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A inoponibilidade das exceções pessoais e os títulos de crédito

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APONTAMENTOS FINAIS

Pensar na inoponibilidade das exceções é pensar, a um só tempo, na circulação dos títulos de crédito. Diz-se isto porque, sem qualquer dúvida, o poder circulante do título de crédito restaria mitigado caso este não gozasse de presunção de liquidez, certeza e exigibilidade. Ser título de crédito, então, é mais que ser um título executivo extrajudicial. É ser um título executivo extrajudicial, sim, sem dúvida, mas é ser um título executivo extrajudicial que goza do poder de negocialidade. Um poder que demanda, para se efetivar, outra presunção: a presunção de inoponibilidade.

No início dos tempos, em épocas remotas, não se falava em título de crédito. Não faz sentido, por certo, se falar em título de crédito quando não se tem riqueza para circular. Estes títulos surgem, então, da necessidade de circulação de bens e riquezas quando o escambo não mais atende à dinâmica social.

Parece lógico que os títulos de crédito surjam como meio de fomento da circulação de riquezas. Como se quer que esta circulação se mantenha, a instrumentalização jurídica passa a ser demandada. Nesta linha, os títulos de crédito vão assumindo presunções ao longo da história, chegando ao momento atual, em que são títulos executivos extrajudiciais a gozar de um diferencial: negocialidade.

Como os títulos de crédito são negociáveis, é muito provável que eles não se mantenham na mão do portador originário. Este portador, que estabeleceu a relação jurídica de base com o emitente, pode se valer da negocialidade (em uma relação de desconto bancário, por exemplo) e passar o título para um terceiro. É por isto que se diz que o terceiro, estranho a relação de base, nada tem a ver com as relações pessoais que porventura tenham sido estabelecidas.

Como o terceiro nada tem a ver, em regra, com o que fora estabelecido no âmbito do direito material, qualquer vício de vontade ou consentimento não o atinge. Sua boa-fé, e as presunções que marcam os títulos de crédito, nos levam a intuir que ele fica blindado quanto a qualquer abuso. Por outro lado, caso reste provada a má-fé deste terceiro, passa a fazer sentido se falar no regime da objeção e da exceção.

Exceção e objeção, conquanto vulgarmente confundidas, são institutos distintos. A exceção se volta para a alegação de questões em que a pessoalidade é a marca. Portanto, liga-se mormente a vícios, vontades e consentimentos. Em outra medida, a objeção se volta para o combate ao desrespeito de uma ordem pública, como o combate à fraude. Sendo assim, o regime da objeção se faz maior e traz consigo um regramento, previsto na doutrina, mas ainda ignorado por nossa legislação: a objeção de não-executividade.

A objeção de não-executividade, nominada por Pontes de Miranda de exceção de pré-executividade, é um mecanismo com o qual se oferta a resposta no procedimento executivo calcado em título extrajudicial sem que para tanto se garanta o juízo, isto é, nomeiem-se bens à penhora.

O que se quer com a objeção em tela é ofertar uma resposta que contemple matéria de ordem pública. Esta possibilidade exsurge nos casos em que não apenas o réu-executado é atingido, mas também toda a coletividade, já que expedientes escusos estariam sendo usados para a fabricação de direitos.

A objeção de não-executividade é salutar porque permite o que se quer ao final: a preservação da boa-fé. A boa-fé, sem dúvida, deve ser preservada. Faz todo o sentido, portanto, que os títulos de crédito gozem da presunção de liquidez, certeza, exigibilidade e, com tudo isto, sejam negociáveis. Assim, títulos emitidos pelo próprio réu sem vícios de consentimento devem ser honrados. Devem ser honrados antes do procedimento judicial, mas, caso este se faça necessário, todo o sistema deve ser chamado a depor para que se expurgue tentativas de burlas e ganho de tempo com medidas procrastinatórias.


REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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REQUIÃO, Rubens. Cambial: invalidade da lei que exige seu registro. Revista de Direito Mercantil, Industrial, Econômico e Financeiro. Rio de Janeiro, v.1, p. 13-20, 1970.

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Notas

  1. Robert Alexy. Apud. ROTHENBURG, Walter Claudius. Princípios constitucionais. Porto Alegre: Sérgio Antônio Fabris Editor, 1999, p 16.
  2. "Um documento necessário para o exercício do direito literal e autônomo nele mencionado. Diz-se que o direito contido no título (a) é literal, porquanto ele existe segundo o teor do documento: (b) é autônomo, porque a posse de boa-fé enseja um direito próprio, que não pode ser limitado ou destruído pelas relações existentes entre os precedentes possuidores e o devedor: (c) é um documento necessário para exercitar o direito, porque enquanto o título existe, o credor deve exibí-lo para exercitar todos os direitos seja ele principal, seja acessório, que ele porta consigo e não se pode fazer qualquer mudança na posse do título sem anotá-la sobre o mesmo. Esse é o conceito jurídico, preciso e limitado, que se deve substituir à frase vulgar pela qual se consigna que o direito está incorporado ao título." Cf.: VIVANTE, Cesare. Instituições de direito comercial. Trad.: Ricardo Rodrigues Gama. Campinas: LZN, 2003. (destacou-se)
  3. BARCELOS, José Claudio Leão. Títulos de crédito e seus princípios. São Paulo: Direito Net. Disponível em: <www.direitonet.com.br/artigos/x/39/16/3916/> Acesso: 25 agosto 2010.
  4. Mecanismos como a objeção de não-executividade precisam ser observados a partir do contexto excepcional em que foram cunhados. Não é porque Pontes de Miranda falou de exceção de pré-executividade que devemos aceitar a ampliação das matérias de defesa quando se pretende a execução fundada em título executivo extrajudicial. O mecanismo é válido e legítimo, tendo sido uma saída jurídica brilhante que permitiu à Mannesman se defender de execuções fraudulentas, mas não deve perder seu caráter excepcional. Enquanto assim for, os embargos devem ser ofertados tal como preleciona o Código de Processo Civil, com a prévia garantia do juízo.
  5. Pontes de Miranda, conforme Bernardo Dib, foi o primeiro jurista a traçar os contornos deste meio de defesa. Em parecer que ofertou em julho de 1966 a um caso envolvendo a Companhia Siderúrgica Mannesman, assolada por várias execuções em São Paulo, Rio de Janeiro e Belo Horizonte, além de pedidos de falência, apontou que a comprovação de falsas assinaturas nos títulos reclamados era motivo mais que suficiente para que a empresa pudesse ofertar resposta sem a necessidade de se garantir previamente o juízo. Sua alegação apontava para um regime excepcional: a execução conflita com interesses gerais, exigindo do juiz se preocupar também com a "segurança intrínseca", e não apenas com a "segurança extrínseca". DIB, Bernardo Sebastião Cheir. Exceção de Pré-Executividade. São Paulo: Sob Júdice. Disponível em: <www.subjudice.hpg.com.br/art5.htm> Acesso: 26 agosto 2010.

  6. Navarrini. apud LUCCA, Newton de. Aspectos da Teoria Geral dos Títulos de Crédito. São Paulo: Pioneira, 1979, p. 18.
  7. Os ensinamentos de Paulo da Silva Pinto são interessantes para o assunto em pauta: "forte argumento no sentido de se reconhecer a literalidade no sistema anglo-americano é a existência da parol evidence rule, prevista em common law. De acordo com esta regra, não se admite prova testemunhal para contrariar ou modificar o teor de um documento em que se contenham os termos de um contrato. Há uma preferência absoluta em favor da prova documental. Diante dessa desaparece a possibilidade de recurso à prova testemunhal, sempre passível de vícios e incertezas. Como a cambial basta a si mesma, não se admite qualquer prova testemunhal para contrariar os seus termos. PINTO, Paulo José da Silva. Direito Cambiário: Garantia Cambiária e Direito Comparado. Rio de Janeiro: Forense, 1948, p. 57. Apud. LOPES, André Côrtes Vieira. Inoponibilidade das exceções ao terceiro de boa-fé nos títulos cambiais. Teresina: Jus Navigandi. Disponível em: <http://jus.com.br/revista/texto/747>. Acesso: 21 agosto 2010.
  8. De acordo com Ascarelli, o conceito de literalidade não foi bem aprofundado na doutrina brasileira, aliás, não há um único autor que tenha se preocupado com o assunto. Ele explica a literalidade na autonomia da declaração mencionada no título e na função constitutiva em que exerce a sua redação – declaração cartular esta que se verifica submetida exclusivamente à disciplina decorrente das cláusulas constantes no próprio título. É esse o passo mais importante para a compreensão dos títulos de crédito e, conseqüentemente, para o entendimento de seu alcance. ASCARELLI, Tulio. Teoria Geral dos Títulos de Crédito. São Paulo: Saraiva, 1969, p. 56.
  9. WHITAKER, José Maria. Letra de Câmbio. 6. ed. Rio de Janeiro: Revista dos Tribunais, 1985, p. 18.
  10. O dinheiro possui valor no tempo. Esta é uma das grandes, se não a maior, máximas da economia. Desta máxima parece decorrer a lição de Whitaker quando este fala de fungibilidade. Uma possibilidade a partir da qual se aventa as chamadas operações de desconto bancário.
  11. Através do desconto bancário o portador terá em suas mãos o crédito corresponde ao título, já diminuído dos juros cobrados pela operação. Desta forma, caso se antecipe em um mês o recebimento da nota promissória no valor de R$ 10.000,00, e o banco cobre 5% ao mês, o portador receberá R$ 9.500,00.

    Tais operações se justificam porque o título nasce com o objetivo de circular, e não de restar nas mãos das partes primitivas. Ele realiza, pois, verdadeira função econômica. Por isto é um elemento propiciador de circulação rápida e segura de riqueza. Como conseqüência, é um dinamizador da economia, prestando estimável contribuição para a formação e o desenvolvimento das modernas economias de mercado.

  12. Cf.: MARTINS, Fran. Títulos de crédito. 13. ed., vol. I. São Paulo: Forense, 1998.
  13. Cf.: MIRANDA, Pontes de. Tratado de Direito Privado. 2. ed. Rio de Janeiro: Borsoi, 1961.
  14. RT Informa, 1ª quinzena de 12/75, p. 19.
  15. Diz-se abstrato, porque nele se abstrai da causa, não porque a vontade privada o tenha imposto, e sim porque a Lei o quer. É abstrato por força de Lei. Assim, além de direito autônomo, que adquire o possuidor, tem êle direito abstrato, com que a sua posição se fortalece, fazendo-o livre do contágio de quaisquer causas das relações jurídicas em que estiverem os possuidores precedentes. Diante dele está o conteúdo objetivo de uma promessa, e uma Lei, que a faz vinculativa. MIRANDA, Pontes de. Op. cit., p. 9.
  16. A abstração é a regra para todos os títulos cambiários e cambiariformes. Os negócios jurídicos unilaterais que ocorrem são indiferentes ao que esteve à base ou determinação das declarações unilaterais de vontade que se tornaram negócios jurídicos. Não importa se o declarante unilateral de vontade esperava algum proveito, ou se não esperava, se tinha intenção de liberalidade, ou se não tinha. Nem se o declarante manifestou a vontade por existir alguma relação jurídica, ou ter de existir, em que era ou seria sujeito passivo; nem se nenhuma relação jurídica existiu, nem teria de existir em que fôsse ou tivesse de ser sujeito passivo. De tudo isso o título abstrai. Idem., p. 209.
  17. "A cambial deve ser efetivamente apresentada ao devedor para resgate, mesmo quando deixada em branco para cobrança, não se podendo supor renunciado esse direito do devedor, pelo silêncio, quando a falta de pagamento pode acarretar graves consequências, como a rescisão do compromisso, com perda das prestações pagas". SÃO PAULO. Tribunal de Justiça. Embargos n. 92.205. 1º Grupo de Câmaras Cíveis. Deferimento do pedido. Apud. LOPES, André Côrtes Vieira. Op. cit., s.p. (nota 21).
  18. Embora costumeiro as sustações "motivadas" de cheques, esta prática não encontra respaldo na teoria dos títulos de crédito. É comum as pessoas dizerem que sustaram o cheque porque o serviço foi mal prestado ou mesmo não foi prestado. Tais justificativas, conquanto legitimem a ocorrência aos olhos de um leigo, mostram-se divergentes do espírito trazido pelo princípio da autonomia. Tecnicamente, então, o cheque deve ser pago. Caso o serviço tenha sido mal prestado esta ocorrência será a causa de pedir de uma ação em que se pretenda indenização por danos materiais ou, até mesmo, morais.
  19. BORGES, João Eunápio. Títulos de Crédito. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1976, p. 124.
  20. A obrigação, em princípio, tem a sua origem, nos verdadeiros títulos de crédito, em um ato unilateral de vontade de quem se obriga: aquele que assim o faz não subordina sua obrigação a qualquer outra por acaso já existente no título. Daí poder o portador, no momento oportuno, exigir de qualquer obrigado a realização da obrigação por ele assumida, desde que tenha praticado os atos determinados por lei. MARTINS, Fran. Op. cit., p. 20-21.
  21. A necessidade de assegurar a circulação cambiária levou à concepção da autonomia das obrigações cambiárias. Certamente, o título cambiário é unidade, e por vezes o designamos pela expressão ato unitário; mas, coexistente com a aparência do todo, há a aparência dos outros singulares, cujo despregamento resulta do fato mesmo das assinaturas, que são diversas e lançadas em diversos tempos. Seria sem história e, portanto, sem traços do tráfico, título em que, a despeito da multiplicidade das mãos por que andou, recebesse declarações bilaterais de vontade, sem lhes assegurar autonomia. O andar deu-lhe o ser solto, soltura que se reflete, como vimos, na solidariedade cambiária. MIRANDA, Pontes de. Op. cit., p. 119.
  22. A autonomia é principio que se associa à razão teleológica, e por que não dizer axiológica, do título de crédito. Os títulos de crédito surgem no afã de facilitar a livre circulação de riquezas. Portanto, a autonomia é elemento de facilitação da circulação. Como elemento que facilita, deve ser reconhecida. A autonomia, nesta linha, não foi criada em beneficio da livre circulação dos títulos. Em verdade, a autonomia é uma decorrência da necessidade da livre circulação dos títulos.
  23. Cf.: COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de direito comercial. 6. ed. vol. I. São Paulo: Saraiva, 2002.
  24. Cf.: ROSA JÚNIOR, Luiz Emygdio F. da. Títulos de crédito. 2. ed., Renovar, Rio de Janeiro, 2002.
  25. Os títulos ao portador são aqueles em que o nome do beneficiário da prestação não aparece expressamente mencionado, sendo transferíveis por tradição manual, como nos bens móveis. Esse documento justifica sua existência pelo princípio de que quem se obriga pelo título não o faz unicamente com relação àquela pessoa, mas à coletividade; ao universo de pessoas que detém a cambial.
  26. Conceitua-se o endosso como sendo um negócio jurídico unilateral, onde tem o condão de apontar a transmissibilidade do título e ingressar no seu âmbito de validade. Corresponde, pois, o endosso, a uma declaração unilateral e acessória, adquirindo a eficácia relacionada no documento por intermédio do endossante. Analogamente, o endosso se identifica com a projeção de um novo saque, com a transferência de todos os direitos inerentes à cambial e, desta forma, o endossador responde solidariamente pela obrigação assumida, a tal ponto de criar maior garantia em prol do endossatário. TAVARES, Antônio Augusto Gonçalves. Do Endosso. Belo Horizonte: Praetorium. Disponível em: < http://www.praetorium.com.br/?section=artigos&id=37> Acesso: 23 agosto 2010.
  27. Outra forma de endosso é aquela denominada de endosso em preto, completo ou pleno. Surgirá essa figura quando o endossador, ao contrário do que ocorre no endosso em branco, preferir designar na própria cártula o nome da pessoa favorecida (o endossatário). Diante disso, tem-se que o endosso está completo sob o aspecto da circulação do crédito. Em sendo pleno (ou em preto) o endosso poderá ser lançado em qualquer parte do título, pois não há como confundi-lo com outra declaração cambiária em face de sua expressa caracterização. Ibidem.
  28. Há quem entenda que títulos causais são os decorrentes de uma causa determinada, necessariamente referida no título, vinculando-a ao negócio subjacente que lhe deu vida e colocam como exemplo a duplicata mercantil, o que não se tem por incorreto. No entanto, acrescenta Newton de Lucca, o título de crédito somente será causal se a Lei assim o determinar. Não basta, dessa forma, que a causa esteja mencionada no título: faz-se mister que haja previsão em Lei da sua vinculação ao negócio jurídico subjacente.LUCCA, Newton de. Op. cit., p. 117.
  29. Entre os títulos impróprios denominados, estão os bilhetes de passagem, de shows, os tíquetes de refeição etc. Como não concedem ao possuidor direito literal e autônomo, podem ser discutidas, eventualmente, causas não cartulares.
  30. José Xavier Mendonça (MENDONÇA, José Xavier Carvalho de. Tratado de Direito Comercial Brasileiro. 7. ed. Rio de Janeiro: Freitas Bastos, 1963, p. 49.) aponta entre os títulos de crédito propriamente ditos os títulos da dívida pública. Fazemos a referência em razão do conceito que ostenta o professor, referência necessária em todos os livros que abordam o Direito Empresarial em nossos dias. Criticamos a inclusão, contudo, uma vez que os títulos de crédito, na gênese, são criados a partir de um acordo de vontades, daí se falar na inoponibilidade das exceções pessoais. Em relação à dívida ativa, todavia, o título é feito apenas pela Fazenda Pública. Este fato, por si somente, soa estranho. Fica mais complicado, sem qualquer dúvida, quando se leva em consideração que é prática corriqueira entre as fazendas do Brasil a negativa em receber títulos da dívida pública.
  31. A crítica nos pareceu necessária por uma questão de reciprocidade. O título da dívida pública é confeccionado de modo totalmente singular e esbarra na negocialidade quando a própria fazenda se recusa ao recebimento.

  32. Independem de qualquer outro título para o qual existam.
  33. São títulos acessórios aqueles que pressupõem a existência de um outro principal, ao qual se agrega; têm como conteúdo um direito acessório dependente de um outro direito, em conexão com o título principal e, como exemplo tradicional, o cupom de cautela de ações da sociedade anônima.
  34. Nos títulos individuais ou singulares, revela-se a existência de um único negócio à emissão do título.
  35. Nos títulos seriados, ou em massa, uma única operação, ou várias delas, todas iguais, correspondem à emissão de vários títulos que se distinguem pela numeração que neles está mencionada.
  36. Aqueles que outorgam ao seu portador um único direito (cambial).
  37. É a denominação atribuída aos títulos dos quais derivam vários direitos, verbis gratia, as ações de sociedades anônimas (que concedem direito de voto, direito aos dividendos da sociedade).
  38. Bastam por si mesmos, pois a relação entre portador e emitente está, na totalidade, mencionada no documento cartular; inconcebível desse modo a referência a elementos extracartulares. Os referidos títulos têm o conteúdo determinado pela Lei, de que são exemplos a nota promissória, a letra de câmbio, o cheque.
  39. Não se bastam de per si: é necessário, sempre, que se busque a sua integração a outros papéis, ou seja, que se recorra a outros documentos para que se possa completar a compreensão dos direitos a ele relativos. A ação é novamente aludida como exemplo; eis que as relações entre a sociedade e o proprietário do título concebem-se do estabelecido nos Estatutos sociais, referidos no próprio documento de crédito.
  40. São aqueles emitidos por pessoas jurídicas de direito público: União, Estados, Distrito Federal e Municipíos e as suas respectivas autarquias (Decreto-Lei 6.016, de 22/11/43).
  41. São os emitidos por pessoas privadas, naturais ou jurídicas, civis ou comerciais, inclusive as sociedades de economia mista que, como é de todos sabido, são entidades de direito privado subordinadas à Lei de sociedade por ações.
  42. São títulos cuja posse do titular é sempre imprescindível para o exercício do direito.
  43. São aqueles títulos cuja posse somente é necessária para a transferência do direito e, não, para o seu exercício.
  44. Cf.: REQUIÃO, Rubens. Cambial: invalidade da lei que exige seu registro. Revista de Direito Mercantil, Industrial, Econômico e Financeiro. Rio de Janeiro, v.1, p. 13-20, 1970.
  45. Como aponta o prefácio de Cultura das transgressões no Brasil, obra escrita por grandes intelectuais brasileiros, a transgressão é um fenômeno que se instalou no Brasil. As leis existem para serem respeitadas e seguidas, mas devido a vários fatores, entre eles a impunidade e a informalidade, transgredir deixou de ser uma atitude incomum e passou a ser um hábito. A cultura das transgressões passou a fazer parte do dia-a-dia de muitas pessoas, nas mais diversas camadas da sociedade. Sendo assim, o livro traz as idéias e sugestões dos pensadores para acabar com essa cultura e trazer de volta a boa prática de agir com ética. MONTORO FILHO, André Franco; LAMOUNIER, Bolívar; CARDOSO, Fernando Henrique; Falcão, Joaquim; CARVALHO, José Murilo de; MOREIRA, Marcílio Marques; e, DAMATTA, Roberto. Cultura das transgressões no Brasil. Lições da história. São Paulo: Saraiva, 2008.
  46. O direito pessoal compreende todas as alegações que o réu pode opor à pessoa do autor, seja com relação aos requisitos gerais de direitos necessários ao nascimento das obrigações, seja os atinentes à sua validade e efeitos como à sua extinção. A alegação apresenta um cunho pessoal entre as partes, estranho ao direito cambiário. Refere-se a qualquer fato modificador ou extintivo e compete somente a certo réu contra certo autor. Com isso não se está negando o direito literal e autônomo que o autor possui em virtude do título de crédito, apenas se está contrapondo-o com o direito extracambial que contra ele tenha o réu.
  47. O portador de boa-fé está incólume a qualquer objeção ou exceção concernente às transgressões do negócio jurídico extracambiário. O título cambiário é abstrato. MIRANDA, Pontes de. Op. cit., p. 188.
  48. BORGES, João Eunápio. Op. cit., p. 127
  49. ROSA JÚNIOR, Luiz Emygdio Franco da. Letra de Câmbio e Nota Promissória: Direito Cambiário I. Rio de Janeiro: Freitas Bastos, 1984, p. 434.
  50. REQUIÃO, Rubens. Op. cit., p. 304.
  51. Nesse contexto, esclarece REQUIÃO: "a vontade do devedor já não importa para tal efeito obrigacional. O título é que o produz. É o título que cria a dívida. A única condição que se impõe a sua eficácia é a posse pelo primeiro portador, qualquer que seja ela." REQUIÃO, Rubens. Curso de direito comercial. 23. ed, vol. II. São Paulo: Saraiva, 2003, p. 363.
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Sobre os autores
Alessandro Marques de Siqueira

Mestrando em Direito Constitucional pela UNESA. Professor da Escola de Administração Judiciária do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro. Professor convidado da Pós-Graduação na Universidade Cândido Mendes em parceria com a Escola Superior de Advocacia da OAB/RJ na cidade de Petrópolis. Associado ao CONPEDI - Conselho Nacional de Pesquisa e Pós-Graduação em Direito. Bacharel em Direito pela Universidade Católica de Petrópolis.

Joana Sarmento de Matos

Juíza de Direito em Roraima. Doutoranda em Ciências Jurídicas e Sociais pela UMSA. Professora licenciada de Direito Penal da FACSUM. Pós-Graduada em Direito Público pela UNIGRANRIO. Associada ao CONPEDI - Conselho Nacional de Pesquisa e Pós-Graduação em Direito. Bacharel em Direito pelo Instituto Vianna Júnior.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

SIQUEIRA, Alessandro Marques ; MATOS, Joana Sarmento. A inoponibilidade das exceções pessoais e os títulos de crédito. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 15, n. 2665, 18 out. 2010. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/17621. Acesso em: 23 abr. 2024.

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