4. Considerações finais
A Baixa Idade Média foi um período histórico muito importante para o Direito. O Direito nesse período conseguiu se consolidar como instrumento de ordenação social e se fez presente nos grandes acontecimentos do período. Merece ênfase a sistematização do Direito Canônico, inicialmente pensado para o meio eclesiástico, mas que trouxe grandes influências para o chamado direito laico. Foi um direito que se sedimentou como um direito escrito, catalogado, o que paralelamente também aconteceu com o Direito Romano, segundo alguns, redescoberto na Idade Média.
O Direito Romano se expandiu para grande parte da Europa Medieval, em especial, graças ao trabalho da escola dos glossadores e comentadores. As glosas e os comentários deram a atualização e a adequação do Direito Romano para o período da Baixa Idade Média.
O direito consuetudinário, os costumes, também tiveram importante papel no período, sofrendo também algumas formas de catalogação e compilação, de forma que os costumes eram transcritos em documentos, para que não houvesse dúvida da sua existência. Mais que isso, a Baixa Idade Média também sedimentou a cultura jurídica do common law, o direito baseado em precedentes e na jurisprudência dos tribunais.
As evoluções do direito medieval são fruto, antes de tudo, das intensas modificações sociais e econômicas do período, que assistiu a guerras, ao renascimento das cidades, ao fim do sistema feudal e a crescente hegemonia da Igreja Católica. Tudo isso foi o fermento para uma crescente tendência pelo direito escrito (romano e canônico), talvez os primeiros anseios para a segurança jurídica, para a certeza do direito e para a igualdade de tratamento aos súditos.
Na Baixa Idade Média foram preparadas as bases para a formação dos Estados Nacionais, para a formação de um direito nacional, legitimado pelo poder real e, posteriormente, para os movimentos jusracionalistas dos séculos XVII a XVIII.
Bibliografia
BATISTA NETO, João. História da Baixa Idade Média (1066 a 1453). São Paulo: Editora Ática, 1989.
CAENEGEM, R. C. van. Uma introdução histórica ao direito privado. 2. ed. São Paulo: Martins Fontes, 1999.
GILISSEN, John. Introdução histórica ao direito. 3. ed. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 2001.
GONÇALVES NETO, Alfredo de Assis. Direito de empresa: comentários aos artigos 966 a 1.195 do Código Civil. 2. ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2008.
PAIS, Marco Antonio de Oliveira. O despertar da Europa: a Baixa Idade Média. Coordenação Marly Rodrigues, Maria Helena Simões. São Paulo: Atual, 1992.
PIRENNE, Henri. História econômica e social da Idade Média. 6. ed. São Paulo: Mestre Jou, 1982.
WIEACKER, Franz. História do direito privado moderno. 2. ed. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 1980.
Notas
Marco Antonio Pais assinala que, na verdade, a atividade comercial realizada com moedas acontecia em menor grau, limitada às classes aristocratas na compra de produtos de luxo, como seda, veludo, jóias e armas (PAIS, 1992, p. 3).
Os historiadores afirmam que no ano de 843, através do Tratado de Verdum, o império de Carlos Magno foi dividido entre seus netos, culminando num primeiro esboço de repartiãno foi dividido entre seus netos, culminando num primeiro esboço de repartição política da Europa moderna, porque esta divisão fez nascer os reinos embrionários da França e Alemanha. Sobre o assunto, ver BATISTA NETO, Jônatas. História da Baixa Idade Média (1066 a 1453). Editora Ática, 1989.
Jonatas Batista Neto traz alguns trechos deste documento embrionário das famosas encíclicas: "I – A Igreja romana foi fundada por Deus; II – O pontífice romano é o único que pode, verdadeiramente, ser chamado de universal; VIII – Só o papa pode dispor dos símbolos imperiais; IX – O único homem a quem os príncipes devem beijar os pés é o papa; XII – Só ele pode depor os imperadores; XXII – A Igreja romana nunca errou, e conforme o texto das Escrituras, jamais errará; XXVII – O papa pode libertar os súditos dos juramentos de fidelidade feitos aos príncipes injustos". Chama atenção este último ditado, e se percebe a intenção que o Papa tinha de realmente desestruturar senhoras e príncipes que fossem contrários aos ideais da Igreja, o que se daria através da "libertação" dos servos. Sobre o assunto, ver BATISTA NETO, Jonatas. História da Baixa Idade Média: 1066 a 1453. São Paulo: Editora Ática, 1989.
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Os povos normandos não eram apenas invasores, tendo em vista que também conseguiram desenvolver com êxito o comércio. Veja a seguinte observação de Henri Pirenne: "Entretanto, não devemos apresentar os normandos como meros saqueadores. Senhores do mar, podiam ordenar suas agressões, como efetivamente fizeram. Seu objetivo não era nem podia ser a conquista. O único objetivo a que se propuseram foi estabelecer no continente, assim como nas ilhas britânicas, certos centros de povoamento. Mas as incursões levadas a termo em terra firme apresentam, no fundo, o caráter das grandes razzias, organizadas com um método indiscutível. Elas as iniciam de um campo fortificado que lhe serve de base de operações e em que armazenam as presas conquistadas ao inimigo, em regiões vizinhas, enquanto não chega a ocasião de transportá-las à Dinamarca ou à Noruega. Os vikings são, na realidade, piratas, e sabe-se que a pirataria constitui a primeira etapa do comércio. Isso é tão certo que, desde os fins do século IX, quando deixam de saquear, transformam-se em mercadores" (PIRENNE, Henri. História econômica e social da Idade Média. 6. ed. São Paulo: Mestre Jou, 1982).
Os judeus se dedicaram a este tipo de prática comercial porque não podiam ser proprietários de terras, nem pertencer às guildas e corporações de comerciantes. Mas há relatos de que cristãos e ordens eclesiásticas também se dedicavam à usura. Múnus non parit múnus (dinheiro não procria dinheiro) argumentou Santo Tomás de Aquino. P. 98, BATISTA NETO.
As observações de Franz Wieacker são muito interessantes: "Ao contrário do que acontece com o direito profano, a ordem jurídica da Igreja baseava-se, já na Alta Idade Média, numa tradição salvaguardada pelo uso da escrita, da redacção documental e pela escola. As bases desta tradição eram as fontes escritas e os actos de aplicação do direito da Igreja desde o seu início: a Sagrada Escritura e os padres da Igreja; as decisões dos concílios e dos sínodos; os cânones e as decretais do papa; por fim, as leis imperiais e os capitulares relativos à igreja imperial franca. WIEACKER, Franz. História do direito privado moderno. 2. ed. Fundação Calouste Gulbenkian, 1980, p. 69.
Por exemplo, o Professor Alfredo de Assis Gonçalves Neto. Sua lição é a seguinte: "Com o desenvolvimento comercial entre as diversas cidades soberanas na Baixa Idade Média, exigências de certeza e segurança nas relações comerciais impulsionaram o surgimento das primeiras compilações desse novo direito. Os usos e costumes comerciais, as decisões dos cônsules e os estatutos das corporações forem sendo reunidos em repositórios, formando compilações de grande autoridade entre os povos da época. Dentre elas, destacaram-se, no comércio terrestre, as Consuetudines, de Gênova (1056), o Constitutum Usus, de Pisa (1161) e o Líber Consuetudinum, de Milão (1216)", in Direito de empresa: comentários aos artigos 966 a 1.195 do Código Civil. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2008, p. 44.
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Vale registro as observações de Caenegem: "O entusiasmo que caracterizou o estudo do Corpus iuris, à medida que se estendeu da Itália às várias sociedades do Ocidente, era só uma parte do renascimento cultural mais amplo, de que um dos aspectos foi a fundação de universidades. Além do direito antigo, a filosofia grega (Aristóteles) e a ciência grego-árabe (medicina, física, matemática) foram redescobertas, traduzidas e comentadas. A autoridade do ensino antigo era absoluta; o que as Sagradas Escrituras eram para a teologia, Aristóteles era para filosofia, Galeno para a anatomia e o Corpus iuris para o direito. Mas motivos e necessidades adicionais mantiveram o interesse pelo antigo direito romano: as cidades e os principados em crescimento precisavam de um arcabouço jurídico adaptado às novas estruturas administrativas; e, durante a controvérsia das investiduras, cada lado procurou os argumentos para sustentar sua causa nos textos do Corpus iuris" CAENEGEM, R. C. van. Uma introdução histórica ao direito privado. 2. ed. São Paulo: Martins Fontes, 2000, p. 67.
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