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A utilidade da arbitragem como forma jurisdicional de resolução dos conflitos

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Resumo

Este trabalho trata da utilidade da arbitragem como forma jurisdicional de resolução dos conflitos.

Nele, analisa-se o instituto da arbitragem como possibilidade de resolução de conflitos através da intervenção de outrem que recebe seus poderes de uma convenção privada, decidindo com base nesta pactuação sem intervenções do Estado, sendo que a sentença proferida na utilização dela produz efeito judicial.

A arbitragem também conhecida como justiça privada está amplamente caracterizada como atuação de efeito jurisdicional, ou seja, quando um terceiro, por meio da arbitragem resolve o conflito, e este atua como se o Estado fosse, sem duvida alguma há jurisdição. Contudo, é sabido na seara do Direito que a jurisdição não é monopólio do Estado, e que este tem participação fundamental na arbitragem, que é uma das formas de heterocomposição dos conflitos.

Em linhas gerais, a utilização da arbitragem para resolver problemas cotidianos busca satisfazer os interesses do cidadão, com vistas a uma entrega célere da prestação jurisdicional.

Por fim, o conteúdo deste mostra um caminho alternativo de solução de conflitos pouco utilizado pelos operadores do Direito e que a utilização da arbitragem é uma necessidade em momento de racionalização da atividade judiciária que os novos tempos exigem.

Palavras-chave: Utilidade, Arbitragem, Jurisdição, Resolução de conflitos.


1. INTRODUÇÃO

É sabido por todos que labutam na atividade jurídica que o Estado, através do Poder Judiciário não tem condições de solucionar a grande demanda de processos com a estrutura na qual se encontra.

Os estudos realizados até o momento apontam para a necessidade de um estudo critico e de uma reforma de todo o aparelho normativo e judicial, passando pela reforma dos procedimentos e dos próprios tribunais, que devem modernizar-se, bem como da simplificação do próprio direito positivo.

A tendência do direito processual para o futuro é voltada à busca de um direito e uma justiça mais acessível, essa busca de uma consciência jurídica para a dimensão social do processo é objeto de estudo de muitos juristas nacionais e estrangeiros.

É importante dizer que os meios ou formas alternativas de solução de conflitos não visam o enfraquecimento do Poder Judiciário. A solução do problema pela autodefesa, ou a escolha entre a solução do problema através da tutela estatal ou paraestatal não significa que é melhor ou pior, mas formas distintas em que as pessoas buscam a solução de problemas.

Demonstraremos que o conflito é algo importante na vida das pessoas e das sociedades das quais fazemos parte. Se a humanidade sempre demonstrou forte interesse por suas crises e por seus conflitos, é porque eles podem alterar substancialmente o rumo de nossa existência e o destino de nossas famílias, de nossas comunidades e de nossos países.

Boa parte das pessoas dedica-se a buscar segurança e proteção e a criar sistemas de solução de conflitos de todos os tipos, enquanto os demais trabalham para produzir os bens necessários à subsistência e à melhoria das condições de vida.

Todas as pessoas dedicam uma parte de suas vidas ao esforço de encontrar soluções as suas crises e para os seus conflitos. Quando estamos tristes, aborrecidos ou preocupados, estamos, ao mesmo tempo, em plena atividade para encontrar solução aos nossos conflitos com nós mesmos ou com os outros.

Veremos nesse trabalho, que a justiça também se estabeleceu com a finalidade de solucionar os litígios e conflitos que pudessem surgir entre pessoas de uma mesma comunidade. Quando alguém causa algum mal ou prejuízo a outro, em vez de permitir que os desejos de vingança dominem as respostas dos prejudicados, estabelece-se um sistema judicial, uma idéia de justiça, que procura elucidar quem está com a razão e tenta estabelecer soluções pouco onerosas, razoáveis e justas, visando a solução do problema em questão.

Por outro lado, encontramos a autocomposição, onde as parte podem renunciar e transacionar para obter o resultado mais satisfatório, esse modelo pressupõe que os conflitos entre as partes devam ser resolvidos autonomamente por elas próprias, cabendo ao Estado, preponderantemente, o papel de assegurar um ambiente institucional que propicie o maior equilíbrio de forças entre os conflitantes.

Já o modelo de heterocomposição de conflitos pressupõe a intervenção direta de um terceiro ator na relação, com o poder de julgar o impasse. Esse terceiro ator pode ser o juiz, como ente estatal, e um árbitro privado com delegação pelo Estado, de acordo com a Lei n° 9.307/96, para proferir a sentença, exercendo o papel do Estado na solução dos conflitos.

Nesses termos, é que se faz necessário uma abordagem eminentemente eficaz sobre a arbitragem e sua natureza jurídica, pois se existe uma lei criada pelo Estado, autorizando um terceiro a decidir um conflito, e este como se o Estado fosse, então há jurisdição.

Assim, a jurisdição é a composição da lide através do Estado, que faz às vezes do terceiro alheio às partes. Este, através de pessoas especialmente autorizadas para agir em seu nome, diz qual é a solução mais adequada para a resolução do problema instaurado, sempre se pautando no seu próprio direito objetivo, visando manter a paz social, única capaz de assegurar sua existência e a convivência mútua dos seres humanos.

Portanto, serão mostrados nesse trabalho os antecedentes históricos da arbitragem, questões importantes, e as vantagens que faz com que seja possível fazer justiça em tempo hábil, além de que ela é essencial para o fim da crise no judiciário e uma alternativa para o fim do demandismo que se alastra pelo país.


2. ANTECEDENTES HISTÓRICOS DA ARBITRAGEM

Conforme LEMOS (2001:23) o "instituto da arbitragem é bem antigo, e começou a ser difundido antes do cristianismo. Originou-se basicamente na cidade de Roma, onde os conflitos eram resolvidos com a autorização das partes, por um terceiro, denominado árbitro.".

Desde tempos remotos, a humanidade busca caminhos que não sejam morosos, burocráticos e onerosos, pois os negócios envolvendo o direito privado exigem soluções rápidas e eficazes. A arbitragem como meio alternativo de solução de conflitos foi bastante utilizada nos tempos de conquista, quando os dominados recusavam os ordenamentos existentes e procuravam terceiros para dirimirem seus problemas, dando lugar a uma arbitragem consensual.

LEMOS (2001:25) afirma o seguinte:

A historia nos revela que a solução dos litígios entre grupamentos humanos encontrou, por diversas vezes, procedimentos pacíficos através da mediação e da arbitragem, ao invés de optar pelas guerras.

E ainda:

De origem consuetudinária, a arbitragem remonta a mais de 3.000 a.Csendo, pois, um dos institutos mãos antigos. Tem-se noticia de soluções amigáveis entre os babilônicos, via arbitragem publica e, entre os hebreus, através das contendas de direito privado se resolviam com a formação de um tribunal arbitral.

Em análise cronológica, o desenvolvimento da arbitragem se deu na Judéia, entre os sábios que preparavam o Talmud, que nada mais era do que repositório de tradições judaicas e interpretações da Lei proposta pelos livros do Pentateuco.

O fato era que existiam restrições impostas pelo conquistador romano ao funcionamento das cortes rabínicas.

Na Babilônia, o outro grande centro jurídico dos judeus, nos séculos que antecederam e sucederam o aparecimento de Cristo, as comunidades judaicas tinham ampla autonomia e as cortes funcionavam sem maiores problemas.

A Mishnah, que era o ensino do povo hebreu determinava que a arbitragem se processasse da seguinte forma:

Questões econômicas se dividem por três. Cada parte escolhe um julgador e ambas as partes escolhem um terceiro; esta a opinião de Rabbi Meir. Os sábios sustentam que os dois julgadores escolhidos escolhem mais um julgador.

Se por ventura os árbitros escolhidos não forem de acordo com a escolha do terceiro arbitro, este poderia ser escolhido pela liderança da comunidade, circunstancia em que poderia ser nomeado sem a concordância das partes. A escolha dos árbitros recaia sobre as pessoas que não fossem parentes, e também era vedado escolher amigos íntimos ou inimigos de qualquer parte.

O sistema arbitral com a presença de três julgadores funcionou por muito tempo na historia do povo judeu.

Convém dizer que, nas comunidades onde havia um tribunal rabínico oficialmente instituído, as partes em demanda tanto podiam optar por um sistema ou pela arbitragem, a questão da escolha do terceiro árbitro era para se ter o desempate em caso de opiniões conflitantes, veja-se que naquela época já existia o voto Minerva.

Em Roma utilizava-se o instituto da arbitragem inicialmente nos conflitos entre Estados e, depois, entre particulares, principalmente na fase do jus peregrinus, quando o praetor peregrinus solucionava as questões entre os estrangeiros.

O juízo arbitral comparando à jurisdição togada, aquele levava vantagens, uma vez que era mais simples e informal e permitia ao árbitro decidir sem se submeter a qualquer lei, bastavam o compromisso e a cláusula compromissória destinados a acatar a decisão arbitral.

Observa SOARES (1996:63):

Acentue-se o fato de que, especialmente nas corporações de ofícios e de profissões liberais, onde imperava rígida hierarquia entre os membros, era natural que se buscassem soluções de controvérsias, por meio de recursos que não saíssem do âmbito daquelas comunidades.

No período Justiniano, o instituto da arbitragem aperfeiçoou-se com a legislação sobre o costume havia criado. A partir daí, os demandantes vinculavam-se à execução do laudo, e aos árbitros cabia a obrigação de bem desempenhar o encargo.

Na Constituição de Justiniano, do ano 531, ficou expresso que, caso fosse instituída a penalidade tanto na cláusula compromissória quanto no compromisso, haveria a interferência do magistrado na execução do laudo arbitral.

O tempo se passou, e o que era utilizado apenas no mundo dos negócios foi estendido ao setor religioso, passando a serem solucionadas as pendências entre leigos ou religiosos pelos bispos, na condição de árbitros. Quando acontecia uma simples divergência, as pessoas diziam para procurarem o bispo, pois este resolveria o problema.

Aponta VENOSA (2004:604) que:

A Igreja Católica Apostólica Romana exerceu ao longo dos tempos um importante papel na solução pacifica de conflitos. O padre era o arbitro supremo e os bispos tinham a função eclética de resolver os litígios de fronteiras e questões privadas.

Os árbitros de então eram investidos de poderes através do compromisso arbitral e utilizavam em constância as penas de cunho religioso, tais como a excomunhão e o interdito.

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Quando uma pessoa recebia a sanção de excomunhão, a ela ficava vedado tomar sacramento pelo resto da vida.

Por outro lado, a sansão de interdito proibia o sacramento em determinada cidade ou região, podendo haver, também, a suspensão do oficio da missa, por longo período, sobre aqueles que desrespeitassem o compromisso assumido.

Em conseqüência desses fatos, em meados de 1794, por força da reforma protestante, ocorreu a homologação do Tratado Jay de Amizade, dispondo sobre comercio e navegação, que foi realizado entre os Estados Unidos e a Grã Bretanha. Na realização do Tratado, utilizou-se um numero impar de árbitros, nacionais de inúmeros lugares, no qual se buscava fixar a identidade do rio Santa Cruz, o pagamento aos credores ingleses e cuidar das presas marítimas. Como diz LEMOS (2001:28): "Esse Tratado fez renascer o procedimento de solução pacifica de controvérsias internacionais feito por terceiro alheio ao conflito".


3. A ARBITRAGEM

A arbitragem permaneceu dormente por décadas em nosso país. Muito embora prevista em lei, tínhamos as condições a ela relativas como uma espécie de letra morta. As dificuldades impostas por um modelo superado, jogaram-na num estado de perda de essência, sem que se tivesse qualquer esperança quanto à sua real utilidade.

No entanto, a promulgação e vigência, a partir de novembro de 1996, da Lei n° 9.307, de 23 de setembro de 1996, fizeram como que num passe de mágica, a exemplo do que ocorreu no conto infantil, que a sociedade acordasse para a importância desse mecanismo extrajudicial de solução de controvérsias e nele encontrasse um meio eficiente de busca da estabilidade social.

Com o advento da nova Lei produziu-se um fenômeno de renascimento do instituto no Brasil, desenhada que foi de acordo com as mais modernas teorias e fundamentos desenvolvidos em paises que dela se servem há muito tempo. A nova Lei colocou o Brasil na dianteira da modernidade, dotando-o de uma legislação afinada com as conquistas obtidas pela arbitragem ao longo dos anos em que esta, no Brasil, estava dormente.

É certo, pois, dizer que a arbitragem é forma de solução dos conflitos na qual as partes envolvidas convergem as suas vontades no intuito de eleger uma ou mais pessoas, terceiro, distinto dos envolvidos, para que aprecie a demanda e profira uma decisão, que previamente, se comprometem a aceitar e cumprir.

Segundo afirmam TEIXEIRA e ANDREATTA (1997:30), a arbitragem é o: "compromisso através do qual as pessoas interessadas submetem um litígio à decisão de um ou mais árbitros, ficando antecipadamente a respeitar o resultado".

Os autores referem-se à arbitragem como sendo:

Uma técnica para a solução de controvérsia através da intervenção de uma ou mais pessoas que recebem seus poderes de uma convenção privada, decidindo com base nesta convenção sem intervenção do Estado, sendo destinada a assumir eficácia de sentença judicial.

No mesmo sentido CACHAPUZ (2000:12), parafraseando José Carlos de Magalhães, diz que a arbitragem é: "a instituição pela qual as partes confiam a árbitros que livremente designam a missão de resolver seus litígios".

E ainda:

Um foro privilegiado e propicio para a composição amigável ou para a convergência dos esforços dos litigantes no sentido de alcançarem rapidamente, sem descurar dos valores maiores que são a segurança e a justiça da decisão, a solução final da lide, tendo em vista que, quase sempre, ambos têm interesses na resolução do conflito, que não raras vezes, envolve quantias vultosas de dinheiro, com inúmeros efeitos diretos e reflexos.

Enquanto isso NAZO (1997), obtempera que:

A arbitragem em sentido amplo caracteriza-se todas as vezes que um conflito de interesses for solucionado através da decisão de um terceiro que não esteja investido das funções de magistrado. É a autonomia de vontade das partes, que podem escolher o direito material e processual aplicável à solução da controvérsia, assim como fazer decidir o litígio com base nos princípios gerais do direito, nos usos e costumes ou nas regras internacionais do comércio.

3.1 A arbitragem no Brasil

A Constituição de 1824, previa em seu artigo 18, que as partes poderiam nomear juizes árbitros, e que, sendo acordado entre elas, as sentenças seriam executadas sem recurso.

A Constituição de 1937 extinguiu a existência de juízos arbitrais para resolução de conflitos territoriais entre os Estado brasileiros, contudo, a Constituição de 1946 voltou a instituir a faculdade das pessoas em utilizar o juízo arbitral.

A Magna Carta dispõe sobre a arbitragem como meio alternativo de solução de dissídios. No artigo 114, § 1° com nova redação dada pela emenda constitucional n° 45, que introduziu a reforma do judiciário, está implícito a eleição de árbitros para resolver litígios entre empregados e empregadores.

O Brasil não tem cultura na utilização desse instituto, muito embora ele esteve sempre presente no nosso ordenamento jurídico. Antes da edição da Lei n° 9.307/96, o Brasil assinou o Protocolo de Genebra, em 1923, participando igualmente do Código de Bustamante, da Convenção Interamericana sobre a Arbitragem Comercial Internacional do Panamá, em 1975, que fora promulgado em 09 de maio de 1996. Isso é o que afirma LEMOS (2001:32).

Também anterior à Lei da arbitragem, o Código de Processo Civil dispunha o instituto nos artigos 1.072 a 1.102, sendo esses considerados letras mortas, devido a sua inutilização no país.

Todavia, o instituto da arbitragem previsto no Código de Processo Civil ainda não trazia regras modernas, obrigando a homologação judicial do laudo arbitral e simplesmente ignorando a cláusula compromissória. Assim, como o advento da Lei n° 9.307/96, introduziu-se uma nova era para a implementação deste instituto em nosso ordenamento jurídico.

A Lei n° 9.099/95, Lei dos Juizados especiais, traz em seus artigos 24 a 26, a possibilidade da utilização da arbitragem nos juizados. Nesse procedimento dispensa-se o compromisso das partes, e o que se chama de sentença arbitral na Lei n° 9.307/96, neste a denominação é, tão somente, laudo arbitral, que é homologado por sentença irrecorrível.

Vale lembrar que o Código Civil de 2002, trouxe inovação, ao tratar da arbitragem nos artigos 851 a 853, sob o titulo "Do Compromisso". A leitura do artigo 852nos reporta ao artigo 1° da Lei n° 9.307/96, sendo o artigo 3° correspondente ao artigo 853 do Código, que se refere à clausula compromissória para a solução de conflitos através do juízo arbitral.

O Código Civil Brasileiro prevê o compromisso judicial e extrajudicial, para solucionar litígios entre pessoas ligadas contratualmente.

O nosso código, não permite, entretanto, o compromisso para resolver questões de estado, de direito pessoal de família e de outras que não tenham caráter estritamente patrimonial.

É relevante citar, que contratos realizados entre imobiliárias e locadoras, atualmente, elegem as Cortes de Conciliação e Arbitragem, para resolver conflitos que porventura venham a acontecer. A maioria das cortes funciona nas Associações Comerciais das cidades.

A escolha pela arbitragem é no nosso ordenamento jurídico, voluntária ou facultativa, a teor da maioria das legislações estrangeiras. Ela é instituída através de cláusula compromissória ou do compromisso arbitral, aquela expressa no contrato, e esta consistente numa convenção entre as partes que submetem litígio atual aos termos da arbitragem.

Seu inicio se dá após a aceitação e nomeação do arbitro e termina com a sentença arbitral, irrecorrível, salvo nas hipóteses de embargos de declaração e ao visando à anulação da sentença arbitral.

Para CARMONA (1998:27), os motivos que levam as partes a escolher a solução arbitral são:

A ausência de formas solenes, a possibilidade de julgar por equidade ou escolher livremente a lei a ser aplicada e ainda a neutralidade dos árbitros na solução de litígios envolvendo partes de nacionalidade diferentes, alem da especialização técnica dos julgadores.

Nestes termos podemos afirmar que, após 9 (nove) anos da publicação da lei que instituiu as regras da arbitragem no ordenamento jurídico brasileiro, a sua utilização ainda é muito tímida e isto se deve, principalmente, pela falta de informação pela sociedade.

3.2 A arbitragem e sua diferença com o procedimento da Lei dos Juizados Especiais

A Lei dos Juizados Especiais, trouxe nos artigos 24 a 26 uma nova regra de arbitragem, utilizada somente no âmbito destes juizados. As regras ali instituídas diferentes da prevista na lei n° 9.307/96.

Na Lei n° 9.099/95, o arbitro é escolhido somente entre os conciliadores/ juizes leigos, quando na lei da arbitragem a escolha é livremente feita pelos interessados. A arbitragem terá o seu inicio conforme as regras do Juizado Especial após a conciliação frustrada, enquanto na regra da lei 9.307 as partes podem eleger estas vias arbitrais antes mesmo de existir o conflito.

Diante das regras da lei do Juizado, a sentença arbitral estará sujeita a homologação judicial, enquanto na lei da arbitragem fica excluída a necessidade da homologação judicial, pois ela própria tem força de sentença judicial.

3.3 Da constitucionalidade da Lei n° 9.307/96.

É sobremodo importante assinalar que o instituto da arbitragem, posto em voga pela lei n/ 9.307/96 é de todo constitucional, e não ofende os princípios constitucionais da inafastabilidade de controle judicial, nem do juiz natural, a lei, simplesmente deixa a cargo das partes a escolha, ou seja, se querem elas ver sua lide julgada por juiz estatal ou por árbitros.

É preciso dizer que o interesse é compor a lide, sendo que o arbitro será o representante Estatal na solução pacífica das controvérsias.

Sobre a constitucionalidade da Lei da Arbitragem, CASABONA (2001:45) afirma:

Seria inconstitucional a Lei da Arbitragem se estipulasse arbitragem compulsória, excluindo do exame pelo Poder Judiciário, a ameaça ou lesão a direito. Não fere o juiz natural, pois as partes já estabeleceram, previamente, como será julgada eventual lide existente entre elas. O requisito da pré-constituição na forma da lei, caracterizador do principio do juiz natural, está presente no juízo arbitral.

3.4 Pressupostos da arbitragem.

A lei n/ 9.307/96 traz no artigo 1° os pressupostos da arbitragem, quais sejam, capacidade das partes e o objeto litigioso. Quanto à capacidade das partes, determina a lei que somente pessoas "capazes de contratar poderão valer-se da arbitragem".

Determina a lei que somente poderá instituir a arbitragem pessoas capazes de contratar, não podem instaurar processo arbitral pessoas que detenham apenas poderes de administração e os incapazes, mesmo que representados ou assistidos.

Na questão do objeto, que também é pressuposto da arbitragem, a lei restringe somente a "direito patrimonial disponível". De modo geral, estão afastadas do âmbito do juízo arbitral as ações de família que versem sobre a capacidade das pessoas. É bem verdade que diante de uma ação de alimentos, por exemplo, as partes jamais poderiam pretender o decreto da procedência deste pedido perante a arbitragem.

Todavia, a lei permite a transação entre as partes a respeito do quantum dos alimentos prestados, assim, há de se entender que o quantum dos alimentos prestados não está na esfera do direito patrimonial indisponível, e, portanto, é arbitrável.

Para CARMONA (1998:33):

Diz-se que um direito é disponível quando ele pode ser ou não exercido pelo seu titular, sem que haja norma cogente impondo o comprimento do preceito, sob pena de nulidade ou anulabilidade do ato praticado com sua infrigência. Assim, são disponíveis aqueles bens que podem ser livremente alienados ou negociados, por encontrarem-se desembaraçados, tendo o alienante, plena capacidade jurídica para tanto.

E no mesmo sentido, afirma NERY (2005:1623):

Não estão no âmbito do direito disponível as questões de direito de família, em especial ao estado das pessoas (filiação, pátrio poder, casamento, alimentos), aquelas atinentes ao direito de sucessões, as que têm por objeto as coisas fora do comercio, as obrigações naturais, as relativas ao direito penal, entre tantas outras, já que ficam estas matérias fora dos limites em que podem atuar a autonomia da vontade dos contendentes.

Estes posicionamentos não são suficientes, porém, para excluir de forma absoluta do âmbito da arbitragem toda e qualquer demanda relacionada ao direito familiar ou o penal, pois as conseqüências patrimoniais tanto num caso como no outro podem ser objeto de solução extrajudicial. Dizendo de outro modo, se é verdade que uma demanda que verse sobre o direito de prestar e receber alimentos trata de direito indisponível, não é menos verdadeiro que o quantum dos alimentos pode ser livremente pactuado pelas partes, e isto torna arbitrável esta questão.

Partindo destas premissas, poder-se-ia concluir que as partilhas de bens em separação, divórcio e união estável, a quantum de alimentos devidos e as questões de direito sucessório são arbitráveis, desde que estivesse presente a capacidade dos contratantes, partes do processo arbitral, determinada no artigo 1° da Lei n/ 9.307/96.

Existem juristas que defendem que, na esfera dos direitos de família, o casamento e a guarda entre outros não são arbitráveis, assim como os de caráter patrimonial como alimentos e regime matrimonial de bens.

Embora seja louvável o posicionamento a respeito, discordamos do entendimento de que as ações de direito de família estão totalmente fora do âmbito do juízo arbitral, preferindo a inclusão deste instituto à parte patrimonial das demandas de direito da família.

Alguns países admitem a instituição do juízo arbitral nas ações de família, para aquelas demandas onde o objeto do litígio é direito patrimonial. Cabe aos operadores do direito a tentativa de estender a utilização dos meios alternativos de resolução de controvérsia a todos os meios possíveis, visando à desburocratização do direito e a efetivação da justiça.

3.5 A arbitragem no Direito Comparado

Na Argentina o Código de Processo Civil, Art. 737, determina o objeto da arbitragem às questões que podem ser de transação. E assim diz: "Cuestiones excluídas – No podrán comprometerse em árbitros, bajos pena de nulidade, lãs cuestiones que no pueden ser objeto de transacción".

Não é diferente o Código de Processo Civil, Art. 476, do Uruguai, que determina: "Causas excluídas del arbitraje – no pueden someterse a processo arbitral la cuestione respecto a lãs cuales está prohibida la transacción".

No México fica excluída do procedimento da arbitragem toda a matéria que envolve estado de capacidade das pessoas. As demandas decorrentes de relação familiar, de cunho eminentemente patrimonial são administrativas. Os tutores poderão optar pelo juízo arbitral para negócios de seus tutelados.

O artigo 613 do Código de Procedimentos Civiles do México, informa a autorização da utilização da arbitragem nas ações de herança, desde que autorizado por todos os herdeiros.

Autoriza, também esta legislação, a inserção de cláusula compromissória instituída pelo autor da herança, vejamos:

Art. 613. Los albaceas necesitam del consentimento unânime de los herdeiros para comprometer em árbitros los negócios de la herencia y para nombrar árbitros, salvo el caso em que se tratara de cimplimentar el compromiso a cláusula compromisoria pactados por el autor. En este caso, si no hubiere árbitro nombrado se hará necesariamente con intervención judicial.

Na Bélgica a arbitragem é admitida em todos os litígios que versem sobre direitos e relações que admitem a transação, e assim prevê o Code Judiciaire:

Art. 1676. Tout différend déjà né ou qui pourrait naître d’un rapport de droit determine et sur lequel il est permis de transiger, peut faire objet d’uneconvention d’arbitrage.

A lei espanhola n° 36 de 05 de dezembro de 1988, determina em seu artigo 1, a possibilidade da arbitragem nas matérias de livre disposição conforme o direito. Determina ainda o Art. 7, as validades da arbitragem por disposição do testador, vejam:

Art. 1. Mediante el arbitraje, lãs personas naturales o jurídicas puedem someter, prévio convenio, a la decisión de uno o varios árbitros las cuestiones litiosa, surgidas o que puedan surgir, en materias de su libre disposición conforme a derecho".

Art. 7. Excepcionalmente, será valido el arbitrage instituído por la sola voluntad del testador que lo estabeleza para solucionar las diferencias que puedan surgir entre ferederos no forzosos u/o legatarios para cuestiones relativas a la distribuición a administración de la herencia.

O artigo 1.030 do Código de Processo Civil Alemão com a devida tradução determina que:

Admissibilidade da arbitragem. Toda pretensão legal sobre bens pode ser objeto de convenção arbitral. A convenção arbitral será válida sempre que as partes tiverem o direito de transigir sobre o objeto da disputa.

Também temos a disposição do Código de Processo Civil italiano, que em seu artigo 806, proíbe a utilização da arbitragem para os processos trabalhistas e previdenciários, além daqueles que resguardam questões de Estado e de separação pessoal entre cônjuges e as outras que não podem formar objeto de transação.

Nos Estados Unidos da América a arbitragem pode ser instituída em questões que envolvam direito disponível em larga escala nas separações e divórcio. A razão do grande crescimento da utilização da arbitragem nos EUA reside no fato de que neste país existe um grande número de câmaras arbitrais especializadas em direito da família, o que leva ao termino do conflito com mais celeridade que as vias judiciais, com uma boa qualidade de decisões.

Uma forma muito comum é a utilização de uma forma de arbitragem, onde as partes, após a colheita probatória, formulam seus pedidos de acordo e o arbitro decidirá escolhendo uma das propostas.

Assim, o juízo arbitral é utilizado por mais legislações no âmbito do direito de família e nada justifica que em nossa legislação, este instituto não venha a ser utilizado para dirimir estas questões, mormente para os litígios de cunho patrimonial.

Um grande avanço na utilização deste instituto no país é a autorização legal para a inserção de cláusula compromissória em acordo de vontade entre as partes antes de ser instaurado um litígio, como aquelas inseridas nos contratos de convivência e nos pactos antenupciais. É sobremodo importante dizer, que as sentenças arbitrais proferidas no estrangeiro só serão reconhecidas executadas no Brasil se homologadas pelo Supremo Tribunal Federal.

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Sobre o autor
Hebert Mendes de Araújo Schutz

Oficial de Justiça-Avaliador Judiciário do Tribunal de Justiça do Estado de Goiás/Especialista em Direito Processual Civil/Pós-graduado em Ciências Penais e Docência Universitária. Mestrando em Direito, Relações Internacionais e Desenvolvimento pela PUC-GO. Professor do curso de Direito na Faculdade Objetivo em Rio Verde-GO

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

SCHUTZ, Hebert Mendes Araújo. A utilidade da arbitragem como forma jurisdicional de resolução dos conflitos. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 16, n. 2908, 18 jun. 2011. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/19305. Acesso em: 22 dez. 2024.

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