I Introdução
:O Ministério Público, instituição permanente, essencial à função jurisdicional do Estado, possui, entre outras funções infraconstitucionais, a de promover e acompanhar os procedimentos sócio-educativos, bem como conceder a remissão como forma de exclusão do processo ex vi do artigo 201, incisos I e II, da Lei Federal nº 8.069/90. A concessão de remissão entendida como forma de exclusão de processo judicial pertinente atende ao disposto no item 11.2 das Regras Mínimas das Nações Unidas para a Administração da Justiça de menores (Res. 40/33, de 29.11.85)(1).
É a remissão supra mencionada instrumento valioso de proteção integral do adolescente, evitando-se os eventuais maus efeitos da instauração da ação sócio-educativa, assim como a remissão judicial poderia acarretar a minimização dos efeitos da continuação do feito.
A remissão excludente do processo judicial no dizer de Paulo Afonso Garrida de Paula(2) seria justificado quando "...o interesse de defesa social assume valor inferior àquele representado pelo custo, viabilidade e eficácia do processo...".
II Remissão - Perdão
:Dita o dispositivo legal em comento que antes de iniciado o procedimento judicial para apuração de ato infracional, o representante do Ministério Público poderá conceder a remissão, como forma de exclusão do processo, atendendo às circunstâncias e consequências do fato, ao contexto social, bem como à personalidade do adolescente e sua maior e menor participação no ato infracional (art. 126, caput, E.C.A.). A remissão, no dizer dos doutos, pode ser concedida "...como perdão puro e simples, sem a aplicação de qualquer medida, ou, a critério do representante do Ministério Público ou da autoridade judiciária, como uma espécie de transação, como mitigação das consequências do ato infracional..." (3).
Há, pois, possibilidade da concessão de remissão pelo Parquet de natureza pura ou cumulada com medida sócio-educativa, excluindo-se as que caracterizam privação de liberdade semiliberdade e internação na forma do artigo 127, da Lei Federal nº 8.069/90.
III Remissão pelo Ministério Público com INCLUSÃO
de medida sócio-educativa. Possibilidade
:
A discussão jurídica acerca da possibilidade ou não de cumulação de medida sócio-educativa com a concessão de remissão (artigos 126, caput combinado com o artigo 127, ambos da Lei Federal nº 8.069/90) foi travada, concessa maxima venia, levou em consideração apenas a questão do termo aplicação´ constante do texto legal supra referido, sendo que tais discussões levaram à edição da Súmula nº 108 do Superior Tribunal de Justiça a qual se transcreve in albis: A aplicação de medidas socioeducativas ao adolescente pela prática de ato infracional, é da competência exclusiva do juiz. Ocorre que a previsão legal não importa em aplicação de medida sócio-educativa pelo Ministério Público cumulada com remissão. Há verdadeira transação entre o Parquet e o adolescente e seus pais ou responsável legal como instrumento de proteção integral e de política de paz social ao adequar a exclusão do processo judicial ao perdão com inclusão de medida sócio-educativa.
Assim sendo, data venia, há negócio jurídico bilateral envolvendo o Ministério Público e o adolescente e seus pais, havendo o oferecimento do "...não processar em troca da aceitação voluntária de medidas socioeducativas, excluídas ex vi legis a semiliberdade e a internação (ECA, art. 127, in fine)...omissis...O Ministério Público, ao conceder a remissão como forma de exclusão do processo, não pode aplicar medida. O que a lei permite é que A INCLUA como condição do não-processar, como contrapartida a disponibilidade da ação socioeducativa..."(4) Apelação nº 22.014.0/5, da Comarca de Mairiporã SP. Apelante: Ministério Público do Estado de São Paulo e Apelado: Juízo de Direito da Infância e Juventude.
Tem-se, pois, que o(a) adolescente e seus pais ou responsável legal podem ou não aceitar a remissão concedida, tanto com caráter puro, quanto no caso da cumulativa. Isto se aplica nos casos em que a remissão é concedida pelo Parquet ou pela autoridade judiciária, podendo haver negativa daqueles para tais propostas. Seria a remissão um verdadeiro negócio bilateral entre o agente político (Ministério Público e Juiz) e o adolescente e seus pais ou responsável, no escopo de evitar a instauração de procedimento judicial ou a suspensão ou extinção deste, ao mesmo tempo em que garante a proteção integral do adolescente ao possibilitar que este não seja constrangido pelo processo judicial ou em tê-lo abreviado com sua extinção de eventual ação sócio-educativa.
IV Entendimento Jurisprudencial:
Os Tribunais Pátrios vêm interpretando tal tema com decisões com caminhos divergentes, mas preponderando-se o seguinte entendimento
Acórdão RESP 157012/SP. RECURSO ESPECIAL. (97/0086250-0) Fonte DJ. DATA:07/12/1998. Relator Ministro JOSÉ ARNALDO DA FONSECA Ementa: PROCESSO PENAL. ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE. REMISSÃO CONCEDIDA PELO MINISTÉRIO PÚBLICO CUMULADA COM MEDIDA SÓCIO-EDUCATIVA DE LIBERDADE ASSISTIDA. HOMOLOGAÇÃO PELO MAGISTRADO. COMPATIBILIDADE. INCIDÊNCIA DA SÚMULA 108, DO STJ. CUMPRIMENTO DA MEDIDA. - Sentença extintiva da execução. Afronta aos princípios constitucionais do devido processo legal e do contraditório. - Inocorrência. - Continuidade das providências para dar eficácia e cumprimento à medida de liberdade assistida, homologada pelo juiz. - Recurso conhecido e provido. Data da Decisão 10/11/1998. Orgão Julgador T5 - QUINTA TURMA. Decisão Por unanimidade, conhecer do recurso e dar-lhe provimento para, reformando os V. acórdãos recorridos, proclamar a validade da medida de liberdade assistida aplicada pelo Juiz a requerimento do Ministério Público, em remissão concedida pelo órgão ministerial, nos termos dos arts. 126/127, do ECA.
Conclusão
O Ministério Público, via de seu membro, é legitimado para conceder, atendendo às circunstâncias e consequências do fato, ao contexto social, bem como à personalidade do adolescente e sua maior ou menor participação no ato infracional, a remissão como forma de exclusão do processo podendo incluir eventualmente qualquer medida prevista em lei (medidas protetivas e sócioeducativas), com exceção da colocação em regime de semiliberdade e internação, cabendo à autoridade judiciária, neste último caso, após a homologação da mesma, aplicá-la na fase de execução da mesma.
BIBLIOGRAFIA
Paulo Afonso Garrido de Paula, in Direitos de infrator merecem respeito, O Estado de São Paulo de 24.04.91;
Munir Cury e outros, in Estatuto da Criança e do Adolescente, Malheiros Editores, 1992, p. 386/387.
NOTAS
1. Recomendação de concessão de faculdade à autoridade policial, ao Ministério Público e outros entidades que cuidem de adolescentes autores de atos infracionais de não levá-los à serem objeto de procedimentos formais;
2. Paulo Afonso Garrido de Paula, in Direitos de infrator merecem respeito, O Estado de São Paulo de 24.04.91.
3. Munir Cury e outros, in Estatuto da Criança e do Adolescente, Malheiros Editores, 1992, p. 386/387.