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INSS e construção civil: reescrevendo uma norma técnica

01/08/2000 às 00:00
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Quando o Instituto Nacional do Seguro Social cita em suas disposições normativas uma norma técnica da ABNT, supõe-se que a citação tenha origem em um estudo criterioso e num conhecimento consolidado do texto. Correto? Nem sempre.

Por inúmeras vezes, temos questionado o uso que o INSS faz da NBR 12.721/92 da ABNT. Uso que se fundamenta em apenas um de seus objetos - o CUB (Custo Unitário Básico da Construção Civil). O restante da aplicação da norma citada é, via de regra, um misto de interpretação leiga, conceitos redefinidos ao gosto do propósito a que servem, e, não poucas vezes, fruto de artifícios de um lógica distante do contexto normativo.

Evidente que o "status" do Custo Unitário Básico confere ao sistema que nele se sustenta uma credibilidade por conseqüência. Este aval, na verdade, é o objetivo do procedimento do INSS, que, utilizando o custo unitário básico por metro quadrado, estima um custo de mão de obra e, sobre este, arbitra as contribuições à previdência social.

O não dito nas instruções normativa desse instituto é que, entre os dados que geram esta estimativa e o resultado final, existe um caminho que, mesmo sendo definido em norma como um "procedimento matemático simplificado", exige um profundo conhecimento dos conceitos e do modelo matemático proposto. É simplificado em comparação com o complexo sistema de orçamentação onde são discriminados todos os itens, e seus respectivos preços, que farão parte do custo final de uma obra de construção civil. Mas não o é em relação aos conceitos e aos procedimentos matemáticos que instruem o cálculo.


          A Ordem de Serviço 161/97 do INSS, que estabelece o roteiro de cálculo para aferição indireta de salários de contribuição em obras de construção civil, por exemplo, estabelece que as unidades habitacionais cuja área seja inferior a 100,00 m2 (cem metros quadrados) podem ser classificadas como de padrão Baixo; aquelas que estiverem no intervalo de 100,00 m2 (cem metros quadrados) até 250,00 m2 (duzentos e cinqüenta metros quadrados) podem ser enquadradas dentro do padrão Normal; e quando a área superar os 250,00 m2 (duzentos e cinqüenta metros quadrados) serão classificadas como de padrão Alto. Esta recomendação é a que se encontra na norma técnica citada como fundamento? De forma alguma. A ABNT apresenta as diversas combinações das especificações de materiais de acabamentos que definem os padrões em questão (Baixo, Normal e Alto). É na comparação do memorial descritivo da obra em análise com as tabelas normalizadas que se poderá dizer qual o padrão da obra - e não com base num critério de intervalo de áreas.

Outro aspecto, entre tantos, que merece crítica é a forma como se define, segundo o roteiro em questão, a área da unidade, no caso de edifícios com diversas unidades autônomas. Divide-se a área total pelo número de unidades. Simples assim. Desconhecendo conceitos de área privativa, de uso em comum e total.

Após criar este conceito rápido e quantitativo de padrão de construção, a Ordem de Serviço abre a possibilidade de apresentação de "laudo de padrão" elaborado por profissional habilitado, com registro no Conselho Regional de Engenharia, Arquitetura e Agronomia (CREA), mediante anotação específica de responsabilidade técnica, como forma de contestação ao padrão adotado pela aferição do INSS.

É exatamente esta a questão central: por que se sugere (e a informação ao contribuinte fica a critério do INSS) a apresentação de um documento técnico que defina o padrão em substituição a um laudo que estabeleça o custo da mão de obra? Por que o profissional habilitado legalmente é chamado a corrigir um equívoco originado em conceitos de origem duvidosa, e não lhe é - como deveria ser - solicitado o laudo integral com o valor estimado segundo os preceitos normativos? Porque o sistema de aferição indireta proposto mantém vigilância sobre o resultado final. Assim como se toma parte da norma da ABNT, toma-se parte do trabalho profissional. Assim como o CUB empresta seu aval ao valor aferido, o profissional concede ao esquema de cálculo sua habilitação naquilo que lhe é "permitido".

Quando se adota um norma para determinado serviço técnico, não se pode recorrer ao expediente de excluir as disposições que não conduzem a um resultado desejado. Aliás, o objetivo do normalização, segundo a ABNT, é:

          "Estabelecer e aplicar regras a fim de abordar ordenadamente uma atividade específica, para o benefício e com a participação de todos os interessados e, em particular, de promover a otimização da economia, levando em consideração as condições funcionais e as exigências de segurança."

Seja dito que, para toda intervenção do profissional de engenharia civil e arquitetura, o INSS exige a anotação de responsabilidade técnica junto ao CREA; no entanto, para o cálculo final, elaborado pela própria instituição, a exigência de responsabilidade técnica é sumariamente desconsiderada.

Havendo intenção de provar que o custo de mão de obra não é o aferido, o INSS estabelece onde a norma técnica da ABNT tem validade, e quando o profissional pode atuar. E isto, definitivamente, não é ter uma norma técnica como embasamento.

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Voltando à questão inicial, o sistema elaborado pelo INSS tem um objetivo apenas: garantir a adoção de um procedimento matemático com base em um índice confiável, porém com a garantia adicional de que a arrecadação atingirá valores previamente estabelecidos.

E, para isso, pelo menos o INSS conhece os fundamentos básicos da norma que define o uso do CUB? Na instrução normativa No 08, de 23 de outubro de 1998 - Manual de Procedimentos de Arrecadação e Fiscalização - os autores do texto que "explica" os conceitos da NBR 12.721 chegam a abusar de sua capacidade criativa. Para explicar o significado da letra "H" nas tabelas divulgadas pelos Sindicatos Estaduais da Construção Civil, assim definem:

          "6.4.1.2 - (...) Na tabela do CUB a designação de pavimentos é representada pela letra "H", proveniente da palavra "higt" em inglês, que significa altura."

A NBR 12.721, em nota à Tabela 01, ensina:

          "Nas notações adotadas para designação dos projetos-padrão, a letra "H" significa habitacional."

Seria cômica, se não trágica, esta obra mais literária do que técnica, à qual o INSS busca amparar com fundamentos normativos sérios. Absurdos com estes embasamentos são apresentados em juízo, em desfavor do contribuinte. E tudo isto com o argumento de que a base de cálculo é o próprio Custo Unitário Básico da Construção Civil. Quando, na verdade, a base é desfigurada através de redefinições de conceitos e de procedimentos de cálculo não normalizados.

Resta-nos, apenas, evocar a Lei 5.194, de 24.12.1966, que regula o exercício das profissões de Engenheiro, Arquiteto e Engenheiro-Agrônomo:

          Art. 13 - Os estudos, plantas, projetos, laudos e qualquer outro trabalho de Engenharia, de Arquitetura e de Agronomia, quer público, quer particular, somente poderão ser submetidos ao julgamento das autoridades competentes e só terão valor jurídico quando seus autores forem profissionais habilitados de acordo com esta Lei.

Este preceito, certamente, não consta como fundamento legal nas instruções normativas do INSS. O valor arbitrado é calculado por fiscais e funcionários sem habilitação legal para o exercício de profissões regulamentadas por Lei, com base, apenas, num roteiro que mais parece uma obra literária de ficção. E de péssimo gosto, diga-se em crédito dos bons autores literários.

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Sobre o autor
Paulo Andres Costa

engenheiro civil em Chapecó (SC), consultor em incorporações imobiliárias <i>(in memoriam)</i>

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

COSTA, Paulo Andres. INSS e construção civil: reescrevendo uma norma técnica. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 5, n. 44, 1 ago. 2000. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/1494. Acesso em: 2 nov. 2024.

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