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Novos prefeitos e velhas dívidas: devem ser pagas?

01/11/2000 às 00:00
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O momento atual é de intenso debate na mídia com relação a débitos deixados por prefeitos que se despedem do mandato e deixam para o seu sucessor a espinhosa tarefa de administrá-los ou solvê-los.

Existe em nosso ordenamento remédio jurídico que o prefeito, ou demais legitimados, possam adotar para o efeito de buscar a responsabilização dos antigos prefeitos ou a lei é silente e a impunidade é inevitável?

O tema em questão será delimitado tendo em vista a sua extensão, tão somente as despesas assumidas no último mês de mandato, mesmo já existente o prévio empenho.

A Lei 4.320/64, em seu artigo 59, § 2º (editada quando ainda sequer se cogitava da chamada reforma fiscal) já estabelecia que era vedado aos prefeitos: "assumir, por qualquer forma, compromissos financeiros para execução depois do término do mandato" e cominava de absoluta nulidade empenhos e atos praticados fora desse modelo legal no parágrafo 4º do mencionado dispositivo. 1

Examinando a posição de alguns doutrinadores, destaca-se o posicionamento do Culto Magistrado Henrique Baltazar Vilar dos Santos, da 2ª Vara da Comarca de Caiacó (RJ), embora dos idos de 1997, mas com o sabor de novo, que acerca do tema faz as seguintes advertências: "Em resumo, correta a posição do atual Prefeito em negar-se a pagar débitos deixados pelo anterior, em ocorrendo uma das seguintes situações: 1º) Despesa não empenhada; 2º) Despesa excedente ao limite de crédito autorizado para aquela dotação orçamentária; 3º) Despesa empenhada no último mês do mandato do Prefeito em valor superior ao duodécimo da despesa prevista no Orçamento vigente; e 4º) compromissos financeiros para execução depois do seu término".

E arremata o doutrinador: "E, só para relembrar, além de nulos e sem qualquer efeito os empenhos e atos praticados naquelas situações, o Chefe do Executivo que assumiu os compromissos financeiros cujo pagamento seja negado pelo novo Prefeito será responsável pessoalmente pelos mesmos, além de responder perante a Justiça Criminal pela prática do crime de responsabilidade previsto no inc. V do art. 1º do Decreto-Lei 201/67 (" ordenar ou efetuar despesas não autorizadas por lei, ou realizá-las em desacordo com as normas financeiras pertinentes "), "sujeito a julgamento pelo Poder Judiciário, independentemente do pronunciamento da Câmara de Vereadores, e cuja pena prevista é de detenção de três meses a três anos ".2

Existe uma única exceção no dispositivo, tangente pela qual alguns Prefeitos, em alguns casos, tentam se valer para ladear o dispositivo, que é a calamidade pública, mas que é situação excepcional, assim definida por DE PLÁCIDO E SILVA: "Vocábulo formado da palavra latina calamitas, quer significar todo evento infeliz ou desgraça, que venha a transtornar toda a vida normal de uma cidade ou vila, ou de parte dela, por tal forma que os poderes públicos ficam na contingência de tomar medidas assecuratórios do sossego público e de proteção aos habitantes da zona por ela atingida, medidas estas que designam socorros públicos.

Vários fatores podem motivar a calamidade: a guerra, as inundações, os terremotos, as epidemias, as secas prolongadas, enfim, qualquer outro flagelo que se mostre ruinoso ou prejudicial à coletividade, exigindo enérgicas e imediatas medidas de proteção, para que as populações por eles atingidas não venham a perecer ou não fiquem em doloroso desemparo" . 3

Diante desse quadro, devem evidentemente os novos Prefeitos e certamente o farão, se acautelar, no momento de transição, examinando se a hipótese aventada pela doutrina referida no presente trabalho se fez presente na gestão do anterior Prefeito, e se eventuais decretos de calamidade pública se enquadram no figurino do Direito Administrativo, e nos casos de não enquadramento como real situação de calamidade pública, adotar as medidas preconizadas na Lei, evidentemente com as atualizações devidas.


NOTAS

1 Lei 4.320/64. Art. 59. O empenho da despesa não poderá exceder o limite dos créditos concedidos.

§ 1º. Ressalvado o disposto no artigo 67 da Constituição Federal, é vedado aos Municípios empenhar, no último mês de mandato do Prefeito, mais do que o duodécimo da despesa prevista no orçamento vigente.

§ § 2º. Fica também, vedado aos Municípios, no mesmo período, assumir, por qualquer forma compromissos financeiros para execução depois do término do mandato do Prefeito.

2 Santos, Henrique Baltazar Vilar dos. Dos débitos deixados pelos ex-prefeitos para pagamento pelo atual chefe do executivo. In: Informativo Coad, n. 10/97, 1997, p. 140-141.

3 SILVA, De Plácido e. Vocabulário Jurídico. Rio de Janeiro: Forense, 1997, p. 141.

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Sobre o autor
Luiz Cláudio Barreto Silva

advogado em Campos dos Goytacazes (RJ), escritor, ex-diretor-geral da Escola Superior de Advocacia de Campos dos Goytacazes, professor universitário

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

SILVA, Luiz Cláudio Barreto. Novos prefeitos e velhas dívidas: devem ser pagas?. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 5, n. -973, 1 nov. 2000. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/1560. Acesso em: 24 nov. 2024.

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