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O novo regramento do mandado de segurança.

Exame da constitucionalidade do art. 7º, inciso III, da Lei nº 12.016/2009

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25/11/2010 às 15:02
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3. Argumentos favoráveis à constitucionalidade do art. 7º, inciso III, da Lei nº 12.016/2009.

Muitas vozes doutrinárias levantaram-se a favor do art. 7º, III, da Lei nº 12.016/2009.

A maioria o defende com o argumento de que a previsão contida art. 7º, III, da Lei nº 12.016/2009 não representa, em tese, violação à Constituição.

Nesse sentido, Vicente Greco Filho [08]:

"A Lei prevê a possibilidade de o juiz, em qualquer caso, exigir do impetrante a prestação de caução, fiança ou depósito com o objetivo de assegurar o ressarcimento da pessoa jurídica por eventual concessão de liminar que venha a ser cassada na sentença final e que tenha causado prejuízo. Não se pode dizer que a norma seja inconstitucional, mas se, no caso concreto, vier a obstar a garantia do instrumento constitucional de tutela de direitos não pode ser exigida, como, por exemplo, se o impetrante for pobre e não puder prestar a caução, finança ou fazer deposto de qualquer quantia."

Marcelo Navarro Ribeiro Dantas compartilha a mesma opinião, em crítica contra a fundamentação despendida na ADI nº 4.296 – DF:

"Com as vênias devidas aos ilustres membros do Conselho Federal da Ordem, não enxergamos inconstitucionalidade no caso. Entretanto, lamentamos que o legislador tenha se preocupado em explicitar essa possibilidade de caução, fiança ou depósito, se ela já era possível diante das normas processuais aplicáveis subsidiariamente, e se efetivamente pode induzir magistrados inseguros a instituir tal requisito para a liminar em situações que, silente a lei específica, sequer se lembrariam de estabelecer."

Arrematando o posicionamento doutrinário acima, citamos novamente Cássio Scarpinella Bueno [09]:

"A regra em comento inova, contudo, ao facultar ao magistrado que exija "do impetrante caução, fiança ou depósito, com o objetivo de assegurar o ressarcimento à pessoa jurídica". Trata-se do prevalecimento, em sede legislativa, da orientação defendida, dentre outros, por Celso Agrícola Barbi, Lucia Valles Figueiredo e Hely Lopes Meirelles.

A previsão legal, tal qual feita, não atrita com o "modelo constitucional do mandado de segurança". Não há como interpretar a exigência de caução como condição para a concessão da liminar. O que o inciso III do art. 7º da Lei n. 12.016/2009 quer é que o magistrado, consoante as peculiaridades do caso concreto, possa impor a caução para assegurar eventual resultado infrutífero se, ao final, o pedido do impetrante for rejeitado. É o que, para o "dever-poder geral de cautela", que também tem, para nós, estatura constitucional – é importante destacar esta característica diante do art. 5º, XXXV, da Constituição Federal –, decorre do art. 805 do Código de Processo Civil."

Historicamente, a exigência de caução em procedimentos sumários e de cognição não exauriente não é, como lembrou Marcelo Navarro Ribeiro Dantas, propriamente uma novidade no ordenamento jurídico.

A previsão genérica do uso este instituto ainda figura presente no art. 804 do Código de Processo Civil, com aplicação subsidiária à revogada Lei nº 1.533/51 e à atual Lei nº 12.016/2009.

O mesmo pode-se dizer quanto à sua previsão específica na legislação pertinente ao Mandado de Segurança.

A Lei nº 2.410, de 29 de janeiro de 1955, exigia a prestação de caução em títulos da dívida pública ou em fiança bancária idônea como condição para a execução da decisão de primeiro grau, em sede de Mandado de Segurança, que concedesse ordem para o desembaraço de bens vindos a qualquer título do exterior, sem prévia licença ou com licença considerada falsa, antes de confirmada pela instância superior.

Como outro exemplo, o inciso II e § 3º do art. 5º da Medida Provisória nº 375, de 23 de novembro de 1993, estipulavam, respectivamente, a prestação de garantia acauteladora do interesse exposto a risco e a indispensabilidade de prestação de garantia correspondente à caução contratual na hipótese de suspensão ou interrupção de licitação pública.

No plano prático, em todos esses casos, a exigência de garantia para concessão de liminares ou para a execução de decisões meritórias do mandamus vigorou sem ofensas à ordem constitucional que preconiza a inafastabilidade da jurisdição.

Assim, a corrente a favor da constitucionalidade do art. 7º, III, da Lei nº 12.016/2009 sustenta que este dispositivo não obriga o juiz a somente conceder a liminar quando efetuada a garantia prevista em lei. Tornou, isto sim, uma faculdade a exigência de caução, fiança bancária ou depósito, a ser avaliada pelo magistrado em cada caso concreto.

Por isso, se inconstitucional for a medida, a ofensa à Constituição só poderá ser verificada diante das circunstâncias do caso posto a julgamento e, sobretudo, da ponderação entre o potencial desfalque do erário com a concessão da liminar e a capacidade econômica financeira do Impetrante para, obviamente, suportar este ônus legal.

Com efeito, não haveria inconstitucionalidade em tese do art. 7º, III, da Lei nº 12.016/2009, já que não é possível afirmar categoricamente que em todos os casos a que se destina esta norma haverá uma possível restrição ao princípio da inafastabilidade da jurisdição.


CONCLUSÃO

A exposição feita nos tópicos anteriores demonstrou que o regramento imposto pelo art. 7º, III, da Lei nº 12.016/2009 já encontrou guarida em ordenamentos constitucionais anteriores à Carta de 1988.

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De fato, é impossível aferir sob um ângulo meramente hipotético e genérico uma ofensa à Constituição Federal engendrada pela possibilidade de o juiz exigir caução, fiança bancária ou depósito para liminares concedidas em mandado de segurança. Somente diante do caso concreto poder-se-á afirmar se subsiste ou não contrariedade ao art. 5º, XXXV, da Constituição Federal.

Logo, ao ter o legislador consignado a exigência de garantia da qual tratamos como uma faculdade do magistrado, e não como um requisito obrigatório e incondicional para a concessão da liminar no mandamus, foram eliminadas eventuais alegações de inconstitucionalidade em tese do dispositivo. Assim, se no plano fático vir a ser concretizada a violação ao texto constitucional temida pela OAB, esta decorrerá não diretamente da Lei nº 12. 016/2009, mas do ato do juiz que mal aplicar a mencionada norma.


Notas

  1. DA SILVA, José Afonso. Curso de Direito Constitucional Positivo. 19ª Edição. São Paulo: Malheiros, 2001. p. 444.
  2. MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional. 15ª ed. São Paulo: Atlas, 2004. p. 167.
  3. GARCETE, Carlos Alberto. A nova lei do mandado de segurança (de acordo com a Lei Federal nº 12.016, de 7.8.2009). Rio de Janeiro: GZ Ed., 2001. p. 19.
  4. ROCHA, César Asfor. A luta pela efetividade da jurisdição. São Paulo: RT, 2007.
  5. CUNHA, Leonardo José Carneiro da. A Fazenda Pública em Juízo. São Paulo: Dialética, 2003.
  6. BUENO, Cássio Scarpinella. A nova lei do Mandado de Segurança. São Paulo: Saraiva, 2009.
  7. BUENO, Cássio Scapinella. Curso sistematizado de direito processual civil: tutela antecipada, tutela cautelar, procedimentos cautelares específicos. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 10.
  8. GRECO FILHO, Vicente. O novo mandado de segurança: comentários à Lei n. 12.016, de 7 de agosto de 2001. São Paulo: Saraiva, 2010.
  9. Bueno. Ob. citada.
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Sobre a autora
Ana Beatriz da Motta Passos

Procuradora do Município de Manaus. Especialista em Direito Tributário pela Universidade Federal do Amazonas. Mestranda em Direito Ambiental pela Universidade do Estado do Amazonas.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

PASSOS, Ana Beatriz Motta. O novo regramento do mandado de segurança.: Exame da constitucionalidade do art. 7º, inciso III, da Lei nº 12.016/2009. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 15, n. 2703, 25 nov. 2010. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/17909. Acesso em: 24 abr. 2024.

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