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Imunidade tributária da casa pastoral

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23/10/2010 às 10:28
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Conclusões

Tendo em vista a exposição do problema, podemos perceber que a importância do tema ultrapassa os limites do Direito Tributário, alcançando a matéria constitucional das imunidades e o direito fundamental da liberdade religiosa.

No que diz respeito às imunidades e sua abrangência não se encontra consenso na doutrina pátria. Tampouco quanto à amplitude da imunidade específica dos templos religiosos. É um campo de especulação já abordado de uma maneira ou de outra por vários doutrinadores. Sem ter a pretensão de trazer a última palavra quanto ao tema – mesmo porque a extensão do trabalho não o permitiria –, tentou-se tratar a imunidade das casas pastorais sob um enfoque de lógica jurídica, seguindo os princípios constitucionais que delineiam os rumos da hermenêutica jurídica.

Como acima demonstrado, as imunidades são, sim, extensíveis aos tributos, não apenas aos impostos, como defendem aqueles que se aferram a literalidade do texto constitucional. A interpretação há de ser feita de modo mais abrangente, de modo a dar a máxima eficácia à Constituição e a seus princípios.

Adotando-se a interpretação sistemática da Carta Magna, percebe-se que não apenas os templos estão abrangidos pela imunidade tributária, mas também as atividades que nele se realizam com intuito de propagar a crença, enfim de atender à finalidade que tenham. Essa é a significação que se extrai da leitura do §4° do artigo 150 da Constituição Federal que prevê que o disposto nas alíneas "b" e "c" do inciso VI "compreendem somente o patrimônio, a renda e os serviços relacionados com as finalidades essenciais das entidades nelas mencionadas", permitindo, assim, uma interpretação mais extensa do conteúdo da imunidade, de modo a abarcar a "renda do templo", o "patrimônio do templo" e os "serviços do templo".

Essa é a interpretação que nos parece mais correta, vez que o templo não tem personalidade jurídica. O imóvel destinado aos cultos religiosos pertence a uma organização religiosa. Por isso, em verdade, o que ocorre é que é a entidade religiosa que não pode sofrer a incidência de gravames tributário, quer quanto ao imóvel, ou mesmo quanto a renda auferida em decorrência do culto ou que se destine ao culto, ou os serviços integrantes da atividade religiosa considerada em si mesma.

Conclui-se, assim, que a casa pastoral tampouco pode ser tributada. Sua finalidade essencial é a de proporcionar moradia ao pároco, sacerdote, pastor, bispo, que atenderá à comunidade religiosa. Noutro versar, é a residência dos responsáveis pelo bom andamento da comunidade religiosa. A casa pastoral está umbilicalmente ligada à finalidade essencial da entidade religiosa – templo, na dicção constitucional –, tanto é assim que esta serve para suprir a necessidade de seus líderes, que, não poucas vezes, têm de mudar-se de cidade e de casa para atender ao bem estar da congregação da qual fazem parte.

Tendo em vista o acima exposto é que, de maneira despretensiosa, conclui-se pela imunidade também das casas pastorais, uma vez que estas, assim como os templos propriamente ditos, pertencem às entidades religiosas que as dirigem.

Ao se referir a templo, a Constituição quer, em verdade, falar de entidade religiosa. Essa entidade pode ter seus templos stricto sensu, que são os locais onde se propagam os cultos – mesquitas, sinagogas, igrejas –, além de outros imóveis. A jurisprudência tem entendido que mesmo imóveis alugados, cuja renda seja revertida a favor da organização religiosa e aplicada em suas finalidades essenciais, devem ser considerados, para os efeitos de tributação, imunes, isto é, estão contidos na definição constitucional de "templo de quaisquer cultos".

Com mais razão, então, deve ser considerada a casa pastoral como também contida no conceito constitucional de "templo", uma vez que não é somente sua renda revertida à finalidade religiosa, mas toda a sua essência se volta à satisfação do propósito vital de tais entidades, tanto é assim, que o imóvel continua sob a propriedade da instituição religiosa, que pode dele dispor de acordo com o que bem entender. A casa é cedida para que seja prestado um serviço afeto ao objetivo primordial da religião, qual seja, o acompanhamento dos fiéis, ou a divulgação da fé a que professam.

Portanto, a casa pastoral há de ser açambarcada pela imunidade tributária do art. 150, inciso VI, "b" da Constituição Federal, uma vez que é inerente ao próprio conceito de templo religioso.


Referências

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Notas

  1. COELHO, Werner Nabiça. A Imunidade Tributária dos Templos – Breves Considerações. Revista Tributária e de Finanças Públicas, São Paulo, RT v. 48, jan. 2003, p. 128.
  2. CANOTILHO, J.J. Gomes. Direito Constitucional. 6ª ed. Coimbra: Almedina, 1993, p.182.
  3. SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. 21 ed. Malheiros: São Paulo, 2002, p. 240.
  4. No mesmo sentido caminha a doutrina argentina: "Si bien no se puede restringir la liberdad de conciencia religiosa, sí se puede reglamentar el derecho a practicar um culto religioso, cuando esa práctica lesiona la moral, el orden público o los derechos de terceros" EKMEKDJIAN, Miguel Angel. Manual de la Constituición Argentina. 5ª ed. Buenos Aires: Depalma, 2002, p. 108.
  5. No Brasil, apenas Constituição Imperial, de 1824, adotou uma religião como a oficial do Estado. Ainda hoje, há Estados que optem por ter uma religião oficial, como é o caso, por exemplo, da Argentina. EKMEKDJIAN, Miguel Angel. Manual de la Constituición Argentina. 5ª ed. Buenos Aires: Depalma, 2002, p. 109.
  6. MOTTA FILHO, Sylvio Clemente da, e SANTOS, William Douglas Resinente dos. Direito constitucional: teoria jurisprudência e 1000 questões. 12 edição revista, ampliada e atualizada até a Emenda Constitucional nº 39/2002. 2003. Impetus: Rio de Janeiro, p. 65.
  7. PEREIRA JÚNIOR, Aécio. A imunidade das entidades beneficentes de assistência social. Disponível em: http://www.tj.ro.gov.br/emeron/sapem/2004/SETEMBRO/0309/ARTIGOS/A05.htm. Material da 7ª aula da Disciplina Sistema Constitucional Tributário: Princípios e Imunidades, ministrada no Curso de Especialização Telepresencial e Virtual de Direito Tributário - UNISUL - REDE LFG.
  8. ICHIHARA, Yoshiaki. Imunidades Tributárias. 1ª ed. São Paulo: Atlas, 2000, p. 121 e ss.
  9. MACHADO, Hugo de Brito. Curso de Direito Tributário.20ª edição revista atualizada e ampliada de acordo com as EC 32 e 33/2001, Malheiros Editores, 2002, p. 241.
  10. MELO, José Eduarto Soares de. Curso de direito tributário. São Paulo: Dialética, 1997 apud ICHIHARA, Yoshiaki. Imunidades Tributárias. 1ª ed. São Paulo: Atlas, 2000, p.160.
  11. MARTINS, Ives Gandra da Silva (coord). Imunidades Tributárias. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 1998, p. 31 apud ICHIHARA, Yoshiaki. Imunidades Tributárias. 1ª ed. São Paulo: Atlas, 2000, p. 161.
  12. COÊLHO, Sacha Calmon. Comentários à Constituição de 1988 – Sistema Tributário. Rio de Janeiro: Forense, 2005. p. 425.
  13. AMARO, Luciano. Direito Tributário Brasileiro. 12ª ed. São Paulo: Saraiva, 2006, p. 156.
  14. DERZI, Misabel. Anotações in BALEEIRO, Aliomar. Direito Tributário Brasileiro. 11ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 1999, p. 116.
  15. CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de Direito Tributário. 17ª ed. São Paulo: Saraiva, 2005, p. 172 e ss.
  16. CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de Direito Tributário. 17ª ed. São Paulo: Saraiva, 2005, p. 185.
  17. CHIESA, Clélio. Imunidades e Normas Gerais de Direito Tributário. In Santi, Eurico Marcos Diniz de. Curso de Especialização em direito tributário: estudos analíticos em homenagem a Paulo de Barros Carvalho. 1ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2005, p. 924.
  18. SABBAG, Eduardo. Imunidades Tributárias – Art. 150, VI, "a" e "d", CF. Material da 6ª aula da Disciplina Sistema Constitucional Tributário: Princípios e imunidades, ministrada no Curso de Especialização Telepresencial e Virtual em Direito Tributário – UNISUL – REDE LFG. – No mesmo sentido CASSONE, Vittorio. Direito Tributário. 4ª ed. São Paulo: Atlas, 1992, p. 85.
  19. FERRARA, Francesco. Como aplicar e interpretar as leis. 1ª ed. Belo Horizonte: Líder, 2002, p. 23.
  20. Por exemplo, BASSOLI, Marlene Kempfer. Imunidade Tributária para impostos: entidades assistenciais e religiosas (Art. 150, VI, "b" e "c" da CF/88). Material da 6ª aula da Disciplina Sistema Constitucional Tributário: Princípios e imunidades, ministrada no Curso de Especialização Telepresencial e Virtual em Direito Tributário – UNISUL – REDE LFG.
  21. CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de Direito Tributário. 17ª ed. São Paulo: Saraiva, 2005, p. 179.
  22. CHIESA, Clélio. Imunidades e Normas Gerais de Direito Tributário. In Santi, Eurico Marcos Diniz de. Curso de Especialização em direito tributário: estudos analíticos em homenagem a Paulo de Barros Carvalho. 1ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2005, p. 936.
  23. LEMOS, Pedro. A supressão da imunidade tributária concedida aos cultos religiosos. Disponível em: http://jus.com.br/revista/texto/4179. Material da 6ª aula da Disciplina Sistema Constitucional Tributário: Princípios e Imunidades, ministrada no Curso de Especialização Telepresencial e Virtual de Direito Tributário - UNISUL - REDE LFG.
  24. Ver, por exemplo, a primeira acepção de templo no Dicionário Caldas Aulete: 1 Edifício público consagrado a divindade(s) e ao culto religioso (retirado da versão digital do Dicionário).
  25. ICHIHARA, Yoshiaki. Imunidades Tributárias. 1ª ed. São Paulo: Atlas, 2000, p. 233.
  26. CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de Direito Tributário. 17ª ed. São Paulo: Saraiva, 2005, p. 190 e 191.
  27. BASSOLI, Marlene Kempfer. Imunidade Tributária para impostos: entidades assistenciais e religiosas (Art. 150, VI, "b" e "c" da CF/88). Material da 6ª aula da Disciplina Sistema Constitucional Tributário: Princípios e imunidades, ministrada no Curso de Especialização Telepresencial e Virtual em Direito Tributário – UNISUL – REDE LFG.
  28. BALEEIRO, Aliomar. Direito Tributário Brasileiro. 11ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 1999, p. 137.
  29. CARRAZZA, Roque Antônio. Curso de Direito Constitucional Tributário. 16ª edição revista, ampliada e atualizada até a EC nº 31/2000, Malheiros Editores, 2001, p. 618.
  30. COELHO, Werner Nabiça. A Imunidade Tributária dos Templos – Breves Considerações. Revista Tributária e de Finanças Públicas, São Paulo, RT v. 48, jan. 2003, p. 130.
  31. Bastos, Celso Ribeiro. Hermenêutica e Interpretação Constitucional. 1ª ed. São Paulo: Celso Bastos Editor, 1997, p. 29.
  32. COELHO, Werner Nabiça. A Imunidade Tributária dos Templos – Breves Considerações. Revista Tributária e de Finanças Públicas, São Paulo, RT v. 48, jan. 2003, p. 129,
  33. NOGUEIRA, Ruy Barbosa. Imunidades contra Impostos na Constituição anterior e sua disciplina mais completa na Constituição de 1988. 2ª edição revista e atualizada. São Paulo: Saraiva, 1992, p. 78.
  34. Erro! A origem da referência não foi encontrada. - N. Erro! A origem da referência não foi encontrada., julgado em 13/07/2010.
  35. Apelação Cível 1.0024.04.412777-7/001 TJ/MG.
  36. Apelação Cível e Reexame Necessário 0309787-4 TJ/PR.
  37. 2007.001.20471 - Apelação Cível - 2ª Ementa Des. Conceição Mousnier - Julgamento: 22/08/2007 - Vigésima Câmara Cível.
  38. Apelação e Reexame Necessário 70003042694 TJ/RS
  39. RE 325822/SP, rel. Min. Ilmar Galvão – Tribunal Pleno -DJ de14-05-2004, pp 00033.
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Sobre o autor
Luiz Roberto Lins Almeida

advogado em Campo Grande/MS

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

ALMEIDA, Luiz Roberto Lins. Imunidade tributária da casa pastoral. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 15, n. 2670, 23 out. 2010. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/17683. Acesso em: 4 mai. 2024.

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