O advento da Lei 9099/95 para a solução das infrações penais de menor potencial ofensivo, sem dúvida constitui um grande passo no sentido da desburocratização e agilização do sistema penal, aliada a uma redução da violência deste mesmo sistema com a adoção de diversos institutos de caráter despenalizador e descarcerizador. Entretanto, como qualquer obra humana, não deixa de ser passível de críticas, em especial no que tange a determinados aspectos em que ao supervalorizar a presteza da resposta jurisdicional, acaba por negligenciar as garantias de ampla defesa constitucionalmente asseguradas, chegando a um indesejável retrocesso.
É dentro deste quadro lamentável que se assiste à implantação do art. 83, § 2º. daquele diploma legal, tratando como mero caso de suspensão do prazo para recursos a oposição dos embargos de declaração.
Sabe-se que os embargos de declaração têm por fim o esclarecimento da sentença ou acórdão que apresente obscuridade, contradição, omissão ou dúvida, de modo que antes deste esclarecimento não é possível ao opositor atacar a decisão embargada por qualquer recurso, pelo simples fato de que ainda não tem seguro conhecimento daquilo que deverá combater. Este conhecimento quanto ao conteúdo da sentença ou acórdão equivale à imprescindível ciência quanto aos termos da imputação no sentido de possibilitar o exercício livre da ampla defesa e do contraditório de acordo com os ditames do art. 5º., LV, da Constituição Federal. Portanto, nenhuma validade terá o prazo transcorrido antes da oposição dos embargos, enquanto manifestação das mencionadas garantias constitucionais, coarctadas pela própria indefinição da situação jurídico - processual.
O Código de Processo Penal em seus artigos 382 e 619, ao tratar respectivamente dos embargos de sentença e de acórdão, foi silente quanto aos prazos para os demais recursos. Seguiu-se sempre as diretrizes do art. 538 do CPC, considerando a "suspensão" dos prazos. Com as diversas reformas por que passou a lei adjetiva civil, em especial as trazidas pela Lei 8950/94, passou-se a ter por "interrupção" o efeito gerado sobre os prazos de interposição de recursos, enquanto não declarada a sentença ou acórdão. Eis um progresso na amplitude de defesa e uma mudança consentânea com o moderno processo, voltado para a efetiva garantia dos direitos individuais em harmonia com a funcionalidade e eficácia do sistema.
A justiça desse novo mecanismo é evidente, pois que o prazo "interrompido volta depois a ser contado do marco zero; o prazo meramente suspenso é retomado do ponto em que estava antes da suspensão". A sistemática em destaque possibilita evitar o prejuízo daquele prazo transcorrido antes da oposição dos embargos (Princípio da inteireza dos prazos processuais), quando ao oponente não havia como analisar a decisão e formar qualquer convicção para interposição de eventual recurso. Note-se que nem mesmo o aceno ao chamado "Princípio da Complementaridade" dos Recursos teria o condão de justificar a mera suspensão em detrimento da interrupção. Ocorre que se o recorrente ingressar com o recurso pretendido concomitantemente aos embargos e deixar para complementar suas razões eventualmente após a declaração da decisão também pode sofrer prejuízos em sua ampla defesa e contraditório dependendo da situação, o que seria totalmente evitado pelo respeito à integralidade dos prazos conferido pelo sistema da interrupção.
Por isto, o retorno pela Lei 9099/95 à antiga sistemática de mera suspensão dos prazos, constitui um retrocesso deletério e um golpe doloroso nas garantias individuais, cuja supressão, infelizmente, tem tido em grande incidência a pretensão de erigir-se em meio ou instrumento gerador de maior eficácia e celeridade do sistema penal.