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Direito à liberdade (sobre a Lei 9296/96)

19/11/1997 às 00:00
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Consagrado em nossa Constituição de 1.988, o Direito à Liberdade, vem integrar nosso ordenamento jurídico penal a Lei 9.296, de 24/07/96, que trata das Interceptações Telefônicas, a qual merece algumas considerações a serem observadas, mesmo que seja a mesma, uma regulamentadora do Artigo 5º, inciso XI da Carta Magna vigente.

Há que se atentar ao fato da presente Lei, dar às Autoridades Judiciárias e Policiais, de nosso país, um instrumento de reprimenda jamais vista em nossa história recente.

Aqui gostaria de alertar, pois, nem mesmo em nossos períodos de ditadura, aqueles que no poder estavam, realizaram tal ato, qual seja, impor, baseando na "Luta pelo Social", à sociedade brasileira, uma lei vexatória, quanto a que se nos apresenta.

Dessas épocas, até se era sabido que se prestavam o serviço de inteligência dos ditadores que tal fato acontecia, com só uma diferença, realizavam estes ilícitos às "escuras", imaginando que a população não sabia dessa práticas.

Hoje, porém, tal prática será lícita do ponto vista jurídico-legal, visto que agora temos, como se isto fosse algo de orgulho, uma lei autorizadora.

Com a promulgação da respectiva lei, todo cidadão, honesto ou não e, aí enseja outra consideração, pois, só deixamos de ser honesto com o devido processo legal, onde após ser esgotados todos os meios de se provar nossa inocência, é que deixamos esta qualidade e passaremos integrar o rol dos reprováveis sociais; com nova Lei estará a sociedade em geral a mercê de seja tolhido em definitivo, a garantia constitucional, que é a presunção de inocência, pois se ao devassarem a vida de todo cidadão, ainda que, somente existe uma suspeita de delito, ou pior ainda, se se é parente ou amigo daquele em que estão os meios repressivos espionando, terá o que para alegar sua inocência? Creio que nada mais poderá ser dito ou apresentado para que seja apreciado, visto que o magistrado autorizador da quebra de sigilo da comunicações, tem em sua gaveta, toda a vida daquele que se está sendo processado.

Talvez, seja este um dos maiores riscos que a nova lei trás para os operadores do Direito, mais em particular aos defensores, que ao serem surpreendidos com clientes seus nessas situações, irão ao processo apenas para discutir se é ou não válida a prova existente.

Em nome de, toda lei elaborada e promulgada, foi pela vontade do povo, nossos legisladores criam mecanismos que desrespeitam àqueles que neles confiaram suas aspirações políticas-sociais.

Outra questão não menos importante e que liga-se diretamente à da liberdade, é a que não se terá mais direito à intimidade. Qualquer um de nós teremos nossa intimidade, que nos é tão preciosa invadida. Saberão os meios judiciais de nossa vida mais intima, pois a autoridade será obrigada a transcrever toda as conversações telefônicas devassadas legalmente, o que, com efeito se saberão se somos bons amigos, maridos, filhos, pais; teremos um sem fim de conversações gravadas, visto que o artigo 5º da lei em tela, prevê que se possa devassar a vida dos investigando pelo prazo de 15 dias, podendo, portanto, dilatar-se por igual período o prazo inicial, sob indispensável justificativa para tal.

Fala o Artigo 8º da lei apreciada aqui, em "... preservando-se o sigilo das diligências, gravações e transcrições respectiva". A que sigilo referiu-se o legislador, visto que uma gama enorme de pessoas tomarão conhecimento daquilo que se esta devassando. Pois, se dá o direito a que funcionários das concessionárias telefônicas realizem as interceptações (grampos), seguida daquele agente policial que transcreverá o que dito se foi, aos funcionários do forum que receberão o inquérito com tal transcrição.

Ora, é inerente ao ser humano a curiosidade sobre às pessoas, principalmente ao que tange a sua intimidade, aliás recentemente tivemos uma perda incalculável da Princesa Dianna, vítima da quebra de sua intimidade por parte dos paparazzi. Seremos também vítimas dos paparazzi do meios judiciais?

Falou também o legislador que toda a prova imprestável aos autos, serão anuladas por decisão judicial, na fase inqueritorial, na fase processual ou após essa, por requerimento do Ministério Público ou da parte (artigo 9º).

Vejamos, se devem ser inutilizadas as imprestáveis provas por decisão judicial, onde reside o sigilo? Ou ainda, se assim não entender o magistrado, a devassa se tornará pública? Penso que sim, pois o segredo de justiça em que trata o artigo 1º, apenas se dá aos que não lidam diretamente com o processo ou inquérito em seus dia-a-dia, seria para os que não sejam parte naqueles autos, o que nada possa impedir que seja revelado para outrem por parte destes, é curiosidade humana aqui já declinada.

Seremos, pois devassados a qualquer momento por nem mesmo sabermos o motivo.

Tal lei em seus 12 artigos jamais refere-se na questão do sigilo profissional, a exemplo o sigilo assegurado pelo Lei n.º 8.906, de 04/07/94, Estatuto da Advocacia e O.A.B, que em seus artigo 7º, inciso trata do sigilo à suas correspondências, comunicações ou afins, dentre outros direitos assegurados. Como ficaria a questão suscitada?

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Poderiam responder mas são as comunicações realizadas em escritórios.

Até seria condizente tal resposta , senão fosse o fato de que o Advogado é profissional liberal e, como tal, poderá exercer seu mister em qualquer lugar, até mesmo dentro de sua residência, como aliás incomum não é. E, ademais, é comum verificar-se nos meios advcatícios o fato em que, mesmo tendo sua banca em endereço diverso de sua residência, o advogado acaba sempre fornecendo a alguns clientes o número do telefone residencial, ou mesmo poderá no aconchego de seu lar receber uma ligação telefônica de um colega advogado lhe pedindo opinião sobre um devido processo de seu cliente, onde o receptor de tal ligação se verá constrangido da mesma forma que o amigo, em ter sua intimidade invadida sem mesmo ser ligado ao caso.

Finalmente, tal lei se verifica um imenso constrangimento, por não se poder falar em inconstitucionalidade, visto que fora bem recebida pelo nossos Tribunais Superiores. Não tendo como se resguardar desse ato "data venia" repugnante de nossos legisladores, visto que abrange todas as formas de comunicações, telefônicas, informatizadas e telematizadas. É de se repensar nessa hipóteses aqui expostas a reflexão, sendo que nem mesmo o cuidado que se pretendeu dispensar, fazendo com que as Autoridades judiciárias e policias tenham, a mim parece serem inevitáveis que sejam cumpridas.

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Sobre o autor
Ricardo Braga Lou

membro do Instituto de Ciências Criminais (IBCCrim) e da Associação dos Advogados Criminais do Estado de São Paulo (ACRIMPESP)

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

LOU, Ricardo Braga. Direito à liberdade (sobre a Lei 9296/96). Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 2, n. 21, 19 nov. 1997. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/200. Acesso em: 23 dez. 2024.

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