O Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) divulgou, no dia 15 de dezembro de 2010, a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad/2009). No campo "Vitimização e Justiça" os dados colhidos demonstram que o percentual de pessoas de 10 anos ou mais de idade entrevistadas, vítimas de furto ou roubo, atingiu 12,7% da população pesquisada (20,6 milhões de pessoas, do total de 162,8 milhões).
As vítimas de tentativa de roubo ou furto triplicaram de 1,6% para 5,4% da população pesquisada (8,7 milhões de pessoas). Quanto aos furtos e roubos consumados temos: 7,3% da população pesquisada, 11,9 milhões de pessoas. Esse crescimento foi similar em todas as regiões do país.
Quais seriam as razões dessa vitimização em massa? O povo brasileiro seria "mau caráter"? Faltariam lei e ordem? Deficiência na segurança pública? As vítimas estariam negligenciando a segurança dos seus próprios bens? Não estaríamos vivendo um momento de anomalia completa nas nossas relações sociais? Perdemos os valores éticos e morais?
No mundo da ciência do crime (da Criminologia) há muitas teorias que tentam explicar a origem dos delitos. Hoje as teorias mais reputadas são as multifatoriais (Glueck, Mercil, Elliot etc.). Os crimes não derivariam de um único, sim, de múltiplos fatores. Um dos mais relevantes, no que diz respeito aos crimes de furto e de roubo, ao que tudo indica, reside na desigualdade (social e econômica).
Isso é o que estão tentando comprovar dois epidemiologistas britânicos, Richard Wilkinson e Kate Picket, no livro The Spirit Level: Why Greater Equality Makes Societies Stronger – "O nível espiritual: porque uma maior igualdade torna as sociedades mais fortes".
A principal conclusão deles é a seguinte: a desigualdade intensa (étnica, social e econômica), que é percebida como fortemente desarrazoada, contribui para o aumento dos crimes, para o uso de drogas, para o aumento de adolescentes grávidas, para as doenças cardíacas, doenças mentais, mortalidade infantil, obesidade, evasão escolar, aumento dos homicídios, dos policiais, das prisões etc.
No livro eles compararam o País de Gales (um dos mais iguais do planeta) com Chicago (EUA): o número de crimes desta cidade é trinta vezes maior do que o registrado pela polícia no País de Gales.
A desigualdade econômica é brutal (também) nos EUA: 1% dos americanos mais ricos possui, ao todo, mais do que a riqueza total de 90% da população do país. Os números do Brasil são piores. Nossa desigualdade na distribuição de renda é chocante. Consoante a Veja de 29.12.10, p. 47: (a) Coeficiente de Gini, que mede a desigualdade na distribuição de renda: Brasil 56,7, um dos mais desiguais do planeta; (b) IDH, que revela o índice de desenvolvimento humano com base na expectativa de vida, a educação e o PIB per capita: Brasil, 0,699, um dos países menos desenvolvidos do planeta; (c) PIB per capita (em dólares): Brasil, 10.470 (frente aos EUA 47.131).
As pistas dadas pelos dois epidemiologistas carecem de mais estudos, de qualquer modo talvez nunca se tenha abordado a questão da desigualdade tão profundamente. Vale a pena explorar mais o tema da desigualdade, que pode explicar muitos males do nosso país.