser tomado, para o estudo da proteção de sítios urbanos.

Se, por um lado, cada vez mais se adotam medidas governamentais para preservação do Patrimônio Cultural à medida que cresce o interesse turístico, por outro, constata-se a destruição de monumentos arquitetônicos para a simples adequação à modernidade, com vistas ao conforto, à diminuição dos custos com a manutenção e à valorização imobiliária.

Portanto, constatam-se, simultaneamente, um efeito positivo, tendente a preservar os sítios históricos, e um impacto negativo, quando se descaracteriza e desfigura sobremaneira o patrimônio arquitetônico, para atender aos interesses econômicos.

É, pois, questão relevante e atual buscar a conciliação da atividade turística com a preservação do Patrimônio Cultural, harmonizando a atuação governamental e a dos cidadãos que necessitam conscientizar-se de que o bom turista não danifica nem exaure o Patrimônio desta e das futuras gerações.


II – PATRIMÔNIO CULTURAL

O patrimônio cultural é elemento do meio ambiente, considerando-se obsoleta a concepção de que o meio ambiente refere-se apenas aos recursos naturais e suas relações com o ser vivo (GRAU) [01]

Assentou-se, hoje, que o meio ambiente figura-se como a interação do conjunto de elementos naturais, artificiais e culturais que propiciem o desenvolvimento equilibrado da vida humana. (SILVA) [02]

A lei nº 6.938/81, que dispõe sobre a Política Nacional do Meio Ambiente, no art. 3º, inciso I, define o meio ambiente como "o conjunto de condições, leis, influências e interações de ordem física, química e biológica, que permite, abriga e rege a vida em todas as suas formas."

Acolhida, pois, e consagrada, a conceituação ampla, pelo Direito brasileiro, considerando o meio ambiente natural como o conjunto dos recursos naturais, constituído pelo solo, água, ar atmosférico, flora, fauna; o meio ambiente artificial, formado pelas edificações, equipamentos urbanos públicos (ruas, praças, áreas verdes, espaços livres em geral) e comunitários, enfim, todos os assentamentos de reflexos urbanísticos; e o meio urbanístico cultural, composto pelo patrimônio arqueológico, artístico, histórico, paisagístico e turístico.

O intuito de preservar o meio ambiente é fruto da conscientização universal à qual aderiram a coletividade e os poderes nacionais, dando relevância não apenas ao ambiente natural mas, também, concomitantemente, ao meio artificial e cultural, entendido este como as diversas formas de expressão de um povo, elo formador e determinante dos sentimentos de nação e cidadania. (PINTO) [03]

A Magna Carta brasileira, de 1988, dedica o capítulo VI ao Meio Ambiente, dispondo, em norma fundamental:

Art. 225 – Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações.

2 – Patrimônio Cultural Brasileiro

A preservação dos bens culturais e naturais vem desde a Antiguidade, quando gregos e romanos veneravam determinados símbolos religiosos, históricos, etc. A Igreja Católica, ao longo da História, também desempenhou relevante papel na preservação de monumentos e documentos.

O patrimônio cultural incorpora as produções sócio-culturais, os bens intangíveis, os modos de vida, as memórias senhoriais, os estilos e formas de comportamento que integram as memórias coletivas.

Em relação ao patrimônio cultural móvel, artístico ou histórico, o teor da Convenção da UNESCO sobre exportação de bens culturais, ao definir o que se deve entender por nacionais, em relação a tais bens, igualmente indica hipóteses diversas da pura nacionalidade (Convenção de Paris, de 14 de novembro de 1970, da UNESCO, aprovada no Brasil pelo Decreto Legislativo nº 71, de 28 de novembro de 1972, e ratificado pelo Decreto nº 72.312, de 31 de maio de 1973).

3 – Proteção do Patrimônio Cultural

3.1 – Legislação Pertinente

No Brasil, a primeira iniciativa do Poder Público relativamente à proteção do Patrimônio Cultural ocorreu em 1742, quando o Conde de Galveias – Dom André de Melo e Castro – manifestou-se favorável à preservação do Palácio das Duas Torres, em Pernambuco, através de carta enviada ao Governador Luis Pereira Freire de Andrade.

Todavia, somente no século XX, a preservação dos bens históricos se mostra significativa. A partir de 1924, as iniciativas de proteção do Patrimônio Cultural Brasileiro deslocam-se da órbita federal para os Estados.

O Decreto Federal nº 22.928, de 12 de julho de 1933, consagra a cidade mineira de Ouro Preto como monumento nacional.

A Constituição de 1934, no Capítulo III, relativo à Educação e Cultura, prevê, em seu artigo 148, a proteção ao Patrimônio Histórico e Artístico, como mandamento constitucional.

Em 1937, surge o Decreto-Lei nº 25, evoluído para a época, avançado e bastante válido nos dias de hoje, assim conceituando o Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, no seu artigo 1º:

"Constitui o patrimônio histórico e artístico nacional o conjunto dos bens móveis e imóveis existentes no País e cuja conservação seja de interesse público, quer por sua vinculação a fatos memoráveis da História do Brasil, quer por seu excepcional valor arqueológico ou etnográfico, bibliográfico ou artístico."

Ressaltem-se a clareza e a abrangência do conceito incorporando todos os elementos da moderna visão do que seja Patrimônio Cultural. (CF/88, art. 216).

3.2 – Tombamento

Há vários meios de restringir-se o uso da propriedade e proteger o bem cultural, direta e indiretamente, constituindo o tombamento apenas um deles. Seu conteúdo, procedimento, efeitos, estão previstos no Dec. Lei nº 25/37. Este Decreto prevê, ainda, o motivo que determinará a proteção do bem, o órgão administrativo competente para escolher e julgar o valor do bem, aspectos do procedimento administrativo e os efeitos que irão operar, a partir da determinação da tutela especial do Estado, efeitos estes que geram obrigações tanto para o titular do domínio do bem, quanto para os cidadãos em geral (CASTRO). [04]

O tombamento é o meio pelo qual o Estado intervém na propriedade privada de um cidadão, proibindo a sua destruição ou alteração, sobrepondo os interesses de proteção do patrimônio cultural aos interesses privados. É ato administrativo que objetiva preservar, mediante a aplicação de legislação específica, bens de valor histórico, cultural, arquitetônico, ambiental e também afetivo para a população, impedindo que venham a ser destruídos ou descaracterizados.

A Constituição Federal de 1988 define a competência para a proteção ao Patrimônio Cultural. Em nível federal, a decisão, quanto ao tombamento, cabe, precipuamente, ao órgão especificamente designado pelo Dec. Lei nº 25/37, isto é, o Conselho Consultivo do Patrimônio, através de deliberação coletiva, a ser submetida à homologação ministerial.

O tombamento pode ser voluntário ou compulsório, sendo, no primeiro caso, solicitado pelo proprietário do bem, e, no segundo, ao proprietário cabe a impugnação do tombamento.

Nos âmbitos estadual e municipal, a legislação específica indica a autoridade competente para o tombamento e delimita o papel dos órgãos de proteção.

3.3 – Órgãos Administrativos de Proteção ao Patrimônio Cultural Brasileiro

Em 1937, foi criado o Serviço de Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, pela Lei federal nº 378/37 c/c o Decreto-Lei nº 25/37, encarregado de cadastrar, tombar e restaurar os bens considerados de excepcional valor histórico, artístico, documental, arquitetônico, paisagístico e arqueológico, no âmbito federal.

No ano de 1946, o SPHAN foi elevado a Diretoria do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, transformando-se, posteriormente, em IPHAN – Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, pelo Decreto nº 6967, de 20 de junho de 1970. Durante 30 anos, sob a direção de Rodrigo Melo Franco de Andrade, o IPHAN viveu a chamada "melhor fase", por causa das dificuldades encontradas no período.

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O IPHAN é um órgão autônomo, situado na cúpula da Administração, diretamente ligado ao Executivo, através do Ministério da Cultura. Erigiu-se, pois, à categoria de órgão diretivo, autônomo, técnica e financeiramente; suas principais funções são relativas ao planejamento, supervisão, coordenação e controle das atividades no âmbito de sua competência.

Com a criação da Fundação Pró-Memória, em 1979, a política de preservação do Ministério da Educação e Cultura adquiriu novo dinamismo, com base em uma concepção ampla de bem cultural. Naquele período, vários museus nacionais foram incorporados à Fundação, que era o braço executivo da Secretaria de Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, órgão normativo e fiscalizador da política federal do patrimônio.

Onze anos mais tarde, foi criado o Instituto Brasileiro do Patrimônio Cultural, que acumulou as funções dos órgãos anteriores. Em janeiro de 1995, ganhou o nome de Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, vinculado ao Ministério da Cultura.

A Lei mineira nº 5.775, de 30 de setembro de 1971, criou o IEPHA, que executa seu trabalho mediante convênio com o órgão federal, preservando o acervo cultural mineiro, identificando o patrimônio de interesse regional e adotando medidas complementares de preservação.

Em outros Estados, há órgãos semelhantes, entre os quais podemos citar, na Bahia, o Conselho do Patrimônio Histórico e Artístico; no Maranhão, a Fundação Cultural; em São Paulo, o CONDEPHAT – Conselho de Defesa do Patrimônio Histórico, Artístico e Turístico de São Paulo.

A nível municipal, há a tendência, ainda lenta, de criação de Conselhos de Patrimônio Histórico e Artístico.

Interessante notar que, até o advento da Lei nº 6.292, de 15 de dezembro de 1975, cabia ao IPHAN toda a decisão do tombamento. A partir de então, a definitividade do tombamento foi condicionada à homologação do Ministro da Cultura, cabendo ao IPHAN apenas o tombamento provisório.

A retirada de parte do poder do referido órgão é objeto de constantes críticas, principalmente da doutrina especializada, pois contribui para a morosidade do procedimento e o prejuízo da preservação do Patrimônio Cultural.

O Decreto nº 99.492, de 3 de setembro de 1990, no art. 1º, constitui a Fundação Instituto Brasileiro de Arte e Cultura – IBAC, a Biblioteca Nacional – BN e a autarquia federal Instituto Brasileiro do Patrimônio Cultural – IBPC, vinculadas à Secretaria da Cultura do Presidente da República.


III - TURISMO

O Turismo, já realizado pelas civilizações antigas, tornou-se uma das atividades mais rentáveis, hodiernamente.

Instrumento importantíssimo para o desenvolvimento de um país, a indústria turística representa garantia de crescimento econômico-social das mais diversas regiões, possibilitando a expansão do mercado de trabalho, gerando emprego e propiciando mais justa distribuição de renda.

A Organização Mundial do Turismo – OMT conceitua o turismo como o deslocamento para fora do local de residência por período superior a 24 (vinte e quatro) horas e inferior a 60 (sessenta) dias, motivado por razões não econômicas.

Em 1910, o economista austríaco Herman Von Schullard o definiu como "a soma das operações, especialmente as de natureza econômica, diretamente relacionadas com a entrada, a permanência e o deslocamento de estrangeiros para dentro e para fora do país, cidade ou região". (apud SALAH – ELOIN, Abdel Wahab) [05]

A Escola de Berlim estudou o turismo em seu aspecto econômico. Arthur Bormann define-o como "o conjunto de viagens que tem por objetivo o prazer ou motivos comerciais, profissionais ou outros análogos, durante as quais é temporária sua ausência da residência habitual. As viagens realizadas para locomover-se ao local de trabalho não constituem turismo". (apud ANDRADE) [06]

Turista, no conceito tradicional, é aquele que viaja com o objetivo de recreação. Em 1954, a ONU – Organização das Nações Unidas – conceituou o turista como "toda pessoa, sem distinção de raça, sexo, língua e religião, que ingresse no território de uma localidade diversa daquela em que tem residência habitual e nele permaneça por prazo mínimo de 24 (vinte e quatro) horas e no máximo de 6 (seis) meses, no transcorrer de um período de 12 (doze) meses, com finalidade de turismo, recreio, esporte, saúde, motivos familiares, estudos, peregrinações religiosas ou negócios mas sem propósito de imigração" (apud IGNARRA). [07]

No Brasil, o turismo impacta segmentos diferentes da economia, empregando, em sua cadeia, desde a mão-de-obra mais qualificada, em áreas que se utilizam de alta tecnologia (transportes e comunicações) até as de menor qualificação, tanto no emprego formal quanto no informal.

Como fonte geradora de empregos, são grandes as vantagens do turismo, seja pela realização de promoções, eventos, novos investimentos, seja pela diversidade qualitativa dos empregos e geração de vagas em áreas com desemprego estrutural, como centros de cidades e áreas rurais, bem como a predominância dos postos de ocupação em micro, pequenos e médios empreendimentos.

2 – O Turismo Cultural: tipos

De acordo com as motivações dos turistas, classificam-se os vários tipos de turismo, segundo ANDRADE: turismo de férias, cultural, de negócios, desportivo, de saúde, religioso.

Para nossa reflexão, no momento, é de suma importância a compreensão do que seja o turismo cultural. As suas características básicas ou fundamentais não se expressam pela viagem em si mas por suas motivações, fundadas na disposição e no esforço de conhecer, pesquisar e analisar dados, obras ou fatos, em suas variadas manifestações.

O turismo cultural abrange as atividades de deslocamento voltadas para a satisfação de objetivos de encontro com emoções artísticas, científicas, de formação e de informação, em decorrência das próprias riquezas de inteligência e da criatividade humanas.

O turismo cultural se subdivide em dois subtipos: o turismo científico e o turismo de congressos.

2.1 – O Turismo Científico

Neste tipo de turismo, o interesse ou a necessidade de realização de estudos e pesquisas é o elemento motivador. São as viagens de estudo e pesquisa, as excursões científicas, de modo que "o autêntico turismo científico pode realizar-se tanto em locais e regiões desprovidos da suficiente estrutura urbana, como em regiões poupadas em sua natureza primitiva, ou em locais e regiões dotados de maior nível de desenvolvimento turístico".(ANDRADE) [08]

No turismo científico, o lazer e o repouso são elementos secundários e, não raro, inexistem, em virtude da própria programação ou dos objetivos dos turistas ou visitantes.

2.2 – O Turismo de Congressos

O turismo de congressos, ou turismo de convenções, é o conjunto de atividades exercidas pelas pessoas interessadas em participar de congressos, convenções, assembleias, simpósios, seminários, reuniões, ciclos, sínodos, concílios e demais encontros que visam ao estudo de alternativas, de dimensionamentos ou de interesses de determinada categoria profissional, associação, clube, crença religiosa, corrente científica ou organizações com objetivos nos campos científicos, técnicos e religiosos, visando o aperfeiçoamento profissional, cultural, técnico, científico, etc...

Os diversos tipos de eventos dessa natureza proporcionam inúmeros motivos suscitadores e incentivadores do turismo cultural, criando novas oportunidades e garantindo o crescimento da taxa de demanda por tal modalidade turística.

3 – Legislação Pertinente

As cidades históricas, os monumentos artísticos, arqueológicos e pré-históricos, as paisagens notáveis, os lugares de particular beleza, as reservas, os parques e as estações ecológicas, as localidades e os acidentes naturais grandiosos exercem forte atração, especialmente dos visitantes, integrando, pois, o denominado "Patrimônio Turístico Nacional."

É necessário, porém, observar que o turismo, embora seja influência direta sobre o Patrimônio Cultural Brasileiro, divulgando-o, conhecendo-o, mantendo-o, pode, também, representar riscos irreparáveis, caso não seja dirigido de maneira adequada.

Tomando-o nos seus vários aspectos – econômico, cultural, jurídico – busca-se a compatibilização entre o crescimento econômico e a proteção do ambiente.

A Constituição Federal de 1988 aborda o turismo em sede distinta do Capítulo relativo ao Meio Ambiente. Assim, no Capítulo VII – Da Ordem Econômica e Financeira – pela primeira vez, na história das constituições brasileiras, o turismo aparece, expressamente:

"Art. 180 – A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios promoverão e incentivarão o turismo como fator de desenvolvimento social e econômico."

Cabe, pois, ao Estado Brasileiro, a promoção e o incentivo ao turismo, obedecendo-se aos princípios constitucionais, como objeto de um processo de planejamento setorial.

Três aspectos relevantes da atividade turística se destacam no exame do mandamento constitucional: 1) a elevação do turismo à condição de fator de desenvolvimento social e econômico; 2) promoção estatal do turismo; 3) incentivo estatal ao turismo.

Para buscar o desenvolvimento social e econômico do País, através da atividade turística, a Administração Pública, níveis federal, estadual e municipal, deve incentivar e estimular essa atividade.

O art. 23, incisos III e VI, da CF/88, confere competência comum para a União, Estados e Municípios protegerem bens de valor histórico e cultural, monumentos e paisagens naturais notáveis, importantes componentes do patrimônio turístico nacional, e, ainda, para protegerem o meio ambiente.

O art. 24, incisos VII e VIII, aborda a competência legiferante concorrente da União, Estados e Distrito Federal relativa à proteção do patrimônio turístico e responsabilidade por dano a bens e direitos de valor turístico.

Assim, inexistindo lei federal sobre, por exemplo, tópico específico de ordenação de uso do solo de interesse turístico, os Estados poderão fazê-lo, assim como também poderão, no uso de competência suplementar, legislar sobre matéria já disciplinada em lei federal, em ambos os casos, observadas as disposições e limitações constitucionais.

A expressão "Patrimônio Turístico" surgiu no Brasil não por força de lei mas por citação, como parte do processo de planejamento turístico, no Informativo EMBRATUR nº 01, Rio de Janeiro, de 29 de abril de 1976, onde se percebe a vontade de se instituir proteção jurídica ao patrimônio turístico, com sua adequada utilização, visto que o uso desordenado provoca inevitável degradação.

Ocorre que o processo de planejamento das áreas de interesse turístico esbarrou na ausência de normas legais, indispensáveis à sua concretização.

Na esfera federal, surgiu, em 1977, a Lei 6.513, que dispõe sobre a criação de Áreas Especiais e de Locais de Interesse Turístico, sobre o Inventário com finalidades turísticas dos bens de valor cultural e natural, acrescenta inciso ao art. 2º da Lei nº 4.132, de 10 de setembro de 1962, altera a redação e acrescenta dispositivo à Lei nº7 4.717, de 29 de junho de 1965, valendo destacar a respectiva Exposição de Motivos:

"Um dos mais sérios problemas do desenvolvimento do turismo é a compatibilização do uso de locais apropriados à prática das atividades turísticas com a defesa dos bens naturais e culturais, que são a primeira razão da atração dos turistas e visitantes" [09]

Verifica-se, pois, a necessidade de se atingir o equilíbrio entre o estímulo à realização do turismo e suas consequências.

A ordenação legal pertinente à utilização adequada do turismo visa atingir duas finalidades: a econômica e a social. Assim, o legislador pátrio utilizou-se de instrumentos legais de natureza urbanística e administrativa, restritivos da plena propriedade, direcionados a ordenar o momento inicial do ciclo econômico turístico. (PINTO) [10]

A Lei nº 8.181, de 28 de março de 1991, e o Decreto nº 448, de 14 de fevereiro de 1992, que a regulamenta, dispõe sobre a POLÍTICA NACIONAL DE TURISMO.

Esta Lei revogou expressamente o Dec. Lei nº 55, de 18 de novembro de 1966, que criara a EMBRATUR e o CNTUR – Centro Nacional de Turismo; deu nova denominação à EMBRATUR – Empresa Brasileira de Turismo, que passou a ser denominada Instituto Brasileiro de Turismo, embora a sigla continue a mesma – EMBRATUR, alterando-lhe a personalidade jurídica, de empresa pública para autarquia, cuja finalidade é formular, coordenar, executar e fazer executar a Política Nacional de Turismo. Extingue-se o CNTUR.

Cabe aos três entes estatais – União, Estados e Municípios – implementar a melhor execução e aplicação da Lei nº 6.513/77. Sua competência para aplicar a lei federal e legislar é concorrente e complementar, desde que respeitados os ditames constitucionais (arts. 23, 24, 30, I, da CF/88).

O art. 33 da Lei nº 6.513/77 determina a inclusão dos bens de valor turístico no rol daqueles que formam o patrimônio público, nos termos do art. 1º, § 1º, da Lei nº 4.717, de 29 de junho de 1965, que disciplina a Ação Popular:

"Art. 1º - (...)

§ 1º - Considera-se patrimônio público para os fins referidos neste artigo, os bens e direitos de valor econômico, artístico, estético, histórico e turístico."

Consoante o Dec. nº 448/92, a Política Nacional de Turismo deve considerar o turismo como forma de promover a valorização e a preservação do patrimônio nacional e cultural do País e a valorização do homem como destinatário final do desenvolvimento turístico.

Em abril de 2003, foi editado o Plano Nacional de Turismo, definindo estratégias para o setor turístico até o ano de 2007.

4 – Órgãos Administrativos do Turismo

A Administração Pública do Turismo foi profundamente alterada com a edição da Lei nº 10.683/03 e do Dec. nº 4.686/03, que regulamenta o Conselho Nacional de Turismo.

Pelo art. 35 da Lei nº 10.683/03 foi criado o Ministério do Turismo, desmembrando o antigo Ministério do Esporte e Turismo, ficando a competência do novo Ministério definida pelo artigo 27, XXIII, da referida Lei.

De acordo com o art. 29, da Lei nº 10.683/03, o Ministério do Turismo, para a consecução de suas finalidades, contará com o Conselho Nacional de Turismo e com duas secretarias: a de Políticas de Turismo e a de Programas de Desenvolvimento do Turismo.

A primeira deve executar a política nacional para o setor, seguindo as diretrizes ditadas pelo Conselho Nacional de Turismo; cuidar da estruturação e diversificação da oferta turística, procurando regionalizar e segmentar os produtos turísticos para promover a universalização do acesso ao lazer e ao desenvolvimento econômico e social; promover e zelar pela qualidade da prestação do serviço turístico brasileiro, responsabilizando-se pela normatização da qualidade da prestação do serviço turístico.

A Secretaria de Programas de Desenvolvimento cuidará da infra-estrutura e a melhoria da qualidade dos serviços prestados ao turismo, o que implica fomentar o investimento no setor, financiar empresas e empreendimentos, incluindo aqueles voltados especificamente para a infra-estrutura física e a qualificação profissional dos trabalhadores, desenvolver a produção associada ao turismo, implantar programas regionais de desenvolvimento do turismo.

Outro órgão de extrema importância é o Conselho Nacional de Turismo, regulamentado pelo Dec. nº 4686/03, constituindo-se como órgão colegiado de assessoramento, diretamente vinculado ao Ministro de Estado do Turismo.

O Instituto Brasileiro de Turismo – EMBRATUR – teve suas funções alteradas pela Lei nº 10.683/03, que definiu as competências do Ministério do Turismo. Como as Leis nº 8.181/91 e 6.505/77 definiam como da competência da EMBRATUR o que a Lei nº 10.683/03 expressamente atribuiu ao Ministério de Turismo, ocorreu a derrogação das normas anteriores pela norma posterior, posição consolidada pelo Decreto nº 4.653/03.

O art. 1º da Lei nº 8.181/91 transformou a Empresa Brasileira de Turismo – EMBRATUR, autarquia criada nos termos do art. 11 do Dec-Lei nº 55, de 18/11/1966, em EMBRATUR – Instituto Brasileiro de Turismo. Ao Instituto foram transferidos o acervo documental, as atribuições e competências do extinto Conselho Nacional de Turismo – CNTur.

As funções da EMBRATUR são as de promoção, marketing e apoio à comercialização dos produtos turísticos brasileiros no exterior.

O FUNGETUR – Fundo Geral de Turismo – criado pelo art. 11 do Dec-Lei nº 1.191, de 27/10/71, era gerido pela EMBRATUR, sendo-o, agora, pelo Ministério do Turismo, conforme Lei nº 10.683/03. Rege-se atualmente pelo Dec.-Lei nº 1.439, de 30/12/75 e tem por objetivo prover recursos para o financiamento de empreendimentos, obras e serviços de finalidade ou de interesse turístico.

5 – Programa Nacional de Municipalização do Turismo

Visando o fomento do turismo, no Brasil, foram adotadas medidas como o Programa Avança Brasil (Plano Plurianual), o PNMT – Programa Nacional de Municipalização do Turismo, destinado a conscientizar a população beneficiada das ações realizadas no próprio Município.

O PNMT pretende conscientizar os Municípios sobre o fato de que somente possuir atrativos ou potencial turístico não é suficiente para que a atividade cresça. O turismo só poderá produzir benefícios sociais, econômicos, históricos – culturais e ambientais, se for planejado e gerenciado dentro de um contexto regional, nacional e até internacional.

O turismo constitui atividade que se desenvolve através de atrativos localizados, utiliza serviços e gera impostos primordialmente municipais, nada mais adequado do que concentrar os processos de planejamento e gerenciamento no Município, procurando envolver ao máximo a sua comunidade, vinculando-a aos programas a serem implantados. Esta ação deverá ser de consenso básico entre autoridades e moradores. Assim, os residentes nos Municípios envolvidos nas decisões que definirão o planejamento turístico municipal estarão mais comprometidos a colaborar para que os resultados sejam mais satisfatórios.

O Programa objetiva conscientizar a sociedade sobre a importância do turismo como instrumento de crescimento econômico, geração de empregos, melhoria da qualidade de vida da população e preservação de seu patrimônio natural e cultural. Objetiva, ainda, dotar os Municípios brasileiros com potencial turístico, de condições técnicas e organizacionais para promover o desenvolvimento da atividade turística.

São objetivos do PNMT:

1 – descentralizar as ações de planejamento turístico, de forma a capacitá-los a elaborarem seus próprios planos de desenvolvimento através do fortalecimento das relações entre os órgãos públicos federais, estaduais e municipais, com a iniciativa privada dos Municípios envolvidos;

2 – acelerar a expansão e a melhoria da infraestrutura básica, buscando parcerias para investimento nas regiões;

3 – incentivar o intercâmbio com entidades nacionais e internacionais, a fim de promover a captação e a geração de eventos para os Municípios, no sentido de minimizar o efeito da sazonalidade;

4 – contribuir para a formação e capacitação dos profissionais que prestam serviços para o turismo, visando qualidade e produtividade;

5 – incentivar as atividades do Conselho Municipal de Turismo, para viabilização de novos projetos;

6 – difundir os modelos de Conselhos, Fundos e outros investimentos de municipalização;

7 – assessoria técnica na formação de Conselhos Municipais de Turismo;

8 – orientação na elaboração de Plano Diretor de acordo com a Lei Orgânica dos Municípios, o qual deverá conter, entre outros, o Plano de Desenvolvimento do Turismo e sua implantação e o zoneamento;

9 – conscientização e sensibilização para a formação e capacitação profissional através de cursos de acordo com as demandas municipais;

10 – assessoria técnica na geração e captação de eventos;

11 – criação de oportunidades de negócios com atividades específicas, tais como turismo ecológico, turismo cultural e histórico, turismo de eventos e outros;

12 – orientação no desenvolvimento de projetos voltados para a melhoria das condições gerais da infraestrutura turística municipal;

13 – orientação na criação de mecanismos de incentivos a atividades turísticas, como, por exemplo, a redução do IPTU no caso de preservação do patrimônio histórico.

É imprescindível a parceria entre o Ministério do Turismo e o Ministério da Cultura, por meio de ações integradas da EMBRATUR e o IPHAN – Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, visando colocar, no cenário nacional e mundial, o patrimônio arquitetônico, integrando a este todas as demais expressões e manifestações da cultura brasileira.

Com o objetivo de garantir a sustentabilidade dos destinos turísticos, a implementação do Turismo Cultural, dentro de critérios adequados de planejamento e formatação de produtos, será ponto fundamental para a manutenção e a melhoria dos sítios históricos e arqueológicos, do folclore, do artesanato, das festas e festejos populares. Isso só será possível com a efetiva participação das comunidades locais.

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Sobre a autora
Angela Silva

Pocuradora Federal e Professora da UFOP

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

SILVA, Angela. Impacto do turismo sobre o patrimônio histórico-cultural de Ouro Preto e Mariana. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 15, n. 2518, 24 mai. 2010. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/14910. Acesso em: 27 abr. 2024.

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