Propõe-se, no presente artigo, mais do que uma simples análise do "caso Escola Base", uma reflexão sobre as implicações e ensinamentos, que devem ser assimilados por parte da imprensa nacional, em face do incidente em tela. O transcorrer dos fatos relacionados às investigações sobre as denúncias de abusos sexuais cometidos contra crianças da referida escola revela o incontestável poder da mídia e a enorme responsabilidade da mesma sobre os dados noticiados.
Há de se fazer, a princípio, ressalvas à condução do inquérito policial. Não se pode presumir a autoria de um crime, ou a sua prática. Faz-se estritamente necessário apresentar os indícios e as provas, os quais conduzem às conclusões sobre o caso. O inquérito policial tem absoluto caráter de investigação, não de condenação. A Constituição Federal, diploma máximo do ordenamento jurídico, preceitua que "ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença condenatória" (art. 5º, LVII). Assim, somente com a manifestação do Judiciário, da qual não caiba mais qualquer recurso, o indivíduo poderá ser considerado como autor de um crime. Os direitos dos indiciados sofreram nítidas lesões.
Quanto às acusações que recaíram sobre os proprietários da Escola Base, não se demonstrava prudente propagar, muito menos a nível nacional, afirmações dos pais de alunos; as quais, no momento, não apresentavam qualquer respaldo probatório. Até mesmo porque, no processo criminal, quando subsistem dúvidas acerca da titularidade do delito, ou sobre a prática da conduta típica, torna-se imperativa a absolvição do réu.
Com o término do inquérito policial do "caso Escola Base", evidenciou-se a insuficiência de instrumentos a comprovar as alegações quanto à prática de crime sexual. Assim, o porteiro da instituição de ensino, Maurício Alvarenga e os proprietários da mesma, Icushiro Shimada e Aparecida Shimara, através de advogado em comum, acionaram o delegado responsável pelo caso e o Estado de São Paulo. Defendeu-se tese de que o delegado era responsável pelo massacre imposto ao seus clientes (Revista Imprensa, nº 145, pg. 30). Como resultado do processo, Edélcio Lemos, a autoridade policial, foi condenado ao pagamento de indenizações para os autores da demanda. Em razão de o Estado de São Paulo possuir o dever de zelar pela prestação dos serviços públicos (responsabilidade objetiva dos entes estatais), condenado-se também, o mesmo, ao pagamento de R$100.000,00 para cada um dos acima citados, como forma de ressarcir os danos morais e materiais verificados.
Cumpre frisar que nem todos os meios de comunicação veicularam as denúncias sobre as supostas moléstias aos impúberes da escola. Isto revela que alguns setores da imprensa já adquiriram consciência de sua influência na sociedade e as conseqüências do poder do qual se reveste a mídia. Não se pretende afirmar com essas assertivas que os veículos divulgadores do caso em questão são irresponsáveis, ou desprovidos de qualquer ética profissional. Incontestável, porém, o equívoco cometido pelos mesmos, fato este que deve servir como alerta, no sentido de se proceder com maior cautela, no momento de se selecionar, não só as notícias a serem divulgadas, como também a abordagem a ser conferida uma questão controversa. As prerrogativas constitucionais e legais, consagradas aos particulares, são de observância imperativa.
Intenta-se focalizar o presente texto no comportamento da mídia. Diante de uma situação não comprovada, promoveu a execração pública das pessoas envolvidas. O efeito imediato da publicação da matéria em análise consistiu no saque e depredação do prédio da escola. Dificilmente, alguém que acompanhasse a cobertura da imprensa restaria imune ao desejo de adotar alguma medida contrária aos pretensos culpados. A sociedade, com base nas informações difundidas na imprensa, julgou-os antes da devida apreciação do caso pelo Judiciário.
As seqüelas emocionais nos acusados, com certeza, são insanáveis. Constata-se serem os mesmos as verdadeiras vítimas de toda esta celeuma propagada nos veículos de comunicação de todo o País. A Lei Máxima assegura que "são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra, a imagem das pessoas, assegurado o direito de indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação". Utilizando-se desta garantia legal, a advogada do casal Saulo da Costa Nunes e Mara Cristina França, suspeitos de participação nas orgias e abusos sexuais envolvendo crianças, propôs ação em razão da conduta da Rede Globo de Televisão e da Folha da Manhã, quanto ao caso.
Dessa forma, encontra-se na esfera dos órgãos jurisprudenciais a exposição difamatória imposta aos acusados, a fim de que os verdadeiros culpados respondam, nos termos da legislação da legislação pátria vigente, pelos danos causados aos "Monstros da Escola Base".