5 – Conclusão
Todas as reflexões desenvolvidas neste trabalho se iniciaram pelas indagações que precedem as discussões entre taxa e tarifa, quais sejam, o conceito de serviço público para fins tributários e suas conseqüências jurídicas. Em princípio, restou evidenciado que não restam dúvidas quanto ao matiz jus-administrativista do conceito de serviço público para efeitos fiscais, razão pela qual em se tratando do conhecimento do critério material da hipótese de incidência de um tributo vinculado, sempre encontrar-se-á às voltas com uma relação de Direito Administrativo, no caso, a relação entre o usuário do serviço e o prestador que, mesmo não sendo a Administração Central de uma das pessoas políticas de direito interno, estará representando-a, posto nem a concessão nem a permissão implicarem em transferência da titularidade do serviço público, consoante a mais balizada doutrina.
Por outro lado, pode-se perceber que a noção de serviço público em todos os seus aspectos deve ser encontrada na Constituição Federal, eis que a mesma apresenta todos os caracteres necessários a esta definição. Assim, para qualquer forma de aplicação do direito no campo dos serviços público deve ser levada em consideração um conceito constitucional tentando-se dissipar noções que estejam fora do âmbito jurídico a fim de se evitar incongruências.
No que diz respeito à remuneração pelos serviços públicos prestados, resta também evidenciado que continua grassando séria controvérsia a distinção entre taxa e tarifa, na doutrina e na jurisprudência, apesar de a primeira pertencer ao ramo do direito público, onde vige o princípio da estrita legalidade, e a segunda situar-se no âmbito do direito privado, regido pelo princípio da autonomia da vontade. Essas controvérsias emergem de
discussões acaloradas sobre o fundamento da exação por meio de taxa ou tarifa.
Em matéria de pedágio, por exemplo, a discussão perdura mesmo após o advento da Constituição de 1988, que pelo seu art. 151, V, praticamente, conferiu natureza tributária ao pedágio à medida que vedou o estabelecimento de ‘limitações ao tráfego de pessoas ou bens, por meio de tributos interestaduais ou intermunicipais, ressalvada a cobrança de pedágio pela utilização de vias conservadas pelo poder público’.
Da dicotomia surgida em face das várias casuísticas jurisprudenciais colacionadas, pode-se concluir que existem de certos interesses por trás da recorrente discussão entre taxa e tarifa. Os doutrinadores que defendem que a prestação exigida em razão de serviço público será sempre taxa, na verdade, defendem interesses pelos quais advogam, literalmente. Por outro lado, os doutrinadores que defendem a aplicação de tarifa ao invés de taxa, na verdade, encetam procedimentos que visam resguardar direitos tributários aos cofres públicos, além de tornar o gerenciamento sobre a tarifa mais maleável.
A tentativa de deixar compreendido, a final, que as taxas e os preços públicos, independentemente das diversas naturezas jurídicas que apresentam, submetem-se ao princípio geral da legalidade e, conforme o caso, à regra da legalidade estrita, uma vez identificados como prestações coativas de direito público, categorização jurídica que, para além da forma do instituto, liga-se à incidência dos valores constitucionais relacionados à segurança jurídica, à legalidade, ao amplo acesso à satisfação das necessidades básicas, à indisponibilidade genérica dos bens e atividades públicas, etc.
6 – Bibliografia
ALVES, Anna Emilia Cordelli. Da Contribuição para o custeio da iluminação pública. In: Revista Dialética de Direito Tributário, São Paulo, N.º 97, 20-33, outubro-2003.
ATALIBA, Geraldo. Hipótese de incidência Tributária. 5. ed., São Paulo: Malheiros Editores, 1997.
BALEEIRO, Aliomar. Direito Tributário Brasileiro. 10ª Edição. Rio de Janeiro: Forense, 1994.
CARRAZA, Roque Antônio. Curso de Direito Constitucional Tributário. 12ª edição, 1999.
DA SILVA, José Afonso. Curso de Direito Constitucional Positivo. 15ª edição, 1998.
FIGUEIREDO, Lúcia Valle. Curso de Direito Administrativo. São Paulo: Malheiros, 2ª Edição, 1995.
GRAU, Eros Roberto. A Ordem Econômica na Constituição de 1988. São Paulo: Malheiros Editores, 2005.
GROTTI, Dinorá Adelaide Musetti. O Serviço Público e a Constituição brasileira de 1988. São Paulo: Malheiros, 2003.
LEITE, Fábio Barbalho. O conceito de serviço público para o direito tributário. In: Direito Tributário Constitucional. Elizabeth Nazar Carraza (org.), São Paulo: Max Limonad, 1999.
MACHADO, Hugo de Brito. Parecer: Tarifas Aeroportuárias. Natureza Tributária. Adicional de tarifas aeroportuárias. CIDE. Inconstitucionalidade. In: Revista Dialética de Direito Tributário, São Paulo, N.º 119, 88-119, agosto-2005.
MEDAUAR, Odete. Serviço Público. In Revista de Direito Administrativo. 189. Julho-Setembro. 1992.
MELLO, Celso Antônio Bandeira. Curso de Direito Administrativo. São Paulo: Malheiros, 7ª Edição, 1995.
MORAES, Bernardo Ribeiro de. Doutrina e Prática das Taxas. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 1976.
VILLA ROJAS, Francisco José. Tarifa, tasas, peajes y precios administrativos – Estúdio de su natureza y régimen jurídico. Granada: Comares, 2000.
VILLAÇA, Ana Cristina Othon de Oliveira. Serviços notariais e de registro público e a incidência de ISS. In: Revista Dialética de Direito Tributário, São Paulo, N.º 119, 09-19, agosto-2005.
Notas
- . Frase de Villa Rojas, para que gratuito "no los es la asistencia sanitaria tampoco el alumbrado público ni la televisión pública. En cuanto todo servicio supone una prestación es evidente que tiene un coste que debe ser cubierto. Cuestión distinta es cómo y, en su caso, quién y em qué medida debe ser cubierto." (VILLA ROJAS, Francisco José. Tarifa, tasas, peajes y precios administrativos – Estúdio de su natureza y régimen jurídico. Granada: Comares, 2000, p. 1).
- . BALEEIRO, Aliomar. Direito Tributário Brasileiro. 10ª Edição. Rio de Janeiro: Forense, 1994, p. 324.
- . MORAES, Bernardo Ribeiro de. Doutrina e Prática das Taxas. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 1976, p. 6.
- . LEITE, Fábio Barbalho. O conceito de serviço público para o direito tributário. In: Direito Tributário Constitucional. Elizabeth Nazar Carraza (org.), São Paulo: Max Limonad, 1999, p. 178.
- . "‘Serviço Público’ é tema clássico do Direito Administrativo, que não encontra paralelo no direito privado e tem sido indicado, dentre outros, como prova de não dependência do Direito Administrativo ao direito privado." MEDAUAR, Odete. Serviço Público. In Revista de Direito Administrativo. 189. Julho-setembro. 1992. p. 100. Referido comentário demonstra que a noção de serviço público dá azo à separação dos regimes jurídicos incidentes sobre uma determinada atividade. Isso demonstra que a separação entre as atividades públicas e privadas tem uma marcante utilidade prática.
- . GRAU, Eros Roberto. A Ordem Econômica na Constituição de 1988. São Paulo: Malheiros Editores, 2005, p. 136.
- . MELLO, Celso Antônio Bandeira. Curso de Direito Administrativo. São Paulo: Malheiros, 7ª Edição, 1995, p. 399.
- . FIGUEIREDO, Lúcia Valle. Curso de Direito Administrativo. São Paulo: Malheiros, 2ª Edição, 1995, p. 58-59.
- . TAXA – REQUISITOS – MUNICÍPIO DE FRANCA – EXERCÍCIOS DE 1990 A 1992 – AUSÊNCIA DOS REQUISITOS DE ESPECIFICIDADE E DE DIVISIBILIDADE – Impossibilidade de cobrança das taxas de incêndio, iluminação, limpeza, conservação, remoção de lixo e assistência social. Serviço de caráter genérico. Ação declaratória de inexistência de obrigação tributária procedente. Recursos voluntário e oficial improvidos. (1º TACSP – AP 791.165-1 – 4ª C. – Rel. Juiz Rizzatto Nunes – J. 09.02.2000).
EMBARGOS DO DEVEDOR – EXECUÇÃO FISCAL – IPTU – LEI MUNICIPAL – PUBLICAÇÃO – VALIDADE E EFICÁCIA – TAXAS AGREGADAS – CONSERVAÇÃO DE VIAS E COMBATE A INCÊNDIO – ILEGALIDADE DA COBRANÇA – COLETA DE LIXO – LEGALIDADE – SENTENÇA REFORMADA EM REEXAME NECESSÁRIO – APELAÇÃO PROVIDA EM PARTE – Válida e eficaz a publicação da lei questionada. Ilegal a cobrança dos serviços de conservação de vias e de combate a incêndio, bem como iluminação pública porque, ao contrário da taxa de coleta de lixo, não contém, na hipótese, os requisitos da divisibilidade e da especificidade, que se constituem como fato gerador de taxa. Sucumbência recíproca reconhecida. (TAPR – RN-AC 145413100 – (12819) – Londrina – 3ª C.Cív. – Rel. Juiz Rogério Coelho – DJPR 28.04.2000)