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Aplicabilidade do princípio da capacidade contributiva às sanções tributárias

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03/08/2010 às 10:32
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5.Conclusões.

Ante todas as considerações estruturadas neste ensaio, as seguintes conclusões podem ser sumarizadas:

1.As sanções previstas na legislação tributária brasileira possuem natureza específica, qual seja, a tributária, e não outra qualquer como pretendem alguns, dado que decorrem do poder de tributar estatal;

2.Por terem origem no ius tributandi de cada um dos entes políticos, as penalidades fiscais estão jungidas às denominadas limitações constitucionais ao poder de tributar, dentre as quais se encontra, com destacada importância, o princípio da capacidade contributiva;

3.Nessa condição, o princípio figura como legítimo limite quantitativo à imposição de sanções, exigindo, desta feita, a conformação destas de acordo com as diferentes capacidades econômicas dos infratores;

4.Em decorrência disso, pela capacidade contributiva, de um lado estão expressamente vedadas sanções fiscais que impliquem o desrespeito do mínimo existencial, que comprometam o desempenho regular de atividades econômicas e que signifiquem a superação do referido limite do razoável, e, de outro, impõe-se a graduação dessas penalidades segundo as disponibilidades econômicas do transgressor, de modo a realçar a própria função punitiva a elas inerentes; e, por fim,

5.Há de se salientar que a aplicação do princípio da capacidade contributiva não pode se dar de forma apartada de outros igualmente relevantes nessa seara, como são, exemplificamente, o princípio do não confisco, a ele indissociavelmente atrelado, da proporcionalidade, com o seu tríplice comando (exercido pelos juízos de adequação, necessidade e proporcionalidade em sentido estrito) e do ne bis in idem, ao qual nos referimos no início deste estudo.


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Notas

  1. O seguinte trecho do texto "Nota Técnica – inadimplência dos contribuintes", publicado no sítio eletrônico , a hábil a demonstrar a gravidade da inadimplência fiscal no Brasil. Veja-se:
  2. De acordo com artigo publicado no Portal Brasil, pelo economista Marcos Cintra, a quantidade de tributos a receber pelo governo federal soma mais de R$880 bilhões em créditos tributários, ou seja, valor equivalente a aproximadamente 40% do PIB brasileiro.

    De acordo com dados publicados pelo Jornal Valor Econômico de 24 de março de 2008, o REFIS – Programa de Recuperação Fiscal – criado em 2001, já excluiu mais de 106 mil contribuintes dentre quase 130 mil inscritos.

    De acordo com o Secretário Adjunto da Receita Federal do Brasil (RFB), Paulo Ricardo de Souza Cardoso, a dívida total consolidada com o REFIS é de R$ 96 bilhões, sendo que 69% do valor refinanciado deixou de ser pago. Assim, houve a exclusão de 106 mil contribuintes tanto por falta de pagamento de parcelas quanto pela falta de cumprimento das obrigações tributárias correntes, ambos motivos enumerados pela Lei nº. 9.964/2000 – instituidora do REFIS.

  3. Ressalte-se, pela oportunidade e relevância da presente afirmação, que a competência para impor sanções para práticas infracionais não é exclusiva do Direito Penal: todo campo de conhecimento jurídico que impõe deveres ou prevê direitos pode cominar sanções para o seu descumprimento e/ou inobservância.
  4. Segundo estes autores, o próprio CTN acolhe esta distinção no seu art. 167, que, ao disciplinar o direito à restituição dos tributos indevidamente recolhidos aos cofres públicos, ressalva a devolução das penalidades relativas a infrações de caráter formal.
  5. Nesse mesmo sentido é RICARDO LOBO TORRES, para quem o CTN aderiu, "(...) em princípio, à teoria da objetividade da infração fiscal. Não importa, para a punição do agente, o elemento subjetivo do ilícito, isto é, se houve dolo ou culpa na prática do ato. Desimportante também que se constate o prejuízo da Fazenda Pública" (2004, p. 228). De se ressaltar, todavia, que, inobstante predominante, tal entendimento vem sendo revisitado e revisto. O próprio professor fluminense, ao analisar o art. 136 do CTN, admite que a pretensa objetividade da responsabilidade por infrações tributárias merece temperamentos, principalmente em razão do disposto no art. 112 do diploma tributário (2004, p. 228).. LUCIANO DA SILVA AMARO, por sua vez, assevera, igualmente ao examinar a norma inserta no citado art. 136, que o "(...) preceito questionado diz, em verdade, que a responsabilidade não depende da intenção, o que torna (em princípio) irrelevante a presença de dolo (vontade consciente de adotar conduta ilícita), mas não afasta a discussão de culpa (em sentido estrito)." (2008, p. 428).
  6. A este respeito, são bastante esclarecedoras as lições de PAULO ROBERTO COIMBRA SILVA:
  7. Logo, sanção pode existir com ou sem coação, máxime ao se considerar a possibilidade do adimplemento espontâneo do dever jurídico (endonorma a ela correlata) ou, ainda, a possibilidade de uma norma vir a ser violada sem que haja alguma coação contra o seu infrator (hipótese de perniciosa impunidade). Mas o inverso não é verdadeiro. A coação jamais prescinde da sanção, sob pena de abuso e arbítrio, inadmissíveis no Estado de Direito. Por certo, não se pode conceber uma coação sem sanção, assim como não se admite a cobrança de um tributo sem lei ou, no Direito Penal, a aplicação de uma pena sine lege. Pelas mesmas razões decorrentes do princípio da legalidade, assevera-se que a existência de uma norma vigente (e, ipso facto, da sanção nela erigida) deve sempre anteceder a coação (2007, p. 51).

  8. Necessário ressaltar, conforme bem faz PAULO ROBERTO COIMBRA SILVA em obra intitulada Direito Tributário Sancionador, em relação qual já se fez referência, que não se reconheceu na Europa a supremacia do Direito Penal sobre os demais ramos do Direito, mas sim, tão-somente, a sua maturidade no trato das sanções.
  9. A respeito do princípio do ne bis in idem, cuja análise não se intensificou por não consistir no objeto do presente estudo, veja-se o artigo intitulado "O Princípio do ne bis in idem e sua Vertente Substancial na Repressão ao Ilícito Fiscal" (Revista Internacional de Direito Tributário, v. 7, p. 173-194, 2007), de autoria de PAULO ROBERTO COIMBRA SILVA.
  10. Nesse sentido, confira-se SILVA, Paulo Roberto Coimbra, in Direito Tributário Sancionador, São Paulo: Quartir Latin, 2007, p. 126.
  11. De se ressaltar que há doutrinadores, de igual renome, porém em menor número, que sustentam opinião contrária, a exemplo de MARCO AURÉLIO GRECO, segundo o qual:
  12. No texto atual, a capacidade contributiva, por ser um princípio do sistema tributário, é diretriz positiva de sua conformação. Assim, por dizer respeito à composição estrutural e funcional do sistema, sua aplicação dá-se antes mesmo da aplicação da igualdade tributária (hoje limitação, por força do art. 150, II) (2000, p. 191).

  13. Dos estudos mais clássicos, destacam-se dois: "Democracia, liberdade, igualdade : (os três caminhos)", de PONTES DE MIRANDA (São Paulo: Saraiva, 1979) e "Conteúdo Jurídico do Princípio da Igualdade", de CELSO ANTÔNIO BANDEIRA DE MELO (São Paulo: Malheiros Editores, 2003). Já dos mais recentes, o "Teoria da Igualdade Tributária", de HUMBERTO ÁVILA (São Paulo: Malheiros Editores, 2008), tem merecido grande atenção.
  14. Opinião que é compartilhada pela doutrina majoritária, a exemplo de SPAGNOL (2004, p. 117-118) e DERZI (2004, p. 103), segundo a qual "(...) no Direito Tributário, o critério básico que mensura a igualdade ou desigualdade é a capacidade econômica do contribuinte"
  15. A esse respeito, veja-se esse autor nas suas próprias palavras:
  16. Mas sem dúvida a teoria do sacrifício é a que mais vem se prestando a fundamentar a capacidade contributiva. Esta teoria tem um apelo intuitivo que afasta as captações dos tributos fixos, pois neles resta claro que aqueles que possuem maior riqueza e patrimônio sofrem um sacrifício menor do que aqueles que possuem menos renda ou patrimônio. A teoria do sacrifício aponta então para o critério da capacidade contributiva e diz: por aí se implementa a igualdade, pois todos pagam suportando o mesmo ônus, o mesmo sacrifício. Esta teoria do sacrifício tem a vantagem de tratar o tributo de forma mais familiar ao senso comum: como ônus, e da forma mais teórica que aponta para os benefícios obtidos, às vezes até de maneira indireta ou abstrata (GODOI, 1999, p. 190).

  17. De se ressaltar, por oportuno, que a classificação da capacidade contributiva entre negativa e positiva, é relevante apenas didaticamente, não sendo, ainda, unanimemente usada pela doutrina dessa maneira. A categorização adotada condiz com a de DOUGLAS YAMASHITA (2002, p. 67-68), para quem, na feição negativa, a capacidade contributiva veda a tributação confiscatória, e na feição positiva, impõe a graduação da incidência. Há autores, contudo, que a usam com sentidos diversos, como, a título ilustrativo, MISABEL DERZI (2001, p. 697), segundo a qual, no aspecto negativo, o princípio proíbe o legislador de tributar de forma idêntica cidadãos de diferentes capacidades contributivas (dever de não discriminar), no aspecto positivo, determina a quantificação do tributo, de acordo com a capacidade contributiva de cada um, capacidade que é aferida em duas etapas: capacidade contributiva mínima, pela renda mínima, a partir da qual incide o tributo; e capacidade contributiva, para que não haja efeitos confiscatórios, violando o direito de propriedade do contribuinte.
  18. A esse respeito, TIPKE salienta que o princípio da capacidade contributiva protege o mínimo existencial, na medida em que só há de se falar em capacidade contributiva do cidadão se ultrapassado seu mínimo existencial. "A capacidade contributiva começa além do mínimo existencial". (2002, p. 46) O princípio do mínimo existencial decorre da dignidade humana e do Estado Social. Assim, não é permitido que a tributação do Estado alcance o mínimo existencial para depois resgatá-lo através de benefícios concedidos pelo próprio Estado: "O Estado não pode, como Estado tributário, subtrair o que, como Estado Social, deve devolver". (2002, p. 34).
  19. Destaque-se que a capacidade contributiva e o princípio que veda o confisco estão, dados os seus conteúdos normativos, indissociavelmente atrelados, sendo este decorrência lógica daquela, conforme já se pronunciou MISABEL DERZI (2001, p. 695)
  20. Segundo o próprio PAULO ROBERTO COIMBRA SILVA, a alcunha "Direito Tributário Sancionador" mostra-se mais adequada a batizar o estudo das infrações e das sanções de índole estritamente tributária.
  21. Saliente-se que, para a jurisprudência consolidada no âmbito do STF, é perfeitamente possível a redução de multas de índole fiscal quando aplicadas em valores exorbitantes. Nesse sentido, são os REs 55.906, 60.413, 82.510 e 92.373.
  22. A título de exemplo, tem-se a opinião de MARIE-CHRISTINE BOUVIER, noticiada por PAULO ROBERTO COIMBRA SILVA, segundo a qual "(...) pela feição punitiva, entendia que a capacidade contributiva não deveria ser observada de forma cogente na aplicação ou estipulação nas sanções de natureza tributária." (20072, p. 157).
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Sobre o autor
Marco Túlio Fernandes Ibraim

Advogado e Professor de Direito Tributário nas Faculdades Pedro Leopoldo. Mestrando em Direito Tributário pela UFMG.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

IBRAIM, Marco Túlio Fernandes. Aplicabilidade do princípio da capacidade contributiva às sanções tributárias. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 15, n. 2589, 3 ago. 2010. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/17105. Acesso em: 23 dez. 2024.

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