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Thomas Kuhn e o novo paradigma da responsabilidade civil.

Em busca da reparação da perda de uma chance

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28/03/2011 às 12:36
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3 RESPONSABILIDADE CIVIL: CONSIDERAÇÕES GERAIS

O ser humano tem a liberdade de agir de acordo com a sua consciência, mas, ao mesmo tempo, tem o dever de respeitar os limites impostos pela sociedade. Sendo assim, essa liberdade é limitada não só pela noção de certo e errado decorrente da consciência, mas também das normas estabelecidas e impostas pela coletividade.

A responsabilidade civil nasce da violação dos limites impostos a liberdade humana, sendo imputado, aquele que gera danos ao direito de outrem ou a quem a lei impõe a responsabilidade, o deve de reparar o dano causado em toda a sua integralidade.

Sendo um instituto do direito Civil que está inserido no direito obrigacional, que se diferencia da obrigação por ser um dever sucessivo que nasce do descumprimento obrigacional, pela desobediência de uma regra estabelecida em um contrato, ou por deixar, determinada pessoa, de observar um preceito normativo que regula a vida, enquanto a obrigação é um dever jurídico originário.

Ao longo do tempo o instituto da responsabilidade civil sofreu diversas alterações, principalmente quanto aos seus elementos essenciais. Valendo destacar, dentre as alterações absorvidas pelo Ordenamento Jurídico Pátrio, que, enquanto o Código Civil de 1916 adotava a responsabilidade civil subjetiva como regra, o Código Civil de 2002 prestigia a responsabilidade objetiva, sendo retirada, desta forma, a culpa dos rol de elementos essências.

A culpa é apresentada por Pablo Stolze Gagliano e Rodolfo Pamplona Filho como elemento acidental da responsabilidade civil, afirmando os autores que:

[…], a culpa (em sentido lato, abrangente do dolo) não é, em nosso entendimento, pressuposto geral da responsabilidade civil, sobretudo no novo Código, considerando a existência de outra espécie de responsabilidade, que prescinde desse elemento subjetivo para a sua configuração ( a responsabilidade objetiva) [27].

Desta forma, responsabilidade civil apresenta três elementos essenciais, sendo eles a conduta humana, o dano e o nexo de causalidade, e como elemento acidental a culpa. Sendo necessária a comprovação, por parte de quem busca a reparação do dano sofrido, destes elementos.

Quanto a conduta humana, esta apresenta como núcleo fundamental a voluntariedade, "que resulta exatamente da liberdade de escolha do agente imputável, com discernimento necessário para ter consciência daquilo que faz". Pode ser positiva, que é a prática de um comportamento positivo, de uma ação, ou negativa, que é a omissão voluntária [28].

Passando para a análise do dano, este é conceituado por Pablo Stolze Gagliano e Rodolfo Pamplona Filho como sendo "a lesão a um interesse jurídico tutelado – patrimonial ou não - , causado por ação ou omissão do sujeito infrator" [29].

O dano apresenta como requisitos para ser indenizável a certeza e atualidade. Afirmando Carlos Roberto Gonçalves [30], quanto ao requisito certeza, que:

O requisito "certeza" do dano afasta a possibilidade de reparação do dano meramente hipotético e eventual, que poderá não ser concretizado. Tanto assim que, na apuração dos lucros cessantes, não basta a simples possibilidade de realização do lucro, embora não seja indispensável a absoluta certeza de que este se teria verificado sem a interferência do evento danoso. O que deve existir é uma probabilidade objetiva que resulte do curso normal das coisas, como se infere do adverbio "razoavelmente", colocado no art. 402 do Código Civil ("o que razoavelmente deixou de lucrar"). Tal advérbio não significa que se pagará aquilo que for razoável (ideia quantitativa) e sim que se pagará se se puder, razoavelmente, admitir que houve lucro cessante a idéia que se prende à existência mesma do prejuízo.

Partindo para a conceituação do nexo de causalidade, este é "o vínculo, a ligação ou relação de causa e efeito entre a conduta e o resultado". Por meio da análise do nexo de causalidade que se chega a conclusão de quem foi o causador do dano [31].

Ainda quanto ao nexo de causalidade, no ordenamento jurídico Pátrio, em especial o Código Civil vigente, determina que apenas as perdas e danos, que abrangem o que efetivamente perdeu com o que razoavelmente deixou de lucrar, direitos e imediatos devem ser indenizados, conforme se extrai da leitura do artigo 403, "in verbis":

Art. 403. Ainda que a inexecução resulte de dolo do devedor, as perdas e danos só incluem os prejuízos e os lucros cessantes por efeito dela direto e imediatamente, sem prejuízo do disposto na lei processual.

Cumpre destacar que tal exigência também estava prevista no Código Civil anterior, em seu artigo 1060 [32], e a partir da análise deste dispõe Mário Moacyr Porto [33] que "a exigência de que o dano deve ser direito e imediato significa que é imprescindível a constatação de uma relação de causa e efeito entre o prejuízo e o fato que lhe deu lugar". Afirmando ainda que "desnecessário acrescentar que o prejuízo futuro é indenizável, desde que certo".

Quanto a culpa, afirma Anderson Schreiber:

A demonstração da culpa libertou-se, ao longo dos últimos anos, de muitos de seus tormentos originais. A transformação vivida no âmbito da própria responsabilidade subjetiva corroboram tal constatação. A proliferação das presunções de culpa, as alterações no método de aferição da culpa, a ampliação dos deveres de comportamento em virtude da boa-fé objetiva, e outros expedientes semelhantes vem contribuindo, de forma significativa, para a facilitação da prova da culpa, hoje não mais uma probatio diabolica [34].

Anderson Schreiber afirma que o estágio atual da responsabilidade civil pode ser descrito como um momento de erosão dos filtros tradicionais da reparação, "isto é, da relativa perda de importância da prova da culpa e da prova do nexo de causal como obstáculos ao ressarcimento dos danos na dinâmica das ações de ressarcimento" [35].

Contudo, as mudanças que ocorreram nos elementos que devem ser comprovados para que ocorra a reparação pode ser visto como a mudança do paradigma na responsabilidade civil e, com isso, uma revolução científica, ou apenas algumas mudanças dentro do paradigma da ciência normal decorrente de de resolução de quebra-cabeças.

O que se buscará no item seguinte é tentar responder este questionamento, com foco nas alterações sofridas por estes elementos para que ocorra a reparação por perda de uma chance.


4.RESPONSABILIDADE CIVIL POR PERDA DE UMA CHANCE E OS PROBLEMAS DO NOVO PARADIGMA;

O sistema da responsabilidade civil consagrado pelas grandes codificações ancorava-se em três pilares, que são a culpa, o dano e no nexo de causalidade. De tal maneira, a vítima de um dano, para que tivesse este ressarcido precisava, além de evidenciar seus prejuízos, superar duas sólidas barreiras para obter a indenização, sendo elas a demonstração da culpa do ofensor e a demonstração do nexo de causalidade entre a conduta culposa do ofensor e o dano [36].

Conforme destacado no item anterior, o rompimento de uma dessas barreiras, sendo a da comprovação da culpa, se dá com a responsabilidade objetiva, onde não se cogitará se a conduta foi dolosa, negligente, imprudente ou decorrente de imperícia, pois a simples verificação do evento danoso, juntamente com a comprovação do nexo de causalidade, basta para que se configure a responsabilidade civil e o decorrente dever de indenizar.

Contudo, no caso da perda de uma chance, durante um longo período, mesmo após superado o obstáculo criado pela comprovação da culpa ou diante da sua dispensa, as outras duas barreiras existentes demonstravam-se intransponíveis, quais sejam, demonstração de um dano efetivo e do nexo de causalidade.

Com isso, nos casos em que o dano era decorrente da perda da chance, com a privação da vítima, a partir de um ato de terceiro, da chance de obter alguma vantagem ou de ter evitado um prejuízo, com o paradigma vigente na Responsabilidade Civil, os danos eram suportados pela própria vítima

Colocando-se a doutrina e a jurisprudência em face de um novo problema a ser resolvido, qual seja a superação dos moldes tradicionais de dano e nexo de causalidade, para que desta forma ocorra a reparação da perda de uma chance.

Valendo ressaltar que, conforme dispõe Rafael Peteffi da Silva [37], a aplicação clássica dos conceitos de dano reparáveis e nexo de causalidade fariam com que os prejuízos, cujas causas não poderiam ser imputadas a um sujeito de direito, fossem suportadas pela vítima. Nesse sentido, sempre que o magistrado não possuísse a convicção de que algum sujeito de direito houvesse causado determinado dano, nenhuma reparação seria conferida.

Neste diapasão, afirma Sérgio Savi [38]:

Durante muito tempo, o dano decorrente da perda desta oportunidade de obter uma vantagem ou de evitar um prejuízo foi ignorado pelo Direito. Como não era possível afirmar, com certeza, que, sem o ato ofensor, a vantagem seria obtida, ignorava-se a existência de um dano diverso da perda da vantagem esperada, qual seja o dano da perda da oportunidade de obter aquela vantagem.

Conforme entendimento do autor supramencionado, em decorrência do desenvolvimento do estudo das estatísticas e probabilidades, hoje é possível predeterminar, com uma aproximação mais que tolerável, o valor de um dano que inicialmente parecia entregue à própria sorte, a ponto de poder considerá-lo um valor normal, dotado de certa autonomia em relação ao resultado definitivo.

Com isso, para que fosse possível a reparação dos danos decorrentes da perda de uma chance foi necessário a superação do paradigma vigente na responsabilidade civil, em especial quanto aos contornos dos elementos que devem ser comprovados para que fosse possível a reparação, quais sejam, o dano e o nexo de causalidade.

De posse dos conceitos fundamentais para a compreensão da teoria de Thomas Kuhn [39], pode ser afirmado que a impossibilidade de reparação dos danos decorrentes da perda de uma chance por meio do paradigma vigente na responsabilidade civil não se trata apenas de um quebra-cabeça, já que não encontrou solução dentro deste paradigma, mas sim de uma anomalia.

Vendo a responsabilidade civil como a ciência normal apresentada por Thomas Kuhn, com o surgimento da citada anomalia foi estabelecido um momento de crise, que só chegaria ao fim com a emergência de um novo paradigma [40].

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Visando solucionar tal impasse, a jurisprudência e a doutrina começaram a repensar os elementos da responsabilidade civil, passando a cogitar a adoção da teoria da perda de uma chance, por meio do qual traz para o campo do ilícito as condutas que minam as chances, serias e reais, de evitar um dano ou gerar um benefício, as quais as vítimas faziam jus. Passando, assim, a ser suportado por seus causados e não mais pelas vítimas, tais danos decorrente da perda de uma chance.

Partindo para as mudanças do paradigma da responsabilidade civil, a principal mudança foi quanto o elemento dano. Enquanto no paradigma anterior era necessária a comprovação de um dano efetivo, mesmo quando diante de lucros cessantes, com o novo paradigma passou a ser possível a reparação quando o dano decorreria da perda de uma chance, quando o dano a ser indenizável é a própria chance, que deve ser estabelecida a partir da probabilidade existente de obter a vantagem ou impedir o dano.

A discussão que ainda existe na doutrina e quanto a que tipo de dano é o decorrente da perda de uma chance, fazendo parte dos problemas que surgem quando se encontra no momento de revolução cientifica, e que os pesquisadores buscam responder com as ferramentas disponíveis no paradigma que está se estabelecendo.

Cumpre destacar que tal discussão não esta presente apenas na doutrina, mas também na jurisprudência, conforme trecho do voto do relator Adão Sergio do Nascimento Cassiano, em decisão sobre o temo do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul:

Mas há controvérsia com relação à modalidade de dano patrimonial a "perda da chance" constitui se dano emergente, lucro cessante ou modalidade intermediaria. Há julgados nos tribunais pátrios concedendo a indenização pela "perda de uma chance" a título de lucro cessante. No entanto, parece predominar o entendimento de que se trata de uma terceira espécie de dano patrimonial, consistente em um dano material hipotético (porem real), intermediário entre o lucro cessante (o que efetivamente deixou de ganhar) e o dano emergente (o que a vitima perdeu). (TJRS. Ap Civil 70006227599, Nona Câmara Civil, Relator Desembargador Adão Sergio do Nascimento Cassiano, julgado em 29/09/2004)

Ao tratar sobre a problemática da perda de uma chance, Silvio de Salvo Venosa [41] pontua que há forte corrente doutrinária que coloca a perda da chance como um terceiro gênero de indenização, ao lado de lucros cessantes e dos danos emergente, pois o fenômeno não se amolda nem a um nem a outro segmento.

Entre os autores que apresentam a perda de uma chance como lucros cessantes destaca-se Maria Helena Diniz [42], que ao dispor sobre lucro cessante, afirma que:

Logo, ao se admitir indenização por lucro cessante, procurar-se-á, em razão de juízo de probabilidade, averiguar a perda de uma chance ou de oportunidade, de acordo com o normal desenrolar dos fatos.

Entretanto, com posicionamento contrário, afirma Gilberto Andressa Júnior: "A chance perdida, diga-se de passagem, jamais poderá ser confundida com os lucros cessantes, haja vista que estes somente se concretizam no momento dos fatos, enquanto a chance preexiste" [43].

No entendimento de Fernando Noronha as vantagens futuras e os prejuízos presentes que estão em questão na perda de uma chance podem ser patrimoniais ou extrapatrimoniais. Para este o dano por perda de uma chance terá que ser certo para ser reparado. E a perda de uma chance pode dizer respeito tanto a danos presentes como a futuros, afirmando [44]:

Por outro lado, a perda de uma chance pode dizer respeito tanto a danos presentes como a futuros. Os danos ligados a chances perdidas hão de ser danos certos, isto é, danos que não só sejam conseqüência adequada de um determinado fato antijurídico, como também sejam objeto de prova suficiente para demonstrar a sua ocorrência, se danos presentes, ou da verossimilhança de que virão a ocorrer, se danos futuros.

Sergio Savi [45] defende que a perda de uma chance além de causar dano material, que será enquadrado na subespécie de dano emergente, poderá, também, ser enquadrado como um agregador do dano moral. O que não se pode admitir, segundo o autor, é considerar o dano causado pela perda de uma chance como sendo um dano exclusivamente moral. Apresentando a seguinte conclusão:

Em conclusão, haverá casos em que a perda da chance, além de causar um dano material poderá, também, se considerada um "agregador" do dano moral. Por outro lado, haverá casos em que apesar de não ser possível indenizar o dano material, decorrente da perda da chance, em razão da falta dos requisitos necessários, será possível conceder uma indenização por danos moral em razão da frustrada expectativa. Frise-se mais uma vez: o que não se pode admitir é considerar o dano da perda da chance como sendo um dano exclusivamente moral, já que, presentes os requisitos descritos neste livro, a perda de uma chance pode dar origem a um dano material, nesta hipótese como dano emergente.

Por fim,de acordo com François Chabas, citado por Sérgio Novais Dias, o prejuízo não é a perda da aposta (do resultado esperado), mas da chance que teria de alcançá-la. Afirmando ainda que "a álea integra a responsabilidade pela perda de uma chance. Se fosse certo o resultado, não haveria a aposta e não caberia invocar este princípio especifico da perda da chance, dentro do instituto da responsabilidade civil" [46].

Quanto ao nexo de causalidade, Vale ressaltar o entendimento de Felipe P. Braga Neto [47], de que a formulação clássica, doutrinaria e legal, aponta para o enunciado de que as perdas e danos só abrangem os prejuízos que resultarem direta e imediatamente do dano. Assim, tradicionalmente os prejuízos indiretos e futuros estariam fora da esfera de reparação.

Concluindo o autor que, a teoria da perda da chance vem flexibilizar essa afirmação tradicional, no sentido de que os danos, para serem indenizáveis, devem ser direitos e imediatos. Segundo a teoria da perda da chance, o não pode consistir exatamente, na destruição de uma possibilidade de ganho, a qual, embora incerta, apresenta contornos de razoabilidade.

Desta forma, o elementos nexo de causalidade também sofreu alterações, para que desta forma seja possível a reparação do dano decorrente de perda de uma chance, já que com a forma que era previsto no paradigma anterior não era possível tal reparação.

Valendo a pena, por fim, apresentar o entendimento de Judith Martins-Costa [48] , que afirmando expressamente:

Embora a realização da chance nunca seja certa, a perda da chance pode ser certa. Por estes motivos não vemos óbice à aplicação criteriosa da Teoria. O que o art. 403 afasta é o dano meramente hipotético, mas se a vítima provar a adequação do nexo causal entre a ação culposo e ilícito do lesante e o dano sofrido (a perda da probabilidade séria e real), configurados estarão os pressupostos do dever de indenizar.

Com isso, as alterações sofridas nos elementos da responsabilidade civil, acima expostas, demonstram que houve uma mudança no paradigma da responsabilidade civil, com o surgimento de uma nova ciência normal, sendo decorrente da necessidade de ser reparado o dano por perda de uma chance.

Contudo, a maior problemática referente ao novo paradigma da responsabilidade civil é relativa ao quantum indenizatório, como estabelecer uma indenização que ao mesmo tempo repare integralmente o dano causado mas sem causar enriquecimento ilícito no caso de perda de uma chance.

De início, convém registrar entendimento de Sérgio Cavalieri Filho [49], para quem a indenização deve corresponder à própria chance, que o juiz apreciara in concreto, e não ao lucro ou perda que dela era objeto, uma vez que o que falhou foi à chance, cuja natureza é sempre problemática na sua realização.

Conforme ensinamento de Silvio de Salvo Venosa [50], na ação de indenização decorrente de ato ilícito, o autor não busca a obtenção de vantagem, mas sim a reparação de um prejuízo, sendo a quantificação do dano uma dificuldade à parte no campo da responsabilidade civil, tanto no campo contratual como no extracontratual.

Afirmando ainda que, quando o juiz decide matéria de responsabilidade civil, a tarefa mais árdua é convencer-se da culpa, mas conferir à vítima a indenização mais adequada. Em indenizações complexas, a liquidação dos danos é, portanto, a questão mais sensível. A avaliação não pode partir de premissas abstratas.

Ademais, versa Fernando Noronha [51], ao discorrer sobre o tema, que o valor da reparação do dano certo da perda de uma chance ficara dependendo do grau de probabilidade que havia de ser alcançada a vantagem que era esperada, ou inversamente, o grau de probabilidade de o prejuízo ser evitado.

Ressalta-se, ainda, posicionamento de Silvio de Salvo Venosa [52] acerca do mesmo tema:

Quando vem à baila o conceito de chance, estamos em face de situações nas quais há um processo que propicia uma oportunidade de ganhos a uma pessoa no futuro. Na perda de uma chance ocorre a frustração na perspectivas desses ganhos. A indenização deverá fazer uma projeção dessas perdas, desde o momento do ato ou fato jurídico que lhe deu causa até um determinado tempo final, que pode ser uma certa idade para a vítima, um certo fato ou a data da morte. Nessas hipóteses, a perda da oportunidade constitui efetiva perda patrimonial e não mera expectativa. O grau de probabilidade é que fará concluir pelo montante da indenização.

Desta forma, nos casos referentes a aplicação da perda de uma chance o que deve ser buscar é a integral restituição, não do valor do ganho que foi impedido, mas sim da chance perdida.

Para a definição desse montante tem que ser levado em conta o grau de probabilidade de ter alcançado aquele beneficio ou evitado as perdas se o ato ilícito não tivesse ocorrido. Neste Sentido foi a decisão emanada pelo Colendo Superior Tribunal de Justiça, conforme segue:

Quanto ao valor do ressarcimento, a exemplo do que sucede nas indenizações por dano moral, tenho que ao tribunal é permitido analisar com desenvoltura e liberdade o tema, adequando-o aos parâmetros jurídicos utilizados, para não permitir o enriquecimento sem causa de uma parte ou dano exagerado de outra

A quantia sugerida pelo recorrente (R$ 125.000,00 cento e vinte cinco mil) equivale a um quarto do valor em comento, por ser uma "probabilidade matemática" de acerto de uma questão de múltipla escolha com quatro itens reflete as reais possibilidades de êxito do recorrido. (REsp 788459. Relator Ministro Fernando Gonçalves. T4-Quarta Turma. DJe 13/03/2006)

Embora no caso apresentado acima haja a definição do quantum indenizatório, além da apresentação do critério utilizado para a definição deste, qual seja a probabilidade, a questão da quantificação dos danos decorrentes da perda de uma chance, conforme ensinamento de Rafael Peteffi Silva, é bastante tormentosa na jurisprudência pátria.

De acordo com Rafael Peteffi Silva [53], esta situação é agrava pelo número de decisões judiciais que decide pela quantificação do dano em procedimento de liquidação de sentença, e mesmo nos acórdãos nos quais a quantificação do dano pela perda de uma chance é se faz presente, não há qualquer menção expressa a metodologia empregada para se chegar ao valor conferido à vítima, denotando, para o operador do direito, a impressão de uma quantificação realizada sem qualquer critério técnico.

Em face do exposto, resta demonstrado que estamos diante de um novo paradigma da responsabilidade civil, contudo, existem diversos problemas a serem respondidos dentro dessa ciência que se formou em busca da reparação dos danos decorrentes da perda de uma chance.

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Sobre a autora
Daniela Pinto de Carvalho

Advogada. Mestranda em Direito Privado pela Universidade Federal da Bahia (UFBA), cursa pós-graduação (especialização) em Direito Civil na Universidade Federal da Bahia (UFBA). Graduada em Direito pela Universidade Salvador (UNIFACS)

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

CARVALHO, Daniela Pinto. Thomas Kuhn e o novo paradigma da responsabilidade civil.: Em busca da reparação da perda de uma chance. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 16, n. 2826, 28 mar. 2011. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/18783. Acesso em: 26 abr. 2024.

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