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A doação voluntária de sangue como pena restritiva de direitos

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16/12/2010 às 14:53
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8. Conclusões. A Lei 10.205, de 21 de março de 2001, regulamentou o § 4º do art. 199 da Constituição Federal, relativo à coleta, processamento, estocagem, distribuição e aplicação do sangue, seus componentes e derivados, estabelece o ordenamento institucional indispensável à execução adequada dessas atividades, e dá outras providências. E, em seu capítulo II – Dos Princípios e Diretrizes –, no art. 14, elege como fundamento da estratégia governamental, dentre outros, a universalização do atendimento à população; a utilização exclusiva da doação voluntária, não remunerada, do sangue, cabendo ao poder público estimulá-la como ato relevante de solidariedade humana e compromisso social; e, a proibição de remuneração ao doador pela doação de sangue.

Diante da certeza de que a atuação do Poder Judiciário em prol dos que necessitam de sangue para se curar e/ou para viver está em harmonia com as políticas públicas correlatas ao espírito de desprendimento individual e de solidariedade humana, finalizo este trabalho apresentando os tópicos formadores desse convencimento.

Duas vertentes preponderantes guiaram-me na realização desse trabalho: a viabilidade jurídica e o cunho humanitário.

8.1 – Aspecto Jurídico. A doação de sangue como pena restritiva de direitos, deve atender a três requisitos: tipicidade, voluntariedade e consensualidade.

a) Tipicidade. A doação de sangue é uma pena alternativa inominada, a exemplo da doação de cestas básicas, e encontra seu fundamento jurídico no art. 45, § 2º, do Código Penal. E como pena restritiva de direitos deverá atender aos seguintes postulados constitucionais: ter natureza social alternativa (art. 5º, XLVI, d), não ser proibida (art. 5º, XLVII), assegurar respeito à integridade física e moral (art. 5º, XLIX) e preservar a dignidade da pessoa humana. É prestação alternativa inominada oriunda de proposta da acusação em audiências de tentativa de conciliação emanadas da Lei 9099/95, i.e., em transações penais e em audiências de suspensão condicional do processo. Não pode ser decretada em sede de sentença condenatória, por traduzir imposição e não consensualidade.

b) Voluntariedade/Consensualidade. Oferecidas duas ou mais propostas, estas serão apresentadas ao autor da infração que, sponte sua, escolherá aquela que lhe aprouver. Caso opte pela que contenha a doação de sangue, o juiz/conciliador expor-lhe-á o questionário prévio e inicial para que analise e responda se pode doar sangue, tornando indiscutível o caráter voluntário e não impositivo da aceitação. Ultrapassadas essas etapas, a lavratura do acordo poderá ser finalizada com a homologação judicial.

Note-se que se mostra essencial para a completude da exteriorização do ato de vontade, que a doação de sangue seja voluntária, sem representar imposição/ordem.

8.2 – O veio humanitário. Desnecessário estender-me sobre o alcance da pena em tela, uma vez que os quadros, estatísticas e as opiniões das autoridades médicas envolvidas falam por si. Para o juiz ingressar nessa cruzada do bem e da vida, basta articular-se e, em sua cidade, procurar o centro médico adequado para recepcionar os autores de infrações, e expor o ideal de implantação da doação de sangue como pena alternativa. A partir daí, fomentar o interesse dos demais integrantes do tripé judiciário e o auxílio para a comunidade estará materializado.

Tenho esperança que estas linhas sirvam de inspiração para que os colegas juízes, bem como os demais integrantes da justiça, adotem esta sugestão.

Evoco atitudes que nos chegam tímidas, uma vez que somente os Estados do Rio de Janeiro e Paraná divulgaram a adoção da doação de sangue como pena alternativa. Se cada um pensar bem, pressentirá que, logo, todo o país, via Poder Judiciário, poderá ser um agente de transformação do bem para evitar mortes e a eternização de algumas doenças. Daremos início a uma empreitada visando amenizar a dor de tantas famílias que vêm os seus falecer pela falta de sangue.

Repiso que cada juiz criminal detém, sob sua presidência, todo o campo de labor pertinente e indispensável à execução dessa tarefa nobilíssima, bastando que lidere a introdução da novidade em sua seara contatando os operadores do direito e com eles discutindo a implantação da medida.

Quiçá o Poder Judiciário brasileiro deixe de ser criticado por "n" fatores e passe e receber elogios por se tornar um vetor natural de mutação positiva da saúde brasileira.


BIBLIOGRAFIA

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Sobre o autor
Jayme Walmer de Freitas

Professor da Escola Paulista da Magistratura e de Pós-Graduação no COGEAE da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. Coordenador do 7º Curso de Pós Graduação "Lato Sensu" - Especialização em Direito Processual Penal, da Escola Paulista da Magistratura. Autor das obras Prisão Cautelar no Direito Brasileiro (3ª edição), OAB – 2ª Fase – Área Penal e Penal Especial, na Coleção SOS – Sínteses Organizadas Saraiva vol. 14, pela Editora Saraiva, além de coordenador da Coleção OAB – 2ª Fase, pela mesma Editora. Coautor do Código de Processo Penal Comentado, pela mesma Editora. Colaborador em Legislação Criminal Especial, vol. 6, coordenada por Luiz Flávio Gomes e Rogério Sanches Cunha, pela Editora Revista dos Tribunais. Colaborador em o Tratado Luso-Brasileiro da Dignidade Humana, coordenada por Jorge Miranda e Marco Antonio Marques da Silva, pela Editora Quartier Latin. Colaborador em o Direito Imobiliário Brasileiro, coordenada por Alexandre Guerra e Marcelo Benacchio, pela Editora Quartier Latin. Autor de artigos jurídicos publicados em revistas especializadas e nos diversos sites jurídicos nacionais. Foi Coordenador Pedagógico e professor de Processo Penal, Penal Geral e Especial, por 14 anos, no Curso Triumphus – Preparatório para Carreiras Jurídicas e Exame de OAB, em Sorocaba. Juiz criminal em Sorocaba/SP, mestre e doutor em Processo Penal pela PUC/SP.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

FREITAS, Jayme Walmer. A doação voluntária de sangue como pena restritiva de direitos. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 15, n. 2724, 16 dez. 2010. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/18046. Acesso em: 22 nov. 2024.

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