3. PRINCÍPIOS NORTEADORES
Como espécie de processo administrativo, a licitação submete-se não só aos princípios gerais norteadores da Administração pública, consignados expressamente no caput do art. 37 como, implicitamente, aos previstos em outros dispositivos constitucionais, além de ainda observar a princípios próprios, como os preconizados no art. 3º da LLCA, com redação da Lei n° 12.349/2010, in verbis:
Art. 3° - A licitação destina-se a garantir a observância do princípio constitucional da isonomia, a seleção da proposta mais vantajosa para a administração e a promoção do desenvolvimento nacional sustentável e será processada e julgada em estrita conformidade com os princípios básicos da legalidade, da impessoalidade, da moralidade, da igualdade, da publicidade, da probidade administrativa, da vinculação ao instrumento convocatório, do julgamento objetivo e dos que lhes são correlatos.
Aponta-se, assim, como princípios que regem o processo licitatório: a) os princípios expressos no caput do art. 37 da CF/88: legalidade – é o princípio basilar de toda atividade administrativa, constituindo-se na diretriz básica da conduta dos agentes administrativos; o administrador deve observar as regras que o legislador traçou para o processo licitatório, que é totalmente vinculado à lei; impessoalidade – o administrador não pode favorecer este ou aquele interessado, vale dizer, ‘não deve haver fatores de natureza subjetiva ou pessoal interferindo nos atos do processo licitatório’; moralidade administrativa – deve guiar a conduta do administrador público, que deve agir com ética, lealdade e boa-fé, com licitude e sem desvio de finalidade; publicidade – todos os atos deverão ser tornados públicos (o que não significa necessariamente serem publicados na imprensa, a exemplo da carta-convite), desde o início do processo até a contratação eis que não existe licitação sigilosa (art. 21 da LLCA); e, eficiência – deve-se buscar o melhor resultado possível, com qualidade e celeridade; e, b) os princípios constitucionais não expressos bem como os princípios infra-constitucionais, tais como: igualdade de oportunidades entre os licitantes – isonomia entre os licitantes e entre quem pretenda participar do certame, sem privilégios ou discriminações (art. 3º, § 1º, I e II, e art. 90 da LLCA); vinculação ao instrumento convocatório – o edital e a carta-convite constituem ‘lei entre as partes’, pois possuem regras que deverão ser observadas durante o processo licitatório e nortearão o futuro contrato, vinculando a Administração e os licitantes; sua inobservância conduz à nulidade do processo (art. 41 c/c art. 48, I da LLCA); julgamento objetivo – corolário do princípio da vinculação ao instrumento convocatório; regras prévias, objetivas, claras e induvidosas (art. 45); procedimento formal – obediência ao rito e fases estabelecidas em lei; impõe a vinculação da licitação às normas legais pertinentes em todas as fases licitatórias (art. 4º e PU da LLCA); competitividade – correlato ao princípio da igualdade, é decorrente do princípio da isonomia; a Administração não pode criar regras que comprometam o caráter competitivo da licitação (art. 3°, §3°, I da LLCA); padronização - as aquisições deverão, sempre que possível, utilizar padrões previamente fixados; deverá haver compatibilidade de especificações técnicas e de desempenho, observadas, quando for o caso, as condições de manutenção, assistência técnica e garantia oferecidas (art. 15, I da LLCA); contraditório e ampla defesa – princípio basilar nos processos judiciais e administrativos (art. 5º, LV/CF; § 3º, art. 49 e art. 87 da LLCA); sigilo na apresentação das propostas – assegurando a competitividade e a igualdade entre os licitantes (arts. 93 e 94/LLCA); adjudicação compulsória ao vencedor – se a Administração contratar, deverá contratar o vencedor, adjudicatário; livre concorrência – princípio que complementa o da "livre iniciativa", significa o direito de competir, garantido a igualdade de oportunidades a todos os licitantes; e os ‘princípios correlatos’ (art. 3º da LLCA, ‘in fine’).
4.OBRIGATORIEDADE DE LICITAR
A regra geral no Estado brasileiro é a obrigatoriedade de proceder à licitação para que possa contratar obras, serviços, compras e alienações, conforme estipula o inciso XXI do art. 37 da CF/88, conforme anteriormente já dito. Entretanto, o próprio legislador constituinte previu a possibilidade de, em caráter excepcional, nos termos do disposto em lei, ocorrer a dispensa ou a inexigibilidade do certame licitatório. Assim, repita-se, salvo essas exceções, a Administração, para contratar tais objetos, deverá obrigatória e previamente proceder a uma licitação pública.
E são obrigados a licitar, nos termos da LLCA: a) os entes da Administração Direta, que compreende os entes federativos União, Estados membros, Municípios e Distrito Federal, atingindo também todos os órgãos administrativos dos Poderes Judiciário e Legislativo, dos Tribunais de Contas e do Ministério Público (art. 37, XXI c/c art. 22, XXVII da CF/88 e art. 117 e 118 da LLCA); b) o entes da Administração Indireta, compreendendo as Autarquias, Fundações Públicas, Empresas Públicas e Sociedades de Economia Mista (inciso XXI do art. 37 da CF/88), sendo que estas duas últimas e suas subsidiárias, quando exploradoras de atividade econômica, poderão ter um estatuto próprio de licitação, conforme art. 173, § 1º da CF/88 e art. 1º, PU e art. 119 da LLCA; c)os fundos especiais e entidades controladas direta ou indiretamente pelas pessoas federativas, nos termos do parágrafo único do art. 1º c/c art. 119 da LLCA; neste caso encontram-se, por exemplo, os Serviços Sociais Autônomos (SENAC, SENAI, SESC, etc), dentre outros.
4.1.Exceções à obrigatoriedade de licitar
Conforme referido, são duas as hipóteses em que a Administração pública pode contratar diretamente, sem proceder à seleção prévia e que, portanto, constituem exceções à regra da obrigatoriedade de licitar: a) dispensa (podendo haver a licitação dispensada e a licitação dispensável) e; b) inexigibilidade.
4.1.1.Dispensa de licitação
Admite-se a possibilidade de dispensa de licitação quando, apesar de viável, há inconveniência, ou não é oportuno, realizá-la. Dispõe sobre a dispensa os arts. 17 e 24 da Lei n° 8.666/93 - LLCA. São as hipóteses legais em que a Administração pública pode realizar a licitação ouoptar por dispensá-la, procedendo a uma ‘contratação direta’.
Mesmo que se encontre em possibilidade legal de dispensa o administrador, em regra, não é obrigado a dispensar uma licitação; geralmente a dispensa é determinada em razão do valor, de situações excepcionais (greve, grave perturbação da ordem, emergência ou calamidade pública, quando não há interessados habilitados, etc), do objeto ou da pessoa.
Por outro lado, o que se dispensa é só o certame, o procedimento de escolha da melhor proposta. Deverá, entretanto, formalizar-se um processo administrativo caracterizando a dispensa, adequada à hipótese da lei, em que será verificada a personalidade jurídica, a capacidade técnica, a idoneidade financeira e a regularidade fiscal do futuro contratado, o empenho prévio, o instrumento de contrato, a publicação, etc. Ademais, o administrador não pode ampliar os casos de dispensa, que são hipóteses taxativas na lei, e também é defeso ao legislador ordinário estabelecer arbitrariamente outras hipóteses de dispensa de licitação.
Segundo entendimento de Alexandre de Moraes, a Constituição Federal exige dois fundamentos para que possa haver dispensa do certame licitatório: "saber se o fato se ajusta à previsão taxativa da legislação ordinária ou se presente a urgência e, uma vez existente a citada adequação, se há conveniência e oportunidade da Administração para o afastamento do procedimento licitatório".[2006, p.154]
Mister também distinguir a licitação dispensada da licitação dispensável.
Na licitação dispensada a Administração pública não está obrigada a licitar, podendo (e para alguns "devendo") contratar diretamente; são as hipóteses enumeradas no art. 17, I e II, e §§ da LLCA, referente à alienação de bens imóveis e móveis. De fato, nesta hipótese de licitação dispensada a lei determina que a Administração não procederá à licitação, logo, entende-se que o certame é "compulsoriamente" dispensado nos termos da lei:
Já na licitação dispensável deve-se observar as hipóteses taxativamente enumeradas no art. 24 da Lei n° 8.666/93 - LLCA, o que implica em afirmar que as leis estaduais, distritais e municipais não poderão acrescentar qualquer outra hipótese; destacam-se as contratações de pequeno valor, contratações por emergência ou calamidade, a licitação fracassada (nenhum licitante foi habilitado ou todos foram desclassificados) e a licitação deserta (não houve interessados, ninguém compareceu).
Diferencia-se, portanto, a licitação dispensável da licitação dispensada pela faculdade da Administração pública, na dispensável, em optar por proceder ou não ao certame. Assim, na licitação dispensável a lei não dispensa automaticamente, mas considera ser possível sua dispensa. O art. 24 da LLCA enumera trinta e uma (31) possibilidades da licitação ser dispensável, tendo o inciso XXXI sido incluído pela Lei n° 12.349/2010 (conversão da MP n° 465/2010).
4.1.2.Inexigibilidade de licitação
Por outro lado, ocorre a inexigibilidade de licitação quando houver inviabilidade de competição, conforme hipóteses previstas, exemplificativamente, nos incisos I, II e III do art. 25 da LLCA: "I - para aquisição de materiais, equipamentos, ou gêneros que só possam ser fornecidos por produtor, empresa ou representante comercial exclusivo, vedada a preferência de marca, devendo a comprovação de exclusividade ser feita através de atestado fornecido pelo órgão de registro do comércio do local em que se realizaria a licitação ou a obra ou o serviço, pelo Sindicato, Federação ou Confederação Patronal, ou, ainda, pelas entidades equivalentes; II - para a contratação de serviços técnicos enumerados no art. 13 desta Lei, de natureza singular, com profissionais ou empresas de notória especialização, vedada a inexigibilidade para serviços de publicidade e divulgação; III - para contratação de profissional de qualquer setor artístico, diretamente ou através de empresário exclusivo, desde que consagrado pela crítica especializada ou pela opinião pública".
Também neste caso é pacífico o entendimento de que leis estaduais, municipais ou distritais não poderão acrescentar qualquer outra hipótese de inexigibilidade. Não são hipóteses taxativas, mas é de competência restrita à União indicá-las.
Vale trazer a respeito as preciosas palavras de Alexandre de Moraes quando afirma que "diferentemente da dispensa de licitação, ocorrerão as hipóteses de inexigibilidade quando houver impossibilidade jurídica de competição entre os diversos contratantes, seja pela específica natureza do negócio, seja pelos objetivos visados pela Administração Pública. (…). Na inexigibilidade, há inviabilidade da licitação por impossibilidade do processo de competição entre os participantes, seja por inexistir pluralidade de particulares aptos a fornecer produtos ou serviços à Administração Pública, seja por inexistirem produtos ou serviços diversos e inconfundíveis aptos a satisfazer, de modo equivalente, os interesses públicos". [2006, pp.154-155]
Assim, resume-se ainexigibilidade aos casos de: a) compras de materiais, equipamentos ou gêneros fornecidos com exclusividade, sendo vedada a preferência de marca; essa exclusividade deverá ser comprovada através de atestado de órgão competente (em concorrência, relativa a âmbito nacional; em tomada de preço, âmbito local; em convite, referente à praça o localidade da contratação); b) contratações de serviços técnicos (art. 13/LLCA), de natureza singular, com profissionais de notória especialização, exceto em serviços de publicidade; deverão ser serviços técnicos especializados, gravados de complexidade, essencialidade, relevância e indispensabilidade; c) contratação de profissionais do setor artístico, desde que detenha aceitação pela crítica e pela opinião pública.
Importa observar o que dispõe o art. 26 da LLCA, inclusive seu parágrafo único, quando determina que em certas hipóteses do processo de dispensa (§§ 2° e 4° do art. 17 e no inciso III e seguintes do art. 24), de inexigibilidade (art. 25) ou de retardamento (final do parágrafo único do art. 8°) serão eles instruídos, no que couber, com os elementos que caracterizem a situação emergencial ou calamitosa que justifique a dispensa, quando for o caso, a razão da escolha do fornecedor ou executante e a justificativa do preço, bem como de documento de aprovação dos projetos de pesquisa aos quais os bens serão alocados.