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O princípio da solidariedade como caminho na obtenção da cidadania plena

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21/12/2010 às 16:01
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6 - Conclusão

A doutrina do contrato social deve ser entendida atualmente como um contrato constitucional devendo estender-se a uma sociedade mundial, de maneira que cada Estado tenha um prestígio mundial garantidor dos direitos fundamentais.

A cidadania tem como pressuposto a igualdade entre todos os membros de uma sociedade, inexistindo privilégios. É necessário, por conseguinte, uma ordem política democrática que a garanta.

A democracia representativa liberal não consegue efetivar a garantia do exercício da cidadania e dos direitos fundamentais a toda a população. Há apenas a defesa do interesse geral possuindo o representante eleito a confianças dos representados.

A crítica a este tipo de democracia surge em duas frentes: alguns autores defendem uma maior participação dos cidadãos nas deliberações do Estado, no que pode ser chamado de Democracia Participativa (Pateman e Macpherson) ou Democracia Deliberativa (Habermas), enquanto outros defendem um maior aprofundamento dos espaços democráticos na sociedade, no que pode ser denominado Democracia Social (Bobbio e Touraine). (SMANIO, p.335)

Há um grande desafio para a implementação desse tipo de democracia integral. Somente dessa forma será possível atingir os fins do Estado de construção de uma sociedade livre justa e solidária.

A cidadania é um princípio geral do direito e todas as políticas públicas a serem desenvolvidas devem ter este norte. A Constituição Federal de 1988 traz previsão expressa de garantias de exercício da cidadania entendida em sentido amplo.

A solidariedade significa o caminho da participação dos cidadãos nas instituições Estatais e na ocupação dos espaços das instituições da sociedade civil.

A importância do Terceiro Setor como nova forma de exercício da cidadania foi demonstrada. É chegado o momento de atacar não apenas os reflexos da pobreza, mas principalmente suas causas.

Ao abordarmos as ações sociais, a única concepção desejada é a de uma ação transformadora, e não um mero paliativo. Espera-se que as ONGs cumpram um papel transformador no sentido de eficiência de políticas públicas.

Para atingir esses fins, as organizações atuam cada vez mais na linha da exemplaridade. Caminham, outrossim, para uma profissionalização técnica e administrativa, com rigor e transparência na prestação de contas. A Lei 9790/99 determina que as entidades sem fins lucrativos adotem práticas de boa governança, a existência de normas de controle e a prestação de contas, sendo possível a realização de auditoria externa independente.

Há uma tendência de fortalecimento do papel articulador das instituições do terceiro setor, em nível nacional e internacional, com a conseqüente consolidação de uma pauta voltada para o social, o aprimoramento das entidades, a institucionalização das redes de comunicação e o amadurecimento de propostas para políticas públicas alternativas.

Faz-se necessária a interação do terceiro setor com o Estado em três graus: prestação de serviços, pressão política e apoio efetivo. O terceiro setor deve também combater o desperdício de recursos e a avaliar os seus resultados práticos.

A situação da carência de políticas públicas básicas é tão calamitosa que até mesmo o Poder Judiciário tem se imiscuído nessa tarefa que não é sua função principal. Em que pese os importantes entendimentos contrários, o ativismo judicial é bem-vindo tendo em vista que a cidadania é questão precípua do Estado e deve ser resguardada de qualquer maneira.

Nos dizeres de Lopes (2006, p.33) em um mundo marcado pela violência e pelo egoísmo, a necessidade da redefinição da cidadania vislumbra-se como um imperativo impostergável, pois, enquanto a cidadania continuar sendo concebida como um "status" restrito à única obrigação política de votar, a desigualdade e a injustiça continuarão caracterizando a sociedade mundial. Somente a partir do momento em que se conceba a cidadania como um direito fundamental individual de todas as pessoas, que exigem uma direta, constante e ampla participação política, poder-se-á afirmar que o caminho para a construção de uma sociedade justa, livre e solidária.

A solidariedade é o único caminho para a obtenção da cidadania plena. Para alguns, pensar na cidadania plena é um mero sonho. Porém, a ação é o caminho da transformação. Parafraseando o eminente Mascaro (2010, p.9) "é um fantasioso, um idealista vulgar ou metafísico aquele que trabalha com o que o mundo em sua realidade não é, e ver fantasiosamente é ver pior. Mas ver exatamente tal qual é, é ver medíocre (...)ver o que é, e do que é o que ainda não é e poderá ser, eis o mais alto do vigor filosófico, porque o que ainda não é já passa então a ser visto pelo filósofo e poderá ser feito na realidade do mundo".


REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA:

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Notas

  1. v.g. Art. 10. É assegurada a participação dos trabalhadores e empregadores nos colegiados dos órgãos públicos em que seus interesses profissionais ou previdenciários sejam objeto de discussão e deliberação; Art. 194 A seguridade social compreende um conjunto integrado de ações de iniciativa dos Poderes Públicos e da sociedade, destinadas a assegurar os direitos relativos à saúde, à previdência e à assistência social, VII - caráter democrático e descentralizado da administração, mediante gestão quadripartite, com participação dos trabalhadores, dos empregadores, dos aposentados e do Governo nos órgãos colegiados; Art. 29 O Município reger-se-á por lei orgânica, votada em dois turnos, com o interstício mínimo de dez dias, e aprovada por dois terços dos membros da Câmara Municipal, que a promulgará, atendidos os princípios estabelecidos nesta Constituição, na Constituição do respectivo Estado e os seguintes preceitos, XII - cooperação das associações representativas no planejamento municipal; Art. 198. As ações e serviços públicos de saúde integram uma rede regionalizada e hierarquizada e constituem um sistema único, organizado de acordo com as seguintes diretrizes: III - participação da comunidade; Art. 204 . As ações governamentais na área da assistência social serão realizadas com recursos do orçamento da seguridade social, previstos no art. 195, além de outras fontes, e organizadas com base nas seguintes diretrizes: II- participação da população, por meio de organizações representativas, na formulação das políticas e no controle das ações em todos os níveis. (Rol Meramente Exemplificativo)
  2. v.g. Leis ns. 7174/83 ; 7298/84; 7353/85; 8242/91;8069/90;8389/91 (rol meramente exemplificativo).
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Sobre o autor
Leandro Pereira Passos

Advogado.Bacharel em Direito pela Universidade Mackenzie.Especialista em Direito da Seguridade Social pela UNISAL.Mestrando em Direito Político e Econômico pela Universidade Mackenzie

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

PASSOS, Leandro Pereira. O princípio da solidariedade como caminho na obtenção da cidadania plena. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 15, n. 2729, 21 dez. 2010. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/18078. Acesso em: 28 mar. 2024.

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