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A reforma administrativa brasileira (1995-1998) sob a ótica weberiana

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10/08/2010 às 17:56
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Resumo

No primeiro governo de Fernando Henrique Cardoso (1995-1998) foi implementada uma reforma administrativa no âmbito da União. Um dos objetivos da reforma era a implementação de um novo modelo administrativo, substituindo o então modelo burocrático vigente, reputado como ineficiente e ultrapassado. A administração burocrática é o modelo da doutrina de Weber, tendo como princípio básico a racionalização, sendo esta um tipo de dominação. O modelo weberiano é resultado de estudos empíricos de várias organizações.

Palavras-chave: Reforma Administrativa. Burocracia. Primeiro Governo FHC. Dominação.


1. Considerações iniciais

No período de 1995 a 1998, durante o primeiro governo de Fernando Henrique Cardoso, a Administração Pública Federal passou por mudanças significativas em face da chamada "Reforma Gerencial de 1995".

Segundo os mentores dessa Reforma, um dos focos era melhorar a eficiência no serviço público, através da aprovação de normas que instituiriam práticas gerenciais, adotando-se um novo modelo de administração denominado administração gerencial, em detrimento da administração burocrática então existente no país.

Firmou-se um entendimento de que o modelo então existente, baseado, em regra, na concepção de Max Weber sobre burocracia, era ultrapassado, sendo necessária à modificação para que o País ingressasse no novo século seguindo a onda reformista praticada noutros países, sobretudo no Reino Unido e na Nova Zelândia.

Criou-se, então, o Ministério de Administração Federal e Reforma do Estado, MARE, cujo papel principal era não só criar as diretrizes da reforma, mas trabalhar pela implementação das mudanças no âmbito do Congresso Nacional.

No presente artigo, objetivamos analisar os dois modelos propostos, bem como verificar se houve ou não a criação de um novo modelo de cunho gerencial ou, ainda, se houve ou não substituição do modelo clássico weberiano.

Assim, num primeiro momento descreveremos o modelo de burocracia criado por Max Weber no século XIX, destacando os principais alicerces de sua teoria. Partiremos da idéia de dominação, enquanto forma de poder, para chegarmos à teoria tridimensional dos tipos puros de dominação, com o fito de destacarmos a burocracia, tipo de dominação legal considerado puro.

Em seguida, analisaremos a Reforma Gerencial de 1995, através da descrição dos pontos-chaves previstos no Plano Diretor da Reforma, idealizados pelos mentores intelectuais do Plano, bem como positivados no nosso ordenamento legal através de emendas Constitucionais e outras normas infraconstitucionais, tomando-se como cenário a reforma no âmbito da Administração Pública Federal.

Empós compararemos os pontos da Reforma com as idéias da doutrina weberiana, verificando se houve ou não a adoção de um novo modelo, conclusão essa que será feita em tópico próprio no final do trabalho.


2-O MODELO WEBERIANO

2.1. Os tipos de dominação

Para Max Weber a dominação é um dos elementos mais importantes da ação social, pois, na grande maioria dos casos, leva a uma relação associativa racional [01]. No raciocínio que fundamenta sua teoria Weber parte da idéia de poder para a de dominação, afirmando que esta é um caso especial de poder [02].

Há diversas noções de dominação, mas no caso weberiano a idéia se bifurca em dois tipos de dominação com tipos reputados puros, em face do antagonismo detectado por ele. Weber deixa bem claro que os tipos não são encontrados de maneira isolada, havendo formas de transição entre as formas puras de dominação.

O primeiro deles diz respeito a situações de monopólio em virtude de uma constelação de interesses [03], que encontra como tipo puro a dominação monopolizadora do mercado.

Já o segundo tipo, que tem mais importância para o presente trabalho, parte da idéia de que a dominação ocorre em virtude da autoridade, baseada no poder de mando e no dever de obediência, com exemplos pautados no chefe de família, na autoridade administrativa ou no príncipe [04].

Tendo por base os tipos de dominação acima, Weber enuncia uma definição de dominação, nos seguintes termos [05]:

Por "dominação" compreenderemos, então, aqui, uma situação de fato, em que uma vontade manifesta ("mandado") do "dominador" ou dos "dominadores" quer influenciar as ações de outras pessoas ("do dominado" ou dos "dominados"), e de fato as influências de tal modo que estas ações, num grau socialmente relevante, se realizam como se os dominados tivessem feito do próprio conteúdo do mandado a máxima de suas ações ("obediência").

O empirismo é característica predominante em sua obra. Para Weber, a dominação constata-se empiricamente em todo tipo de organização social onde se detecta a presença de um chefe ou soberano, permitindo que sua doutrina seja aplicada a muitas classes diferentes de organização [06].

Qualquer que seja o tipo de dominação, em toda situação em que se possa encontrá-la, há três elementos constitutivos: um sujeito dominante, cujo poder de mando deriva de sua própria vontade; um quadro administrativo encarregado de executar ordens do dominante; e o ou o(s) dominado(s), cujo papel é a obediência.

No presente artigo será analisado o segundo tipo, eis que o mesmo apresenta a dominação sob o aspecto de sua vinculação à administração, com foco na figura da autoridade. Segundo Weber [07]:

Toda dominação manifesta-se e funciona como administração. Toda administração precisa, de alguma forma, da dominação, pois, para dirigi-la, é mister que certos poderes de mando se encontrem nas mãos de alguém.

A dominação é uma situação de fato entre dominando e dominante, que encontra como ponto fiscalizador um quadro administrativo.

Para ser legítima a dominação por meio da administração, deve haver certa vontade de obedecer e interesse na obediência, não sendo todo e qualquer tipo de exercício de poder sobre outrem que se configuraria necessariamente uma dominação legítima. Como bem textualiza Daniel Barile da Silveira [08]:

Para a execução das decisões a sociedade depende do controle hierárquico, que poderá ser gerencial (racional), burocrático (racional-legal) ou tradicional. Weber definiu com clareza os dois últimos tipos de poder hierárquico. O controle tradicional corresponde, na administração do Estado, ao patrimonialismo; o controle burocrático, à administração pública burocrática, em que os objetivos e os meios mais adequados para atingi-los são rigidamente definidos na lei [...]

Partindo da idéia de dominação, Weber elenca princípios observados por ele ao realizar estudos de várias organizações, seja no campo privado ou nas relações com o Estado. Observou em sua análise histórica que os princípios da legitimação da dominação correspondem a três tipos fundamentais puros.

Segundo o autor, as formas encontradas na realidade histórica correspondem a uma combinação, mescla, adaptação e transformação dos princípios reputados como puros [09], havendo fundamentos próprios para cada espécie:

Há, portanto, três tipos de dominação legítima. O tipo legal, em que a validade do poder de mando é feita por sistemas de regras racionais pactuadas ou impostas. O tipo tradicional, que o poder de mando é baseado na autoridade pessoal, cujo fundamento reside na tradição sagrada, isto é, no habitual, no que tem sido assim desde sempre. E, por fim, o tipo carismático, onde a dominação baseia-se na crença, no carisma, isto é, na revelação atual ou na graça concedida a determinada pessoa.

Segundo Píer Paolo Girglioli [10], o modelo weberiano dos tipos ideais de domínio compreende três planos de análise:

o primeiro consiste na formulação de conceitos claramente definidos; o segundo na construção de modelos deduzidos de fenômenos históricos empiricamente semelhantes; o terceiro, na específica explicação, a partir desses modelos, de casos históricos particulares.

Pois bem, no presente artigo o interesse central reside na análise do primeiro tipo baseado no sistema de regras racionais pactuadas ou impostas, cujo tipo puro é a burocracia weberiana, ficando a ressalva de que não há o isolamento de um tipo em detrimento dos demais, havendo sempre a interseção de elementos de um tipo noutro.

Antes, porém, da descrição desse modelo, passamos a delinear os contornos gerais dos outros tipos, que serão importantes não só para dissociar um do outro, mas para identificar os não puros, onde há mescla de características de dois tipos puros.

2.2. O modelo tradicional

No modelo tradicional a característica da impessoalidade, que é característica do tipo burocrático, deixa de existir, não havendo o dever de servir à determinada finalidade objetiva e impessoal mediante a obediência de ordens abstratas que legitimam a conduta do dominado. Ao contrário, as normas que devem ser obedecidas têm o caráter da pessoalidade e são ditadas pelo mandante, tendo como fundamento a "[...] tradição; a crença na inviolabilidade daquilo que foi assim desde sempre.".

Segundo Weber, o germe da dominação patriarcal encontra-se no chefe da comunidade doméstica, eis que a posição autoritária pessoal deste tem como ponto de coincidência com o modelo burocrático a objetividade de suas normas, tendo estas a finalidade pessoal de continuidade de sua existência [11]. É, portanto, a submissão pessoal ao senhor que garante a legitimidade desse modelo.

Weber especifica um tipo especial de estrutura de dominação patriarcal a qual nomeia de dominação patrimonial [12]:

A este caso especial da estrutura de dominação patriarcal: o poder doméstico descentralizado mediante a cessão de terras e eventualmente de utensílios a filhos ou outros dependentes da comunidade doméstica, queremos chamar de dominação patrimonial.

No modelo patriarcal, mormente no patrimonial, há considerável diferenciação da doutrina burocrática weberiana, eis que o elemento competência, assim entendido como esfera de jurisdição objetivamente delimitada [13] deixa de existir, porquanto cada caso é regulado pela discricionariedade do senhor.

Além disso, o critério meritocrático é relevado a segundo plano, eis que as indicações e nomeações para as funções públicas são feitas por critérios puramente pessoais, no mais das vezes através da indicação de parentes ou apaniguados do senhor, sem a observância de critérios técnicos e de mérito.

Utiliza-se, pois, o critério do privilégio, em vez do critério de competência do modelo racional. Seu tipo mais puro é o do pai de família, do chefe da parentela ou do "soberano" [14].

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2.3. O modelo carismático

A outra forma é a dominação carismática, caracterizada pelo extraordinário, pela prevalência do carisma do dominador, cuja pessoa é devotada em face de seus dotes sobrenaturais e, de forma particular, em razão de atributos como faculdades mágicas, revelações ou heroísmo, poder intelectual ou de oratória [15].

Weber indica o nascimento dessa forma de dominação [16]:

Nasce da excitação comum a um grupo de pessoas, provocada pelo extraordinário, e da entrega ao heroísmo, seja qual foi o seu conteúdo. Só disso já resulta que somente in statu nascendi tanto a fé do próprio portador e de seus discípulos em seu carisma – seja este de conteúdo profético ou de outro qualquer – quanto à entrega fiel a ele e à sua missão por parte daqueles para os quais ele se sente enviado atuam como pleno poder, unidade e força.

Nessa forma de dominação, assim como na patriarcal, o elemento competência não é requisito fundamental. Não é também, o elemento privilégio, típico da forma de dominação patriarcal, nem se prende ao critério da tradição. A legitimidade, assim, é caracterizada pela qualificação carismática pessoal do senhor.

Seus tipos mais puros são a dominação do profeta, do herói guerreiro e do grande demagogo". O tipo que manda é o líder. O tipo que obedece é o "apóstolo" [17].

2.4. O modelo legal – a burocracia weberiana

No modelo legal, Weber idealiza o tipo mais puro na dominação burocrática.

O termo burocracia não tem uma acepção só. Ao contrário, há concepções do termo que a utilizam num viés pejorativo, como também, noutro extremo, tendo significado de eficiência, numa acepção mais positiva.

Píer Paolo Girglioli nos ensina que o termo foi utilizado pela primeira vez no século XVIII para "[...] designar o poder do corpo de funcionários e empregados da administração estatal, incumbido de funções especializadas sob a monarquia absoluta e dependente do soberano" [18].

Para firmar sua concepção de burocracia, Weber utiliza-se de vários estudos e de critérios para definir e fixar pontos semelhantes e discordantes, materializados em elementos caracterizadores. Mais importante do que simplesmente conceituar, Weber identifica os pontos principais montando um modelo que deu profundas contribuições a várias ciências. Não se limita em sua obra à análise de instituições públicas, mas a toda forma associativa.

No entanto, restringindo-se ao objeto do presente trabalho, é utilizada a visão weberiana relativa aos órgãos públicos, e não às burocracias privadas.

Em linhas gerais, os elementos característicos da burocracia de Weber são os seguintes [19]:

- Competências fixas e ordenadas por leis ou regulamentos administrativos, em geral: nesse critério, Weber identifica três conseqüências importantes, a saber: i) distribuição de atividades regularmente necessárias para os funcionários; ii) os poderes de mando estão também fixamente distribuídos, bem como os meios coativos para o cumprimento; iii) contratação de pessoal para cumprimento regular e contínuo dos deveres assim distribuídos;

- Hierarquia de cargos e de instâncias: cria-se uma estrutura hierárquica com subordinação entre a chefia e os subordinados. É resultado da competência fixada, pois parte do pressuposto de que determinadas atividades são mais ou menos importantes que outras. Cria, também, uma hierarquia em termos de remuneração dos funcionários;

- Distinção clara entre o bem público e o privado, havendo dissociação entre os bens administrativos e dos funcionários: Weber identifica e diferencia o "escritório" da moradia privada do funcionário, sendo aquele o somatório dos funcionários, objetos e documentos. Há clara distinção da atividade oficial da atividade privada;

- Conhecimento específico em determinadas matérias: a especialização tem papel importante no desenvolvimento de uma burocracia, devendo os funcionários ter uma intensa instrução na matéria;

- Exclusividade ou plena força de trabalho do funcionário para a administração: o cargo deixa de ter papel acessório, transformando-se em autêntica forma de emprego, cujo vínculo do funcionário com a administração deve ser exclusivo, eis que esse deve dar plena força de seu trabalho para a administração;

- Igualdade de tratamento na administração dos funcionários: fiscalização e controle das atividades administrativas, onde as chefias têm a responsabilidade pelo cumprimento de normas e procedimentos. Além disso, há necessidade de pessoal especializado e qualificado para exercer a administração dos funcionários, que detenham conhecimento especializado na matéria, conhecimento esse que Weber chamou de "arte especial que é posse dos funcionários" [20].


3-A REFORMA ADMINISTRATIVA BRASILEIRA (1995-1998)

Sob o mote da reconstrução do Estado, o primeiro governo de Fernando Henrique Cardoso teve como preocupação materializar uma grande reforma na Administração Pública. Dentre os objetivos, a redução dos gastos do Governo, a melhoria na eficiência dos serviços públicos e um aumento na governabilidade.

Segundo Valeriano Mendes Ferreira Costa a reforma do primeiro governo FHC pode ser comparada, em termos da amplitude e impacto, às duas outras reformas da burocracia federal realizadas no século XX, em 1936 e 1967 [21].

A primeira grande reforma teve como marco principal à criação do DASP, núcleo burocrático do novo Estado diretamente ligado à Presidência da República, criado em 1938.

Com a edição do Decreto-Lei nº 200/1967 tem-se a segunda grande reforma da burocracia federal, realizada já no período da ditadura, cujo destaque administrativo foi à delimitação da chamada Administração Indireta.

Quase trinta anos depois, após um longo período de conturbações políticas, econômicas e sociais, foi promulgada a Emenda Constitucional nº 19/1998, alterando dispositivos da recém promulgada Constituição Federal. A vigência dessa Emenda positivou, em nível constitucional, a chamada Reforma Gerencial do Estado, implementada basicamente no primeiro governo de Fernando Henrique Cardoso (1995-1998), cujo mentor foi o então Ministro Luiz Carlos Bresser Pereira.

No seu início o primeiro governo de FHC deu mostras de que haveria profunda reforma na Administração Pública Federal. A criação do Ministério de Administração Federal e Reforma do Estado (MARE) teve a finalidade precípua de mudar o cenário da burocracia federal.

Segundo Bresser Pereira [22], uma ampla e profunda crise deixou o país num vácuo de poder que perdurou até 1991. Nesse cenário, destaca: crise econômica de alta inflação, moratória da dívida externa, abertura comercial apressada e radical e tentativa de desmonte do aparelho burocrática no Governo Collor (1990-1992).

Com base nesses problemas, bem como num cenário internacional onde já havia reformas administrativas em curso, foi implementada a Reforma Gerencial de 1995, cujo foco principal era a transformação do modelo burocrático em modelo gerencial, tendo como princípio a eficiência do serviço público. Como textualiza o autor [23]:

[...] era uma imposição histórica para o Brasil, como para todos os demais países que havia nos cinqüenta anos anteriores montado um Estado do Bem Estar. O grande crescimento que o aparelho do Estado se impusera para que pudesse garantir os direitos sociais, exigiam que o fornecimento dos respectivos serviços de educação, saúde, previdência e assistência social fosse realizado com eficiência. Esta eficiência tornava-se, inclusive, uma condição de legitimidade do próprio Estado e de seus governantes.

A idéia central da reforma foi desenvolvida em 1995 através do Plano Diretor da Reforma do Aparelho do Estado, que contém o diagnóstico e toda a lógica da reforma que então se iniciava [24], com base em reformas feitas noutros países, em especial a desenvolvida no Reino Unido, baseadas numa nova disciplina, a new public manegement [25].

A Reforma era composta de quatro frentes, representativas de componentes ou processos básicos da reforma do Estado, a seguir dispostos [26]:

a) orientação da ação do Estado para o cidadão-usuário ou cidadão-cliente;

b) ênfase no controle dos resultados através dos contratos de gestão (ao invés de controle dos procedimentos);

c) fortalecimento e aumento da autonomia da burocracia estatal, organizada em carreiras ou "corpos" de Estado, e valorização do seu trabalho técnico e político de participar, juntamente com os políticos e a sociedade, da formulação e gestão das políticas públicas;

d) separação entre as secretarias formuladoras de políticas públicas, de caráter centralizado, e as unidades descentralizadas, executoras dessas mesmas políticas;

e) distinção de dois tipos de unidades descentralizadas: as agências executivas, que realizam atividades exclusivas de Estado, por definição monopolista, e os serviços sociais e científicos de caráter competitivo, em que o poder de Estado não está envolvido;

f) transferência para o setor público não-estatal dos serviços sociais e científicos competitivos;

g) adoção cumulativa, para controlar as unidades descentralizadas, dos mecanismos de controle social direto, do contrato de gestão em que os indicadores de desempenho sejam claramente definidos e os resultados medidos, e da formação de quase-mercados em que ocorre a competição administrada;

h) terceirização das atividades auxiliares ou de apoio, que passam a ser licitadas competitivamente no mercado

Uma das frentes da reforma administrativa gerencial de 1995 diz respeito à governança. Segundo Bresser Pereira [27] existe governança em um Estado quando "[...] seu governo tem as condições financeiras e administrativas para transformar em realidade as decisões que toma".

No que pertine às condições financeiras, a reforma apresenta rígidos controles de política fiscal e de controles de gastos, resultante, após os anos 90, na promulgação da Lei de Responsabilidade Fiscal em 2000.

Quanto ás condições administrativas, o objetivo da reforma foi o de levar a administração pública a ser gerencial, tendo por princípio a busca de resultados, mas não só a execução de rotinas. Conceitos novos, não bem trabalhados ou conhecidos nos órgãos públicos, à época, passaram a ser incorporados no cotidiano administrativo, tais como planejamento estratégico e as carreiras típicas de Estado.

Tomando como base às reformas mais importantes da burocracia no cenário mundial, o mentor da Reforma de 1995 critica a burocracia weberiana, que, segundo ele, foi responsável pela criação de um serviço público não profissionalizado e ineficiente. Defendem, assim, uma reforma gerencial da Administração Pública cuja como meta principal é acabar com a ineficiência estrutural da administração pública burocrática. Afirma o ex-Ministro que há a necessidade de substituição do modelo burocrático, ineficiente, pelo modelo gerencial, eficiente e voltado para o interesse público [28]:

Na verdade, foram apenas duas as verdadeiras reformas administrativas desde a construção dos estados nacionais modernos: a Reforma Burocrática ou Reforma do Serviço Público e a Reforma Gerencial da Administração Pública. A primeira, que foi analisada por Weber, diz respeito à formação de um serviço público profissionalizado; ocorreu em meados do século XIX na Europa ocidental, no início do século XX nos EUA e na década de 30 no Brasil. A reforma gerencial, que flexibiliza os processos e os regulamentos burocráticos, conferindo um grau mais elevado de autonomia e de accountability às agências governamentais e aos seus gerentes, é a segunda: é um novo fenômeno histórico, que ganhou força nas últimas duas décadas, quando as pessoas começaram a perceber que uma das razões da atual crise fiscal do Estado era a ineficiência estrutural da administração pública burocrática.

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Sobre o autor
Adriano Craveiro Neves

Juiz do Trabalho Substituto do TRT da 22ª Região. Mestre em Ciência Política. Especialista em Direito Constitucional e em Direito Processual.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

NEVES, Adriano Craveiro. A reforma administrativa brasileira (1995-1998) sob a ótica weberiana. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 15, n. 2596, 10 ago. 2010. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/17153. Acesso em: 29 mar. 2024.

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