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A fraude à lei do estágio e a flexibilização do Direito do Trabalho

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13/10/2010 às 15:44
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3.O CONTRATO DE O ESTÁGIO E SUA SEMELHANÇA COM A RELAÇÃO DE EMPREGO CELETISTA

Via de regra, a relação de emprego é constituída por seus cinco elementos fático-jurídicos, quais sejam: prestação por pessoa física ao tomador; pessoalidade na realização das atividades laborativas; realização das atividades de maneira não-eventual; realização das atividades laborativas sob subordinação ao tomador de serviços e prestação dos serviços de forma onerosa.

No entanto, existem relações de emprego que muito se assemelham a relação empregatícia dos trabalhadores regidos pelo regime celetista, mas, na verdade não se enquadram nesse regime jurídico. É a relação de emprego lato sensu, ou seja, em sentido amplo.

A respeito das relações de emprego lato sensu, afirma DELGADO, 2009, p. 299, que elas: "[...] são mais ou menos próximas da relação empregatícia; todos os trabalhadores lato sensu tangenciam a figura jurídica do empregado".

É o que ocorre claramente no objeto desse estudo, o estágio. O estágio, desde que observado todos os ditames legais para sua consecução, nada mais é do que uma relação de emprego lato sensu, pois, do contrário, ficaria caracterizada a relação de emprego prevista na CLT.

Dentre as diferentes espécies de relação de trabalho lato sensu existentes [01], a relação de estágio, em sua modalidade remunerada é a que mais se aproxima da relação de emprego do regime celetista.

Desde que obedecidos os requisitos formais exigidos pela legislação específica do estágio, não há relação de emprego com o tomador de serviços.

No entanto, optou o legislador por não tipificar o estagiário como trabalhador regido pela CLT, de acordo com o que dispõe o art. 3º da Lei 11.788/08, in verbis: "Art. 3º. O estágio, tanto na hipótese do § 1º do art. 2º desta Lei quanto na prevista no §2º do mesmo dispositivo, não cria vínculo empregatício de qualquer natureza [...]"

A respeito da relação de emprego lato sensu havida entre estagiário e tomador de serviços, DELGADO, 2009, p. 300, afirma que: "[...] não obstante o estagiário possa reunir, concretamente, todos os cinco pressupostos da relação empregatícia (caso o estágio seja remunerado), a relação jurídica que o prende ao tomador de serviços não é, legalmente, considerada empregatícia, em virtude dos objetivos educacionais do pacto instituído.

A seguir, abordam-se as principais características do contrato de estágio, sua evolução histórica, bem como as essenciais mudanças decorrentes da revogação da Lei 6.494/77 pela Lei 11.788/08, que dispõe sobre as novas regras na contratação de estagiários a serem seguidas pelos tomadores de serviços.


4.ASPECTOS GERAIS DA LEI DE ESTÁGIO

Agora, adentra-se no mérito do estudo, onde se abordará o histórico da legislação do estágio no ordenamento nacional, sua finalidade, os requisitos para que essa especial relação de emprego se perfaça na forma da lei e, por fim, apresentam-se os principais direitos conquistados pelos estudantes-obreiros e as obrigações a serem seguidas com o advento da Lei 11.788/08.

4.1 Breve histórico da legislação do estágio no ordenamento Nacional

A legislação do estágio de estudantes no Brasil sofreu uma série de evoluções legislativas em sua história. O termo estágio surgiu de forma singela Lei Orgânica do Ensino Industrial [02], que de acordo com o capítulo IX, intitulado DOS ESTÁGIOS E DAS EXCURSÕES, em seu artigo 47 estabeleceu:

Art. 47 Consistirá o estágio em um período de trabalho, realizado por aluno, sob o controle da competente autoridade docente, em estabelecimento industrial.

Parágrafo único. Articular-se-á a direção dos estabelecimentos de ensino com os estabelecimentos industriais cujo trabalho se relacione com os seus cursos, para o fim de assegurar aos alunos a possibilidade de realizar estágios, sejam estes ou não obrigatórios. (BRASIL, 1942)

A Lei Orgânica do Ensino Industrial, mesmo que timidamente determinou como se daria o estágio no âmbito da indústria, além de estabelecer sua finalidade didático-pedagógica, dando oportunidade ao educando de atrelar o conhecimento teórico ao prático.

Um quarto de século depois surgiu a Portaria n.º 1.002, data de 29 de setembro de 1967, baixada pelo então Ministro de Estado dos Negócios do Trabalho e Previdência Social, Jarbas Passarinho.

Naquele ato normativo, institui-se a figura do estágio nas empresas, tanto de nível superior, quanto de escolas técnicas em nível colegial, conforme artigo 1º da Portaria. O contrato pactuado entre a instituição de ensino e o educando, deveria conter as seguintes cláusulas, de acordo com o artigo 2º da portaria em estudo:

Art. 2º - As empresas poderão admitir estagiários em suas dependências, segundo condições acordadas com as Faculdades ou Escolas Técnicas, e fixadas em contratos-padrão de Bolsa de Complementação Educacional, dos quais obrigatoriamente constarão.

a) a duração e o objeto da bolsa que deverão coincidir com programas estabelecidos pelas Faculdades ou Escolas Técnicas;

b) o valor da bolsa, oferecida pela empresa;

c) a obrigação da empresa de fazer, para os bolsistas, seguro de acidentes pessoais ocorridos no local de estágio;

d) o horário do estágio;

Ademais, o artigo 3º dispunha que o estágio não gerava vínculo empregatício com a empresa, incumbindo a estas, tão-somente o pagamento da bolsa, durante o período do estágio.

Esse artigo da portaria gerou certa polêmica a época em que foi criada. Nesse sentido, afirma NASCIMENTO, 2008, p. 487, que "[...] muito discutida por aqueles que sustentaram que uma Portaria não teria competência para criar direitos e obrigações novas, o que normalmente deveria resultar do texto de uma lei [...]".

Por fim, o artigo quinto da portaria fixou o prazo de duração do contrato de estágio, que não poderia ser superior ao que havia sido pactuado entre as partes. [03]

Em 11 de maio de 1970, foi criado o Decreto n.º 66.546, que Institui a Coordenação do Projeto Integração, destinada à implementação de programa de estágios práticos para estudantes do sistema de ensino superior de áreas prioritárias.

As denominadas áreas prioritárias foram determinadas no artigo primeiro do supramencionado decreto e compreendem: engenharia, tecnologia, economia e administração. Os acadêmicos poderiam colocar em prática seus conhecimentos nos órgãos e entidades públicos e privados, exercendo atividades atinentes à sua área específica. [04]

O Decreto também determinou a concessão de bolsa aos estagiários, bem como declarou que o estágio não gerava vínculo empregatício.

Em 1971, foi criada a Lei n.º 5.692, que fixou as diretrizes e bases para o ensino de 1º e 2º graus. No entanto, essa legislação foi revogada pela Lei n.º 9.394 de 20.12.96.

No ano seguinte, em 1972, o governo instituiu, em todo o país, o programa Bolsa de Trabalho, onde os estudantes poderiam exercer atividades nas empresas ou nas entidades públicas, por meio do Decreto nº 69.927.

O Decreto n.º 75.778/75 criou as normas referentes ao estágio no serviço público Federal.

Somente no ano de 1977 foi definitivamente criada à figura do estagiário, com o advento da Lei número 6.494 de sete de dezembro. Essa lei foi regulamentada pelo Decreto nº 87.497, de 18 de agosto de 1982.

O mencionado decreto conceituou estágio como sendo: Art. 2º. [...] as atividades de aprendizagem social, profissional e cultural, proporcionadas ao estudante pela participação em situações reais de vida e trabalho de seu meio, sendo realizada na comunidade em geral ou junto a pessoas jurídicas de direito público ou privado, sob responsabilidade e coordenação da instituição de ensino.

Cerca de dezessete anos depois da edição da primeira lei de estágio, a Lei n.º 6.494/77 foram alterados, com a nova redação dada aos artigos 1º, parágrafos 1º e 2º e artigo 3º pela Lei n.º 8.859 de 23 de março de 1994.

Quatorze anos após a alteração pela supramencionada lei, surgiu a Lei n.º 11.788 de 25 de Setembro de 2008 [05], que revogou o estatuto anterior, passando a dispor sobre as novas diretrizes a serem seguidas pelas empresas na contratação de estudantes que frequentam os anos finais do ensino fundamental, na modalidade profissional da educação de jovens e adultos ensino médio, educação especial, profissional e superior. [06]

4.2 A finalidade da relação de estágio

Como foi analisado no capítulo anterior, o estágio, quando é prestado pelo estudante-obreiro de forma onerosa é a figura que mais se aproxima da relação de emprego celetista.

Nesse sentido, nos ensina DELGADO que:

Repita-se que o estagiário traduz-se em um dos tipos de trabalhadores que mais se aproximam da figura jurídica do empregado – sem que a legislação autorize, porém, sua tipificação como tal. De fato, no estágio remunerado, esse trabalhador intelectual reúne, no contexto concreto de sua relação com o concedente do estágio, todos os elementos fático-jurídicos da relação empregatícia (trabalho por pessoa física, com pessoalidade, não-eventualidade, onerosidade e sob subordinação ao tomador de serviços). Não obstante, a ordem jurídica, avaliando e sopesando a causa e objetivos pedagógicos e educacionais inerentes á relação de estágio – do ponto de vista do prestador de serviços -, nega caráter empregatício ao vínculo formado. Essa negativa legal decorre, certamente, de razões metajurídicas, ou seja, trata-se de artifício adotado com o objetivo de efetivamente alargar as perspectivas de concessão de estágio no mercado de trabalho. (DELGADO, 2009, p. 301)

O estágio tem por objetivo preparar o estudante-obreiro para a realidade do mercado de trabalho, além de garantir que este goze plenamente de seus direitos políticos e civis.

Sobre a importância do estágio na formação do estudante-obreiro, NASCIMENTO afirma que:

É fundamental o estágio para o desenvolvimento econômico-cultural de um país, principalmente a um país emergente como o Brasil, que envida todos os esforços possíveis para dar um salto de qualidade que tem como ponto de partida a sua preocupação com a educação, voltada esta para a efetiva utilidade profissional, que pressupõe não apenas o conhecimento teórico, mas o domínio das exigências que resultam da realidade do exercício das profissões. (NASCIMENTO, 2008, p. 487)

Desde que o empregador dê condições para que o estagiário obtenha experiência prática em sua área de formação, a relação de estágio atenderá à sua real finalidade, qual seja, a de preparar o estudante-obreiro para o mercado de trabalho.

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4.3 Requisitos formais da relação de estágio

Para que se concretize a relação de estágio é preciso que certos requisitos estejam presentes. São os requisitos formais e materiais, que sem os quais não há que se falar na relação de emprego lato sensu, que é o contrato de estágio.

Os requisitos formais na lei de estágio são os seguintes: a qualificação das partes; formação de termo de compromisso com o estagiário e o tomador de serviços; acompanhamento do estagiário por professor ou por supervisor da parte concedente do estágio e, por fim, a observância das regras impostas pela nova lei do estágio.

O primeiro requisito é a qualificação das partes celebrantes do contrato de estágio, ou seja, a empresa concedente do estágio, o estudante-obreiro e a instituição de ensino. Vê-se, portanto, que a relação de estágio ocorre de forma trilateral.

A lei determinou como sendo parte concedente as seguintes pessoas, de acordo com a redação do artigo 9º:

As pessoas jurídicas de direito privado e os órgãos da administração pública direta, autárquica e fundacional de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, bem como profissionais liberais de nível superior devidamente registrados em seus respectivos conselhos de fiscalização profissional, podem oferecer estágio [...] (BRASIL, 2008)

Grande avanço trazido pela nova lei foi à inclusão dos profissionais liberais no rol de pessoas que podem conceder estágio aos estudantes, o que não ocorria na redação revogada de 1977.

Sobre a importância da realização de estágio com profissionais liberais, agora inclusos no rol do artigo em estudo, VASCONCELLOS aponta: "[...] o estágio com profissionais renomados em suas áreas de atuação sempre foi bastante cobiçado, por sua importância para a formação do estudante. [...]" (VASCONCELLOS. A nova lei do estágio estudantil. Breve análise, 2009.)

As obrigações a serem adimplidas pela parte concedente estão previstas nos incisos de I a VII do art. 9º. [07]

Quanto ao estudante-obreiro, é aquele que frequenta o ensino regular em instituições de educação superior, de educação profissional, de ensino médio, da educação especial e dos anos finais do ensino fundamental, na modalidade profissional da educação de jovens e adultos, de acordo com a redação do art. 1º, caput.

É mister ressaltar que para que o estágio cumpra sua finalidade didático-pedagógica faz-se necessário que e o estudante-trabalhador esteja regularmente matriculados em algum dos cursos mencionados no caput do artigo 3º da Lei. [08]

A respeito da concessão de estagiários estudantes do ensino médio e dos anos finais do ensino fundamental, críticas hão de ser feitas. Os estudantes, por força de disposição constitucional, deverão ter pelo menos a idade de 16 anos para que seja celebrado o contrato especial de estágio. [09] A contração desses estudantes como mão de obra barata caracteriza a fraude à lei.

Nesse sentido, DELGADO, 2009, p. 308, assegura que: "[...] por outro lado, a inserção desse tipo de estudante com formação escolar ainda incipiente e não profissionalizante no ambiente laborativo, pode, na prática, deixar de atender á natureza e objetivos da própria Lei do Estágio, não preenchendo os requisitos materiais desse contrato educativo especial".

E complementa:

Portanto, jamais o contrato de estágio pode ser compreendido como mero instrumento de arregimentação de mão-de-obra barata para entidades públicas e privadas; ele há de corresponder sempre a um ato educativo escolar supervisionado. Esta relação jurídica especial tem de fazer parte do projeto pedagógico do curso, integrando o itinerário formativo do educando (§ 1º do art. 1º da Lei n. 11.788/08); ela se deflagra e se realiza com vistas ao aprendizado de competências próprias da atividade profissional e à contextualização curricular, objetivando o desenvolvimento do educando para a vida cidadã e para o trabalho (art. 1º, §§ 1º e 2º, da Lei n. 11.788/08) (DELGADO, 2009, p.308-309)

A última parte da relação trilateral existente no contrato de estágio é a instituição de ensino a qual o estagiário se vincula.

A instituição de ensino, na legislação revogada, não passava de um mero interveniente da relação havida entre a concedente do estágio e o estudante-obreiro. Com o advento da nova lei, a instituição de ensino muda de figura, passando a ter grande relevância.

O estágio é um ato educativo escolar supervisionado além de integrar o itinerário formativo do educando. [10] Essa característica está presente nos dois tipos de estágios elencados na lei, o obrigatório e no não-obrigatório.

O segundo requisito formal é a formação do termo de compromisso, documento pactuado entre o estudante-obreiro e a parte concedente do estágio, nos moldes do que dispõe o art. 3º, II.

Sobre as condições a serem fixadas no termo de compromisso, DELGADO relata que:

Neste importante documento serão fixadas as condições de adequação do estágio à proposta pedagógica do curso, á etapa e modalidade da formação escolar do estudante e ao horário e calendário escolar (art. 7º, I). Será incorporado ao termo de compromisso o plano de atividade do estagiário, por meio de aditivos à medida que for avaliado, progressivamente, o desempenho do estudante (parágrafo único do art. 7º) (DELGADO, 2009, p. 309)

Todas as entidades que realizarem a contratação de estagiários, de acordo com a nova lei, deverão celebrar esse termo de compromisso tripartite, por força do que dispõe o parágrafo único do art. 8º. [11]

O requisito do acompanhamento do estagiário por professor ou por supervisor da parte concedente do estágio será comprovado mediante a entrega dos relatórios de atividades do estudante-obreiro, apresentados em prazo não inferior a um semestre e por menção de aprovação final, de acordo com os arts. 3º, § 1º e art. 7º, IV, respectivamente.

Sobre confusão deste requisito formal com o material, novamente o relato de DELGADO afirmando que: "Este elemento, embora se confunda com um dos requisitos materiais do estágio, ganhou contornos também formais na matriz da nova lei regulamentadora, em face da necessária designação tanto do professor orientador pela instituição de ensino, como de supervisor de estágio pela parte concedente". (DELGADO, 2009, p. 310)

O último dos requisitos formais da relação de estágio é a observância das regras impostas pela Lei do Estágio, que será analisado no item infra.

4.4 Requisitos materiais da relação de estágio

Os requisitos materiais para a concretização do estágio estão previstos no artigo primeiro e parágrafos da Lei sob comento. [12]

Por seu turno, os requisitos materiais do estágio, no entendimento de DELGADO, 2009, p. 311: "Estes requisitos visam assegurar, como visto, o efetivo cumprimento dos fins sociais (de natureza educacional, enfatiza-se) do contrato de estágio, ou seja, a realização pelo estudante de atividades de verdadeira aprendizagem social, profissional, cultural, proporcionadas pela sua participação em situações concretas de vida e trabalho de seu meio".

O caráter didático-pedagógico norteia essa modalidade de relação de emprego lato sensu.

A nova Lei do estágio possuiu os mesmos requisitos materiais da legislação anterior revogada, a Lei n.º 6.494/77.

Foram definidas duas modalidades de estágio na nova lei, o obrigatório [13] e o não obrigatório [14].

Um dos primeiro requisitos matérias da relação de estágio é que esta deve, obviamente, garantir ao estudante-trabalhador condições para que este efetivamente obtenha experiência prática em sua área de formação acadêmica. Tal determinação decorre da própria redação dada ao artigo 9º, inciso II da lei sob comento [15]. Do contrário, se não desse condições de experiência prática ao estagiário, estaria desnaturado o contrato.

O segundo requisito se refere à compatibilidade das atividades do estagiário com o currículo escolar.

Nesse sentido, mais uma vez leciona DELGADO, 2009, p. 312, dizendo que: "Em segundo plano, que haja real harmonia e compatibilização entre as funções exercidas no estágio e a formação educativa e profissional do estudante em sua escola, observado o respectivo currículo escolar".

O terceiro requisito material da relação de estágio é que esta deva ocorrer com a supervisão pelo tomador de serviços do estagiário, com o intuito de transmitir ao estudante obreiro os conhecimentos profissionais de sua área de atuação. O artigo 3º, § 1º [16] e o 9º, inciso III corroboram para esse pensamento. [17]

Além da supervisão, a lei determinou a elaboração de relatório das atividades de maneira semestral para a instituição de ensino a qual o estudante-obreiro esteja vinculada, por força do que dispõe o inciso VII do art. 9º. Além do relatório de atividades desenvolvidas pelo estagiário, a lei determinou que quando do desligamento deste, entregasse relatório das atividades desenvolvidas. É o que dispõe o inciso V do artigo 9º, abaixo transcrito: "V – por ocasião do desligamento do estagiário, entregar termo de realização do estágio com indicação resumida das atividades desenvolvidas, dos períodos e da avaliação de desempenho;" [...] (BRASIL, 2008)

Os relatórios de atividades do estagiário, também deverão ser entregues à instituição de ensino a que estiver vinculada, se esta o exigir, em lapso temporal não menor que seis meses, por força do que dispõe o art. 7º, IV, devidamente assinado pelo supervisor do estágio e do respectivo professor orientador, conforme dispõe o § 1º do art. 3º da Lei.

O último requisito material, que, de acordo com DELGADO, 2009, p. 312: "é que o estágio proporcione ao estudante efetiva complementação do ensino e aprendizagem, em consonância com os currículos, programas e calendários escolares".

Demonstrados os requisitos imprescindíveis para a realização correta desse contrato especial de trabalho, passa-se a apresentar os direitos dos estagiários e as obrigações parte concedente previstas na lei sob comento, a seguir.

4.5 Direitos e obrigações presentes na lei do estágio

A nova lei inovou em diversos aspectos que a então revogada Lei 6.949 de 7 de dezembro de 1977 não trazia em sua redação.

Os direitos dos estagiários trazidos pela nova lei estão disciplinados nos artigos 10 a 14.

O artigo 10 estipulou as regras referentes à duração da jornada de trabalho dos estudantes-obreiros. As horas de atividade no estágio serão definidas pelas partes envolvidas na relação de estágio, isto é, a instituição de ensino, o estagiário ou seu representante legal e o tomador de serviços.

O termo de compromisso celebrado entre as partes deverá determinar essas condições e ser compatível com as atividades escolares desenvolvidas pelo estudante obreiro.

Nesse mesmo artigo, estabeleceram-se as seguintes jornadas para os estudantes nos diversos níveis:

Art. 10 [...]

I – 4 (quatro) horas diárias e 20 (vinte) horas semanais, no caso de estudantes de educação especial e dos anos finais do ensino fundamental, na modalidade profissional de educação de jovens e adultos; 

II – 6 (seis) horas diárias e 30 (trinta) horas semanais, no caso de estudantes do ensino superior, da educação profissional de nível médio e do ensino médio regular.

[...] (BRASIL, 2008)

Entretanto, excepcionou a lei o limite de jornada nos casos de cursos que alternam teoria e prática, nos períodos em que não estão programadas aulas presenciais, podendo o estudante-obreiro, ter jornada de até 40 (quarenta) horas, desde que assim o preveja o projeto pedagógico do curso e da instituição de ensino a qual o estagiário esteja matriculado. [18]

Novo direito inserido na lei em comento é o referente á redução da carga horária do estágio à metade quando o estudante estiver realizando avaliações junto á instituição de ensino a qual frequenta, com o fito de garantir o bom desempenho do aluno, em conformidade com o estipulado entre as partes no termo de compromisso (conforme parágrafo 2º do art. 10). Ou seja, na semana em que o estudante estiver realizando suas avaliações, terá a oportunidade de revisar seus estudos e obter melhor desempenho nos exames que fará. No caso de estudantes do ensino fundamental, na modalidade de educação especial e de jovens e adultos, a jornada será reduzida a duas horas diárias. Sendo estudante de ensino superior, educação profissional de nível médio e do ensino médio regular a jornada diária será reduzida a três horas diárias.

Quanto à duração da relação de estágio, o legislador optou por determinar a duração máxima de dois anos. No entanto, tal prazo poderá ser prolongado, em se tratando de estudante portador de deficiência, tudo conforme dispõe o art. 11 [19].

A respeito do artigo em comento, a crítica de VERGUEIRO:

[...] merece crítica o artigo 11 da Lei, porque limita a dois anos o prazo máximo de duração do estágio na mesma entidade ou parte concedente, abrindo-se uma exceção para prazo superior quando o estagiário for portador de alguma deficiência.

[...] Nesse particular, o governo foi de uma infelicidade ímpar porque a prorrogação do contrato de estágio deveria ficar submetida ao princípio da autonomia das partes e não á vontade da lei. (VERGUEIRO, 2008, p. 41)

Outra mudança de grande relevância trazida pela lei foi à obrigatoriedade de concessão de bolsa ou outra contraprestação ao estudante-obreiro [20] que realizar o estágio em sua modalidade remunerada, bem como lhe fornecer o auxílio-transporte para sua locomoção, quando se estiver tratando de estágio não-obrigatório. [21]

Por sua vez, o art. 13 determina:

Art. 13.  É assegurado ao estagiário, sempre que o estágio tenha duração igual ou superior a 1 (um) ano, período de recesso de 30 (trinta) dias, a ser gozado preferencialmente durante suas férias escolares. 

§ 1º  O recesso de que trata este artigodeverá ser remunerado quando o estagiário receber bolsa ou outra forma de contraprestação.

§ 2º  Os dias de recesso previstos neste artigo serão concedidos de maneira proporcional, nos casos de o estágio ter duração inferior a 1 (um) ano. (BRASIL, 2008)

A partir da vigência da nova lei de estágio, os estagiários passaram a usufruir de recesso (e não de férias, que somente são gozadas por empregados celetistas), que será gozado, preferencialmente no período em que as atividades estudantis estiverem em recesso.

A época da concessão do recesso, o estagiário deverá receber sua remuneração ou outra forma de contraprestação, de acordo com o parágrafo primeiro do artigo em estudo.

Caso o estagiário não tenha completado o período de um ano no estágio, o recesso ser-lhe-á concedido de forma proporcional.

Ainda, determina o artigo 14 que será aplicada ao estagiário a legislação relacionada à saúde e segurança do trabalho, sendo sua implementação de responsabilidade da parte concedente do estágio.

Adentrando agora as obrigações determinadas em lei que devem ser observadas pelos tomadores de serviços, fazem-se os seguintes apontamentos.

Para que não se verificasse uma contratação desmedida de estagiários pelas empresas concedentes, o legislador delimitou a quantidade de estagiários que poderiam ser contratados, de acordo com o aporte da empresa.

A proporção de estagiários numa empresa está disposta nos incisos de número I a IV do art. 17.

Se a empresa tiver de um a cinco empregados, poderá ter um estagiário (inciso I); se de seis a dez estagiários, até dois (inciso II); se de 11 a 25 empregados, até cinco estagiários (inciso III) e, por fim, se a empresa tiver mais de 25 empregados, até o percentual de 20 estagiários.

O legislador, não deixou tutelar pelos portadores de necessidades especiais. A partir da vigência da nova lei, as empresas devem garantir aos portadores de deficiência o percentual de dez por cento das vagas ofertadas, conforme o parágrafo quinto do artigo 17.

Indubitavelmente, a nova legislação do estágio trouxe grandes inovações que inexistiam com a anterior lei revogada, vindo a ampliar a gama de direitos que amparam o estudante-obreiro nos novos contratos de estágio que são celebrados sobre o pálio da nova lei.

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Sobre o autor
Luigi Capone

Advogado pós-graduado em Direito e Processo do Trabalho

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

CAPONE, Luigi. A fraude à lei do estágio e a flexibilização do Direito do Trabalho. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 15, n. 2660, 13 out. 2010. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/17608. Acesso em: 23 abr. 2024.

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