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Lombadas e redutores de velocidade

01/10/2000 às 00:00
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É realmente inexplicável essa questão das lombadas, porque o novo Código de Trânsito Brasileiro, a Lei 9.503, de 23.09.97, já está velho e até parece que ninguém ainda tomou conhecimento do parágrafo único de seu art. 94, que proíbe "a utilização das ondulações transversais e de sonorizadores como redutores de velocidade, salvo em casos especiais definidos pelo órgão ou entidade competente, nos padrões e critérios estabelecidos pelo CONTRAN".

Na PA-124, exatamente na localidade de Caetezinho, há algumas semanas os moradores resolveram construir, por conta própria, criminosamente e com a aparente conivência das autoridades, quatro lombadas estupidamente irregulares e sem sinalização, colocando em risco a vida dos usuários daquela estrada. E o pior é que essas lombadas já fizeram várias vítimas, e ninguém toma uma providência, a não ser os guardas rodoviários do posto próximo a Nova Timboteua, que se limitam a avisar sobre o perigo a alguns motoristas que são parados para a fiscalização.


O art. 95 do Código de Trânsito proíbe qualquer obra ou evento que possa perturbar ou interromper a livre circulação de veículos e pedestres, ou colocar em risco sua segurança, sem prévia permissão do órgão ou entidade de trânsito, e prevê a multa que varia entre 50 e 300 Ufir, independentemente das sanções cíveis e penais cabíveis, além da aplicação de multa ao servidor público responsável pela inobservância de qualquer das normas dos arts. 93, 94 e 95. Explicando mais claramente: alguém já deveria estar sendo multado, porque somente um cego não conseguiria ver tantas lombadas e tantos obstáculos criminosamente instalados nas vias públicas, colocando em risco a vida de tanta gente.

A competência para essa fiscalização e para a arrecadação dessas multas, de acordo com o art. 21, IX, do Código de Trânsito, é dos órgãos e entidades executivos rodoviários da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, cada um no âmbito de sua circunscrição.

É preciso observar, porém, que a questão não se esgota pela simples aplicação da multa prevista no Código de Trânsito, porque se as lombadas ou obstáculos colocados na pista causarem um acidente, alguém poderá ser responsabilizado por isso.

Assim, quem constrói uma lombada em uma rodovia poderá ser responsabilizado civilmente, para pagar os prejuízos materiais causados aos veículos que se acidentarem, e poderá ser também responsabilizado penalmente, até mesmo como homicida. O mesmo pode ser dito da autoridade, que se omite em suas responsabilidades legais.

O mais interessante é que existem, nos 210 quilômetros, de Belém até Salinas, exatamente 35 lombadas, de todos os tipos, altas, baixas, retangulares, arredondadas, brancas, pretas, listradas, sinalizadas e não sinalizadas, e depois da entrada em vigor do novo Código, quando se pensava que elas seriam retiradas, na realidade o seu número está aumentando. Apenas em Ananindeua, as lombadas foram retiradas, e foram construídas as passarelas.

Das 35 lombadas existentes na estrada, por alguma razão especial, 20 estão localizadas nos últimos 40 quilômetros, inclusive as quatro mais recentes, a que já me referi.

Ainda mais engraçado é o art. 334 do Código de Trânsito, segundo o qual "As ondulações transversais existentes deverão ser homologadas pelo órgão ou entidade competente no prazo de um ano, a partir da publicação deste Código, devendo ser retiradas em caso contrário". Esse prazo terminou, evidentemente, em setembro de 1.998, há quase dois anos. Será que essas lombadas estão todas homologadas? Você decide.

É impossível entender como tais fatos ocorrem, apesar da competência e da honestidade das autoridades responsáveis, e de sua preocupação em relação à segurança do trânsito. É também muito estranho que quase seiscentos congressistas, entre deputados e senadores, tenham trabalhado incansavelmente para a aprovação desse Código, apenas para que ninguém se preocupe em obedecer às suas normas.

Responda a uma pergunta: se quando o motorista desobedece às normas de trânsito, geralmente é obrigado a pagar uma multa, porque será que quando as próprias autoridades de trânsito fazem de conta que essas normas não existem, elas não podem ser também punidas por sua omissão?

Afinal de contas, quem paga todos os prejuízos é o motorista/contribuinte, porque é ele quem paga os subsídios dos deputados e senadores que elaboram as leis, para que depois ninguém as respeite, como também a remuneração ou o vencimento das autoridades e dos agentes de trânsito, que às vezes mais se preocupam em multar e arrecadar do que em prevenir os acidentes. E se o motorista tiver o azar de atropelar uma dessas lombadas, ainda será obrigado a pagar a conta da oficina ou da concessionária, isso se tiver a sorte de escapar com vida, porque se não, ainda terá que pagar as despesas da funerária, depois de se endividar com a conta geralmente salgada do hospital.

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Sobre o autor
Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

LIMA, Fernando. Lombadas e redutores de velocidade. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 5, n. 46, 1 out. 2000. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/1752. Acesso em: 18 abr. 2024.

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Este trabalho foi publicado, sob o título "As lombadas de Salinas", em A Província do Pará

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