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Uma análise da Súmula 294 do TST à luz do princípio da norma mais favorável

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09/08/2011 às 08:12
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CONCLUSÃO

A dualidade prescricional instituída pela súmula 294 do TST não se constitui, definitivamente, na interpretação mais favorável da prescrição qüinqüenal constitucional. Com efeito, o critério diferenciador da aludida súmula para a incidência da prescrição total ou parcial não se coaduna com os fins do direito do trabalho, principalmente pela natureza alimentícia das verbas trabalhistas. Desse modo, e apesar de determinadas parcelas não decorrerem de preceito de lei, não se afigura razoável instituir modalidade prescricional menos favorável ao trabalhador com base no título jurídico, posto que muitas dessas parcelas transcendem tal critério, e passam a integrar a remuneração obreira como se parcela legal fossem. É de ver-se que nem todo ato único do empregador é capaz de sepultar os efeitos daquelas verbas tidas efetivamente como de trato sucessivo, pelo que a incidência da prescrição total sobre tais parcelas constitui-se em flexibilização prejudicial ao obreiro da norma prescricional trabalhista.

Obviamente que a aplicação da prescrição total no direito do trabalho não se constitui em medida impossível ou mesmo absurda. A propósito, a própria prescricional bienal instituída pela Carta Magna possui natureza de prescrição total. No entanto, sua aplicação aos créditos trabalhistas precisa observar, além da natureza jurídica do título creditício, o caráter de trato sucessivo, ou não, desses créditos, a fim de que somente nas obrigações decorrentes de um único ato venha incidir tal modalidade prescricional. Nesta senda, e conforme ensinamentos de Mauricio Godinho, tem-se que o direito do trabalho não se confunde com o direito civilista, em que a prescrição, como regra, atua de forma total e não parcial, e isto pela natureza das obrigações avençadas nessa seara do direito, as quais se exaurem, em sua maioria, num único ato.

Neste sentido, a súmula 294 do TST, para além das críticas aqui ventiladas, necessita de uma revisão quanto ao tratamento conferido à prescrição dos créditos trabalhistas, a fim de que o critério diferenciador para a aplicação da prescrição total ou parcial não esteja lastreado apenas na origem do crédito, mas acima de tudo, no caráter sucessivo ou não das prestações pactuadas, observando-se, em todo o caso, o princípio da norma mais favorável, o qual, conforme registrado alhures vincula a atuação dos militantes da seara laboral em três momentos específicos: na elaboração, no confronto e na interpretação das regras jurídicas.

Se ao órgão superior da justiça do trabalho incumbe interpretar e pacificar as controvérsias surgidas entre empregado e empregador quando da aplicação das normas trabalhistas, e isto por meio da criação de verdadeiros atos-regra (Súmulas e OJs), sua atuação deve ter como parâmetro o princípio da proteção ao trabalhador, considerado em sua tríplice manifestação, a saber, como princípio in dubio pro operario, princípio da norma mais favorável e princípio da condição mais benéfica.

Com efeito, dessa tríplice base principiológica depende todo o direito do trabalho, cuja razão epistemológica é assegurar à parte hipossuficiente da relação trabalhista um plus protetivo, capaz de minimizar as desigualdades das partes nessa relação. E assim, mesmo sendo impossível ao princípio da proteção – norma basilar do direito do trabalho – afastar a incidência do instituto da prescrição sobre os créditos trabalhistas, é possível impedir o agravamento prescricional sobre essas parcelas, de modo a assegurar sempre, uma interpretação mais favorável ao trabalhador, exceto em situações justificáveis, como por exemplo, em momentos de crises econômicas, quando o próprio princípio da norma mais favorável necessita de certa flexibilização.

Destarte, e somente levando-se em consideração essa razão epistemológica do direito do trabalho, é que o ativismo judiciário do TST, por meio de suas súmulas e orientações jurisprudenciais, poderá cumprir sua precípua missão de efetivar os preceitos trabalhistas constitucionais, cujas disposições, iniludivelmente, espraiam o manto da proteção ao trabalhador mesmo quando se afigure necessário extinguir os créditos trabalhistas pela incidência da prescrição. Efetivamente, as Súmulas e Orientações Jurisprudenciais emanadas do órgão superior da Justiça do Trabalho, e que, num jogo de "vai e vem" titubeiam entre a proteção e a flexibilização das normas trabalhistas, a exemplo da súmula 294, carecem de uma profunda e séria revisão, que lhes conduzam, antes de qualquer possibilidade de regulamentação infralegal, a um confronto inadiável perante os princípios do Direito Trabalhista.


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Notas

  1. GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo Curso de Direito Civil –Parte Geral – Vol. I. São Paulo: Saraiva, 2003.
  2. DELGADO. Mauricio Godinho. Curso de direito do trabalho.8 ed. São Paulo: LTr, 2009, p. 255.
  3. BRASIL. Tribunal Superior do Trabalho. Súmula n.° 168. In: ___. Livro de Súmulas.Disponível em: <http://www.tst.jus.br/ jurisprudencia/Livro_Jurisprud/livro_html_atual.html> Acesso em 02 de ago. 2010, p. A-83.
  4. Idem., p. A-56.
  5. Op. cit. p. A-83.
  6. Op.cit., p. 255.
  7. ROMITA, Arion Sayão. A flexibilização das leis do Trabalho em debate: choque e correntes. In FILHO FRANCO, Georgenor de Souza (org). Presente e Futuro nas Relações de Trabalho. São Paulo: LTr, 2000, p. 118.
  8. Op.cit., p. 254.
  9. SOUTO MAIOR, Jorge Luiz. Os Princípios do Direito do Trabalho e sua negação por alguns posicionamentos jurisprudenciais. In MELO FILHO, Hugo Cavalcanti; et al. (coord.). O Mundo do Trabalho: Leituras críticas da jurisprudência do TST: em defesa do direito do trabalho. São Paulo: LTr, 2009, pp. 208, 209, 213.
  10. Antigo Enunciado 168 (cancelado pela Súmula 294 – Res. 4/1989 e publicada no DJ de 14, 18 e 19.04.1989).
  11. Artigo 7°, alíneas a e b, da CF/88 (revogado pela Emenda Constitucional n. 28 de 25.05.2000).
  12. ROMITA, Arion Sayão. A flexibilização das leis do Trabalho em debate: choque e correntes. In FILHO FRANCO, Georgenor de Souza (org). Presente e Futuro nas Relações de Trabalho. São Paulo: LTr, 2000, p. 118.
  13. TAUCEDA BRANCO, Ana Paula. O ativismo judiciário negativo investigado em Súmulas editadas pelo Tribunal Superior do Trabalho. In MELO FILHO, Hugo Cavalcanti; et al. (coord.). O Mundo do Trabalho: Leituras críticas da jurisprudência do TST: em defesa do direito do trabalho. São Paulo: LTr, 2009, p. 172.
  14. COUTINHO, Grijalbo Fernandes; MELO FILHO, Hugo Cavalcanti. O ativismo judicial do TST como fator de flexibilização do Direito do Trabalho no Brasil . In MELO FILHO, Hugo Cavalcanti; et al. (coord.). O Mundo do Trabalho: Leituras críticas da jurisprudência do TST: em defesa do direito do trabalho. São Paulo: LTr, 2009, p. 127.
  15. Op. cit., p. 213.
  16. Op. cit., p. 172.
  17. Henri de Page apud DELGADO, Mauricio Godinho, op. cit., p. 158.
  18. Op. cit., pp. 158-159.
  19. SANSÃO OLIVEIRA, Murilo Carvalho. Notas sobre a crise do Direito do Trabalho. Revista do Curso de Direito da Unifacs. Coleção acadêmica de Direito.Porto Alegre, v. 47, n. 6, p. 147, 2006.
  20. Op. cit., pp. 254-255.
  21. GARCIA, Gustavo Filipe Barbosa. Prescrição no direito do trabalho. 2 ed. São Paulo: Método, 2008.
  22. Op. cit., p. 118
  23. Op. cit., p. 255.
  24. MALLET, Estevão. Empregado rural. Revista Jurídica Consulex, São Paulo, v. 97, p. 57, jan. 2001.
  25. Vide art. 7°, XXIX, da Constituição Federal de 1988.
  26. SÚMULA 326. Tratando-se de pedido de complementação de aposentadoria oriunda de norma regulamentar e jamais paga ao ex-empregado, a prescrição aplicável é a total, começando a fluir o biênio a partir da aposentadoria. SÚMULA 327. Tratando-se de pedido de diferença de complementação de aposentadoria oriunda de norma regulamentar, a prescrição aplicável é a parcial, não atingindo o direito de ação, mas, tão-somente, as parcelas anteriores ao qüinqüênio.
  27. Op. cit., p. 255.
  28. NASCIMENTO. Amauri Mascaro. Curso de direito do trabalho. 24 ed. rev., e atual. e ampl. – São Paulo: Saraiva, 2009, p.341.
  29. Op. cit., p. 184.
  30. Op. cit., p. 149.
  31. Op. cit., p. 342.
  32. Op. cit., p. 255.
  33. Op. cit., p. 344.
  34. Idem, p.343.
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Sobre o autor
Gilberto Soares

Advogado em Salvador (BA).

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

SOARES, Gilberto. Uma análise da Súmula 294 do TST à luz do princípio da norma mais favorável. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 16, n. 2960, 9 ago. 2011. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/19729. Acesso em: 17 nov. 2024.

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