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O parágrafo único do artigo 79 da Constituição Federal e o vice-presidente da República

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25/03/2011 às 10:05
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6. Direito Comparado

Para não abusar demais da atenção dos leitores, faz-se aqui a análise sob o viés do Direito Comparado apenas em relação a um modelo republicano muito próximo ao brasileiro: o dos Estados Unidos da América [68], em que o Vice-Presidente da República possui atribuições no artigo 1º, seção I, e na emenda XXV, de 1967:

"ARTIGO II"

"Seção 1"

"O Poder Executivo será investido em um Presidente dos Estados Unidos da América. Seu mandato será de quatro anos, e, juntamente com o Vice- Presidente, escolhido para igual período, será eleito pela forma seguinte:"

"Cada Estado nomeará, de acordo com as regras estabelecidas por sua Legislatura, um número de eleitores igual ao número total de Senadores e Deputados a que tem direito no Congresso; todavia, nenhum Senador, Deputado, ou pessoa que ocupe um cargo federal remunerado ou honorifico poderá ser nomeado eleitor."

"(Os eleitores se reunirão em seus respectivos Estados e votarão por escrutínio em duas pessoas, uma das quais, pelo menos, não será habitante do mesmo Estado, farão a lista das pessoas votadas e do número dos votos obtidos por cada um, e a enviarão firmada, autenticada e selada à sede do Governo dos Estados Unidos, dirigida ao presidente do Senado. Este, na presença do Senado e da Câmara dos Representantes, procederá à abertura das listas e à contagem dos votos. Será eleito Presidente aquele que tiver obtido o maior número de votos, se esse número representar a maioria do total dos eleitores nomeados. No caso de mais de um candidato haver obtido essa maioria assim como número igual de votos, a Câmara dos Representantes elegerá imediatamente um deles, por escrutínio, para Presidente, mas se ninguém houver obtido maioria, a mesma Câmara elegerá, de igual modo, o Presidente dentre os cinco que houverem reunido maior número de votos. Nessa eleição do Presidente, porém, os votos serão tomados por Estados, cabendo um voto à representação de cada Estado. Para se estabelecer quorum necessário, deverão estar presentes um ou mais membros dois terços dos Estados. Em qualquer caso, eleito o Presidente, o candidato que se seguir com o maior número de votos será o Vice-Presidente. Mas, se dois ou mais houverem obtido o mesmo número de votos, o Senado escolherá dentre eles, por escrutínio, o Vice- Presidente." [69]

"O Congresso pode fixar a época de escolha dos eleitores e o dia em que deverão votar; esse dia deverá ser o mesmo para todos os Estados Unidos."

"Não poderá ser candidato a Presidente quem não for cidadão nato, ou não for, ao tempo da adoção desta Constituição, cidadão dos Estados Unidos. Não poderá, igualmente, ser eleito para esse cargo quem não tiver trinta e cinco anos de idade e quatorze anos de residência nos Estados Unidos."

"No caso de destituição, morte, ou renúncia do Presidente, ou de incapacidade para exercer os poderes e obrigações de seu cargo, estes passarão ao Vice-Presidente. O Congresso poderá por lei, em caso de destituição, morte, renúncia, ou incapacidade tanto do Presidente quanto do Vice-Presidente, determinar o funcionário que deverá exercer o cargo de Presidente, até que cesse o impedimento ou seja eleito outro Presidente."

"Em épocas determinadas, o Presidente receberá por seus serviços uma remuneração que não poderá ser aumentada nem diminuída durante o período para o qual for eleito, e não receberá, durante esse período, nenhum emolumento dos Estados Unidos ou de qualquer dos Estados."

"Antes de entrar no exercício do cargo, fará o juramento ou afirmação seguinte: 'Juro (ou afirmo) solenemente que desempenharei fielmente o cargo de Presidente dos Estados Unidos, e que da melhor maneira possível preservarei, protegerei e defenderei a Constituição dos Estados Unidos."

(...)

"EMENDA XXV"

"Seção 1"

"Em caso de destituição do Presidente do cargo, ou por sua morte ou renúncia, o Vice-Presidente será o Presidente."

"Seção 2"

"Quando ocorrer a vacância do cargo de Vice-Presidente, o Presidente nomeará um Vice-Presidente, que deverá tomar posse após ser confirmado pela maioria de votos de ambas as Casas do Congresso."

"Seção 3"

"Quando o Presidente transmitir ao Presidente pro tempore do Senado e ao Presidente da Câmara dos Deputados sua declaração por escrito de que se encontra impossibilitado de exercer os poderes e os deveres de seu cargo, e até que ele lhes transmita uma declaração em contrário, por escrito, tais poderes e deveres deverão ser exercidos pelo Vice-Presidente como Presidente Interino."

"Seção 4"

"Quando o Vice-Presidente e a maioria dos principais funcionários dos departamentos executivos, ou de outro órgão como o Congresso possa por lei designar, transmitir ao Presidente pro tempore do Senado e ao Presidente da Câmara dos Deputados sua declaração por escrito de que o Presidente está impossibilitado de exercer os poderes e os deveres de seu cargo, o Vice-Presidente deverá assumir imediatamente os poderes e os deveres do cargo, como Presidente Interino."

"Conseqüentemente, quando o Presidente transmite ao Presidente pro tempore do Senado e ao Presidente da Câmara dos Deputados sua declaração por escrito de que não existe incapacidade, ele reassumirá os poderes e os deveres de seu cargo, a menos que o Vice-Presidente e a maioria dos principais funcionários do departamento executivo ou de outro órgão como o Congresso venha por lei designar, comunicar dentro de quatro dias ao Presidente pro tempore do Senado e ao Presidente da Câmara dos Representantes sua declaração por escrito de que o Presidente está impossibilitado de exercer os poderes e os deveres de seu cargo. Imediatamente o Congresso decidirá a respeito, reunindo-se dentro de 48 horas com esta finalidade, se não estiver em sessão. Se o Congresso, dentro de 21 dias após ter recebido a última declaração por escrito, ou, se o Congresso não estiver em sessão, dentro de 21 dias após o Congresso ser convocado, decidir por dois terços dos votos de ambas as Casas que o Presidente está impossibilitado de exercer os poderes e os deveres de seu cargo, o Vice-Presidente continuará a exercer os mesmos direitos e deveres como Presidente Interino; em caso contrário, o Presidente reassumirá os poderes e os deveres de seu cargo." (grifamos)

Como bem ensina Pinto Ferreira [70]:

"II – O VICE-PRESIDENTE NOS EUA"

"O Vice-Presidente nos EUA torna-se Presidente quando o cargo advém vago. É o Presidente do Senado(…) Todavia não é membro do Senado: simplesmente preside as suas sessões."

Quanto a esses preceitos a Lei Fundamental Norte-Americana, os doutos Anselmo Prieto Alvarez e Wladimir Novaes Filho [71] relacionam-nas às disposições dos artigos 79 e 80 da nossa Carta Magna atual.

7. Conclusão

Em suma, Vice-Presidente da República é o cargo de mandato eletivo federal que visa a substituir ou suceder o de Presidente da República. Possui bandeira-insígnia, acomoda-se em gabinete próprio, com chefia e assessorias e ajudância de ordem, com segurança pessoal, de familiares e de residências (a oficial no Palácio do Jaburu) realizada pelo Gabinete de Segurança Institucional da Presidência da República. Na Constituição da República de 1988 este agente político possui como atribuições:

1.Substituto do Presidente da República (art. 79, "caput");

2.Sucessor do Presidente da República (art. 80);

3.Auxiliar do Presidente da República, quando convocado para missões especiais (art. 79, parágrafo único, 2ª parte);

4.Membro nato do Conselho da República (art. 89, I);

5.Membro nato do Conselho de Defesa Nacional (art. 91, I); e

6.Outras atribuições regulamentadas por lei complementar (art. 79, parágrafo único, 1ª parte).

Em relação a essas últimas atribuições, foram apresentados dois projetos de lei complementar do Senado Federal nº 137, de 1993, e nº 71, de 1997, de iguais teor e justificativas, de autoria do então Senador Júlio Campos, propondo:

- atuar como conselheiro do Presidente da República quanto a projetos do Governo e a quaisquer assuntos referentes à administração pública federal;

– manter o Presidente informado dos assuntos relevantes de que tiver conhecimento;

– buscar estar sempre atualizado e familiarizado com os negócios da Nação, de modo a poder preparar-se para a tomada de decisões, caso venha a substituir o Presidente da República, temporária ou definitivamente;

– representar o Presidente em atos ou cerimônias, sempre por ele indicado;

- assessorar o Presidente no estudo e preparação da mensagem e plano de governo a serem encaminhados ao Congresso Nacional, nos termos do art. 84, inciso XI, da Constituição; e

– sugerir ao Presidente a adoção de medidas que julgue indispensáveis à segurança do estado.

No entanto, ambas foram arquivadas: a primeira pelo final da legislatura; e a segunda pela rejeição do projeto em parecer opinando que seriam todas prerrogativas e sujeições de senso comum, porém sem caráter impositivo, quando deveria ter, criando uma "inconsistência jurídica". O então relator Senador Epitácio Cafeteira rejeitou sem emendas nem substitutivos.

A comissão especial da Câmara Federal (GECONSTI), nas palavras do Deputado Cândido Vaccarezza, entendeu que "A atribuição de novas funções ao Vice-Presidente da República é matéria mais afeita ao juízo de conveniência do Chefe do Poder Executivo e ao seu plano de governo, de forma que tal matéria não figura entre as que demandam regulamentação urgente da Câmara dos Deputados." Conclui Régis de Oliveira que "O art. 79, parágrafo único, trata de matéria mais afeita ao juízo de conveniência do chefe do Poder Executivo e ao seu plano de governo."

Reproduzindo o texto do artigo 79, § 2º, da Constituição de 1967 e do artigo 77, § 2º, da emenda constitucional nº 1, de 1969, esse preceito constitucional carecendo ainda de regulamentação evita a acumulação com o cargo de Presidente do Senado Federal ou do Congresso Nacional, de Cartas Políticas de 1946 e 1967.

É fato que a regulamentação dessas últimas atribuições ainda não foi aprovada, descartando-se para essa finalidade, as leis complementares nº 64, de 1990 e alterações posteriores (inelegibilidades), e a de nº 90, de 1997 (sobre o Conselho de Defesa Nacional).

Relembrando, La Pepa e a Constituição do Império não havia Presidente e Vice-Presidente da República. As Constituições Federais de 1891 e suas duas emendas (além da publicada pela lei nº 510, de 1890), de 1946 até a emenda nº 3, de 1961, de 1967 e suas emendas (até a nº 1, de 1969) e a atual de 1988 cuidam do Presidente e Vice-Presidente da República. E as Cartas de 1934 e de 1937 não previam o cargo de Vice-Presidente da República, mas o Presidente Provisório.

A PEC 32, de 2006, do Senado Federal, reiterando a de n. 354, de 1996, da Câmara dos Deputados, buscou alterar o artigo 79 da atual Lei Maior, mas buscou suprimir a figura do Vice-Presidente da República, ocorrendo-se não mais a dupla vacância, mas a "vacância singular". Ainda no Senado, das três PECs sobre parlamentarismo sob a égide da Constituição Federal de 1988, uma (nº 31, de 2007) busca extinguir o cargo de Vice-Presidente e outra tem por finalidade mantê-lo (nº 7, de 2004). Já na Câmara dos Deputados, das treze PECs sobre parlamentarismo na atual ordem constitucional, quatro (nº 282, de 2004; nº 20, de 1995; nº 55, de 1990; e nº 12, de 1989) visavam a extinguir o cargo de Vice-Presidente e uma (nº 24, de 1989) objetiva manter a Vice-Presidência da República apesar de propor a revogação do atual artigo 79.

Em modelo republicano muito próximo ao brasileiro, nos Estados Unidos da América, o Vice-Presidente da República possui atribuições no artigo II, seção 1, e na emenda XXV, de 1967, onde é o Presidente do Senado.

Em momento de Reforma Política urge dar maior significação ao cargo de Vice-Presidente da República, regulamentando o dispositivo constitucional aqui analisado.

Ao invés da iniciativa parlamentar, para evitar questionamentos na Suprema Corte, convém que a augusta Presidência da República envie à Câmara dos Deputados projeto de lei complementar regulamentando as atribuições adicionais ao Presidente da República, porquanto a matéria seja mais afeita às suas atribuições. Não poderia ser por medida provisória (artigo 62, § 1º, III, da Constituição Federal). Também não poderia ser um rol taxativo, mas exemplificativo. Importante destacar que, durante as viagens do Presidente da República, este ainda continuaria no cargo, sendo salutar definir os poderes dos substitutos eventuais, como o Vice-Presidente, no exercício da Presidência.

À guisa de semelhança com a posição majoritária do Congresso Nacional e da augusta Presidenta na lei nº 12.382, de 25 de fevereiro de 2011 (lei do salário mínimo), o texto da lei poderia remeter a matéria à regulamentação presidencial, neste caso, decreto.

Salutar seria definir se o Vice-Presidente da República, em face do artigo 37, incisos XI e XVI, da Constituição Cidadã, poderia cumular cargos como o de Ministro de Estado (atendidos os requisitos do artigo 87), desde com compatibilidade de horários e limitação do subsídio ao de Ministro do Supremo Tribunal Federal, pois não existe vedação desde a Constituição Federal de 1891 (artigo 50, "caput"). Ilustra o Ex-Vice-Presidente da República, José Alencar, que também foi simultaneamente Ministro da Defesa. O exercício do magistério ou docência também poderia ser autorizado.

As vedações poderiam remeter-se aos artigos 37 e 38 da Constituição Federal, sob pena de infração político-administrativa ou crime de responsabilidade (arts. 51, I, e 52, I e parágrafo único, e 85, todos da Carta Magna). O exercício da advocacia deveria ser expressamente proibida, reforçando o comando do inciso I do artigo 28 da lei federal nº 8.906, de 4 de julho de 1994 (Estatuto da OAB e da Advocacia).

Finalizando, o projeto de lei complementar visando a regulamentar o artigo 79, parágrafo único, poderia contemplar todos esses aspectos aqui apontados, visando aprimorar o instituto da Vice-Presidência da República.


Bibliografia

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Sobre os autores
Marcia Yamada

Especialista em Direito Constitucional e Direito Municipal pelo LFG-Unisul.

Luiz Negrão

Especialista em Direito Público pela Escola Paulista de Direito (EPD).

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

YAMADA, Marcia ; NEGRÃO, Luiz. O parágrafo único do artigo 79 da Constituição Federal e o vice-presidente da República. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 16, n. 2823, 25 mar. 2011. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/18773. Acesso em: 22 nov. 2024.

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