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Traços do Direito de Família refletidos no espelho da "modernidade líquida"

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4.Conclusão

Por todo o exposto, verifica-se que as categorias sociológicas de Bauman que giram em torno da "Modernidade Líquida" e aqui tratadas foram tiradas do contexto europeu e se ajustam perfeitamente ao contexto brasileiro deste século XXI. Como exemplos, o crescimento dos casos de divórcio e a consequente Emenda Constitucional nº 66/2010.

Além disso, é de clareza solar que, por mais que a instabilidade e a liquidez persistam, ainda há um tema dentro do ordenamento jurídico que tenta permanecer sólido dentro do tribunal: a paternidade. Daí concluir que, do ponto de vista estritamente nacional, não se pode generalizar o pensamento de Bauman. O amor entre duas pessoas pode ser líquido, a vida e suas responsabilidades, nem sempre. A modernidade, em sua totalidade, talvez não seja líquida.

Por isso, tendo por pano de fundo o panorama aqui traçado, utiliza-se das palavras de Michaël Foessel para enxergar a perspectiva futura e o surgimento de novas instituições, a ver:

"... muito bem que, durante o início da era moderna, a violência destruidora inerente à aceleração e foi moderado pela edificação de novas instituições. Trata-se de um tipo particular, uma vez que sua finalidade é introduzir ordem e sentido no caos aparente de notícias." [23]


Referências bibliográficas

BAUMAN, Zygmunt. Comunidade – a busca por segurança no mundo atual. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 2003.

_________________. Modernidade Líquida. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed., 2001.

________________. Pensando Sociologicamente. Buenos Aires: Ediciones Nueva Vision, 1994.

_________________. Vida Líquida. Rio de Janeiro: Zahar, 2007.

COURTIS, Christian. El juego de los juristas. Ensayo de caracterización de la investigación dogmática. In: Courtis, Christian (org.). Observar la ley: ensayos sobre metodologia de la investigación jurídica. Madrid: Trotta, 2006.

DIAS, Maria Berenice. A PEC do casamento!

Disponível em: http://www.mariaberenice.com.br/pt/separacao-e-divorcio.dept Acesso em: 19 jul 2010.

FOESSEL, Michaël. Tout va plus vite rien ne change : le paradoxe de l’accéleration. Paris : Revue Esprit nº365, junho 2010.

OLIVEIRA, Luciano. No me venga con el Código de Hammurabi... La investigación sócio-jurídica en los estúdios de posgrado en derecho. In: Courtis, Christian (org.). Observar la ley: ensayos sobre metodologia de la investigación jurídica. Madrid: Trotta, 2006.


Notas

  1. COURTIS, Christian. El juego de los juristas. Ensayo de caracterización de la investigación dogmática. In: Courtis, Christian (org.). Observar la ley: ensayos sobre metodologia de la investigación jurídica. Madrid: Trotta, 2006, p. 117.
  2. OLIVEIRA, Luciano. No me venga con el Código de Hammurabi... La investigación sócio-jurídica en los estúdios de posgrado en derecho. In: Courtis, Christian (org.). Observar la ley: ensayos sobre metodologia de la investigación jurídica. Madrid: Trotta, 2006, p. 281.
  3. Idem, p. 282.
  4. Ibidem, p. 279.
  5. Para aprofundamento, vide o prefácio denominado "Ser leve e líquido", na obra: BAUMAN, Zygmunt. Modernidade Líquida. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed., 2001, pp. 7-22.
  6. Entrevista concedida à Folha de São Paulo, em 19 de outubro de 2003, por Maria Lúcia Garcia Pallares-Burke.
  7. KOLAKOWSKI, Leszek. Freedom, Fame, Lying and Betrayal: Essays in Everyday Life. Peguin, 1999, p. 98 apud BAUMAN, Zygmund. Vida Líquida. Rio de Janeiro: Zahar, 2007, p. 155.
  8. BAUMAN, Zygmund. Vida... p. 155.
  9. Tradução livre de ‘Dans la modernité, les sujets historiques éprouvent une disjonction entre leur espace d'experience et leur pour horizon d'attente: l'avenir est um appel à raccourcir le présent pour faire advenir un sens nouveau. La certitude que tout ne va pas assez vite est à la source d'une énergie qui accélère les transformations de l'histoire en même temps qu'elle abolit les traditions.: FOESSEL, Michaël. Tout va plus vite rien ne change : le paradoxe de l’accéleration. Paris : Revue Esprit nº365, junho 2010, p. 26.
  10. BAUMAN, Zygmunt. Vida ... p. 7.
  11. "Una relación humana es moral cuando surge del sentimiento de responsabilidad por el bienestar y la prosperidad de la otra persona. En primer lugar, la responsabilidad moral se distingue por ser desinteresada. No deriva del miedo al castigo ni del cálculo de la posible ganancia que reportará; no surge de las obligaciones contenidas en un contrato que he firmado y que estoy legalmente obligado a cumplir, ni de la expectativa de que la persona en cuestión pueda ofrecerme algo útil a cambio, con lo que mi esfuerzo por ganarme su buena voluntad habría valido la pena." In BAUMAN, Zygmunt. Pensando Sociologicamente. Buenos Aires: Ediciones Nueva Vision, 1994.
  12. BAUMAN, Zygmund. Comunidade – a busca por segurança no mundo atual. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 2003, p. 36.
  13. DIAS, Maria Berenice. A PEC do casamento!
  14. Disponível em: http://www.mariaberenice.com.br/pt/separacao-e-divorcio.dept Acesso em: 19 jul 2010

  15. Disponível em: http://www.jusbrasil.com.br/noticias/2284700/ministerio-publico-adota-emenda-constitucional-66-2010-em-parecer-sobre-divorcio-consensual. Acesso em: 08 de ago. 2010.
  16. Fonte: www.ibge.gov.br/home/estatistica/populacao/registrocivil/2006/tabela6_3.pdf - 2007-12-06
  17. REsp 1.157.273-RN, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 18/5/2010. Publicado no Informativo 435.
  18. REsp 960.805-RS, Rel. Min. Aldir Passarinho Junior, julgado em 17/2/2009, publicado no Informativo 384.
  19. REsp 1.067.438-RS, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 3/3/2009, Informativo 385. No mesmo sentido: RESP 200801354394, Relator(a) NANCY ANDRIGHI, DJE DATA:20/05/2009.
  20. Igualmente interessante é a ementa:

    "Direito civil. Família. Criança e Adolescente. Recurso especial. Ação negatória de paternidade c.c. declaratória de nulidade de registro civil. Interesse maior da criança. Ausência de vício de consentimento. Improcedência do pedido.

    O assentamento no registro civil a expressar o vínculo de filiação em sociedade, nunca foi colocado tão à prova como no momento atual, em que, por meio de um preciso e implacável exame de laboratório, pode-se destruir verdades construídas e conquistadas com afeto.

    Se por um lado predomina o sentimento de busca da verdade real, no sentido de propiciar meios adequados ao investigante para que tenha assegurado um direito que lhe é imanente, por outro, reina a curiosidade, a dúvida, a oportunidade, ou até mesmo o oportunismo, para que se veja o ser humano – tão falho por muitas vezes – livre das amarras não só de um relacionamento fracassado, como também das obrigações decorrentes da sua dissolução. Existem, pois, ex-cônjuges e ex-companheiros; não podem existir, contudo, ex-pais.

    O reconhecimento espontâneo da paternidade somente pode ser desfeito quando demonstrado vício de consentimento, isto é, para que haja possibilidade de anulação do registro de nascimento de menor cuja paternidade foi reconhecida, é necessária prova robusta no sentido de que o "pai registral" foi de fato, por exemplo, induzido a erro, ou ainda, que tenha sido coagido a tanto.

    Tendo em mente a salvaguarda dos interesses dos pequenos, verifica-se que a ambivalência presente nas recusas de paternidade são particularmente mutilantes para a identidade das crianças, o que impõe ao julgador substancial desvelo no exame das peculiaridades de cada processo, no sentido de tornar, o quanto for possível, perenes os vínculos e alicerces na vida em desenvolvimento.

    A fragilidade e a fluidez dos relacionamentos entre os adultos não deve perpassar as relações entre pais e filhos, as quais precisam ser perpetuadas e solidificadas. Em contraponto à instabilidade dos vínculos advindos das uniões matrimoniais, estáveis ou concubinárias, os laços de filiação devem estar fortemente assegurados, com vistas no interesse maior da criança, que não deve ser vítima de mais um fenômeno comportamental do mundo adulto. Recurso especial conhecido e provido. RESP 1003628,

    Relator(a) NANCY ANDRIGHI, DJE 10/12/2008.

  21. REsp 1.088.157-PB, Rel. Min. Massami Uyeda, julgado em 23/6/2009. Informativo 400.
  22. REsp 1.078.285-MS, Rel. Min. Massami Uyeda, julgado em 13/10/2009. Informativo 411.
  23. REsp 1.032.875-DF, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 28/4/2009. Informativo 392.
  24. REsp 714.969-MS, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 4/3/2010. Informativo 425.
  25. Tradução livre de FOESSEL, Michaël. Op. Cit. P. 27.
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Sobre a autora
Suiá Fernandes de Azevedo Souza

Mestranda em Teorias Jurídicas Contemporâneas pela Universidade Federal do Rio de Janeiro. Bacharel em Direito pela Universidade Federal Fluminense. Advogada.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

SOUZA, Suiá Fernandes Azevedo. Traços do Direito de Família refletidos no espelho da "modernidade líquida". Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 15, n. 2617, 31 ago. 2010. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/17298. Acesso em: 19 abr. 2024.

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