Sumário: Introdução; 1.Alimentos: um novo olhar sobre o seu conceito; 2. Natureza e Finalidade; 3. Das pessoas obrigadas a prestar alimentos; 4. Da satisfação e extinção da obrigação; Conclusão; Referências.
RESUMO
O presente artigo se propõe a analisar os elementos presente no paralelo entre a obrigação alimentar e o dever do sustento no novo direito de família. Pretende ainda conceituar e demonstrar a finalidade e natureza jurídica do direito de alimentos, e ainda, esgotar as dúvidas sobre a hierarquia da obrigação de prestação alimentícia, sua satisfação e extinção.
PALAVRAS-CHAVE
Direito alimentar. Obrigação alimentar. Dever de sustento.
INTRODUÇÃO
Atualmente o direito de família é fundado nos anseios e interesses dos diversos integrantes da entidade familiar, considerados tanto de forma global quanto individualmente, passando a priorizar os interesses das crianças, dos adolescentes e das relações afetivas. Isso significa que nas relações jurídicas deve ser considerado o laço afetivo e não apenas o estrito laço genético, biológico ou "registral".
No primeiro Código Civil, fundado nas lições do Código Francês e nas relações familiares patriarcais, a entidade familiar era baseada na família centrada econômica, social e afetivamente na figura do pai ou de outro homem da casa e priorizava o interesse deste em detrimento dos demais integrantes da entidade. O presente estudo pretende esboçar a nova visão da prestação alimentícia no novo direito de família.
1.ALIMENTOS: UM NOVO OLHAR SOBRE O SEU CONCEITO
Vários autores formularam seus conceitos sobre o que vem a ser "alimentos" e todos eles (todos os pesquisados), sinalizaram quase que sempre, para a mesma definição, de certo modo que uns complementaram os outros.
Para Sílvio Rodrigues:
alimentos, em Direito, denomina-se a prestação fornecida a uma pessoa, em dinheiro ou em espécie, para que possa atender às necessidades da vida. A palavra tem conotação muito mais ampla do que na linguagem vulgar, em que significa o necessário para o sustento. Aqui se trata não só do sustento, como também do vestuário, habitação, assistência médica em caso de doença, enfim de todo o necessário para atender às necessidades da vida; e, em se tratando de criança, abrange o que for preciso para sua instrução. [01]
Já o doutrinador Yussef Said Cahali [02], leciona que, alimentos, em seu significado vulgar, é "tudo aquilo que é necessário à conservação do ser humano com vida", e em seu significado amplo, "é a contribuição periódica assegurada a alguém, por um título de direito, para exigi-la de outrem, como necessário à sua manutenção".
Segundo os ensinamentos de Orlando Gomes:
alimentos são prestações para satisfação das necessidades vitais de quem não pode provê-las por si", em razão de idade avançada, enfermidade ou incapacidade, podendo abranger não só o necessário à vida, como "a alimentação, a cura, o vestuário e a habitação", mas também "outras necessidades, compreendidas as intelectuais e morais, variando conforme a posição social da pessoa necessitada. [03]
Contudo, tal convergência de conceitos não impede a tentativa de se formular uma conceituação própria. Qual seja: alimentos são prestações que objetivam atender às necessidades vitais e sociais básicas (como por exemplo, saúde e educação, gêneros alimentícios, vestuário, habitação), sejam elas presentes ou futuras, independente de sexo ou idade, daqueles que não podem provê-las.
É nesse ambiente que o presente trabalho vêm a lume tratar da obrigação alimentar, sua natureza jurídica, e suas características fundamentais. Quando se fala em alimentos fala-se no direito de exigi-los e na obrigação de prestá-los, marcando desse modo, o caráter assistencial do instituto.
2.NATUREZA E FINALIDADE
O ser humano se sente realizado quando dispõe de meios materiais, sejam quais forem. A obrigação alimentar é uma característica desta família moderna. Na organização social vigente, a pessoa obtém seus bens materiais por meio do seu trabalho, da sua renda. Contudo, nem sempre dispõe de recursos, seja para prover o sustento de sua família, seja para o seu próprio. É nesse momento que tal atribuição é imputada ao Estado, ou seja, lhe é atribuída a "idéia" de socorro aos necessitados, contudo, este impõe por meio da Lei a quem deve ser o real responsável pelos alimentos, nesse caso aos parentes, pois como prenuncia Maria Helena Diniz: o laço que os une é além de Moral, Jurídico [04].
Ainda segundo a referida autora, a finalidade do direito de alimentos seria:
fornecer a um parente aquilo que é necessário a sua manutenção, assegurando-lhe meios de subsistência, se ele, em razão de idade avançada, enfermidade ou incapacidade, estiver impossibilitado de produzir recursos materiais com o próprio sustento. [05]
Ou seja, tem a finalidade de atender a necessidade de uma pessoa que não consegue auto sustentar-se, prover seu próprio sustento. É um direito voltado para o ser humano, com conteúdo patrimonial e de finalidade pessoal.
É nesse sentido que o autor Arnoldo Wald preceitua a finalidade do direito de alimentos:
A finalidade de prover alimentos é, portanto, assegurar o direito á vida, subsistindo a assistência da família à solidariedade social que une os membros da coletividade, uma vez que os indivíduos que não tenham a quem recorrer diretamente serão, em tese, sustentados pelo Estado. Nesse sentido, o primeiro círculo dessa solidariedade é o de família, e somente na sua falta dever-se-á recorrer ao Estado. [06]
3.DAS PESSOAS OBRIGADAS A PRESTAR ALIMENTOS
Interessa nesse momento relembrar o que significa o termo "parentes". Estes, que são ligadas entre si em razão da consangüinidade ou adoção. O parentesco consangüíneo é formado pelos vários indivíduos originados de um mesmo tronco comum, ao passo que o parentesco civil é criado em decorrência da lei, criação artificial, fruto de manifestação espontânea das pessoas, caracterizado pela adoção. A afinidade não se enquadra no conceito de parentes, esta se constitui em um vínculo entre o casal (marido ou mulher) e os parentes do outro, isto é, entre sogro e genro, sogra e nora, por exemplo.
Diz-se que há parentesco em linha reta quando os membros forem descendentes uns dos outros – filhos dos pais, netos dos avós, por exemplo. E, em linha colateral, quando existir em comum o mesmo ascendente – dois irmãos filhos da mesma mãe. O grau de parentesco deve ser entendido como o "numero de gerações que separam os parentes.
Seguindo os ensinamentos de Arnoldo Wald [07], e entendendo da mesma forma, "os alimentos devidos entre parentes (fundamentados no dever legal de sustento), cônjuges e companheiros (calcados no dever de mútua assistência), são definidos, caracterizados e regulamentados legalmente nos artigos 1694 a 1710 do Código Civil".
Nesse sentido, pode-se extrair da Lei que os parentes podem exigir alimentos uns dos outros, todavia, é sabido que nem todos são obrigados a prestá-los. No entanto, a Lei restringe tal obrigação aos parentes em linha reta (ascendentes e descendentes) e aos colaterais até o 2º grau (irmãos germanos ou unilaterais), não havendo previsão de alimentos entre os afins. Importante fixar que, sobre o fundamento da obrigação alimentar, ele repousa no princípio da solidariedade que une os membros do mesmo grupo familiar.
Nesse sentido, sábia é a lição de Orlando Gomes [08]:
"Conquanto a lei disponha que os ascendentes devem alimentos uns em falta dos outros, é possível que o alimentando só consiga dos parentes em grau mais próximo parte dos que necessita. Nesta hipótese, podem ser chamados a concorrer para a prestação alimentícia parentes de grau posterior. Dá-se, então, o concurso entre parentes que pertencem a categorias diversas. É possível, assim, que a dívida seja paga, em conjunto, por um avô e um bisavô".
Diante do esboço dos autores acima, fica fácil a concepção daqueles que devem ser chamados para prestar alimentos. Em síntese seria em ordem: pai e mãe, demais ascendentes, descendentes, colaterais de 2º grau e por fim cônjuge ou companheiro.
Há um desconhecimento da lei e da possibilidade que dela surge, de buscar a prestação alimentícia dentre todos os parentes, e não, somente perante o pai, como emerge o pensamento do senso comum.
4.DA SATISFAÇÃO E EXTINÇÃO DA OBRIGAÇÃO
Nos casos de satisfação da obrigação de prestar alimentar, assim preceitua Maria Helena Diniz [09]:
O artigo 1.701 do Código Civil permite que o alimentante satisfaça sua obrigação por dois modos: dando uma pensão pecuniária ao alimentando, efetuando depósitos periódicos em conta bancária ou judicial, ou dando-lhe em sua própria casa (mesmo alugada), hospedagem e sustento, sem prejuízo do dever de prestar o necessário à sua educação, quando menor, nem interná-lo em asilos, nem sustentá-lo em casa alheia.
Como se refere o texto acima, pode alimentante escolher entre uma das formas elencadas no presente artigo do código, e nesse entendimento segue também o doutrinador Orlando Gomes, contudo, o juiz, na forma do artigo 1.701, parágrafo único, poderá fixar a maneira da prestação devida, sendo assim, esse direito de escolha não é absoluto.
Quanto a extinção desta obrigação, ela cessa pela morte do alimentando (neste caso devido a natureza pessoal), sempre lembrando que essa obrigação será transmitida até o momento da herança; essa obrigação ainda se extingue quando figura o "desaparecimento de um dos pressupostos do artigo 1.695 do Código Civil" (capacidade econômico-financeira do alimentante ou necessidade do alimentário); e por fim, pelo casamento, união estável ou procedimento indigno por parte do credor (casos do artigo 1.708 do Código Civil).
Nesse sentido, pesa o posicionamento do doutrinador Arnoldo Wald [10]:
o que se depreende, portanto, é que a obrigação alimentar, depois do advento da nova Lei Civil, também exige, assim como se dá em relação à adoção, a salvaguarda de um sólido vínculo de natureza moral entre alimentando e alimentante.
CONCLUSÃO
O tema alimentos, pela sua amplitude e importância, tem provocado inúmeros debates ao longo do tempo, mas sem dúvida, os maiores questionamentos eram no sentido de não se saber onde começa esse direito, quem tinha obrigação de prestá-lo e quando se extinguia. O presente trabalho foi fundamental no sentido de clarear as idéias do senso comum, cessando as antigas dúvidas e mostrando como o legislador pátrio foi feliz em suas atribuições legais, delegando poderes aos "parentes", e na ausência destes, como se dá a prestação oferecida pelo Estado em socorro aos necessitados.
Dessa forma, entende-se que a obrigação alimentar se difere do dever de sustento. Este resulta de imposição legal, é ato unilateral e o seu cumprimento deve ser efetuado incondicionalmente. É o caso do dever de sustento do pai em relação aos seus filhos menores, por exemplo. Decorre do pátrio-poder, havendo posição doutrinária no sentido de que o referido dever é sempre exigível, não importando a situação econômica do devedor. Já a obrigação alimentar é fundada no "princípio da solidariedade" que une os componentes do mesmo grupo familiar, onde o dever de ajuda é recíproco. Contudo, deve estar pautada, como se referiu o doutrinador Silvio Rodrigues, no binômio necessidade/possibilidade [11].
Ficou esclarecido que os parentes estão ligados pelo vínculo da solidariedade, e que o dever de socorrer os seus membros necessitados deve ser assumido por todos os entes do núcleo. A natureza jurídica do direito à prestação, como foi melhor caracteriza como sendo um direito de conteúdo patrimonial e finalidade pessoal, e a satisfação se mostra no dever de dar pensão ao alimentando (dar-lhe em casa hospedagem e sustento) e se extingue com a morte do alimentando, desaparecimento dos casos do artigo 1.695 do Código Civil e nos casos do artigo 1.708 do CC. [12]
REFERÊNCIAS
RODRIGUES, Sílvio. Direito Civil: Direito de Família. Vol.6. 28 Ed. São Paulo: Saraiva.
CAHALI, Yussef Said. Questão dos Alimentos. Revista dos Tribunais. 4ª Ed. São Paulo.
GOMES, Orlando. Direito de Família, 11ª ed.,Rio de Janeiro: Revista Forense, 1999.
GOMES, Orlando. Questões sobre Alimentos. São Paulo. Revista dos Tribunais.
DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro, v. 5, 22ª ed., São Paulo: Saraiva, 2007.
WALD, Arnoldo.O Novo Direito de Família. 16 Ed.
Notas
- Silvio Rodrigues. Direito Civil: Direito de Família. Vol.6. 28 Ed. P.374
- Yussef Said Cahali. Questão dos Alimentos. Revista dos Tribunais. 4ª Ed. São Paulo. P. 533
- Orlando Gomes. Questões sobre Alimentos. São Paulo. Revista dos Tribunais. P.455
- Maria Helena Diniz. Curso de Direito Civil Brasileiro. Vol.5. 22Ed. P.538
- Maria Helena Diniz. Curso de Direito Civil Brasileiro. Vol.5. 22Ed. P.572
- Arnoldo Wald. O Novo Direito de Família. 16 Ed. P. 43 e 44.
- Arnoldo Wald. O Novo Direito de Família. 16 Ed. P.46.
- Orlando Gomes. Direito de Família, 11ª ed., Rio de Janeiro: Revista Forense, 1999
- Maria Helena Diniz. Curso de Direito Civil Brasileiro. Vol.5. 22Ed. P.564
- Arnoldo Wald. O Novo Direito de Família. 16 Ed. P.74.
- Silvio Rodrigues. Direito Civil: Direito de Família. Vol.6. 28 Ed.
- Maria Helena Diniz. Curso de Direito Civil Brasileiro. Vol.5. 22Ed. P.573