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O orçamento público brasileiro.

Suas origens, princípios norteadores e forma de execução

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4.AS LEIS ORÇAMENTÁRIAS BRASILEIRAS E A EXECUÇÃO DO ORÇAMENTO

Como cediço e já ressaltado no Capítulo 1 deste ensaio, o orçamento público brasileiro compreende a elaboração e a execução de três leis básicas: (i) o Plano Plurianual ("PPA"), (ii) a Lei de Diretrizes Orçamentárias ("LDO") e a Lei de Orçamento Anual ("LOA"), que em conjunto materializam o planejamento e a execução das políticas públicas de cada ente da Federação (União, Estados, Municípios e Distrito Federal). Nesse capítulo, analisaremos cada uma das leis, buscando demonstrar a sua função no sistema orçamentário brasileiro, e de que forma respeitam os orçamentários pátrios, vistos no Capítulo 2.

4.1.O Plano Plurianual

O Plano Plurianual ("PPA"), no Brasil, previsto no artigo 165 da Constituição Federal de 1988, e regulamentado pelo Decreto nº 2.829, de 29.10.1998, em plena compatibilidade com o princípio do orçamento investimento, estabelece as medidas, gastos e objetivos a serem seguidos pela Administração ao longo de um período (exercício) de quatro anos.

É aprovado por lei quadrienal, sujeita a prazos e ritos diferenciados de tramitação e tem vigência do segundo ano de um mandato do Poder Executivo até o final do primeiro ano do mandato seguinte.

Nele se prevê a atuação do Governo, durante o período mencionado, em programas de duração continuada já instituídos ou a instituir no médio prazo, buscando o cumprimento do princípio da continuidade da prestação do serviço público, em prol do interesse público.

Com a obrigatoriedade do PPA, tornou-se obrigatório o Governo planejar todas as suas ações e também seu orçamento de modo a não ferir as diretrizes nele contidas, somente devendo efetuar investimentos em programas estratégicos previstos na redação do PPA para o período vigente. A Constituição, também, sugere que a iniciativa privada volte suas ações de desenvolvimento para as áreas abordadas pelo plano vigente.

O PPA é dividido em planos de ações, e cada plano deverá conter: (i) objetivo, órgão do Governo responsável pela execução do projeto, (ii) o valor, (iii) o prazo de conclusão, (iv) as fontes de financiamento, (v) o indicador que represente a situação que o plano visa alterar, (vi) a necessidade de bens e serviços para a correta efetivação do previsto, (vii) a regionalização do plano, etc.

Cada um desses planos (ou programas), será designado a uma unidade responsável competente, mesmo que durante a execução dos trabalhos várias unidades da esfera pública sejam envolvidas. Também será designado um gerente específico para cada ação prevista no Plano Plurianual, por determinação direta da Administração Pública.

O Decreto nº 2.829, 29.10.1998, que regulamentou o PPA prevê que sempre se deve buscar a integração das várias esferas do poder público (federal, estadual e municipal), e também destas com o setor privado.

A cada ano, deverá ser realizada uma avaliação do processo de andamento das medidas a serem desenvolvidas durante o período quadrienal – não só apresentando a situação atual dos programas, mas também sugerindo formas de evitar o desperdício de dinheiro público em ações não significativas. Com base nesta avaliação é que serão traçadas as bases para a elaboração do orçamento anual.

A avaliação anual poderá se utilizar de vários recursos para sua efetivação, inclusive de pesquisas de satisfação pública, quando viáveis.

Embora teoricamente todos os projetos do PPA sejam importantes e necessários para o desenvolvimento sócio-econômico do ente, dentro do mesmo devem ser estabelecidos projetos que detêm de maior prioridade na sua realização.

4.2.A Lei de Diretrizes Orçamentárias

A Lei de Diretrizes Orçamentárias ("LDO") tem a finalidade precípua de orientar a elaboração dos orçamentos fiscal e da seguridade social e de investimento das empresas estatais. Busca sincronizar a Lei Orçamentária Anual ("LOA") com as diretrizes, objetivos e metas da administração pública, estabelecidas no PPA, em estrita observância aos princípios do orçamento investimento e da unidade orçamentária.

De acordo com o parágrafo 2º, do art. 165, da Constituição Federal de 1988, a LDO (i) deverá trazer as metas e prioridades da administração pública, incluindo as despesas de capital para o exercício financeiro subsequente, (ii) orientará a elaboração da LOA, (iii) disporá sobre as alterações na legislação tributária e (iv) estabelecerá a política de aplicação das agências financeiras oficiais de fomento.

Em observância do princípio da anualidade orçamentária, a LDO será elaborada, anualmente, pela Administração e aprovada pelo Poder Legislativo que, após aprovação, devolverá ao Executivo para sação. É importante destacar que a Constituição de 1988 não prevê a possibilidade de rejeição do projeto de lei de diretrizes orçamentárias, uma vez que prescreve, em seu art. 57, §2º, que a sessão legislativa não será interrompida sem a aprovação do projeto, logo, o projeto após entregue pelo Executivo deverá ser analisado e encaminhado para aprovação.

A Lei de Responsabilidade Fiscal (Lei Complementar nº 101, de 04.05.2000) ampliou a importância da LDO, determinando a previsão de várias outras situações, além das previstas na Constituição. São elas (i) estabelecer os critérios para o congelamento de dotações, quando as receitas não evoluírem de acordo com a estimativa orçamentária; (ii) estabelecer controles operacionais e suas regras de atuação para avaliação das ações desenvolvidas ou em desenvolvimento; (iii) estabelecer as condições de ajudar ou subvencionar financeiramente instituições privadas, fornecendo o nome da instituição, valor a ser concedido, objetivo etc., sendo importante ressaltar que serão nulas as subvenções não previstas na LDO, excluindo casos de emergência; (iv) estabelecer condições para autorizar os entes a auxiliar o custeio de despesas próprias de outros entes, como por exemplo, gastos de quartel da Polícia Militar, de Cartório Eleitoral, Recrutamento Militar, de atividades da Justiça etc.; (v) estabelecer critérios para o início de novos projetos, após o adequado atendimento dos que estão em andamento; (vi) estabelecer critérios de programação financeira mensal; (vii) estabelecer o percentual da receita corrente líquida a ser retido na peça orçamentária, como Reserva de Contingência.

Além do estabelecimento e definição dos itens acima, a LDO deverá ser acompanhada dos chamados Anexos de Metas Fiscais. Esses Anexos deverão conter: (i) metas anuais para receitas, despesas, resultados nominal e primário e montante da dívida para o exercício a que se referirem e para os dois exercícios seguintes; (ii) a avaliação do cumprimento das metas relativas ao ano anterior; (iii) o demonstrativo das metas anuais, instruído com memória e metodologia de cálculo que justifiquem os resultados pretendidos, comparando-as com as fixadas nos três últimos exercícios, evidenciando a consistência delas com as premissas e os objetivos da política vigente; (iv) o demonstrativo da evolução do patrimônio líquido nos últimos três exercícios, destacando a origem e a aplicação dos recursos obtidos com a alienação de ativos; (v) a avaliação financeira e atuarial de todos os fundos e programas de natureza atuarial; (vi) o demonstrativo da estimativa e compensação da renúncia de receita e da margem de expansão das despesas obrigatórias de caráter continuado; (vii) a avaliação dos passivos contingentes e outros riscos capazes de afetar as contas, informando as providências, caso se concretizem, como por exemplo, é importante verificar os processos judiciais de devolução de tributos questionáveis, ou demanda de reivindicações salariais não concedidas.

Enfim, o Anexo de Metas Fiscais compreenderá: (i) a previsão trienal da receita, da despesa, estimando, assim, os resultados nominal e primário; (ii) a previsão trienal do estoque da dívida pública, considerando os passivos financeiro e permanente; (iii) a avaliação do cumprimento das metas do ano anterior; (iv) a evolução do patrimônio líquido ou passivo real descoberto (resultado patrimonial negativo); (v) a avaliação financeira e atuarial dos fundos de previdência dos servidores públicos; (vi) a Estimativa de compensação da renúncia de receitas (anistias, remissões, isenções, subsídios etc.) e da margem de expansão das despesas obrigatórias de caráter continuado.

4.3.A Lei Orçamentária Anual

A Lei Orçamentária Anual ("LOA") ou orçamento anual visa concretizar os objetivos e metas propostas no PPA, segundo as diretrizes estabelecidas pela LDO, em conformidade com o princípio da unidade do orçamento público. É uma lei, em sentido formal, elaborada pelo Poder Executivo e aprovada pelo Poder Legislativo, que estabelece as despesas e as receitas que serão realizadas em determinado ano (princípio da anualidade do orçamento). A Constituição determina que o Orçamento deve ser votado e aprovado até o final de cada Legislatura, sendo competência do Chefe do Poder Executivo de cada ente público enviar ao órgão legislativo a proposta do orçamento.

A proposta da LOA compreende os três tipos distintos de orçamentos, a saber: (i) o Orçamento Fiscal, que compreende os poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, os Fundos, Órgãos, Autarquias, inclusive as especiais, e Fundações instituídas e mantidas pelo ente público; abrange, também, as empresas públicas e sociedades de economia mista em que o Poder Público, direta ou indiretamente, detenha a maioria do capital social com direito a voto e que recebam desta quaisquer recursos que não sejam provenientes de participação acionária, pagamentos de serviços prestados, transferências para aplicação em programas de financiamento atendendo ao disposto na alínea "c" do inciso I do art. 159 da CF e refinanciamento da dívida externa; (ii) o Orçamento de Seguridade Social, que compreende todos os órgãos e entidades a quem compete executar ações nas áreas de saúde, previdência e assistência social, quer sejam da Administração Direta ou Indireta, bem como os fundos e fundações instituídas e mantidas pelo Poder Público; compreende, ainda, os demais subprojetos ou subatividades, não integrantes do Programa de Trabalho dos Órgãos e Entidades mencionados, mas que se relacionem com as referidas ações, tendo em vista o disposto no art. 194 da CF; e (iii) o Orçamento de Investimento das Empresas Estatais: previsto no inciso II, parágrafo 5º do art. 165 da CF, que abrange as empresas públicas e sociedades de economia mista em que o Estado, direta ou indiretamente, detenha a maioria do capital social com direito a voto.

4.4.A Execução Orçamentária

A execução orçamentária ocorre concomitantemente com a financeira! Esta afirmativa tem como sustentação o fato de que a execução tanto orçamentária como financeira estão atreladas uma a outra. Havendo orçamento e não existindo o financeiro, não poderá ocorrer a despesa. Por outro lado, havendo recurso financeiro, mas não se podendo gastá-lo, não há que se falar em disponibilidade orçamentária.

Em consequência, pode-se definir execução orçamentária como sendo a utilização dos créditos na LOA. Já a execução financeira, por sua vez, representa a utilização de recursos financeiros, visando atender à realização dos projetos e/ou atividades atribuídas às Unidades Orçamentárias pelo Orçamento.

Na técnica orçamentária, inclusive, é habitual se fazer a distinção entre as palavras crédito e recursos. O primeiro termo designa o lado orçamentário e o segundo, o lado financeiro. Crédito e Recurso são duas faces de uma mesma moeda! O crédito é a dotação ou autorização de gasto ou sua descentralização, e o recurso é o dinheiro ou saldo de disponibilidade bancária.

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Uma vez publicada a LOA, observadas as normas de execução orçamentária e de programação financeira para o exercício, e lançadas as informações orçamentárias, cria-se o crédito orçamentário e, a partir daí, tem-se o início da execução orçamentária propriamente dita.

Executar o orçamento é, portanto, realizar as despesas públicas nele previstas, ressaltando que para que qualquer utilização de recursos públicos seja efetuada, a primeira condição é que esse gasto tenha sido legal e oficialmente previsto e autorizado pelo Poder Legislativo e que sejam seguidos à risca os três estágios da execução das despesas previstos na Lei nº 4.320/64, isto é, (i) o empenho, (ii) a liquidação e (iii) o pagamento – atualmente se encontra em aplicação a sistemática do pré-empenho antecedendo esses estágios, já que, após o recebimento do crédito orçamentário e antes do seu comprometimento para a realização da despesa, existe uma fase geralmente demorada de licitação obrigatória junto a fornecedores de bens e serviços que impõe a necessidade de se assegurar o crédito até o término do processo licitatório.

Pois bem, o empenho é o primeiro estágio da despesa e pode ser conceituado como sendo o ato emanado de autoridade competente que cria para o Estado a obrigação de pagamento, pendente ou não, de implemento de condição. Nele se registra o comprometimento da despesa orçamentária, obedecidos os limites estritamente legais, bem como aos casos em que se faça necessário o reforço ou a anulação desse compromisso. Não se deve confundir, entretanto, empenho da despesa com nota de empenho; esta, na verdade, é a materialização daquele, embora, no dia-a-dia haja a junção dos dois procedimentos em um único.

Todavia, ocorre que estando a despesa legalmente empenhada, nem assim o Estado se vê obrigado a efetuar o pagamento, uma vez que, o implemento de condição poderá estar concluído ou não. Seria um absurdo se assim não fosse, pois a Lei nº 4.320/64 determina que o pagamento de qualquer despesa pública, seja ela de que importância for, passe pelo crivo da liquidação. É nesse segundo estágio da execução da despesa que será cobrada a prestação dos serviços ou a entrega dos bens, ou ainda, a realização da obra, evitando, dessa forma, o pagamento sem o implemento de condição.

O segundo estágio da despesa pública é a liquidação, que consiste na verificação do direito adquirido pelo credor, tendo por base os títulos e documentos comprobatórios do respectivo crédito, ou seja é a comprovação de que o credor cumpriu todas as obrigações constantes do empenho.

Esse estágio tem por finalidade reconhecer ou apurar a origem e o objeto do que se deve pagar, a importância exata a pagar e a quem se deve pagar para extinguir a obrigação e é efetuado pelo documento Nota de Lançamento ("NL"). Ele envolve, portanto, todos os atos de verificação e conferência, desde a entrega do material ou a prestação do serviço até o reconhecimento da despesa.

Ao fazer a entrega do material ou a prestação do serviço, o credor deverá apresentar a nota fiscal, fatura ou conta correspondente, acompanhada da primeira via da nota de empenho, devendo o funcionário competente atestar o recebimento do material ou a prestação do serviço correspondente, no verso da nota fiscal, fatura ou conta.

O último estágio da despesa é o pagamento, que consiste na entrega de numerário ao credor do Estado, extinguindo dessa forma o débito ou obrigação. Esse procedimento normalmente é efetuado por tesouraria, que deve ter como favorecido o credor do empenho. O pagamento normalmente é efetuado por meio de crédito em conta bancária do favorecido. Se houver importância paga a maior ou indevidamente, sua reposição aos órgãos públicos deverá ocorrer dentro do próprio exercício.

Todo esse processo ocorre observando, estritamente, os princípios constitucionais orçamentários, bem como aqueles que regem a Administração Pública, dentre eles a moralidade, a publicidade e a eficiência, de modo que o interesse público seja sempre garantido.

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Sobre o autor
Antônio Carlos da Cunha Gonçalves

Bacharel em Direito pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro - UERJ, pós graduando em Direito Tributário pela Universidade Gama Filho - UGF, advogado e consultor jurídico no Rio de Janeiro

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

GONÇALVES, Antônio Carlos Cunha. O orçamento público brasileiro.: Suas origens, princípios norteadores e forma de execução. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 15, n. 2523, 29 mai. 2010. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/14940. Acesso em: 19 abr. 2024.

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