A submissão das operações que possam ser classificadas como Ato de Concentração à Agência Nacional de Telecomunicações – ANATEL visa atender à previsão contida nos parágrafos 1º e 2º do art. 7º da Lei n.º 9.472, de 1997 e segue o procedimento previsto na Norma 04/98 – Anatel, anexo à Resolução nº 76, de 16 de dezembro de 1998. Neste sentido:
Art. 7º. As normas gerais de proteção à ordem econômica são aplicáveis ao setor de telecomunicações, quando não conflitarem com o disposto nesta Lei.
§ 1º. Os atos envolvendo prestadora de serviço de telecomunicações, no regime público ou privado, que visem a qualquer forma de concentração econômica, inclusive mediante fusão ou incorporação de empresas, constituição de sociedade para exercer o controle de empresas ou qualquer forma de agrupamento societário, ficam submetidos aos controles, procedimentos e a condicionamentos previstos nas normas gerais de proteção à ordem econômica.
§ 2º. Os atos de que trata o parágrafo anterior serão submetidos à apreciação do Conselho Administrativo de Defesa Econômica - CADE, por meio do órgão regulador.
§ 3º. Praticará infração da ordem econômica a prestadora de serviço de telecomunicações que, na celebração de contratos de fornecimento de bens e serviços, adotar práticas que possam limitar, falsear ou, de qualquer forma, prejudicar a livre concorrência ou a livre iniciativa. (Lei 9.472/97) (grifos nossos).
A operação deve ser encaminhada à ANATEL por meio de sua Procuradoria, dentro do prazo de 15 dias úteis, previsto no § 4º do art. 54 da Lei nº 8.884/94 e art. 3º da Norma 04/98 – Anatel. In verbis:
Art. 3º Os atos de que trata o artigo 54 da Lei n° 8.884/94 deverão ser apresentados para exame, previamente ou no prazo máximo de quinze dias úteis de sua realização, em duas vias, perante a Anatel, encaminhados à sua Procuradoria (...).
O objeto da análise é o disciplinado no parágrafo terceiro e no caput do artigo 54 da Lei nº 8.884, de 11 de junho de 1994, que prevê:
Art. 54. Os atos, sob qualquer forma manifestados, que possam limitar ou de qualquer forma prejudicar a livre concorrência, ou resultar na dominação de mercados relevantes de bens ou serviços, deverão ser submetidos à apreciação do CADE. (grifos nossos).
[...]
§ 3º Incluem-se nos atos de que trata o caput aqueles que visem a qualquer forma de concentração econômica, seja através de fusão ou incorporação de empresas, constituição de sociedade para exercer o controle de empresas ou qualquer forma de agrupamento societário, que implique participação de empresa ou grupo de empresas resultante em vinte por cento de um mercado relevante, ou em que qualquer dos participantes tenha registrado faturamento bruto anual no último balanço equivalente a R$ 400.000.000,00 (quatrocentos milhões de reais). (grifos nossos).
Tais aspectos serão objeto de análise da ANATEL e do Conselho Administrativo Defesa Econômica – CADE – e as operações submetidas não poderão gerar para as partes requerentes, poder de mercado nos mercados relevantes envolvidos, nem qualquer aspecto prejudicial à manutenção da ordem econômica, ao direito concorrencial e ao ambiente regulatório, para que possam ser aprovadas sem qualquer restrição.
De fato, a análise concorrencial da operação pela ANATEL serve apenas de indicativo, uma vez que a competência para tratar da matéria é exclusiva do CADE, conforme os ditames da Lei n.º 8.884, de 1994.
O pedido de anuência prévia da operação, submentido à Anatel, ocorre nos moldes do art. 97 da Lei Geral de Telecomunicações – LGT (Lei 9.472, de 16 de julho de 1997), in verbis:
Art. 97. Dependerão de prévia aprovação da Agência a cisão, a fusão, a transformação, a incorporação, a redução do capital da empresa ou a transferência de seu controle societário.
Parágrafo Único. A aprovação será concedida se a medida não for prejudicial à competição e não colocar em risco a execução do contrato, observado o disposto no art. 7º desta Lei. (grifos nossos).
A partir da análise da Lei nº 8.884/94 e da LGT, observa-se que, no caso de alteração de controle societário de concessionária de serviços de telecomunicações capaz de produzir efeitos anti-concorrenciais, não há, de maneira clara, previsão legal que especifique todos os passos do procedimento necessário para que a operação seja válida e eficaz, o que abrangeria as aprovações pela Anatel e pelo CADE.
Assim, sob o ponto de vista estritamente literal, a Lei nº 8.884/94 e a LGT não determinam, de forma expressa, se é a Anatel que deve conceder a anuência prévia antes de o CADE examinar a operação, ou se essa autarquia deve se manifestar antes da Agência Reguladora.
Na ausência de previsão legal expressa, deve-se partir de uma interpretação sistemática para que se defina o procedimento a ser seguido em tais casos. De fato, quando mais de um ente da Administração Pública Federal deve manifestar-se sobre um requerimento deve-se verificar se as condutas tomadas por uma das entidades não inviabilizem o trabalho desempenhado das demais, de forma a coordenar as suas manifestações.
No caso dos atos referidos no art. 54 da Lei nº 8.884/94, existem três etapas para a análise que são: anuência prévia (art.97 da LGT) e a instrução do ato de concentração (art. 7º da LGT) por parte da ANATEL e a análise concorrencial (art. 54 da Lei nº 8.884, de 1994 e art. 7º da LGT) de competência do CADE.
Ora, parece claro que o método procedimental mais coerente para a análise seria o seguinte: a Anatel realiza a análise para conceder a anuência prévia (art.97 da LGT) e a instrução do ato de concentração (art. 7º da LGT), enviando os autos ao CADE para a análise quanto aos efeitos anti-concorrenciais do ato (art. 54, caput, da Lei nº 8.884, de 1994). Desse modo, a operação somente será examinada pelo CADE se foi antes aprovada pela Anatel, no exercício das respectivas competências, não sendo aprovada, os atos sequer serão examinados pelo CADE.
De fato, a aprovação do CADE representaria o procedimento de análise de legalidade do ato concentração conferindo-lhe, então, plena eficácia, nos termos do art. 54, § 7º, da Lei Antitruste.
O próprio Sistema Brasileiro de Direito da Concorrência está baseado numa estrutura que conceitua o CADE como última instância administrativa em matéria de concorrência. Neste sentido, o próprio sítio eletrônico do Conselho assim define as suas funções:
Assim, após receber o processo instruído pela Secretaria de Acompanhamento Econômico (Seae/MF) e/ou pela Secretaria de Direito Econômico (SDE/MJ), o CADE tem a tarefa de julgar as matérias. A Autarquia desempenha, a princípio, três papéis: 1. Preventivo 2. Repressivo 3. Educativo. (Disponível em: <http://www.cade.gov.br/Default.aspx?a686868a9675b793a0>. Acesso em: 07 março de 2009) (grifos nossos).CADE é a última instância, na esfera administrativa, responsável pela decisão final sobre a matéria concorrencial.
O que se deve ter em mente é que o CADE e a Anatel podem, e devem, analisar um mesmo ato de concentração sob óticas distintas, embora ambas proporcionem a visão sobre um panorama comum: a preservação da competição. Enquanto o CADE analisa o interesse do consumidor e as perspectivas de infração à concorrência, a Anatel analisa, além desses mesmos fatores, os riscos à prestação dos serviços de telecomunicações. No exercício das suas duas competências (instrução de ato de concentração e anuência prévia) a Anatel deve realizar uma análise econômica das operações e dos agentes econômicos envolvidos.
É importante que se ressalte que, no procedimento de anuência prévia (artigos 97 e 98 da LGT), examina-se a validade da operação, enquanto na análise dos aspectos concorrenciais pelo CADE, é a eficácia do ato que está condicionada (art. 54, § 7º da Lei nº 8.884, de 1994). Assim, tendo em vista que a eficácia de um ato jurídico pressupõe a validade deste, o CADE não pode examinar uma operação que ainda não observou os seus requisitos de validade, uma vez que a legalidade é princípio expresso da Administração Pública (Constituição Federal, art. 37, caput). Nesse sentido, observa-se:
Art. 54. Os atos, sob qualquer forma manifestados, que possam limitar ou de qualquer forma prejudicar a livre concorrência, ou resultar na dominação de mercados relevantes de bens ou serviços, deverão ser submetidos à apreciação do CADE. (...)
§ 7º A eficácia dos atos de que trata este artigo condiciona-se à sua aprovação, caso em que retroagirá à data de sua realização; não tendo sido apreciados pelo CADE no prazo estabelecido no parágrafo anterior, serão automaticamente considerados aprovados. (Redação dada pela Lei nº 9.021, de 30.3.95) (grifos nossos).
O exame pelo CADE de uma operação em que a Anatel ainda não concedeu a anuência prévia referida no art. 97 da LGT, apesar de necessária para a sua validade, poderia equipara-se à análise de eventual fusão de pessoas jurídicas que exploram atividades irregulares. Com a análise prévia da Anatel, o CADE não correria sequer o risco de aprovar uma operação "irregular" (do ponto de vista da LGT), ainda que esta não produzisse efeitos anti-concorrenciais. De tal modo, a ausência da análise da Anatel quanto à validade do negócio jurídico representa, na verdade, questão prejudicial à análise do CADE que não poderá se manifestar sobre atos jurídicos que não passaram pelo exame de validade desta Agência.
Dessa forma, tendo em vista que a aprovação pelo CADE é a condição para a eficácia do negócio jurídico, quando a Anatel tiver que se manifestar no procedimento, a atuação desta, que envolve a análise de validade do negócio jurídico (pressuposto natural da eficácia jurídica), deve ocorrer necessariamente antes da do CADE. Nesse contexto, após a análise de anuência prévia pela Anatel, o negócio jurídico é considerado válido, mas ainda não adquiriu eficácia. Tal degrau de força vinculativa só será atingido após a aprovação do CADE, nos termos do parágrafo 7º. do artigo 54 da Lei nº 8.884, de 1994.
O que deve ficar clara é a existência de um degrau lógico a ser percorrido pelo negócio jurídico para que este se encontre em condições de produzir todos os seus efeitos. No primeiro plano e como questão prévia ou preliminar, há a análise de validade do ato, e somente depois de superada tal questão, passa-se à análise da eficácia do negócio.