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O controle jurisdicional do mérito do ato administrativo no Estado Democrático de Direito.

Apontamentos para um Direito Administrativo contemporâneo

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14/01/2011 às 18:26
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CONCLUSÃO

Somente com uma renovação consciencial dos valores dos operadores do Direito, inclusive dos juízes, será possível a reformulação axiológica dos valores políticos. Não podemos ficar presos à tradição. Apesar de jovem, a nossa Constituição é promissora e traz compromissos novos, que devemos seguir. O Direito não é algo estanque, ele muda no tempo. É necessário nos adequarmos as suas novas filosofias. É isso que espera a sociedade brasileira, uma reconversão dos nossos valores.

O Estado Democrático busca concretizar direitos que o Liberalismo não soube buscar. A postura omissiva do Judiciário não é mais aceita. Almejamos atuação e influencia no governo, de todas as formas. Não se quer mais juízes meramente procedimentalistas e sim uma jurisdição constitucionalmente voltada ao interesse público e aos direitos humanos. O Judiciário deve poder fiscalizar todos os detalhes dos atos administrativos, eis que a modernidade conferiu-lhe esses direitos, que ele pode e deve usar, apoiado por todas as construções hermenêuticas que vimos. A realização da justiça e dos direitos fundamentais passa também pela jurisdição.

O constitucionalismo democrático permite que, usando os princípios de direito, os magistrados possam ir ao cerne de todos os méritos (inclusive diante de regimentos internos do Congresso Nacional), em todas as áreas do Direito. Por que negar a força do progresso? Porque não reconhecer as novas filosofias do Estado Democrático de Direito? É nesse sentido que reforçamos a nossas teses de que uma jurisdição plena não é local para arbitrariedades, mas sim um meio de garantirmos a preservação dos direitos subjetivos e uma forma de contermos as lesões aos direitos. Democracia pressupõe solidariedade.

Só queremos que os juízes sintam esse sentimento em si mesmos e que, pela Constituição, sigam todos os rumos que considerarem necessários para preservarem a justiça, pois que este é um dos maiores fins do Poder Judiciário, e as luzes da modernidade são meios de fortalecimento das decisões judiciais, em prol dos direitos humanos e de um Estado volvido à proteção contra toda forma de abuso de poder ou excesso administrativo.

Tal é o sentido axiológico da democracia, como uma grande conquista social, capaz de gerar um Poder Judiciário mais próximo da sociedade e mais harmônico com todas as formas legítimas de interesses, buscando a valorização de todos os direitos que constituem o fundamento de dignidade da vida humana e os valores ideais que devemos preservar.

É necessária uma consciência histórica por parte dos magistrados quanto ao que significam a possibilidades da jurisdição constitucional em relação ao direito administrativo. Este artigo não teve como objetivo realizar uma depreciação das decisões judiciais, que merecem todo o nosso respeito. Conforme manifestamos, a jurisdição constitucional é vital para a concretização da democracia. O que buscamos foi demonstrar como o tradicionalismo influi nas sentenças judiciais. A jurisdição constitucional, no domínio da Política e das Leis, é uma das mais belas conquistas da racionalidade humana.

É compreensível e até mesmo natural que a compreensão do direito administrativo ainda esteja ligada à França revolucionária, pois pouco mais de dois séculos se passaram daquela época até hoje. Não queremos negar a esplêndida conquista da liberdade conquistada à força e o valor do Iluminismo. O que é vital é a idéia de que o Liberalismo e o Estado Social vivem no Estado Democrático, que não morreram ou pereceram, que estão tão vivos como nunca, e, para que o Estado evolua, são necessárias novas diretrizes em busca da maximização das garantias sociais.


REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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Notas

  1. O itálico é nosso.
  2. O neoliberalismo se molda como uma doutrina econômica e política que surgiu do liberalismo clássico o capitalismo do século XXI e por isso pretende que o Estado não intervenha nas relações econômicas do mercado, dando liberdade às empresas para que realizem uma livre competição; almeja liberdade comercial e desregulamentação do comércio, de forma a permitir que os sistemas econômicos atuem sem a intervenção da mão do Estado e que não tenham que se submeter aos seus critérios. Com relação a tal doutrina, surge a crítica que a intervenção do Estado deve ser regulada pelo princípio da proporcionalidade, oriundo do constitucionalismo alemão, ou seja, a intervenção do Estado é às vezes necessária para evitar a formação de cartéis e monopólios, pois que a legalização das relações jurídicas comerciais faz com que um maior controle seja feito e os abusos possam ser sanados. O livre jogo da Economia, porém, tenderia facilmente a monopolização do capital em torno das empresas de maior porte, pois que as pequenas não teriam força para competir, e por isso é necessário pensarmos que a intervenção do Estado é necessária, mas também não pode ser excessiva de forma a tolher as liberdades de negociação e troca.
  3. Podemos diferenciar liberdade formal e substancial da mesma forma que se diferencia democracia formal e substancial. A liberdade formal é a liberdade presente em uma declaração de direitos ou em uma Constituição, é um fim do Estado, que almeja cumpri-la; a liberdade substancial é a manifestação concreta dessa liberdade, baseada na relação prática entre os interesses presentes formalmente nas normas jurídicas e suas efetivas aplicações, de forma que é a efetividade de liberdade presente nas normas do Estado, e não a sua mera idealização ou positivação formal. (No mesmo sentido, COPETTI, André, 2000, p.54).
  4. O itálico é nosso.
  5. Se considerarmos que o clero e a nobreza tinham 30% das propriedades, mesmo constituindo 1/50 da população, notaremos que os outros 49/50 da população ficavam com os outros 7 % . Logo, o clero e a nobreza tinham quase 1/3 dos territórios, ou seja, quase 33% das propriedades, mesmo constituindo 1/50 da população (HISTÓRIA VIVA. Uma sociedade paralisada desde o ano mil. São Paulo: Duetto, n. 2, 2004).
  6. O itálico é nosso.
  7. É interessante notarmos que Locke e Rousseau concebiam a importância do Poder Legislativo, mas isso está ainda mais vivo em Locke. Rousseau parece focalizar sua atenção no interesse geral da sociedade e concebe a lei como meio de realizá-lo; Locke focaliza a própria lei como sendo representante a sociedade. Locke justifica as leis com base na idéia do estado de natureza, enquanto Rousseau invoca a própria soberania social, o "pacto social", para fundamentar suas teses.
  8. O itálico é nosso.
  9. BRASIL. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul. Ação ordinária 7003917770. Laércio Foresti e Serviço Autônomo Municipal de Água e Esgoto. Relator: Des. Vasco Della Giustina. 29 de maio de 2002. <http:// www.tj.rs.gov.br/>
  10. O itálico é nosso.
  11. BRASIL. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul. Apelação Cível 70003943016. Marcelo Aquini Fernandes e FUNDATEC. Relator: Wellington Pacheco Barros. 8 de maio de 2002. <http:// www.tj.rs.gov.br/>
  12. O itálico é nosso.
  13. BRASIL. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul. Apelação Cível 70003997426. Sociedade de Ensinos São Aprovados e Estado do Rio Grande do Sul. Relator: Araken de Assis. 8 de maio de 2002. <http:// www.tj.rs.gov.br/>
  14. O itálico é nosso.
  15. O itálico é nosso.
  16. É irrazoável que um Tribunal de Justiça se alegue incapaz de avaliar a justiça, eis que é a onde está a sua função, conforme diz seu próprio nome.
  17. BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Agravo regimental no agravo de instrumento 500. 416-5. Adelino Augusto Pinheiro Pires e Estado do Espírito Santo. Relator: Ministro Gilmar Mendes. 24 de agosto de 2002. <http:// www.stf.gov.br/>
  18. O itálico é nosso.
  19. O itálico é nosso.
  20. O itálico é nosso.
  21. Com isso queremos afirmar que as competências do três poderes existem e são diferentes funcionalmente, mas isso não quer dizer que eles sejam incomunicáveis entre si ou que não possam mutuamente se controlar em seus excessos. O Judiciário é muito mais legítimo para controlar excessos que o Legislativo, por exemplo, em razão do conhecimento do Direito que possuem os magistrados.
  22. Ibid. p. 228. O itálico é nosso.
  23. O itálico é nosso.
  24. O itálico é nosso.
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Sobre o autor
Logan Caldas Barcellos

Advogado. Mestre em Direito Público pela UNISINOS/RS. Especialista em Direito Previdenciário pela Faculdade IDC/RS. Graduado em Direito pela UNISINOS.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

BARCELLOS, Logan Caldas. O controle jurisdicional do mérito do ato administrativo no Estado Democrático de Direito.: Apontamentos para um Direito Administrativo contemporâneo. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 16, n. 2753, 14 jan. 2011. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/18275. Acesso em: 19 abr. 2024.

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