Resumo: A inversão da ordem direta no período simples constitui numa operação sintática merecedora de destaque, porque o insucesso desta manobra compromete, fatalmente, em espécie, a compreensão da informação que o texto visa transmitir e contribui na manutenção do famigerado "juridiquês" (gênero). Se a premissa jurídica basilar é o ideal de justiça, as dúvidas quanto ao entendimento das escritas judiciais interessam apenas aos operadores-proteladores. Portanto, a inversão, quando operada, exige habilidade, por não dizer, parcimônia de quem a utiliza.
Palavras-chave: Ordem direta, período simples, inversão, juridiquês, sintaxe.
Da leitura das obras dos autores Bechara (2006, p. 406-409), Cunha (2001, p. 119-123 e 162-167), Faraco (2007, p. 385-386), Gonçalves (2008, p. 56-57), Perini (2007, p. 61-63 e 234-237) e Terra (2001, p. 185), infere-se a construção de uma definição para a ordem direta no período simples. Essa definição consiste numa oração com uma frase de sentido completo e sintaticamente apresentável na sequência: sujeito, predicado, complemento e advérbio, com apenas um verbo ou uma locução verbal. Numa oração esses elementos se interagem sintaticamente (BECHARA, 2006, p. 581).
Quando se altera a posição de um ou mais elementos da construção sintática direta, observa-se a inversão do período simples (BECHARA, 2006, p. 582. e TERRA, 2001, p. 189).
A idéia de simplicidade não deve ser confundida com a de conteúdo do texto. Mas o discurso escrito, inclusive o da jurídica, deve também ser simples e trazer embutido a clareza de idéias. Os conceitos serão explanados de forma mais apropriada adiante.
O trabalho consistiu no levantamento de períodos simples em peças jurídicas e a constatação da inversão sintática. Portanto uma pesquisa social se estabelece por focalizar a atuação de um grupo específico da sociedade. Em paralelo, foram procedidos à leitura e ao levantamento da pesquisa teórica de idéias de gramáticos, doutrinadores jurídicos e normas jurídicas.
Os operadores do Direito sejam juízes, promotores, procuradores, defensores públicos, advogados ou outros constituem, extinguem, modificam e alteram direitos e deveres, e se comunicam por meio da escrita. Esses documentos com conteúdo de Direito denominam-se peças jurídicas, pode-se relacionar algumas: Habeas Corpus, Habeas Data, Mandado de Segurança, petição inicial, notificação, sentença, acórdão, resolução, recursos, embargos de declaração, inquérito policial, denúncia-crime, etc.
Após explicar os termos de maneira introdutória, passa-se à importância do tema para mim. Oportuniza-me a verificação do embasamento teórico de quanto o dito "juridiquês" cujo resultado são textos jurídicos ininteligíveis, no nível gênero, e da contribuição da inversão da ordem direta, no nível espécie. A Ciência, principalmente, a Jurídica, ganha ao ter pesquisadores interessados em analisar e criticar comportamentos anacrônicos e desviantes dos objetivos sociais da Justiça, ao se perceber operadores do Direito com o hábito de construir e afirmar linguagens cujos conteúdos são vazios e incompreensíveis. A sociedade ganha ainda mais, pois se a função judiciária, que faz base ao Poder Único e nascente do Estado, a partir de uma autorreflexão, fizer-se entender de forma mais clara, com o apoio de ferramentas sérias de outras ciências, tais como o Português Jurídico, a cidadania fluiria para um país mais íntegro.
O trabalho tem como hipótese analisar se, nas resoluções expedidas pelo Tribunal Superior Eleitoral, usa-se mais a inversão da ordem direta no período simples.
Pretende-se discutir o seguinte problema: nas resoluções expedidas pelo Tribunal Superior Eleitoral, usa-se mais ou menos a inversão da ordem direta no período simples?
Do projeto para o artigo, houve uma alteração. Em vez de se estudar as Instruções expedidas para as Eleições, as peças analisadas passaram a ser resoluções diversas, uma vez que o relator das Instruções era um único ministro, o que limitaria bastante a pesquisa.
Para iniciar o estudo do Português Jurídico nas peças jurídicas selecionadas, deve-se explicar o objeto dessa ciência, ou seja, visa tornar o "juridiquês" menos influente nas peças jurídicas, de forma que o discurso se torne compreensível de acordo com a norma culta da língua.
Se o Direito depende da escrita, então se deve pensar nas idéias de Gonçalves (2008, p. 102-105) ao defender serem elementos necessários para uma redação eficiente: coerência (lógica formal), coesão (recursos que procuram tornar o texto conciso), concisão (dizer algo com o menor número de palavras). Esses elementos refutam a prolixidade (dizer algo com o maior número de palavras). Já o "juridiquês", na contramão, contempla este último elemento e outros mais, de forma a constituir Justiça e Direito distantes do público-alvo: o cidadão.
Marcos Bagno (2007, p. 9-19) em sua obra Preconceito Linguístico, ao discorrer sobre o porquê de se ter uma elite disseminadora do mito da unidade da linguagem falada do Brasil, afirma ser uma ideologia cômoda a certas camadas sociais. Para o autor há uma riqueza de linguagens impressionante no país continental. O preconceito se alimenta pela mídia ao não admitir as características regionais ricas em cultura. A imprensa dita o certo e o errado, mas se baseia tão-somente na Gramática Normativa e nos Livros Didáticos.
Apesar de o prof. Bagno defender a linha sócio-linguista, concepção defensora de que a comunicação se deu está correto, teve suas idéias mostradas para indicar que a língua falada encontra-se no patamar mais alto e rico, em detrimento da pregação midiática, calcada na Gramática Normativa, como único meio correto de falar. Dessa forma, o sócio-linguista difere língua falada da Gramática. No contexto, o "juridiquês" seria o terceiro patamar forçado, pois inverte a ordem, e os que operam o Direito assim se veem acima de todos. Seria uma escrita desarmônica com a Norma Culta Gramatical, e ignora os anseios da maioria dos brasileiros. Com a contribuição do prof. Bagno e dentro da lógica desenvolvida, é possível para os intolerantes defensores da Norma Culta ou do "juridiquês" conceber os nordestinos, apesar de sua riqueza vocabular regional, como incultos, principalmente se não mantiverem diplomas formais nem declinarem de sua cultura e de seu sotaque.
Como fica a situação da Justiça diante da cultura multifacetada brasileira?
Arrudão (2005, p. 6) mostra que a linguagem é uma das expressões do sistema jurídico, e uma visão de hierarquia, em que quem manda tem de se portar diferente dos demais, é típico da Idade Média, em que os poderosos comiam e falavam de forma distinta da do povo, pois com eles não poderiam nem queriam se confundir.
Na operação do "juridiquês" há a utilização descabida do latinismo, idolatrado pelos operadores do Direito, somam-se a este, outros "ismos" (BITTAR, 2005, p. 41-43): o academicismo, o arcaísmo, o eruditismo, o conservadorismo. São visões negativas e deturpadas de algo que na origem é bom. Seria um abuso da posição em que se encontram. De forma simplória, seria abuso de poder. Bittar (2005, p. 41-43) questiona a Filosofia Jurídica por sua escrita hermética e ininteligível, e se pode realizar pensamento dedutivo para a linguagem e a escrita Jurídicas, uma vez que operadores do Direito se valem dos "ismos" de jeito equivalente.
Bechara (2006, p. 598) considera vício e anomalia de linguagem o estrangeirismo, que consiste na utilização de palavras tomadas de outras línguas, que não a portuguesa. O autor frisa a necessidade de se combater a utilização dessas construções quando se encontram palavras e giros semelhantes no vernáculo.
A situação da escrita jurídica e, por conseqüência, da utilização indiscriminada do "juridiquês" chegou a ponto de constituir no sistema legal brasileiro o recurso Embargos de Declaração. O advogado, o Ministério Público, ou a parte interessada interpõem contra decisões de juiz ou tribunal, para esclarecimento do conteúdo da sentença ou acórdão, por se encontrar obscuro e/ou contraditório. O art. 535, do Código de Processo Civil (Lei nº 5.869/1973) e os regimentos internos dos tribunais contemplam e orientam a interposição desse recurso.
Seguindo a explanação, veja-se o exemplo que o professor Marcelo Paiva trouxe como pérolas jurídicas: "Estribado no escólio do saudoso mestre baiano, o pedido contido no exordial não logrou agasalho" (2006, p. 14).
Nota-se que, de gênero, o "juridiquês" aplicado no período tornou quase inacessível o conteúdo do discurso. Para decifrar, necessário se faz os passos seguintes: 1º passo – dicionário em mãos, para chegar ao seguinte período: "Apoiado no esclarecimento do saudoso mestre baiano, o pedido contido na inicial não obteve êxito."; 2º passo – simplificação da linguagem, por fim, com algum conhecimento jurídico, é possível tornar inteligível o período dado como exemplo pelo professor Paiva, convertendo-se em: "O pedido da inicial foi negado com base nas idéias do mestre baiano."
Quando o texto não se volta ao leitor, dificulta-se o contexto democrático, principalmente no caso de escrita jurídica. José Afonso da Silva (2009, p. 119) afirma que a democracia é plena quando o "Estado Democrático de Direito [...] se faz de tal forma que "o poder emana do povo, e deve ser exercido em proveito do povo [...]".
Mas será que a dificuldade de escrita recai totalmente sobre o operador do Direito? Cavalieri Filho (2007, p. 171) explana que "[...] o ensino do direito em nosso país tem sido duramente criticado nas últimas décadas", mas, "[...] o problema já vem do ensino fundamental, 59% dos estudantes brasileiros não conseguem lermais do que frases simples."
Ao buscar o valor de uma ciência, no caso, a do Direito, Bittar (2005, p. 39-40) diz que a "ciência e filosofia são úteis, mas são feitas por humanos e para humanos, devendo contribuir nessa mesma medida da humanidade [...]", se, ao invés disso, houver uma implementação de "minoração de auditório dos cientistas e dos filósofos faz com que [...]" se afaste de seu compromisso com a sociedade.
Será que a presunção de conhecimento da lei é absoluta? Para Bittencourt (2009, p. 95) não há relatividade além do acesso restrito real. O penalista ainda considera que "nem todo cidadão poderia entender o conteúdo das leis, em virtude da linguagem especial que se utiliza em sua elaboração."
Ao discorrer e apreender as idéias dos autores pode-se dizer que a escrita jurídica tornou-se "[...] prisioneira de expressões arcaicas e rebuscadas [...]" (PAIVA, 2006, p. 13), mesmo ao se saber que "palavras técnicas e precisas inibem falhas de linguagem".
Se as orientações de gramáticos e juristas não animam os operadores do Direito a escrever com coerência, concisão e simplicidade. Talvez se os operadores tão apegados a normas jurídicas, os positivistas-kelsenianos1, e, em tempos atuais autointitulados legalistas, souberem das normas orientadoras para a escrita sem latinismo, direta e clara, tenham motivação para fazê-lo.
O constitucionalista (SILVA, 2009, p. 119) discorria sobre Direito Constitucional ao destacar a autoridade, de mando do Estado e de alvo da atuação estatal, a ser exercida pelo povo. A Constituição Federal Brasileira, promulgada em 1988, expressa em seus Princípios Fundamentais no art. 1º, parágrafo único que "[...] todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente [...]. O cliente da escrita jurídica está claro pela Constituição.
O Código de Processo Civil (CPC) orienta o que se segue:
Art. 156. Em todos os atos e termos do processo é obrigatório o uso do vernáculo. Art. 157. Só poderá ser junto aos autos documento redigido em língua estrangeira, quando acompanhado de versão em vernáculo, firmada por tradutor juramentado. (Lei nº 5.869/1973)
No Código de Processo Civil, ao tecer orientações aos juízes quanto aos critérios de admissão e indeferimento dos pedidos, verifica-se que a escrita pode ser alvo de derrota judicial, conforme se observa na transcrição a seguir:
Art. 282. A petição inicial indicará: [...] III – o fato e os fundamentos jurídicos do pedido; [...] Art. 284. Verificando o juiz que a petição inicial não preenche os requisitos exigidos nos arts. 282. e 283, ou que apresenta defeitos e irregularidades capazes de dificultar o julgamento de mérito, determinará que o autor a emende, ou a complete [...] Art. 295. A petição inicial será indeferida: [...] Parágrafo único. Considera-se inepta a petição inicial quando: [...] II – da narração dos fatos não decorrer logicamente a conclusão; [...] (Lei nº 5.869/1973)
Qual a relação da gramática/língua com o CPC e seus termos: fato, fundamentos, narração dos fatos, conclusão lógica, julgamento dificultado? Íntima e profunda. Como se percebe a escrita constitui ferramenta de trabalho do operador do Direito.
Resolução do Conselho Nacional de Justiça 85, de 8/9/2009, – art. 1º:
[...] II – divulgar, de forma sistemática, em linguagem acessível e didática, os direitos do cidadão e os serviços colocados à sua disposição pelo Poder Judiciário, em todas as suas instâncias; [...] VIII – adequação das mensagens, linguagens e canais aos diferentes segmentos de público, utilizando sempre uma forma simplificada acessível àqueles que desconhecem as expressões típicas do universo jurídico; [...]
Após a fundamentação teórico-jurídica e normativa, cabe agora buscar a Ciência do Português para auxiliar na correção de rumo da escrita empolada.
Por que buscar o transcurso das idéias de doutrinadores jurídicos e das normas? Simples, porque este trabalho visa de forma acanhada influenciar na desconstrução do "juridiquês", por isso buscar apoio em gênero no próprio Direito. Frisa-se, os operadores do Direito e os legisladores do Brasil tem a lei como solução para todas as problemáticas, como se sem ação, alguma coisa funcionasse. Como se para respeitar uma velhinha necessitasse do Estatuto do Idoso, mas se passe adiante na reflexão do assunto.
Se se falava em gênero, agora se fala em espécie: a inversão da ordem da oração no período simples.
Cegalla (2007, p. 321) declara que para melhor compreensão, tem-se de se socorrer dos conceitos sintáticos. Afirma que a frase pode ser vista como o enunciado (declara, pergunta, ordena, explana) de sentido completo, com verbo ou não. Mostra que a oração consiste num enunciado com verbo, os elementos interagem sintaticamente, apresenta sujeito e predicado. Por sua vez, mostra ser o período uma frase com uma oração ou mais, com sentido completo. Se houver apenas um verbo ou locução verbal trata-se de período simples, se houver mais, trata-se de período composto. O período simples consiste no objeto deste trabalho.
Cegalla (2007, p. 321) mostra que a estrutura básica é sujeito e predicado. Mas são também normais e verificáveis, segundo Gonçalves (2008, p. 56-57) sujeito, predicado, complemento, advérbio; sujeito, predicado e complemento; predicado, complemento e advérbio.
Cegalla (2007, p. 324-327) afirma que o sujeito pode ser determinado simples ou composto. Expresso ou oculto. Indeterminado ou inexistente. Orienta o autor que o Predicado Verbal pode ser objeto direto ou objeto indireto, pode também ser os dois – regência do verbo, ou ainda, ser intransitivo, pois não solicita complemento algum. Aponta que o Predicado Nominal ocorre quando o verbo liga o sujeito a uma qualidade ou condição. Visualiza, por sua vez, o Predicado Verbo-Nominal quando há verbo transitivo ou intransitivo acrescido de Predicativo.
Bechara (2006, p. 416) indica ser a Voz Passiva a inversão de ação, de forma que o sujeito da ativa se torna agente da passiva e o objeto da ativa se torna sujeito paciente.
Vistos os elementos da oração que interagem entre si, e que lhe dá tal condição, passa-se ao estudo da inversão da ordem direta do período simples (BECHARA, 2006, p. 581, NICOLA, 2004, p. 248. e SAVIOLI, 2002, p. 56).
Nos estudos das obras selecionadas, conclui-se que os gramáticos consideram a inversão correta. Contudo, consideram o uso da ordem direta mais interessante, e o é, pois quem opera a inversão terá de dominar mais regras, tais como "concordância verbal" (INFANTE, 1999, p. 361) regência, sintaxe, "uso da vírgula" (GONÇALVES, 2008, p. 56-57, GOLD, 2007, p. 185. e SAVIOLI, 2002, p. 56), entre outras.
Nas obras de Terra (2001, p. 273. e 2003, p. 199-200) e Nicola (2004, p. 251) encontram-se as defesas expressas pela ordem direta, por: lógica, modernidade e natureza, e além de diminuir os riscos de erros gramaticais. A ordem direta torna-se a melhor opção.
A utilização da ordem direta encontra-se reforçada pela Lei Complementar 95/1998 (técnica legislativa), em seu art. 11. traz:
[...] b) usar frases curtas e concisas; c) construir as orações na ordem direta, evitando preciosismo, neologismo e adjetivações dispensáveis; d) buscar a uniformidade do tempo verbal em todo o texto das normas legais, dando preferência ao tempo presente ou ao futuro simples do presente; e) usar os recursos de pontuação de forma judiciosa, evitando os abusos de caráter estilístico; [...]
Após verificar que o entendimento majoritário dos gramáticos de considerar a inversão como correta, apesar de a ordem direta ser preferida, passa-se as figuras de construção ou de sintaxe, dispostas e conceituadas a seguir.
Bechara (2006, p. 595), Cegalla (2007, p. 622), Infante (1999, p. 521) e Nicola (2004, p. 432) mostram que o Anacoluto é a quebra do nexo sintático.
Faraco (2007, p. 529), por seu turno, diz ser a Anástrofe a ordem inversa que colide com a norma geral.
Bechara (2006, p. 595) indica que a Antecipação é quando se coloca expressão fora do lugar lógico.
Bechara (2006, p. 583) e Cegalla (2007, p. 622) afirmam ser a Inversão, denominada Prolepse por Faraco (2007, p. 529), utilizada para dar ênfase, geralmente, em linguagem poética e linguagem falada.
Faraco (2007, p. 529) e Nicola (2004, p. 432) observam que o Hipérbato consiste na disposição violenta que altera a clareza da mensagem.
Cegalla (2007, p. 622), Infante (1999, p. 521) e Nicola (2004, p. 433) conceituam a Silepse como a concordância com a idéia dos termos.
Bechara (2006, p. 583) e Faraco (2007, p. 529) explanam a Sínquese como causa de ambigüidade na oração.
Bechara (2006, p. 598) mostra ser o Solecismo erro de sintaxe: concordância, regência, colocação e má estruturação dos termos da oração.
A pesquisa encontra-se embasada na teoria, passa-se à análise dos dados obtidos das peças jurídicas: as resoluções expedidas pelo Tribunal Superior Eleitoral.
A hipótese foi contrariada, pois se usa mais a ordem direta nas resoluções expedidas pelo Tribunal Superior Eleitoral, no período simples, para a grata surpresa do pesquisador.
Para se ter um cenário de auxílio, a seguir se transcrevem trechos de períodos simples extraídos das peças jurídicas.
Ordem direta.
Período 1 – A Assessoria Especial (Asesp) informa às fls. 7-11.
Período 2 – Assim, o filho da ex-companheira do atual prefeito (reeleito) não poderá se candidatar ao cargo prefeito, sob pena de afronta ao art. 14, § 7o, da Constituição Federal.
Ordem inversa.
Período 3 – Ante o exposto, acolho a sugestão da Asesp.
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Período 4 – O Tribunal, por unanimidade, respondeu negativamente à consulta, na forma do voto do relator.
No quadro abaixo, estão dispostos os números estatísticos extraídos das resoluções.
Quadro 1 – Dados das peças.
Número |
Ordem Direta |
Ordem Inversa |
Períodos Simples |
Períodos Compostos |
Total de períodos das peças |
Res. 1 |
1 |
2 |
3 |
15 |
18 |
Res. 2 |
7 |
2 |
9 |
27 |
36 |
Res. 3 |
3 |
2 |
5 |
17 |
22 |
Res. 4 |
1 |
1 |
2 |
14 |
16 |
Res. 5 |
3 |
2 |
5 |
18 |
23 |
Res. 6 |
6 |
2 |
8 |
14 |
22 |
Res. 7 |
9 |
4 |
13 |
25 |
38 |
Res. 8 |
6 |
3 |
9 |
25 |
34 |
Res. 9 |
2 |
1 |
3 |
16 |
19 |
Res. 10 |
4 |
4 |
8 |
17 |
25 |
Totais |
42 |
23 |
65 |
188 |
253 |
Com o encontro da teoria e dos dados das peças jurídicas, encontrou-se resposta à hipótese. Ou seja, na Ciência do Português Jurídico o pesquisador teve sua premissa refutada pelos fatos. Chama-se aqui atenção para o universo de peças jurídicas selecionado, uma vez que pesquisas futuras poderão se aprofundar no tema. Portanto, o trabalho se constitui apenas num iniciar os primeiros passos.
O trabalho deu-se, respectivamente, com as informações introdutórias ao tema, reconhecimento de conceitos; com os doutrinadores jurídicos e as normas para a apreensão de mensagens indicadoras de que o Direito e Justiça servem ao povo; com os gramáticos têm-se a força da Norma Culta afirmada para orientar escrever de forma clara, objetiva, concisa e inteligível; com os dados das peças jurídicas, o pesquisador teve sua hipótese refutada, o que prova a forma científica de operação.
Gratifica verificar um Tribunal Superior voltado ao mais simples, portanto mais assimilável pela maioria das pessoas. Apesar de não ser foco da pesquisa verificou-se a utilização de termos mais corriqueiros e simples.
Com a hipótese refutada e após as preleções, o trabalho passará a reflexão do "juriquês" como obstáculo a ser demolido para se chegar ao ideal de Justiça. A Ciência Português Jurídico constitui ferramenta apta a incutir a boa prática da redação simples e isso contribui, sobremaneira, com a sociedade como um todo. Seria uma filosofia da forma da linguagem jurídica, se se entendê-la como questionadora dos primeiros valores e princípios daquilo que se acha correto na escrita jurídica, mas, ao contrário, mostra-se inadequado e ineficaz.
Somam-se, ainda, ações de instituições nacionais como a Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB) – a ser explicada adiante–, que deixam contentes aqueles sonhadores em ter uma democracia, real, forte e atuante no Brasil.
O operador do Direito poderia conceber a oração "O juiz solicitou ao réu explicação sobre o ocorrido ontem" como mais compreensiva e simples, sem de maneira alguma ser vulgar, do que a oração "O Excelentíssimo Senhor Juiz, em oitiva, perante o réu referenciado nos autos, solicitou a este esclarecimento sobre o fato delituoso, ocorrido no dia pretérito a hoje."
O problema da má escrita do Direito ganhou ares de gravidade, retomando a citação da atuação de organizações brasileiras, que levou a Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB) a lançar a Campanha pela Simplificação da Linguagem Jurídica. Dessa campanha resultaram prêmios a estudantes e magistrados em 2005 e 2007, na ocasião foram lançados livros, respectivamente, Simplificação da Linguagem Jurídica (AMB, 2005)e O Judiciário ao alcance de todos – noções básicas de Juridiquês (AMB, 2007). O presidente da AMB, Rodrigo Collaço, escreveu no prefácio do primeiro livro a expressão "Ninguém valoriza o que não entende!"
Arrudão (2005, p. 1-6) trouxe exemplos, no mínimo exóticos, extraídos da escrita dos operadores do Direito: abroquelar = fundamentar; Egrégio Pretório Supremo = Supremo Tribunal Federal; cártula chéquica = talão de cheques. A intenção do autor decorre da intenção da AMB em desgrudar o "juridiquês" da escrita jurídica. Mas parece ser árdua a ação da AMB, pois o autor mostra advogados defensores da escrita empolada e codificada. Por fim, o artigo do autor trouxe um alento ao descortinar para o Brasil, com a técnica do Direito Comparado, a prática de países de língua italiana, inglesa, espanhola e portuguesa, reiterada em excluir o "juridiquês" de suas normas e do Direito. O Judiciário se aproxima do povo e fortalece a Democracia.
Com a Filosofia busca-se a valoração. A professora-filósofa Marilena Chauí (2008, p. 147-157) defende ser a palavra o grande diferenciador entre homem e animal, pois com ela se exprime o bom e o mau, o justo e o injusto. Portanto a utilização da escrita deve ser aplicada com temperança. A linguagem se opera com signos ou sinais para que as pessoas interajam pelo sentimento, pensamento e expressão de idéias. A filósofa auxilia pensar a admiração do ser culto (voltado ao eruditismo) e do inculto (tudo que é voltado às classes populares), ressalta a autora que a Música Popular Brasileira (MPB) foi classificada em idos tempos como de pobre. A elite não aceita o simples. Culto e inculto, simples e erudito, também são parâmetros para a cultura, bem como para a arte. Há a cultura erudita afastada do povo, para este se tem a cultura de massa. O discurso e a escrita do operador do Direito encontram-se afetados por aquela cultura?
O trabalho almeja a modesta função de contribuir com os pregadores de uma Justiça efetiva rumo à Democracia forte, da qual os brasileiros jamais compartilharam. A Justiça mencionada entra em choque com a vislumbrada por Hans Kelsen (apartou a Moral e Ética do Direito e da Justiça), focada na lei. É aquela efetiva, tal como pregava Sócrates e Platão (PLATÃO, 2009), em que o justo necessariamente se mostrava bom e moral, a temperança da alma guiava as ações, e por natureza o homem se absteria de aplicar o mal no amigo, mas também no inimigo.
Kelsen resgatou Sócrates e Platão para forçar suas teorias, mas, uma parte, ou desvirtuou de acordo o que lhe conviria. Deixou para trás o mais importante para os dois gregos. Se o homem deveria seguir a lei, inclusive injusta, mas deveria se portar de maneira proba e honesta com ele próprio e com os outros, para purificar a alma. Logo o dever-ser (lei-positiva) de Kelsen é de pormenor, porque o ser, o comportamento, era o que dava ritmo à vida do justo, pois era um ser cheio de moral e ética.
Sócrates e Platão consideravam os prazeres e os apetites do corpo corruptores da alma, tornavam o homem injusto. A falácia de que a lei é o parâmetro justo, por estar escrito, cai por terra, vez que, como tudo é relativo e útil, segundo os próprios positivistas-legalistas-kelsianos, as leis são úteis a quem? Se os juízes erram se não houver lei, e não errariam com leis más em mãos? O que dizer de países tais como Inglaterra e Estados Unidos da América, em que os costumes são a fonte primeira, na verdade a jurisprudência, onde o respeito ao ser humano é severamente mais elevado do que no Brasil? Será que legislar é solução? É possível escrever todas situações do mundo concreto? O Estado brasileiro e suas instituições são sérias?
Voltando à Justiça concebida por Sócrates, encontra-se no discurso Górgias, questionamentos intrigantes "[...] A ordem e a harmonia da alma têm o nome de legalidade e lei, que é o que deixa os homens justos e ordeiros, e vem a ser, precisamente, justiça e temperança. Aceitas isso, ou não? [...] Com isso em mira é que o orador honesto e competente deverá dirigir seus discursos à alma dos homens, sempre que lhes falar, e todos os seus atos; e quer lhes dê ou tire alguma coisa, deverá pensar e sempre no modo de fazer nascer a justiça na alma de seus concidadãos e de banir a injustiça, de implantar nela a temperança e de afastar a intemperança. Concordas comigo neste ponto, ou não? [...]
Diante das afirmações dos filósofos e do "juridiquês", pode-se questionar ser o Direito uma ciência instrumental sem ter como fim a Justiça? Isso seria um absurdo. Mas, as injustiças são covardes e saltam aos olhos das pessoas ao assistirem a um simples telejornal.
Finaliza-se com um convite a refletir uma das perguntas do prof. Bagno (2007, p. 165) "A quem interessa defender o "português ortodoxo" de uns pouquíssimos" melhores contra a suposta "heresia gramatical" de milhões de outros?" A quem interessa manter o obstáculo entre o povo e a Justiça da qual é dono absoluto.