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Papel do Ministério Público na promoção dos direitos humanos

14/09/1997 às 00:00
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Por direitos humanos ou direitos do homem devemos que se tratam daqueles que o homem possui por sua própria natureza humana e pela dignidade que ela é inerente. Não resultam de uma concessão da sociedade política. Constituem sim, um dever da sociedade política a ser garantido e consagrado. São admitidos desde a antigüidade: No código de Hamurabi (Babilônia), na filosofia de Mêncio (China), na república (de Platão), no direito Romano. Logicamente que nessas épocas, não existia o conceito que hoje temos de direitos humanos.

Na Idade Média, apesar das atrocidades cometidas pela inquisição, podemos destacar a existência da Magma Carta (1226) que estabeleceu alguns direitos básicos que se incorporariam a partir de então no seio de nossa consciência e prevalece até nossos dias.

Séculos mais tarde vieram as declarações dos direitos do homem e do cidadão, com a revolução Francesa e tais ideais foram consolidados. Em nosso século a Constituição Mexicana 1917 proclamou os direitos do trabalhador . A Revolução Russa trouxe a luz a declaração dos direitos do povo , dos trabalhadores e explorados (1918).

Ultrapassado o ideal liberalista em nosso século , surgiu a idéia dos direitos sociais. Já não bastava o estado de direito . Era necessário um Estado Social de direito. Essas aspirações foram colocadas de maneira solene na proclamação das quatros liberdades, de Roosevelt em 1941 (a liberdade de palavra e expressão, a de culto, a de não passar necessidade, e a de não sentir medo ). Depois vieram as declarações das nações unidas (1942), e as das conferência de Moscou (1943), são Francisco (1945), culminando com a conhecida Declaração universal dos direitos do homem, de 1948.

Numa primeira geração ficaram cristalizados os direitos de cidadania . Numa segunda geração foram inseridos os direitos sociais na dos direitos fundamentais . A partir de então a preocupação centrou-se não mais na formulação de meras declarações mais ficou evidenciada a necessidade de verdadeira promoção dos direitos humanos. Não adianta mais multiplicarmos textos que encerem promessas mais ou menos vagas . E preciso que tais textos sejam aplicados no mundo jurídico a fim de que surtam efetivo efeito.

Não podemos negar o caráter pedagógico da declaração do Direitos do homem. Tal documento carrega uma presunção de verdade, de legitimidade, e de amplo consenso seus termos . Todavia , a declaração sofreu um profundo desgaste decorrente entre a distância que separa seus enunciados e o efetivo cumprimento dos mesmos. Daí a necessidade de criarmos mecanismo que os provam e salvaguardem tais direitos a todos nós. No Brasil, a situação não é diferente.

Não podemos falar de direitos humanos sem falarmos em classe sociais . Com efeito , a historia demonstrou que o discurso discursos em direitos humanos no Brasil veio sendo influenciado pela classe média que oscilou sua defesa e hoje procura esvaziar o discurso em favor dos direitos humanos. Isso porque o discurso dos direitos humanos no Brasil (como de resto em toda América latina) durante muito tempo sempre foi uma maioria marginalizada e pobre .

A luta pelos direitos humanos no Brasil nas três últimas décadas é o reflexo do movimento popular da classe média . Do golpe de 64 ( e especialmente depois de 1969) até a morte do jornalista Wladimir Herzog nas dependência do DOI-CODI em 1975, a luta pelo direitos humanos era sinônimo de luta pelo direitos políticos e, principalmente contra a tortura. Nessa fase destaca-se o trabalho da Igreja Católica em favor dos direitos humanos, no Brasil, e fora do Brasil, o apoio Anistia Internacional.

A partir da morte de Herzog, até 1979, com a "distensão lenta e gradual" promovida pelo governo militar , buscou-se não apenas garantir a atividade física dos opositores do regime militar mas também procurou-se alcançar os direitos de cidadania política. Essa época foi marcada pela a luta pela anistia, por campanha contra a Lei de Segurança Nacional, pelas greves do ABC paulista, e pelo engajamento do movimento sindical paulista. Nesse período a Igreja não lutou sozinha. A Ordem dos Advogados do Brasil e o próprios sindicatos dos trabalhadores, organizados e fortes, se engajaram na luta pelos direitos humanos. Ocorre aí, como reflexo dessa luta, o fim da censura à imprensa. O assassinato do operário Santos Dias da Silva , nas greves de 1979/80 em São Paulo é o símbolo da luta nesse período .

A partir de 1979, a identificação dos direitos humanos com as classes marginais se deu de maneira total. Conquistados os diretos políticos e restabelecido o regime democrático, o discurso, a prática e a luta migraram para a conquista dos direitos econômicos e sociais. Passou-se a lutar pelo trabalho, (não nos esquecendo que a recessão de 1981 a 1984 exerceu uma influência importante nesse sentido), à saúde, à vida, à moradia e à integridade física. A luta continuou em favor dos presos (agora presos comuns) e em prol dos lares pobres. Marcou essa época a campanha pela reforma agrária. O assassinato de dois menores na favela de Heliópolis (Teodoro e Dirley) representam um marco nas reivindicações deste período.

Com a Constituição de 1988, consolidado o regime democrático, a luta pelos direitos humanos passou a ser a luta pela efetiva implementação dos direitos adquiridos através da nova carta. E também a partir daí que surge um novo perfil do Ministério Público, que se consolidam (pelo menos no papel) os direitos democráticos e surgem leis mais importantes em defesa do cidadão. O conteúdo da luta pelos direitos humanos continua a favor dos presos e pela inserção das classes menos favorecidas nos direitos mais essenciais como a moradia, a saúde, a educação e pelos menores. Esse último período pode ser simbolizado pela chacina da Candelária, chacina de Carandiru e pelos violentos conflitos com o sem-terra em Eldorado do Carajá, no norte do país .

O professor paulista José Reinaldo de Lima Lopes observou bem que, do ponto de vista das classe sociais a historia recente dos direitos humanos pode ser dividida em dois momentos: o Golpe Militar até 1975, e de 1975 até nossos dias . O primeiro período foi marcado pela violação dos direitos da classe média (intelectuais, artista e estudantes ) ao lado das lideranças populares. A distinção de classes não constitui uma figura de retórica mas verdadeiramente aparece como um divisor de águas pelos direitos humanos. No período inicial, a prisão e a opressão do Estado recaía sobre a classe média (as classes dominantes nunca sofreram com as ditaduras militares nem no Brasil, nem no resto da América Latina )e havia uma retórica em favor do Estado de Direito. A violência contra as classes populares , que já existia desde antes de 1964, existiu durante o regime militar e persiste até hoje. Essa violência é reflexo de nossa infeliz tradição, desde os tempos da escravatura, onde os açoites eram públicos passando pela abolição que deixou uma grande massa de negros sem a mínima perspectiva, abandonados à própria sorte em que continuaram a reproduzir o mesmo modo de produção anteriormente estabelecido.

E em cima desse movimento pendular da classe média é que podemos melhor compreender a situação de luta pelos direitos humanos no Brasil. A deterioração das condições de sobrevivência da classes populares constitui um fator importante para a ampliação da pauta de reivindicações que deixou de ser apenas na proteção aos presos e partiu para a luta por melhores condições salubridade, habitabilidade e educação das periferias. Assim, o modelo econômico brasileiro acabou de implantar um sistema falido de habitação popular . O êxodo rural, que antes era interessante porque garantia mão de obra barata para o processo de industrialização passou a constitui um problema sério porque o inchaço da cidade acabou degradando as classes dos trabalhadores . A luta agora e contra o Estado através de reivindicações de caráter social (das classes populares enquanto produtora) e econômico ( das classes sociais enquanto consumidoras). São lutas de caráter concreto por melhores condições de trabalho ( produção) ou de sobrevivência (reprodução).

As classes médias apoiaram os movimentos de direitos humanos no momento em que buscava defender os presos políticos e retiraram esse apoio no momento em que a expressão "direitos humanos" passou ter uma conotação estendia a um caráter social e econômico . No período em que vigorava a censura no Brasil , o envolvimento das classes médias se deu através daqueles que diretamente se sentiam afetados pelos problema. Assim, as famílias de presos torturados e desaparecidos , os setores que tinham acesso à imprensa alternativa, exerceram, juntamente com a igreja, um papel importante na luta pelos direitos humanos no Brasil durante a ditadura militar . É importante ressaltar que a classe média brasileira não foi unânime nesse apoio. Muitos se calaram , seduzidos pelo "milagre econômico".

No período ditatorial ocorreu um contato maior dos intelectuais (artistas, professores, estudante e advogados), oriundos em geral da classe média , com a realidade social das classes populares, através da proximidade física com os presos comuns . Num segundo momento , restabelecido o Estado de direito , o apoio dos intelectuais se esvaziou e somente aqueles desligados e independentes do grande capital e que não têm , em principio grande apoio da imprensa , é que continuaram na luta em favor dos direitos humanos , agora com um conceito renovado e com uma pauta de reivindicações ampliada .

Em contrapartida , iniciaram-se as distorções com a redução do discurso pelos direitos humanos uma questão policial, deixando de lado os direitos básico à sobrevivência . Essa distorção pretende mudar o eixo das discussões todo o conteúdo dos direitos humanos reduzindo-o à um discurso limitado.

Esse discurso policial que procura limitar a atuação dos movimentos de defesa dos direitos humanos a uma questão policial ainda carrega uma grande distorção. Muitos acabam sem responder a uma indagação que amiúde surge na boca daqueles que pretendem esvaziar o discurso acerca dos direitos humanos: "e os direitos humanos da vítima?" Parece até que existem duas espécies de direitos humanos: os dos marginalizados e o das vítimas. Direitos humanos constituem um instrumento forjado defender a pessoa humana de um modo geral e não apenas um indivíduo qualquer , seja ele criminoso , seja ele vítima de crimes. Os direitos humanos estão disseminados não só através transgressões à lei praticadas pelos homens mas sim no exercício abusivo do poder político e do poder econômico . Esquecem-se de uma violação de um direito, seja ele uma pessoa , seja um grupo de pessoas, é permanente e estruturalmente subordinadas ao autor da violação mas também estão envolvidos outros fatores sociais e econômicos na questão.

As pessoas que lutam pelos direitos humanos no Brasil são rotuladas como aquelas que lutam pela proteção do bandido contra a policia . Esquecem-se ( ou fingem esquecer) que o conceito e muito mais abrangente e envolvem outras ações civis de reintegração de posse, ações civis relativa a tutela ou curatela de crianças e adolescentes carentes na busca de regularização de áreas urbana de forma irregular, na divulgação dos direitos trabalhistas e previdenciários , na verdadeira luta por condições dignas de vida. O discurso, portanto, é muito maior.

A retórica de que os direitos humanos se resumem na busca de proteger os bandidos da policia encobre o fato de que a policia e utilizada com freqüência como repressora dos movimentos de reivindicação das classes populares. A invasão do Carandiru em São Paulo, o massacre do sem terra ocorrido recentemente no Pára são exemplos disso. Na verdade o choque não e entre a policia e o cidadão e sim entre o estado e o cidadão . A policia serve apenas de instrumento , de força aparente , de materialização do Estado mas ela não e o Estado . O conflito não ocorre entre policia e bandido e sim entre Estado e cidadão .

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É importante ressaltar que essa retórica , hoje, interessa a classe média . Afinal, seus membros já não estão mais no cárcere porque os motivos políticos que ensejaram a prisão de seus membros já se acabou . Institua-se novamente a ditadura militar no Brasil e veremos de novo a classe média ingressar as fileiras dos movimentos em defesa dos direitos humanos...

E o direito? Onde é que ele se engaja nesse contexto? Os operadores do Direito estariam capacitados para atender as demandas sociais que hoje vivemos ? Qual seria o papel do Ministério Público nesse sentido ?

Vivemos uma situação peculiar em nosso país . Nossas leis são avançadíssimas . Somente pare exemplificar , possuímos um estatuto da criança e do adolescente moderno mas que, na prática , vem se mostrando ineficaz . Possuímos uma lei de execução penal de moldes europeus que vem sendo permanentemente desrespeitada. Possuímos um Código de defesa do consumidor avançado mas que não surte efeito frente a uma grande massa de pessoas que não tem acesso ao consumo . Como podemos falar em direito do consumidor num País em que existem inúmeros cidadãos vivendo dos restos que são depositados em lixões das grandes cidades? Como podemos pensar na proteção integral à criança ao adolescente quando abrirmos os jornais e constatamos o trabalho escrava nas carvoarias , nas plantação de erva-mate e a prostituição queque grassa em alguns estados do Nordestes e Centro Sul do País? Será que podemos resumir o conteúdo das discussões sobre o direito humano aos maus tratos que recebe nossa população carcerária ? Não seria uma simplificação demasiada de seu conteúdo?

Sabemos que o Brasil é rico em leis. Possui uma estrutura legal que da inveja a muito país dito desenvolvido. O grande problema é fazer com nossas leis sejam cumpridas porque leis existem para promover direitos humanos no Brasil . O judiciário (e aqui podemos colocar também o Ministério Público) possui algumas deficiências que impedem a efetiva aplicação das leis Brasileiras . Afinal , não é do interesse das classes dominantes fazer com que as leis sejam cumpridas . Por outro lado , as classes populares quando começam a reivindicar aquilo que lhes pertence , não como esmola mas sim como direito garantidos pela a lei, a situação muda de figura . De fato , as garantias de direitos fundamentais que estão na lei mas sim no modo como se aplica a lei. A relevância não e sobre aquilo que esta escrito mas principalmente no modo como são tomadas as decisões sobre matéria . Nesse sentido , o Ministério Público pode exercer um papel importantíssimo na garantia da aplicação das leis que já existem.

O Ministério Público adquiriu uma nova configuração a partir de 1988 quando foi colocado na constituição como constituição permanente , essencial à função jurisdicional do Estado , incumbindo-lhe a defesa da ordem jurídica , do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis . Essa nova configuração Ministério Público é decorrente de suas ações a partir do século 80, 7347/ 85). Por outro lado, o contexto político da redemocratização e as aspirações das classes médias e especialmente do legislador constitucional alçaram o Ministério Público a uma categoria forte de operadores do direito . Com o passar dos anos , o Ministério Público incorporou sua nova faceta e desde de então passou a incomodar as classes dominantes . Não é por acaso que hoje , com o processo constitucional , pretende-se cortar algumas atribuições conferidas ao Ministério Público pela carta de 1988. E que, no atual contexto , a instituição forte que era necessária para se contrapor sobre aos interesses dominantes passou a incorporar lutas que incomodaram as próprias classes dominantes.

O Ministério Público está colocado não dentre a organização dos poderes mas como instituição permanente, essencial à prestação jurisdicional do estado . Incube-lhe a defesa da ordem jurídica dos interesses sociais e individuais indisponíveis e do regime democrático . Deve zelar pelo efetivo respeitos dos poderes Públicos e dos serviços de relevância pública aos direitos assegurados na constituição . Por isso, os membros do ministério Público não são considerados meros funcionários públicos são agentes políticos investidos de atribuições constitucionais e responsáveis pelo exercício de funções mais altas e complexas , cuja atuação e decisões exigem independência funcional . Para tanto são garantidas pela constituição a vitaliciedade . Não pode o promotor perder o cargo senão por sentença judiciária. Não se admite a perda do cargo por decisão administrativa (senão seria estabilidade). Também é garantida a inamovibilidade que visa garantir o exercício funcional e não apenas a garantia do membro do Ministério Público . Por isso , é impossível a remoção compulsória do promotor , salvo por motivo público , mediante decisão do colégio de procuradores (art. 12, III, lei 8625/ 93). Tais garantias conferiram força ao Ministério Público para poder agir livremente, sempre de acordo com a lei.

A constituição estabelece que o Ministério Público tem as seguintes funções institucionais, dentre outras:

I - Promover privativamente a ação penal pública;

II- zelar pelo efetivo respeito dos poderes públicos e dos serviços de relevância pública aos direitos assegurados na constituição , promovendo as medidas necessárias à sua garantia;

III- promover o inquérito civil e a ação civil pública , para a proteção do matrimônio público e social , do meio ambiente e de outros direitos difusos e coletivos.

IV- defender juridicamente os direitos e interesses das populações indígenas;

V- Exercer o controle externo da atividade policial; além de outras funções que lhe foram conferidas , desde que compatíveis com sua finalidade.

De acordo com a constituição , o Ministério Público constituiu uma entidade governamental que pode, e muito, promover os direitos humanos .

A ação penal pública, função privativa do Ministério Público , tem sido promovida e constitui instrumento poderoso para que se busque soluções justas para a repressão aos violadores dos direitos humanos. Infelizmente, nesse sentido o Ministério Público deixa muito a desejar no que se refere às leis especiais . Os dispositivos previstos no estatuto da criança e do adolescente bem como aqueles que protegem o consumidor são bem aplicados . falta conhecimento , empenho e vontade do Ministério Público para a devida aplicação das leis penais contra o deficiente físico ( lei 7853/89) , contra a discriminação racial (lei 1390/51, lei 7437/85, lei 7716/89) crimes resultantes de atos discriminatórios ou de preconceito de raça , religião , etnia ou de procedência nacional , praticados por meios de comunicação de massa (lei 8081/90). Mas e importante nos fazermos também uma ressalva . Esses dispositivos legais que tratam de incriminar condutas preconceituosas são de difícil aplicação por que trazem em deu conteúdo algumas expressões que limitam sua aplicação e que acabam por tornar leis inócua . A lei penal que trata de proteger os deficientes físico coloca como conduta criminosa os atos de recusar , suspender, procrastinar, cancelar ou fazer cessar , sem justa causa , a inscrição de alunos em estabelecimento de ensino , por motivos da derivados da defici6encia que porta . A prova desses crimes é difícil consecução. Como provar a procrastinação de uma inscrição de alunos em um estabelecimento de ensino ? Como provar que está procrastinação se deu decorrência de preconceito advindo da defici6encia física do aluno ? Nesses sentidos, nossas leis são hipócritas . Racismo , na delegacia de policia , é tratado como injúria . Tortura é tratada como crimes de lesões corporais ou abuso de autoridade . Com a tipificação de crime de tortura esperamos poder dispor de meios mais eficientes para tratar do assunto .

O zelo pelo efetivo respeito aos serviços relevantes assegurados pela constituição também constitui armas poderosas nas mãos do Ministério Público que pode fazer valer os direitos da minoria , das crianças e dos adolescentes . Inúmeras são as ações do Ministério Público nesse sentido. O Ministério Público tem legitimidade para ingressar com ações de investigação de paternidade, pode efetivamente garantir o ingresso de alunos em escolas , enfim, possui legitimidade para promover inúmeras ações que podem garantir o respeito aos direitos básicos da sociedade .

O controle externo da atividade policial é uma área que também merece por parte do Ministério Público atenção especial . Trata-se de uma função institucional ainda não aproveitada completamente mas que já apresenta resultados visíveis quando entra em ação . Em Goiás já existe um núcleo que fiscaliza a atuação da policia em que vem promovendo medidas efetivas de combate a tortura , aos maus tratos ,e aos abusos de autoridade . Em São Paulo também podemos destacar semelhante atuação . O caso do bar Bodega é exemplo disso .

A policia, instrumento de manutenção de poder durante a ditadura militar sempre cometeu abusos . Inicialmente vigorava uma ideologia de Segurança Nacional que, com a redemocratização política perdeu o sentido . Daí , a tecnologia da tortura passou para uma ideologia da segurança pública e os abusos continuaram a ocorrer . Igual situação encontra-se a policia da Argentina que também comete toda uma séries de abusos em nome da segurança pública . O Ministério Público incomoda as policias . Em Goiás movemos ações contra os policiais e promovemos nós mesmos as investigações . Dessa forma conseguimos furar o espírito corporativo das corregedorias e temos conseguido um resultado satisfatório , apesar da pouca estrutura .

A tortura constituiu o maior desafio a ser vencido pelo Ministério Público . Novas tecnologias foram sendo implantadas à barbárie de modo a fazer com que a tortura seja praticada de maneira de não deixar vestígios . Na linguagem policial trata-se do "método científico" expediente utilizado para obtenção de confissões mediante coação moral, e mesmo com a utilização de mecânicos de violência física que não deixam vestígios . Tal "tecnologia" acaba mascarando qualquer exame médico legal e termina por impedir que as autoridades tomem conhecimento dos fatos. As denúncias de práticas foram trazidas a sociedade quando no final da ditadura e depois disso parece que a questão ficou meio que sepultada como se entre nós a sinistra prática estivesse banida . Infelizmente , o que se constata é o contrário . A tortura conseguiu sobreviver a democracia que ora estamos vivendo .

Durante o regime militar, a tortura era aplicada para conter a "subversão" e tinha caráter eminentemente político . O final da ditadura trouxe a impressão de que com ela estaria encerrado o ciclo da tortura . Na verdade , encerrou-se uma fase em que, em nome da ideologia da segurança nacional , quais meios para manter a estabilidade do regime eram utilizados , inclusive os suplícios aos opositores do regime . Ocorreu assim uma ligação psicológica entre o fim da ditadura e o fim da tortura no Brasil. Tal falácia parece ter encontrado ressonância na sociedade que prefere ignorar , ou fingir ignorar que entre nós existe tal procedimento . O regime militar acabou e a prática de tais atrocidades migrou para o aparato repressivo do Estado . Migrou para os órgãos encarregados da segurança pública.

O levantamentos de tais fatos e difícil e requer coragem e paciência dos investigadores . Os métodos modernos empregados para os maus tratos são insidiosos . Raramente deixam vestígios aparentes . Devido a prática de diversos maus tratos , com emprego de energias mecânicas (lesões corporais), bioquímicas (inanição) ou biodinâmicas (choques) , a determinação médico legal da tortura deve levar em conta um conjunto generalizados de sintomas. Devemos também nos lembrar que por quaisquer meio , sempre a vítima apresenta um violento comprometimento da emotividade , reagindo ante ao terror , medo, revolta ou submissão . Qualquer "verdade" pode ser arrancada de uma pessoa nessas condições . Em sua quase totalidade as vítimas da tortura são pessoas pobres e desenformadas sobre seus direitos fundamentais ou se tratam de pessoas sobre as quais recai uma investigação criminal .

Constatar e provar tais torturas se constitui em tarefas difícil ,tendo em vista que nem sempre é possível levar a vítima ao perito para que realize o exame de corpo de delito a tempo de não ter desaparecido ainda os sinais corporais . Por outro lado , há de se observar que os médicos que realizam tais perícias , na condição de funcionário da secretaria de segurança pública , atendendo a práticas corporativas ou mesmo tendendo represália por parte dos membros da policia , deixam de fazer com devida cautela os exames e os laudos de tortura . Além das aflições físicas e morais , a tortura acaba por trazer também prejuízos jurídicos às vítimas que acabam confessando crimes que não praticaram tornando assim mais difícil a sua defesa perante o poder judiciário . Inúmeras são as acusações que pesam sobre as autoridades brasileiras que governavam o país durante o regime militar após o golpe de 1964 , dentre essas acusações sobressaem aquelas que apontam as referidas autoridades como coniventes e até como fontes de autorização para prática da tortura contra os presos políticos .

Urge divulgar todos esses fatos a sociedade a fim de que seja pressionados os órgãos governamentais encarregados da segurança pública em todo país no sentido em que seja tomadas as medidas institucionais cabíveis . O Ministério Público , fiscal da lei, controlador externo das atividades policiais , por força constitucional, necessita de aparelhamento para poder exercer o seu mister . Para isso , deve ser regulamentado detalhadamente o inciso VII do artigo 127 da Constituição Federal e dos governantes do estados espera-se maior atenção e recursos a fim de que a prática da tortura seja banida das dependência policias .

Outro instrumento poderoso e que vem sendo utilizado com freqüência é o inquérito civil público e a ação civil pública . Tratam-se de mecanismo processuais que visam a garantia dos direitos difusos e coletivos . Destinados à proteção do patrimônio público e social , do meio ambiente e dos outros direitos difusos e tais coletivos tais instrumentos jurídico esta sendo utilizado para a defesa das pessoas portadoras deficiência física , pela criança e adolescente , pelo direito a um meio ambiente equilibrado , dentre outros .

A defesa das nações indígenas também constitui importante atribuição do Ministério Público . Defender juridicamente os direitos e interesses das populações indígenas constitui um conceito amplo que visa a proteção e organização social, dos costumes, das línguas, das crenças, das tradições e dos direitos originário sobre suas terras . Tal proteção recai sobre o Ministério Público da União através das procuradorias da república .

João Batista Herkenhoff já falava em 1979 sobre o judiciário (e tais observações ainda são pertinentes ao Ministério Público) que para que tenhamos êxito na promoção dos direitos humanos é necessário que organizemos uma justiça (e um Ministério Público) que sejam cercados de garantias e preparados para enfrentamos a questão. Além disso, deve-se partir para uma educação libertadora onde o homem terá judiciais mais célebre , eficientes e realmente populares , capazes de salvaguardar todos os direitos humanos .

Temos muito a fazer. Os jornais mostram que crianças brasileiras são explorada sexualmente e atuam em fitas pornográficas no Equador (folha de S. Paulo, 04.12.96 , 3º Caderno , p. 02). Mostram também o descanso com saúde onde só a Maternidade Escola Assis Chateubriand , Fortaleza foram registradas de 91 bebês no mês de novembro desse ano. Sete agricultores sem-terra foram agredidos por funcionários encapuzados dia 04 de dezembro na Paraíba . A Human Rights divulgou relatório em Washington no último dia 04 com dados sobre a violação de direitos humanos em 74 países em que critica o Plano Nacional de Diretos Humanos elaborado pela presidência da República mas que até agora ainda não saiu do papel. O Ministério Público do Para foi acusado de ter formulado "uma denuncia mal substanciada à justiça Militar (OESP, 05.12.96, p. C7). Manchetes sobre a exploração do trabalho infantil também estão presentes ( FSP, 04.12.96, p. 1-3).

Como disse , muito há de ser feito . O Ministério Público precisa tomar uma atitude mais firme com relação ao respeito aos direitos humanos . Para isso precisa se aparelhar melhor , precisa adquirir uma consciência maior acerca do problema . E importante , todavia que mantenha as atribuições que a constituição federal lhes conferiu a fim de que possamos tornar efetivo trabalho de promoção dos direitos humanos . Na medida do possível , o Ministério Público tem feito um trabalho que vai além da retórica e do proselitismo mas é preciso agir mais , é preciso conferir meios materiais para que o Ministério Público tenha condições de desempenhar seus mister . Por outro lado , o Ministério Público é hoje a única instituição governamental capaz de efetivar a promoção dos direitos humanos . O Ministério Público , sozinho , não conseguira atingir esse objetivo . E preciso também contar com o poder judiciário para que as proposições do Ministério Público possam ter efetiva ampliação . Outro elemento importante e que não deve ser olvidado é o intercâmbio entre o Ministério Público e as entidades não governamentais . Pode ser feito uma eficiente trabalho de parceria entre o Ministério Público e as entidades não governamentais . Na área do meio ambiente esse trabalho já se faz sentir . Falta agora ampliar essa parceria para que os trabalhos sejam mais eficientes . As organizações não governamentais poderão utilizar sua força de mobilização para acionar o canal competente . O Ministério Público, por sua vez , alimentando pelos relatos não governamentais , com as prerrogativas dadas pela Constituição pode fazer utilizar sua força na defesa dos direitos da coletividade , em especial , dos direitos humanos .

Para tanto , creio que numa atitude inicial poderíamos propor a inserção do direito ao meio ambiente sadio como direito humano. Trata-se da terceira geração dos direitos humanos . E a luta por um meio ambiente sadio capaz de assegurar uma vida mais saudável a todos .

Passar os institutos Médicos Legais para o Ministério Público constitui uma outra providência salutar ao desenvolvimento das atividades do Ministério Público . Dessa forma , o espírito corporativo da policia pode ser anulado pelo desligamento de tais órgãos da policia .

A regulamentação do art. 127, VII da CF/88 é outro obstáculo que deve ser vencido por muitas das ações do Ministério Público esbarraram na falta de clara e precisa regulamentação dessa função institucional.

Quanto às ONGs, é preciso tirar proveito da liberdade de informação e promover mecanismo de pressão econômica contra os países que violam os direitos humanos . As ações do Ministério Público são eminentemente públicas e abertas as participação popular . Assim, as organizações não governamentais podem se utilizar o Ministério Públicos para canalizar a defesa jurídica de seus direitos . Por outro lado, a publicidade , fator predominante nas ações do Ministério Público pode ser utilizada como fonte de informações para as não governamentais de modo a poderem ter acesso seguro e confiável de dados a fim de que possa exercer sua função de grupo de pressão , especialmente utilizando-se de entidades internacionais . Com a globalização do mundo podemos tirar proveito para pressionar as autoridades . Com as facilidades advindas por exemplo, da INTERNET, podemos divulgar de maneira atualizadas todas as lesões aos direitos humanos que ocorrem no Brasil e com isso buscarmos outras formas de pressão - principalmente de caráter econômico) para que possamos lutar por um mundo melhor.


BIBLIOGRAFIA

BARRAL, Welber . Direitos Humanos : uma abordagem conceitual . revista de informação legislativa, a .31 , nº 121. Brasília : Senado Federal, Subsecretária de edições técnicas, jan/mar. 1994.p. 167-170.

HERKENHOFF, João Batista. Os Direitos Humanos e sua Proteção jurisdicional . Encontros com a Civilização Brasileira. Nº 07. Rio de Janeiro : Civilização Brasileira , 1979.p. 229-259.

LOPES, José Reinaldo Lima . Direitos humanos no Brasil - Compreensão de sua história recente . Revista de Informação Legislativa , a. 24, nº 95. Brasília : Senado Federal - Subsecretaria de edições técnicas, jul./set. 1987.p. 05-22.

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Sobre o autor
Maurício José Nardini

promotor de Justiça em Goiás, coordenador do Centro de Apoio Operacional de Controle Externo da Atividade Policial

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

NARDINI, Maurício José. Papel do Ministério Público na promoção dos direitos humanos. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 2, n. 19, 14 set. 1997. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/172. Acesso em: 5 nov. 2024.

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