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Uma sociedade bem ordenada: incursões teóricas em John Rawls

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07/11/2010 às 20:56

Resumo:


  • A pluralidade de doutrinas e ideais é inerente às sociedades democráticas modernas, e a intervenção estatal é necessária para garantir o equilíbrio e a estabilidade social, limitando razoavelmente as doutrinas que prejudicam o Estado Democrático de Direito.

  • O pacto social entre cidadãos é essencial para o reconhecimento mútuo como partes de um sistema de cooperação equilibrado, evitando a superioridade de ideais e doutrinas particulares.

  • Uma sociedade bem ordenada é aquela em que há uma concepção pública de justiça aceita por todos, as instituições respeitam esses princípios e os cidadãos têm um senso de justiça efetivo, contribuindo para uma convivência harmoniosa apesar das diferenças.

Resumo criado por JUSTICIA, o assistente de inteligência artificial do Jus.

RESUMO

Toda sociedade moderna democrática e de direito possui uma pluralidade de doutrinas e de ideais, sendo impossível prever em um futuro próximo que essa pluralidade não seja sempre uma característica marcante dessas sociedades complexas. Noutras palavras, a pluralidade faz parte da cultura globalizada. E para garantir uma estabilidade social, tendo em vista esta pluralidade de doutrinas e de ideais das sociedades complexas e super-populosas, é preciso a intervenção estatal para reconhecer essas pluralidades e também para supervisar e limitar razoavelmente as doutrinas e ideais que prejudicam as características fundamentais do Estado Democrático de Direito. Tal intervenção estatal é uma forma de garantir o equilíbrio entre as diversas doutrinas e ideais das pessoas que se opõem e, através desta intervenção, que não é simplista, se buscará uma sociedade bem ordenada. Outro ponto importante seria o pacto social que os cidadãos devem fazer para reconhecer no outro a qualidade de cidadão, evitando superioridade de ideais e doutrinas – um verdadeiro sistema de cooperação equilibrado.

Palavras-chaves: Estados Democráticos de Direito, pluralidade de doutrinas e ideais, intervenção estatal, estabilidade social e sociedades modernas bem ordenadas.

SUMMARY

Every modern democratic and lawful society has a plurality of doctrines and ideals, thus making impossible to predict in a near future that said plurality is not always an outstanding feature of those complex societies. In other words, the plurality is part of the globalized culture. And in order to ensure a social stability, taking into account this plurality of doctrines and ideals of the complex and overcrowded societies, it its necessary the state intervention to acknowledge such pluralities and also to inspect and limit, in a reasonable manner, the doctrines and ideals that harm the fundamental characteristics of the Democratic Rule-of-Law State. The state intervention is a method to ensure the balance between the several doctrines and ideals of opposing individuals and, through this intervention, which is not simplistic, it shall be sought a well-orderly society. Another important aspect would be the social pact that the citizens must do in order to recognize in each other the quality of being a citizen, by avoiding the superiority of ideals and doctrines – a genuine balanced cooperation system.

Key-words: Democratic Rule-of-Law States, plurality of doctrines and ideals, state intervention, social stability and well-orderly modern societies.


INTRODUÇÃO

Uma sociedade democrática moderna, que representa boa parte do mundo, se caracteriza por uma pluralidade de sujeitos que possuem doutrinas e ideais religiosos, morais, filosóficos, políticos, morais e éticos dos mais diversos. E pelas próprias palavras de John Rawls (2000-a: IX): "Nenhuma dessas doutrinas é adotada pelos cidadãos [01] em seu conjunto. E não se deve esperar que isso aconteça num futuro previsível". Tal situação é fruto das revoluções, reformas e lutas dos últimos séculos que impulsionaram o reconhecimento jurídico e político das liberdades públicas e da democracia plena. Com liberdade e democracia, as diversidades de ideais e doutrinas são juridicamente reconhecidas e, logo, um resultado "natural" da convivência humana e dos relacionamentos intersubjetivos.

Em vários livros, palestras e textos de John Rawls ele sempre afirmou que a pluralidade de doutrinas e ideais de uma sociedade moderna "é o resultado normal do exercício pelos cidadãos de sua razão no seio das instituições livres de um regime democrático constitucional" (2000-a: IX).Ele ainda ressaltou: "(...) a diversidade de doutrinas religiosas, filosóficas e morais abrangentes e razoáveis não é uma simples condição histórica que pode desaparecer logo; é um traço permanente da cultura pública da democracia" (2000-b: 80).

Assim, com esta base introdutória, se faz uma pergunta: como pode uma sociedade democrática complexa e cheia de diferenças ser bem ordenada?


FUNDAMENTAÇÃO

Segundo John Rawls, tais doutrinas e ideais religiosos, políticos, filosóficos, morais, éticos etc., nem sempre se afloram na sociedade como razoáveis e podem até rejeitar os fundamentos democráticos da mesma.Diante disso, o caminho para evitar esses problemas é limitar essas doutrinas e ideais desarrazoados para que a sociedade seja bem ordenada, justa, estável e verdadeiramente democrática (2000-a: X). O Estado tem que buscar sempre legitimar um pluralismo razoável, pois o pluralismo de ideais e doutrinas sempre vai existir, portanto, o problema é limitar o pluralismo desarrazoado. Somente com esta limitação, as sociedades pluralistas e modernas, no período contemporâneo, conseguirão permitir uma convivência mais pacífica entre as diversas culturas presentes no mundo. A questão, portanto, não é eliminar as doutrinas e ideais perturbadores das sociedades modernas, o problema é como limitar algumas dessas manifestações que prejudicam a democracia [02]. Citando um exemplo contemporâneo: a questão não é eliminar os palestinos ou israelitas, mas sim, como podem tais cidadãos viver em harmonia? O presente texto não tem a pretensão de resolver este problema, mas de apresentar de forma geral como John Rawls propôs em suas obras a proposta de uma sociedade bem ordenada, onde cidadãos são reconhecidamente e legitimamente livres e iguais, em oportunidades e direitos, embora tenham doutrinas e ideais diferentes.

Dizer que uma sociedade política é bem-ordenada significa três coisas:

Primeiro, e implícito na ideia de uma concepção pública de justiça, trata-se de uma sociedade na qual cada um aceita, e sabe que os demais também aceitam, a mesma concepção política de justiça (e portanto os mesmos princípios de justiça política). Ademais, esse conhecimento é mutuamente reconhecido: ou seja, as pessoas sabem tudo o que saberiam se sua aceitação de tais princípios tivesse resultado de acordo público.

Segundo, e implícito na ideia de regulação efetiva por uma concepção pública de justiça, todos sabem, ou por bons motivos acreditam, que a estrutura básica da sociedade – ou seja, suas principais instituições políticas e sociais e a maneira como elas interagem como sistema de cooperação – respeita esses princípios de justiça.

Terceiro, e também implícito na ideia de regulação efetiva, os cidadãos têm um senso normalmente efetivo de justiça, ou seja, um senso que lhes permite entender e aplicar os princípios de justiça publicamente reconhecidos, e, de modo geral, agir de acordo com o que sua posição na sociedade, com seus deveres e obrigações, o exige.

Numa sociedade bem-ordenada, portanto, a concepção pública de justiça fornece um ponto de vista aceito por todos, a partir do qual os cidadãos podem arbitrar suas exigências de justiça política, seja em relação a suas instituições políticas ou aos demais cidadãos (RAWLS, 2003: 11-12).

Noutras palavras, os cidadãos em algum momento precisam abrir mão de suas convicções para o bem estar da sociedade democrática. E logo, não se pode permitir no período contemporâneo que qualquer instituição pública e projetos de governo tenham preferência por uma doutrina ou ideal religioso, filosófico, político, moral, ético etc. O Estado tem o dever de promover o bem de todos, como objetivo fundamental, e não poderá ter preferências por determinadas doutrinas ou ideais, e se tiver terá que usar a opressão:

(...) um entendimento compartilhado e contínuo que tem por objeto uma única doutrina religiosa, filosófica ou moral abrangente só pode ser mantido pelo uso opressivo do poder estatal. Se considerarmos a sociedade política uma comunidade unida pela aceitação de uma única doutrina abrangente, então o uso opressivo do poder estatal faz-se necessário para essa comunhão política (RAWLS, 2000-b: 81).

No período Medieval (Idade Média) quem não era católico era herege e, logo, inimigo do poder público, podendo ser submetido à Inquisição. Noutras palavras, todos tinham que ser católicos porque o poder público era opressor. Da mesma forma, mutatis mutandis, os "Estados" Nazistas e Fascistas optavam por determinadas doutrinas e ideais, e os cidadãos que não se encaixavam nessas doutrinas eram assassinados, presos, torturados etc., situação que não se coaduna com uma sociedade bem ordenada e moderna – diga de passagem, toda sociedade e Estado Moderno devem ser democrático e de direito. Assim, como o pluralismo [03] é uma situação que desde os primórdios é reconhecida socialmente, só com opressão e com sanções estatais severas que se verificará uma tentativa por unidades de doutrinas e ideais dentro de uma mesma sociedade. Aliás, todas essas tentativas opressoras fracassaram ao longo da história.

O poder público e as leis precisam trabalhar não para uma doutrina, mas como todas podem ser reconhecidas, para que os cidadãos sejam livres e iguais, em direitos e oportunidades. A tarefa se torna difícil, pois os cidadãos que tem o poder de representar o poder público possuem suas influências e ideais dos mais diversos. Mas John Rawls fala que deve haver uma cooperação entre os cidadãos para evitar esses problemas. Como já dito anteriormente "(...) uma sociedade [ordenada] na qual cada indivíduo aceita, e sabe que todos os demais aceitam, precisamente os mesmos princípios de justiça" (RAWLS, 2000-b: 79). Isto é, o católico deve entender que o protestante também faz parte do mesmo Estado Democrático de Direito e vice-versa. Os adeptos dos movimentos políticos de esquerda devem entender que os de direita fazem parte do mesmo Estado Democrático e vice-versa. Outros exemplos poderiam ser citados, mas esses já demonstram que os cidadãos devem aprender a viver em uma sociedade ordenada, pois estão no mesmo Estado e, logo, os princípios de justiça adotados são os mesmos ou devem ser os mesmos.

Considere, então, os princípios de justiça como aqueles destinados a formar o mundo social em que nosso caráter e nossa concepção de nós mesmos enquanto pessoas, bem como nossas visões abrangentes com suas concepções do bem, começam a ser adquiridos, e onde nossas faculdades morais devem concretizar-se, se é que devem concretizar-se de alguma forma. Esses princípios devem dar prioridade àquelas liberdades e oportunidades básicas nas instituições fundamentais da sociedade civil que nos possibilitam, antes de mais nada, tornarmo-nos cidadãos livres e iguais e a compreender nosso papel de pessoas com esse status (RAWLS, 2000-b: 85).

Há um momento que os ideais e as doutrinas dos cidadãos não devem prevalecer sobre o Estado, sobre o regime democrático e as leis, inclusive, sobre a Constituição estabelecida por este Estado. No Brasil, por exemplo, se vê com constância inúmeros religiosos não aprovarem determinados projetos de lei porque tais projetos são contrários as doutrinas de suas religiões – situação que prejudica o Estado Democrático de Direito, quando levada com rigor fundamentalista. Esses religiosos têm que discutir aspectos religiosos dentro da igreja ou em manifestações públicas. Não se pode mais permitir que pessoas se deixem contaminar por suas convicções, prejudicando a secularização do Estado e o regime democrático. O que se pode fazer é utilizar razoavelmente certas doutrinas e ideais para ajudar a aprovação ou rejeição de determinados projetos de lei ou projetos políticos, mas nunca como fundamento principal – alguns políticos, por exemplo, utilizam a Bíblia para defender uma maior punição a pedófilos – situação que razoavelmente não prejudica, pois outros argumentos principais são também utilizados – tais argumentos podem ser usados no momento certo e no lugar certo, evitando polêmicas e superioridades de ideias. Um político religioso ou com determinada convicção política ou filosófica na hora de aprovar um projeto de lei ou de realizar um ato público qualquer, deve ter essa concepção política imparcial para que seus ideais não prevaleçam sobre os outros e sobre o Estado Democrático. Isto também serve para os indivíduos no âmbito de seus relacionamentos intersubjetivos. Outrossim, um político religioso também não pode atuar em um cargo público com o fim exclusivo de atender os interesses de sua Igreja, pois ele é representante de todos os cidadãos. E se não for assim, sua atividade política prejudica os fins democráticos.

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A própria Constituição, que é a lei maior do Estado de um país, deve expressar e ter o propósito de limitar doutrinas e ideais que prejudicam o Estado e de proteger as doutrinas e ideais que não prejudicam – todos são livres e iguais. Como já dito anteriormente, cada cidadão tem o direito de expressar suas doutrinas livremente e não pode ser impedido se não estiver prejudicando o Estado Democrático de Direito Moderno.

Assim, uma concepção de justiça pode ser falha porque não consegue conquistar o apoio de cidadãos razoáveis que professam doutrinas abrangentes razoáveis; ou, como direi muitas vezes, porque não consegue conquistar o apoio de um consenso sobreposto razoável, o que é indispensável para uma concepção política de justiça (RAWLS, 2000-b: 79-80).

O que John Rawls disse acima sobre uma característica marcante de um Estado Democrático é que os cidadãos devem legitimar a concepção política de justiça de um Estado e todos os cidadãos devem também ter essa concepção como limite de seus ideais e doutrinas. Importante ressaltar que concepções políticas de justiça que não tem legitimação social não podem ser adotadas como razoáveis. Ademais, uma concepção concreta deve expressar os princípios, normas, ideais e orientações das atividades estatais e dos relacionamentos intersubjetivos, devendo ser competente para proporcionar uma diretriz razoável para as principais questões envolvendo o Estado, por exemplo: manifestações públicas, liberdade de convicção e escolha, voto, eleição democrática, participação popular das decisões públicas, legislação, oportunidades iguais a todos etc. (RAWLS, 1997: 777). Tais concepções políticas de justiça vão se transformando com o tempo, conforme um espiral crescente, muitas das vezes se desenvolvendo para melhor e às vezes para pior. Mas sempre como um processo que depende dos cidadãos e dos representantes dos poderes públicos. A construção dessas concepções, como um espiral crescente, terá melhores resultados quando as pessoas envolvidas no processo de desenvolvimento democrático abordarem argumentos que os outros envolvidos possam aceitar razoavelmente. É por isso que o reconhecimento do outro deve ser importante para garantir uma maior estabilidade social. A hospitalidade e a reciprocidade têm o seu papel importante no âmbito das decisões políticas. Não há como defender um ideal ou doutrina que os outros envolvidos não vão entender e discordar. É preciso deixar alguns interesses particulares de lado para propor uma concepção política de justiça que irá proporcionar uma estabilidade social para garantir uma sociedade bem ordenada. Enfim, os cidadãos precisam justificar suas concepções políticas no outro, para que haja cooperação. É claro que nunca haverá um consenso sobre todas as questões políticas e estatais, mas os aspectos principais dos elementos do Estado deverão ser buscados a todo custo pelos cidadãos (RAWLS, 1997: 765-766).

Quanto mais eles [cidadãos] considerem a sua sociedade política um bem para eles mesmos, tanto como corpo coletivo quanto como indivíduos, e quando maior seu apreço pela concepção política pelo fato de ela garantir as (...) exigências essenciais de um regime estável, menos serão incitados pelas atitudes especiais da inveja, rancor, desejo de dominar e a tentação de privar os outros de justiça (RAWLS, 2003: 288).

Importante ressaltar que concepção política de justiça é aquilo que o Estado tem de essência marcante. Na África do Sul, há poucas décadas atrás, a concepção política de justiça principal era aApartheid, uma verdadeira política de segregação racial. Contudo, como os cidadãos, de modo geral, não legitimaram essa concepção política de justiça, com o tempo ela foi modificada. Como já dito, o Nazismo, o Fascismo e a Inquisição que tinham preferências por determinadas doutrinas, representam muito bem o que é uma concepção política de justiça, embora considerada modernamente desarrazoada.

Como não existe uma doutrina religiosa, filosófica ou moral razoável professada por todos os cidadãos, a concepção de justiça adotada por uma sociedade democrática bem-ordenada deve ser uma concepção limitada ao que chamarei de ‘o domínio do político’ e seus valores. A ideia de uma sociedade democrática bem-ordenada deve ser articulada de acordo com essa limitação. Suponho, então, que as visões globais dos cidadãos têm duas partes: pode-se considerar uma parte como a concepção política de justiça publicamente reconhecida, ou como coincidente com ela; a outra parte é uma doutrina (inteira ou parcialmente) abrangente, à qual a concepção política está ligada de alguma forma. (...). O ponto que precisamos enfatizar aqui é que, como já disse, são os próprios cidadãos que decidem, individualmente, de que maneira a concepção política pública que todos endossam está relacionada com suas visões mais abrangentes (RAWLS, 2000-b: 82).

O que John Rawls afirmou que se destaca acima é o dever de uma sociedade bem ordenada ter uma concepção política que busca limitar as doutrinas e ideais que prejudiquem a ordem social. Outro ponto importante seria a decisão deliberada dos cidadãos em legitimar essa concepção política razoável que vai garantir a estabilidade social e a paz social, embora os cidadãos tenham doutrinas e ideais opostos. A concepção política de justiça vai fundamentar os conceitos e os relacionamentos intersubjetivos e políticos de todos os cidadãos de determinada sociedade. Tal concepção não é utopia e não é uma única doutrina reconhecida pelos cidadãos, mas é a espinha dorsal de uma sociedade que possui uma diversidade cultural imensa e uma pluralidade de doutrinas e de ideais opostos. Essa espinha dorsal seria o limite para a "sobrevivência da estabilidade social" e uma forma de equilíbrio entre a complexidade das doutrinas e dos ideais dos cidadãos.

Portanto, uma verdadeira concepção política de justiça legitimada pelos cidadãos seria o fim da Apartheid na África do Sul, que colocou as pessoas de diversas culturas, classes e cor em mesmo nível de oportunidades e direitos. Nos EUA também existia uma política de segregação racial, embora de forma diferente, onde negros e brancos não recebiam o mesmo tratamento social e político. Com o tempo, tal segregação foi abolida, mas ainda existem tratamentos diferenciados, contudo, a vitória de Barack Hussein Obama, primeiro afrodescendente Presidente dos EUA, nas eleições de 2008 é fruto de tal conquista. Um outro exemplo a ser destacado são os direitos fundamentais promulgados no Brasil na Constituição de 1988, os quais o país não mais aceita como concepção política de justiça às censuras, as proibições de manifestações públicas e políticas de discriminação etc. – práticas do período ditatorial brasileiro. Após a Constituição de 1988, o Brasil adotou como essência principal, a democracia plena, a legitimação dos partidos políticos, igualdade entre sexos, valores sociais do trabalho, direito a saúde, promoção do bem de todos sem discriminação (vide art. 3º, inc. IV, da CRFB/1988) etc. – uma verdadeira concepção política de justiça razoável e legítima, embora se saiba que muitos dos direitos fundamentais ainda não são plenamente efetivados no Brasil. Além do mais, o próprio preâmbulo da CRFB/1988 buscou reconhecer o respeito por uma sociedade fraterna e pluralista como concepção política de justiça.

Preâmbulo da CRFB/1988: Nós, representantes do povo brasileiro, reunidos em Assembléia Nacional Constituinte para instituir um Estado Democrático, destinado a assegurar o exercício dos direitos sociais e individuais, a liberdade, a segurança, o bem-estar, o desenvolvimento, a igualdade e a justiça como valores supremos de uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos, fundada na harmonia social e comprometida, na ordem interna e internacional, com a solução pacífica das controvérsias, promulgamos, sob a proteção de Deus [04], a seguinte CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL (grifo nosso).

Outro exemplo a ser citado, mas agora se referindo a uma concepção política de justiça globalizada, seria o reconhecimento de direitos a homossexuais. Embora ainda exista muito preconceito contra homossexuais, muitos países já estão reconhecendo direitos a eles. Tais direitos não são plenamente criados por todo o planeta, devido o preconceito principal dos grupos religiosos – em alguns países do continente Africano e do Oriente Médio se pune homossexuais com pena de morte ou com prisão perpétua.

O que os religiosos pensam sobre a homossexualidade é legítimo, mas nada justifica negar direitos aos homossexuais que também são cidadãos, e a opinião dos religiosos não tem relação com o reconhecimento de direitos. Portanto, os Estados devem reconhecer direitos aos homossexuais, mas os Estados também devem respeitar os religiosos que são contra a prática homossexual. O que se deve combater como política estatal são as manifestações prejudiciais e discursos fundamentalistas por parte dos homossexuais aos religiosos e vice-versa.

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Sobre o autor
Conrado Luciano Baptista

É escritor, advogado, Especialista em Direito Público, Mestre em Teoria do Direito (Hermenêutica e Direitos Fundamentais) e professor. É um militante de causas sociais e políticas desde os 15 anos. Nasceu em Santos Dumont/MG, onde trabalha como vereador.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

BAPTISTA, Conrado Luciano. Uma sociedade bem ordenada: incursões teóricas em John Rawls. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 15, n. 2685, 7 nov. 2010. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/17766. Acesso em: 22 dez. 2024.

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