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Da supressão do prequestionamento quando ventiladas matérias de ordem pública no recurso extraordinário. É possível?

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A norma processual prevista no art. 267, § 3º, do CPC, dada sua generalidade, não pode prevalecer sobre a constitucional, prevista no art. 102, III e 105, III, que são expressas no sentido de que a questão constitucional ou federal deverá ser decidida em única ou última instância, necessitando, assim, do prequestionamento.

A questão aqui tratada passa obrigatoriamente pelo efeito translativo recursal em contraposição ao instituto do prequestionamento. Em sede de recurso extraordinário, ou mesmo especial, será ele necessário para conhecimento de matérias de ordem pública que, em tese, não precluem? Ou ainda, mesmo se não alegada a dita matéria nas instâncias ordinárias posso ventilá-la na irresignação excepcional?

Analisando as indagações aqui colocadas, temos que a definição de prequestionamento já é por demais tormentosa. Para uma primeira corrente, é a necessidade de que a matéria tenha sido suscitada antes do julgamento recorrido. Uma outra vertente define-o como a questão decidida pelo acórdão a ser impugnado, não bastando a mera alegação da matéria. Por fim, a terceira corrente contenta-se com a decisão sobre o tema ventilado, ainda que não se tenha verificado anterior debate.

Para aguçar ainda mais a questão, temos as súmulas 282, do STF: "É inadmissível o recurso extraordinário, quando não ventilada, na decisão recorrida, a questão federal suscitada" e 356, também do Pretório Excelso: "O ponto omisso da decisão, sobre o qual não foram opostos embargos declaratórios, não pode ser objeto de recurso extraordinário, por faltar o requisito do prequestionamento".

Vendo este rigor, quando o assunto é prequestionar a matéria para ser conhecida em eventual recurso extraordinário, surge-nos a dúvida quanto às matérias de ordem pública: se não forem ventiladas nas instâncias inferiores ou não tenham sido objeto do recurso excepcional, poderiam ser conhecidas de ofício, por ocorrência do efeito translativo recursal?

Exemplificando. Dispõe o art. 267, do CPC: "Extingue-se o processo, sem resolução de mérito: (...) VI - quando não concorrer qualquer das condições da ação, como a possibilidade jurídica, a legitimidade das partes e o interesse processual". Ainda seu parágrafo 3º: "O juiz conhecerá de ofício, em qualquer tempo e grau de jurisdição, enquanto não proferida a sentença de mérito, da matéria constante dos ns. IV, V e VI; todavia, o réu que a não alegar, na primeira oportunidade em que lhe caiba falar nos autos, responderá pelas custas de retardamento.

Pela análise destes dispositivos do CPC, responderíamos as questões aqui colocadas de maneira positiva. Ora, se o juiz pode conhecer de ofício, em qualquer tempo e grau de jurisdição as matérias de ordem pública, pois não estão sujeitas à preclusão, restaria cristalina a possibilidade de suscitá-las em sede de recurso extraordinário, independente de prequestionamento ou mesmo de não ter sido objeto de tal recurso.

Soma-se a isto o chamado efeito translativo recursal, ou seja, a capacidade que tem o tribunal de avaliar matérias que não tenham sido objeto do conteúdo do recurso, por se tratar de assunto que se encontra superior à vontade das partes.

Porém, não é assim que o STF trata do tema, respeitando, na íntegra, o teor de suas súmulas 282 e 356, já mencionadas. Neste sentido a ementa: "(...) Processual Civil. Incompetência do Juízo. Mesmo a alegação de incompetência absoluta não prescinde do questionamento, capaz de ensejar o recurso extraordinário, consoante súmulas 282 e 356". (STF, AgRg.Ag. Inst. nº 79.601-1/RJ).

Na mesma linha, a doutrina de José Miguel Garcia Medina: "Por tal razão, a nosso ver, as matérias que, nas instâncias ordinárias, podem ser conhecidas ex officio, em virtude da aplicação das disposições processuais mencionadas, não podem ser conhecidas ex officio em sede de recurso extraordinário e especial." (2002, p. 216-285).

Este raciocínio se faz em virtude de que a norma processual prevista no art. 267, § 3º, do CPC, dada sua generalidade, não pode prevalecer sobre a constitucional, prevista no art. 102, III e 105, III, que são expressas no sentido de que a questão constitucional ou federal deverá ser decidida em única ou última instância, necessitando, assim, do prequestionamento.

Ab initio, até pensamos na possibilidade do conhecimento de matérias de ordem pública de ofício, via recurso extraordinário, e por arrasto o especial, sem o devido prequestionamento, ou mesmo pela ocorrência do efeito translativo recursal, por aplicação literal da norma insculpida no art. 267, § 3º, do CPC. Chegamos até pensar, se não fosse o caso, na possibilidade do futuro ajuizamento de ação rescisória por violação expressa deste dispositivo legal (art. 485, V, do CPC).

Porém, quando da elaboração deste artigo, depreendemos a ratio constitucional da jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, ou seja, a norma constitucionalmente imposta, por ser de hierarquia superior, deve prevalecer sempre, ainda mais quando em contraste com norma ordinária. Assim, relegada está a aplicação do art. 267, § 3º, do CPC e o translativo recursal às instâncias ordinárias.


BIBIOGRAFIA.

BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Disponível em: <http://www.stf.jus.br>. Acesso em 30/05/2011.

MEDINA, José Miguel Garcia. Prequestionamento. Fonte: O prequestionamento nos recursos extraordinário e especial, e outras questões relativas a sua admissibilidade ao seu processamento. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2002, 3ª ed., itens 3.2.2 e 3.2.3, p. 216-285.

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NEGRÃO, Theotonio, GOUVÊA, José Roberto F., BONDIOLI, Luis Guilherme A. Código de processo civil. 42. ed. São Paulo: Saraiva, 2010.

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Sobre o autor
Frederico Augusto Passarelli Mendonça

Oficial de Registro de Títulos e Documentos e Civil das Pessoas Jurídicas da Comarca de São Gonçalo do Sapucaí/MG - Pós Graduado em Direito Público pela Faculdade de Direito do Sul de Minas/IBEC - Instituto Brasileiro de Estudos Constitucionais; Pós Graduado em Direito Processual Civil - LFG/Anhanguera-Uniderp; Pós Graduando em Direito Notarial e Registral - LFG/Anhanguera-Uniderp

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

MENDONÇA, Frederico Augusto Passarelli. Da supressão do prequestionamento quando ventiladas matérias de ordem pública no recurso extraordinário. É possível?. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 16, n. 2994, 12 set. 2011. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/19973. Acesso em: 18 dez. 2024.

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