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A política das portas abertas nas reuniões de órgãos públicos colegiados: estudo do caso CTNBio

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01/06/2011 às 07:55
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CONCLUSÕES

A administração pública está destinada a suportar a pluralidade onde quer que atue. Ela própria é diversa, regada a contrassensos, repleta de incertezas.

Não obstante, insere-se em paradigma (Estado constitucional de direito) que explica essas características ao mesmo tempo em que determina alguns métodos para acomodá-las.

Um desses métodos é o diálogo com a sociedade.

A realização do princípio da democracia implica em reconhecer que a transparência do poder público é apenas um ponto de partida. Mais à frente, nesta caminhada, está a participação efetiva dos cidadãos no processo decisório.

A inclusão, cujo papel na democracia marca os estudos dos diversos autores lidos, se apresenta como condição da própria eficiência na condução dos negócios públicos.

No âmbito dos colegiados da administração pública, onde se delibera sobre um sem-número de questões fulcrais para a sociedade, fica comprovado o elevado interesse desta em acompanhar, participar e, se possível, controlar o exercício do poder.

Esse controle não reflete mera desconfiança da população nos órgãos, mas uma face da participação pública indispensável à legitimidade de suas ações.

No recorte casuístico feito para esta monografia, os agentes públicos convocados à missão de debater temas polêmicos como a biossegurança expressaram que se sentem mais à vontade quando se reúnem a portas fechadas. Com isso, almejam evitar pressões de populares e das empresas que são parte nos processos que julgam sobre liberação de transgênicos. Além disso, a CTNBio teria resguardada a ordem necessária ao desempenho de suas atividades.

No debate aqui dissecado, foi dito: "aqui é um público diferente!", como a servir de razão para política de reuniões reservadas. Os argumentos que acompanhavam essa declaração foram testados.

Observou-se, entretanto, que os fins (independência funcional e eficiência na condução dos trabalhos) não justificam o meio (impedir o acesso da população às sessões). A tática, além de contrariar transparência administrativa e, portanto, manchar-se de carga antidemocrática, é falha.

Inicialmente, porque eventual influência de grupos empresariais sobre o modo de votar dos conselheiros da comissão não ficaria barrada simplesmente por seus prepostos não poderem assistir às sessões. Em verdade, o poder econômico escolheria modos mais discretos para agir do que estar presente nas deliberações de seu interesse. As atas com as transcrições dos argumentos e votos dos conselheiros são suficientes para conhecer seu raciocínio costumeiro.

Do outro lado, para que a sociedade acompanhe de perto as políticas que estão sendo adotadas pelo órgão, estar presente às sessões apresenta-se como um recurso de grande valia. O calor da deliberação atinge e inspira os cidadãos a participar. Ainda que um protesto se guarde para momento posterior à reunião do colegiado, é importante que não seja sonegada a motivação para contestar.

Em nome da independência funcional dos conselheiros, criem-se outros métodos.

Em segundo lugar, não se pode dar relevo à possibilidade de alguém, admitido a assistir a reunião da CTNBio, querer causar desordem e comprometer a eficiência administrativa pelo desperdício de tempo. O cenário é possível, mas não exclusivo para a atividade daquela comissão. Qualquer evento é passível de tumulto. Qualquer deliberação pública é sujeita a catalisar polêmicas. E não se retira um direito porque seu titular poderá dele abusar.

Em nome da eficiência administrativa, evite-se a desordem sob as circunstâncias que existirem.

Tentou-se também responder ao dilema das reuniões sob perspectiva legal estrita, reconhecendo-as como meros fatos administrativos. Viu-se que lei alguma impingiu a essa categoria jurídica o mesmo regime administrativo da publicidade atribuído aos atos administrativos. Assim, as sessões estariam exoneradas do encargo da ampla abertura. Mas essa seria a única forma de conduzir o problema sem que se prestigiar qualquer norma constitucional.

Os raciocínios desenvolvidos aqui podem se aplicar a diversos órgãos em circunstâncias semelhantes, sem prejuízo de serem consideradas as particularidades de cada um.

A consideração de que as reuniões da CTNBio devem ser realizadas a portas abertas não pode ser estendido a qualquer órgão colegiado. O percurso realizado até este resultado deve ser retomado cada vez que a discussão estiver em aberto em outras instâncias.

Algumas deliberações da administração pública são inquestionavelmente reservadas a autoridades, como é o caso de rodadas de planejamento estratégico entre ministros de Estado.

Também não é o fato de o órgão ser marcado por alguma dose de participação popular que o tornará abrangido pelo mesmo raciocínio aqui proposto. Eis o mencionado exemplo do Conselho da República.

Ao fim dos exames feitos aqui, pode-se afirmar que o contexto em que se insere a Comissão Técnica Nacional de Biossegurança não a excepciona do regime constitucional da transparência. Inexistindo circunstância extraordinária, suas reuniões devem ser realizadas às vistas da sociedade em geral e a presença de qualquer interessado admitida independentemente de convite.

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Se o Estado fecha suas portas ao argumento de que o povo (ainda) não tem trato com a democracia, eis aí o maior de seus obstáculos, pois não se adquire a verve democrática senão pela sua vivência.


REFERÊNCIAS

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ANEXOS

Os documentos anexos estão disponíveis para download em <http://jus.im/jWwFl8>


Notas

  1. Outra organização não governamental, a Terra de Direitos, requereu da mesma forma a participação e enviou um representante à reunião. Este fato não é retomado por não ter havido manifestação sua no debate.
  2. Com exceção de dois membros, que se manifestaram a favor da permanência dos presentes, mas cujos argumentos não foram substanciosos.
  3. Cópias dos documentos estão anexas a esta monografia.
  4. No decreto que regulamenta a lei nacional de biossegurança, consta que a CTNBio adotará providências para resguardar o sigilo de informações cujo interesse comercial o justifique, desde que requerido pela parte a quem aproveite (arts. 35 e 36 do decreto 5.591). Não há requerimento nesse sentido da empresa que fez a solicitação da liberação aqui recontada.
  5. BONAVIDES, Paulo. Teoria constitucional da democracia participativa: por um direito constitucional de luta e resistência: por uma nova hermenêutica: por uma repolitização da legitimidade. 3. ed. São Paulo: Malheiros, 2008, p. 287.
  6. "É precisamente o Estado democrático-parlamentar, fundado no binômio maioria-minoria, que nos proporciona a verdadeira representação da sociedade atual, profundamente cindida em duas classes. E, se existe uma forma que oferece a possibilidade de dirimir essa formidável antítese – que se pode deplorar, mas não negar seriamente -, não através de uma revolução sangrenta, mas pacífica e gradativamente, é precisamente a forma da democracia parlamentar" (KELSEN, Hans. A democracia. São Paulo: Martins Fontes, 1993, p. 126).
  7. BONAVIDES, Paulo. Teoria constitucional da democracia participativa: por um direito constitucional de luta e resistência: por uma nova hermenêutica: por uma repolitização da legitimidade. 3. ed. São Paulo: Malheiros, 2008, p. 64.
  8. CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Direito Constitucional e teoria da constituição. 4ª ed. Coimbra: Almedina, 1998, p. 282
  9. LYCURGO, Tassos. Direito e democracia participativa. Jus Navigandi, Teresina, ano 11, n. 1027, 24 abr. 2006. Disponível em: <http://jus.com.br/revista/texto/8266>. Acesso em: 18 nov. 2010.
  10. DAHL, Robert A. Poliarquia: participação e oposição. Tradução Celso Mauro Paciornik. São Paulo: Editora da Usp, 1997, p. 25
  11. DAHL, Robert A. Poliarquia..., p. 26-28.
  12. ROUSSEAU, Jean-Jacques. Do contrato social e outros escritos. Tradução de Rolando Roque da Silva, São Paulo: Cultrix, 2002, p. 71.
  13. LYCURGO, Tassos. Direito e democracia participativa. Jus Navigandi, Teresina, ano 11, n. 1027, 24 abr. 2006. Disponível em: <http://jus.com.br/revista/texto/8266>. Acesso em: 18 nov. 2010.
  14. BARCELLOS, Ana Paula. A eficácia juridica dos princípios constitucionais. Rio de Janeiro: Renovar, 2002, pp. 249-250.
  15. MIGUEL, Luis Felipe. Promessas e limites da democracia deliberativa. Revista Brasileira de Ciências Sociais, São Paulo, v. 16, n. 46, jun. 2001.
  16. GUTMANN, Amy; THOMPSON, Dennis. O que significa democracia deliberativa. Tradutor: Bruno Oliveira Maciel; revisor técnico: Pedro Buck. Revista Brasileira de Estudos Constitucionais -RBEC, Belo Horizonte, ano 1, n. 1, p. 17-78, jan./mar. 2007.
  17. DOBROWOLSKI, Samantha Chantal. A justificação do direito e sua adequação social. Porto Alegre: Livraria do advogado, 2002, p.52.
  18. MIGUEL, Luis Felipe. Promessas e limites da democracia deliberativa. Revista Brasileira de Ciências Sociais, São Paulo, v. 16, n. 46, jun. 2001.
  19. BOBBIO, Norberto. O futuro da democracia: uma defesa das regras do jogo. Rio de Janeiro: Paz e Terra,1997, p. 89.
  20. BUCCI, Maria Paula Dallari. Direito administrativo e políticas públicas. São Paulo: Saraiva, 2002, p. 135.
  21. FREITAS, Juarez. Discricionariedade administrativa e o direito fundamental à boa administração pública. São Paulo: Malheiros, 2007.
  22. BRITTO, Carlos Ayres. Teoria da Constituição. Rio de Janeiro: Forense, 2003, pp. 180-181.
  23. COELHO, Inocêncio Mártires. Interpretação Constitucional e Política. Direito Público. Brasília, n. 10. Ano III, out-nov-dez-2005, p. 12.
  24. ATALIBA, Geraldo. Como fazer transparente a administração pública - mecanismos de controle popular. Painel realizado na OAB-SP em 1987, cf. Problemas e reformas - subsídios para o debate constituinte, Departamento Editorial da OAB-SP, 1988, p 61.
  25. MARTINS JÚNIOR, Wallace Paiva. Transparência administrativa: publicidade, motivação e participação popular. São Paulo: Saraiva, 2004, p. 20.
  26. MACHADO, Paulo Affonso Leme. Direito ambiental brasileiro. 17 ed. São Paulo: Malheiros, 2009, p. 1028.
  27. BANDEIRA DE MELLO, Celso Antônio. Curso de Direito Administrativo. 22. ed. São Paulo: Malheiros, 2007, p. 118.
  28. BANDEIRA DE MELLO, Celso Antônio. Curso de Direito Administrativo. 27. ed. São Paulo: Malheiros, 2009, p. 122.
  29. RIBEIRO LOPES, Maurício Antônio. Comentários à reforma administrativa. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1998, p. 109.
  30. DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Parcerias na administração pública. Concessão, permissão, franquia, terceirização e outras formas. 5. ed. São Paulo: Atlas, 2005, pp. 293-297.
  31. "Sorrateiramente, apoiados pelo silêncio perverso da imprensa e sob a égide de uma proposta de ‘Reforma Administrativa’ que manifestava pretensões messiânicas de ‘salvação’ da pátria, os neoliberais, contando também com todo o apoio do Governo de então8, de parlamentares adeptos e dos incautos de ocasião, apresentaram e promulgaram a Emenda Constitucional n.° 19, de 04/06/1998. Esta Emenda, além de outras importantes modificações, alterou substancialmente o consagrado rol de princípios da administração pública brasileira9, ‘coração’ da estrutura pública pátria, que fora atingido com duro e cruel golpe" (MARCELLINO JUNIOR, Julio Cesar. Princípio constitucional da e?ciência administrativa: (des)encontros entre economia e direito. Florianópolis: Habitus, 2009, p. 141).
  32. BODNAR, Zenildo; STAFFEN, Márcio Ricardo. A ética neoliberal e o princípio constitucional da eficiência administrativa: (im)possibilidade de flexibilização do direito fundamental ao meio ambiente. Revista Jurídica Unigran, v. 22, 2010, p. 99.
  33. COUTINHO, Jacinto Nelson de Miranda. Efetividade do processo penal e golpe de cena: um problema às reformas processuais. JURIPOIESES – Revista Jurídica dos Cursos de Direito da Universidade Estácio de Sá, Rio de Janeiro, ano 4, n. 5, 2002, p. 34.
  34. SANTOS, Alvacir Correa dos. Princípio da eficiência da administração pública. São Paulo: LTR, 2003, p. 202.
  35. FERRAZ, Sérgio. Uma nova administração pública. Palestra proferida no XXI Congresso Brasileiro de Direito Constitucional, realizado em São Paulo (SP), no período de 24 a 26 de maio de 2000, citado por SANTOS, Alvacir Correa dos, Princípio..., p. 202.
  36. "A eficiência [...] não deve ser entendida apenas como maximização do lucro, mas sim como um melhor exercício das missões de interesse coletivo que incumbe ao Estado, que deve obter a maior realização prática possível das finalidades do ordenamento jurídico, com os menores ônus possíveis, tanto para o próprio Estado, especialmente de índole financeira, como para as liberdades dos cidadãos." ARAGÃO, Alexandre Santos. Interpretação consequencialista e análise econômica do direito público à luz dos princípios constitucionais da eficiência e da economicidade. Interesse Público, Belo Horizonte, ano 11, n. 57, set. 2009.
  37. Vide objetivos fundamentais da República no art. 3º da Constituição.
  38. PESSOA, Robertônio. Princípio da Eficiência e controle dos atos discricionários. Revista da OAB, v. 28, n. 67, p. 39-46, jul-dez. 1998, p 40.
  39. SIRAQUE, Vanderlei. Controle social da função administrativa do Estado: possibilidades e limites na Constituição de 1988. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 2009, pp. 112-113.
  40. José dos Santos Carvalho Filho (2007, p. 89-90)
  41. MARTINS JÚNIOR, Wallace Paiva. Transparência administrativa: publicidade, motivação e participação popular. São Paulo: Saraiva, 2004, p.91
  42. SILVA, José Afonso da. Comentário contextual à Constituição. 6 ed. São Paulo: Malheiros, 2009, p. 337.
  43. KLAUTAU FILHO, Paulo. O direito dos cidadãos à verdade perante o poder público. São Paulo: Método; Belém: CESUPA, 2008. p. 177.
  44. MACHADO, Paulo Affonso Leme. Direito ambiental brasileiro. 17 ed. São Paulo: Malheiros, 2009, p. 1031.
  45. SANTOS, Braulio de Magalhães. Controle, consensualidade e participação como pressupostos de aperfeiçoamento do princípio da eficiência. Revista Brasileira de Direito Municipal – RBDM, Belo Horizonte, ano 10, n. 33, jul.-set. 2009.
  46. MARTINS JÚNIOR, Wallace Paiva. Transparência administrativa: publicidade, motivação e participação popular. São Paulo: Saraiva, 2004, p. 30.
  47. No Supremo Tribunal Federal, pende de julgamento definitivo ação direta de inconstitucionalidade (854/RS) que ataca a composição de conselho deliberativo com participação minoritária do poder público. No acórdão proferido pelo plenário em 1994, apenas um ministro ficou vencido na decisão de conceder a medida cautelar pretendida na inicial. Suspendeu-se, assim, eficácia da norma constitucional do estado do Rio Grande do Sul que concedia a maioria dos assentos aos administrados no Conselho Estadual de Educação.
  48. Barra, Marcello Cavalcanti. O Leviatã eletrônico: a trama política que colocou o Estado na internet. Bauru: EDUSC, 2008, p. 139.
  49. POPPER, Karl. A lógica das ciências sociais. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 1978.
  50. MACHADO, Paulo Affonso Leme. Direito ambiental brasileiro. 17 ed. São Paulo: Malheiros, 2009, p. 1029.
  51. RIOS, Aurélio Virgílio Veiga. O princípio da precaução e sua aplicação na justiça brasileira: estudo de casos in: Princípio da precaução. Belo Horizonte: Del Rey, 2004, p. 374.
  52. MELO, Geórgia Karênia Rodrigues Martins. O princípio da precaução e o caso dos transgênicos. Fórum de Direito Urbano e Ambiental, Belo Horizonte, ano 8, n. 45, maio-jun. 2009.
  53. Consta do site do Ministério do Meio Ambiente que a adoção do Protocolo de Cartagena "cria uma instância internacional para discutir os procedimentos que deverão nortear a introdução de organismos vivos modificados em seus territórios e estabelece procedimento para um acordo de aviso prévio para assegurar que os países tenham as informações necessárias para tomar decisões conscientes antes de aceitarem a importação de organismos geneticamente modificados (OGMs) para seu território. Neste contexto, cabe salientar que o Protocolo incorpora em artigos operativos o Princípio da Precaução, um dos pilares mais importantes desse instrumento e que deve nortear as ações políticas e administrativas dos governos". Disponível em: http://tinyurl.com/mma-cartagena
  54. MACHADO, Paulo Affonso Leme. Direito ambiental brasileiro. 17 ed. São Paulo: Malheiros, 2009. p. 1028.
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Sobre o autor
Rodrigo Chaves

Editor da Revista Jus Navigandi; analista judiciário; doutorando em direito público pela Aix-Marseille Université (França).

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

FREITAS, Rodrigo Chaves. A política das portas abertas nas reuniões de órgãos públicos colegiados: estudo do caso CTNBio. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 16, n. 2891, 1 jun. 2011. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/19252. Acesso em: 5 nov. 2024.

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