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Uso de imagem em unidade de conservação federal e a legalidade da Instrução Normativa IBAMA nº 05/2002

12/11/2010 às 17:36
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Por meio da Instrução Normativa nº 5, de 18 de março de 2002, o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis – IBAMA normatizou o uso da imagem em unidades de conservação federais (UC´s), dispondo sobre a maneira como serão conferidas as permissões do referido uso e o procedimento para tanto, assim como suas restrições.

Interessante anotar que a edição da IN IBAMA nº 05/2002 remonta à época em que o IBAMA detinha a competência para gestão das UC´s. Com a Lei nº 11.516/2007, esta competência foi transferida para o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade – ICMBio.

Apesar disso, a multicitada IN continua em vigor até que seja substituída por outra que venha a ser editada pelo ICMBio. Isso porque, em que pesem os esforços empreendidos pela Autarquia, não se conseguiu substituir todas as normas anteriormente editadas pelo IBAMA, até porque serão objeto de aprimoramento pelo novo Instituto. Diante desse quadro, o entendimento mais consentâneo com a realidade é o de que todas as normas já editadas pelo IBAMA antes da criação do ICMBio e que se relacionem com unidades de conservação deverão ser utilizadas analogicamente. Pois bem.

Já se afirmou que a IN IBAMA nº 05/2002 trata da utilização de imagens de unidades de conservação, bem como a realização de filmagens, gravações e fotografias, de caráter educativo, cultural, científico, comercial e publicitário em seu interior. Tendo em vista seu teor, ela nunca foi bem aceita por associações de fotógrafos ou demais trabalhadores que militam com imagem em UC, os quais usualmente questionam sua constitucionalidade na via administrativa.

Desde logo há de ser feita uma ressalva. Sendo cediço que a norma regulamentadora do uso de imagem retira seu fundamento de validade primário no artigo 33 da Lei nº 9.985/2000 [01], regulamentado pelo Decreto nº 4.340/2002, não há que se falar em controle de constitucionalidade, mas sim em controle de legalidade, devendo ser feito um cotejo com as disposições contidas na Lei e no Decreto mencionados. No máximo, inconstitucional seria a Lei do SNUC que possibilita essa normatização, o que não é o caso. Importa salientar que o juízo agora manifestado é assente na doutrina e jurisprudência, sendo desnecessário tecer maiores comentários.

Estabelecida a premissa do controle da legalidade, passemos ao objeto específico do presente trabalho. Da observação dos requerimentos efetuados em sede administrativa, verifica-se que a maior preocupação reside no cerceamento da livre expressão artística e cultural, impedindo que diversos fotógrafos profissionais ou amadores possam exercer a técnica necessária à sua formação e ao seu ofício. Questiona-se também a obrigação de doação da imagem captada pelo fotógrafo para fins de constituição de banco de dados do ICMBio, sem qualquer contraprestação, ocorrendo usurpação da obra.

Para um maior aclaramento da questão, insta colacionar os dispositivos relacionados ao uso de imagem em UC´s, os quais rezam o seguinte:

Lei do SNUC

Art. 33. A exploração comercial de produtos, subprodutos ou serviços obtidos ou desenvolvidos a partir dos recursos naturais, biológicos, cênicos ou culturais ou da exploração da imagem de unidade de conservação, exceto Área de Proteção Ambiental e Reserva Particular do Patrimônio Natural, dependerá de prévia autorização e sujeitará o explorador a pagamento, conforme disposto em regulamento.

Decreto nº 4.340/02

Art. 25.  É passível de autorização a exploração de produtos, sub-produtos ou serviços inerentes às unidades de conservação, de acordo com os objetivos de cada categoria de unidade.

Parágrafo único.  Para os fins deste Decreto, entende-se por produtos, sub-produtos ou serviços inerentes à unidade de conservação:

I - aqueles destinados a dar suporte físico e logístico à sua administração e à implementação das atividades de uso comum do público, tais como visitação, recreação e turismo;

II - a exploração de recursos florestais e outros recursos naturais em Unidades de Conservação de Uso Sustentável, nos limites estabelecidos em lei.

Art. 26.  A partir da publicação deste Decreto, novas autorizações para a exploração comercial de produtos, sub-produtos ou serviços em unidade de conservação de domínio público só serão permitidas se previstas no Plano de Manejo, mediante decisão do órgão executor, ouvido o conselho da unidade de conservação.

Art. 27.  O uso de imagens de unidade de conservação com finalidade comercial será cobrado conforme estabelecido em ato administrativo pelo órgão executor.

Parágrafo único.  Quando a finalidade do uso de imagem da unidade de conservação for preponderantemente científica, educativa ou cultural, o uso será gratuito.

Art. 28.  No processo de autorização da exploração comercial de produtos, sub-produtos ou serviços de unidade de conservação, o órgão executor deve viabilizar a participação de pessoas físicas ou jurídicas, observando-se os limites estabelecidos pela legislação vigente sobre licitações públicas e demais normas em vigor.

Art. 29.  A autorização para exploração comercial de produto, sub-produto ou serviço de unidade de conservação deve estar fundamentada em estudos de viabilidade econômica e investimentos elaborados pelo órgão executor, ouvido o conselho da unidade.

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Da leitura das normas alhures transcritas, penso inexistir ilegalidade nas disposições constantes da IN relativa ao uso de imagem em UC. Isso porque ela está plenamente fundamentada na Lei do SNUC, a qual institui, em seu artigo 33 acima descrito, a prévia autorização para exploração de recursos cênicos ou culturais ou da exploração da imagem de unidade de conservação.

Ademais, o artigo 27 do Decreto Regulamentador prevê a cobrança para uso de imagens com finalidade comercial e gratuidade quando essas mesmas imagens forem utilizadas preponderantemente para fins científicos, educativos ou culturais. Note-se que, malgrado o fato de a utilização de imagens para outros fins que não os comerciais ser gratuito, não houve normatização no que toca à impossibilidade de necessidade de autorização. Em outras palavras, a Autarquia continua com competência para exigir prévia permissão [02] para execução dessas atividades.

Assim, não procedem os argumentos dos insatisfeitos quando asseveram usurpação de obra artística, ofensa ao direito de indenização ou até mesmo censura, pois plenamente cabível a doação da imagem captada em troca da autorização para captação de imagens dentro de uma unidade de conservação.

Deve-se atentar para o seguinte fato: ao cidadão não é garantido direito líquido e certo de entrada numa unidade de conservação, ainda mais para prática de atividades diversas. À Administração da UC cabe controlar o uso e gozo da unidade, sempre voltando suas ações para proteção da biodiversidade, em consonância com a legislação de regência e o plano de manejo. Dizer se a atividade de fotografia ofende ou não a natureza é da mais estrita competência do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade.

Impende lembrar ainda que a potencialidade do dano não se encontra no ato em si da captação de imagens. A título de exemplo, para que se possa chegar ao local desejado para a fotografia ou filmagem, por diversas vezes o fotógrafo deve enfrentar trilhas por dentro da mata. Sem a companhia de um servidor do ICMBio, quem garante a proteção da natureza? Somente a consciência das centenas e milhares de pessoas que ingressarão na unidade? Inclino-me por uma resposta negativa. Entretanto, não entendo que sempre deva existir um guia a acompanhar o interessado; apenas quero alertar que a questão não é tão simples como almejam demonstrar as partes adversas.

Ultrapassada a hipotética ilegalidade aventada nos autos, destaco que a oitiva de cidadãos é extremamente salutar na composição de normas, pois apenas assim a Administração terá um panorama geral das aflições e dos desejos de seus administrados, sopesando, por conseguinte, as diversas possibilidades que o ordenamento jurídico nos traz. Nesse sentido, v. g., as atividades jornalísticas merecem atenção especial, devendo ser reguladas de forma autônoma em artigos separados. Será realmente que a retromencionada atividade deve ter o mesmo tratamento daquelas de cunho eminentemente artístico? É um debate a ser travado.

De todo modo, percebe-se que a questão faz jus a uma análise atenta da Administração. No que toca à IN nº 05/2002 propriamente dita ou outra norma semelhante que venha a substituí-la, entendo que ela está em consonância com a legislação de regência. Contudo, creio que a razoabilidade deve ser posta mais em foco, visando a evitar a edição de normas que caiam em desuso.


Notas

  1. A Lei nº 9.985/2000 estabelece o Sistema Nacional de Unidades de Conservação da Natureza, usualmente conhecido como SNUC.
  2. Aqui, vista em sentido lato.
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Sobre o autor
René da Fonseca e Silva Neto

Procurador Federal. Coordenador Nacional de Matéria Administrativa da Procuradoria Federal Especializada junto ao Instituto Chico Mendes - ICMBio. Ex-Coordenador Nacional do Consultivo da PFE/ICMBio. Bacharel em Direito pela UFPE. Especialista em Direito Ambiental. Coautor do livro Manual do Parecer Jurídico, teoria e prática, da Editora JusPodivm.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

SILVA NETO, René Fonseca. Uso de imagem em unidade de conservação federal e a legalidade da Instrução Normativa IBAMA nº 05/2002. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 15, n. 2690, 12 nov. 2010. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/17810. Acesso em: 24 nov. 2024.

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