6 – O RECURSO EXTRAORDINÁRIO
O Recurso Extraordinário, como antes visto, está disciplinado no artigo 102, inciso III, alíneas, da Constituição Federal, tendo por tal a justa inscrição no rol dos recursos constitucionais. Indissociável a disciplina das matérias passíveis de julgamento no recurso extraordinário com o disposto no caput do artigo 102 da CRFB-88.
Atento a esta questão, Araken de Assis defende, com muita propriedade, que o recurso extraordinário desempenha função constitucional de suma importância, tendo seu traço específico no quadro do controle de constitucionalidade. É a via, por excelência, o ápice da prestação jurisdicional para exercício do controle difuso de constitucionalidade. A partir da impugnação de julgados das instâncias ordinárias pelos litigantes, diferente do controle concentrado de constitucionalidade, dito de processo objetivo, onde a impugnação se faz sobre tese em abstrato a respeito do confronto de normas infraconstitucionais com o texto constitucional, no recurso extraordinário há um processo subjetivo, suscitado pela defesa do interesse das partes em um caso concreto. Sua evolução no direito pátrio demonstra forte inspiração no atual writ of certitionari, da Suprema Corte dos Estados Unidos da América, o que restou mais evidenciado pela regra da repercussão geral.
Insculpido na constituição, avulta-se o recurso extraordinário na impossibilidade de supressão ou de condicionamento do manejo de tal remédio pela via legislativa ordinária. Foi requerida emenda constitucional, a EC 45 de 2004, inserindo no art. 102 da CRFB-88 o parágrafo terceiro. O seu cabimento encontra-se definido nas alíneas "a", "b", "c" e "d" da Constituição Federal. Toda análise pode, e deve, ter centro no fato de que a natureza do Recurso Extraordinário é a de garantir a supremacia da Constituição Federal . Considerando o caput do art. 102 da Constituição, é o Supremo Tribunal Federal o guardião da Constituição, por conseguinte natural que a impugnação via recurso extraordinário traga elementos concretos que permitem ao STF afirmar a sua própria autoridade, sem prejuízo de outras vias impugnativas.
Não pode ser aqui olvidado toda a discussão sobre a crise decorrente do volume de julgamentos, decorrentes do número crescente de novos recursos extraordinários, e agravos de instrumentos, apresentados ao Pretório Excelso. Este, por sua vez, procura desenvolver uma jurisprudência defensiva, incluindo, como observado por Barione [40], sendo pacificado na jurisprudência do Supremo Sodalício a imprescindibilidade, na apresentação do recurso, da indicação de quais alíneas do inciso III do artigo 102 da Constituição definem o gênero de violação à constituição, sendo afastado o princípio iura novit curia, no entanto, na perspectiva do Tribunal, que seja dada interpretação de falta de zelo e certa atecnia do advogado, tem-se mais um filtro de bloqueio à subida de um considerável número de recursos. Ilustrativo transcrever o dispositivo do Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal que define tal exigência.
O recurso extraordinário para o Tribunal será interposto no prazo estabelecido na lei processual pertinente, com indicação do dispositivo que o autorize, dentre os casos previstos nos artigos 102, III, a, b, c, e 121, § 3º, da Constituição Federal.Art. 321.
Em regra o Supremo Tribunal Federal reconhecendo, em sede de controle difuso através de julgamento de recurso extraordinário, a inconstitucionalidade de dispositivo normativo, o efeito desta declaração resta limitado inter partes. Havendo, contudo, de a decisão reconhecer a inconstitucionalidade do ato normativo em caráter definitivo de determinada norma jurídica, efeitos mais amplos podem decorrer, como envio de comunicação da decisão ao Senado, que poderá promover, no todo ou em parte, a suspensão da execução do dispositivo legal inconstitucional, conforme art. 52, X da CRFB-88. Com o ingresso do instrumento da repercussão geral, há a ser observada uma tendência à objetivação do Recurso Extraordinário, a ser analisada adiante.
No âmbito da questão de ofensa reflexa ou ofensa direta à Constituição, nos é útil tomar um caso concreto que possa ilustrar a questão dentro da interpretação jurisprudencial do STF. A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal se firmou quanto à imprescindibilidade das garantias do devido processo legal. A supressão destas garantias, mesmo na esfera das relações tidas como privadas, viabiliza a possibilidade real de recurso extraordinário.
RECURSO EXTRAORDINÁRIO 201.819-8 RIO DE JANEIRO
RELATOR DO ACÓRDÃO
MIN. GILMAR MENDES
EFICÁCIA DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS NAS RELAÇÕES PRIVADAS. As violações a direitos fundamentais não ocorrem somente no âmbito das relações entre o cidadão e o Estado, mas igualmente nas relações travadas entre pessoas fisicas e jurídicas de direito privado. Assim, os direitos fundamentais assegurados pela Constituição vinculam diretamente não apenas os poderes públicos, estando direcionados também à proteção dos particulares em face dos poderes privados.
VOTO-VISTA
O SENHOR MINISTRO GILMAR FERREIRA MENDES:
(...)
Após o voto da eminente Relatora pedi vista dos autos por se tratar de um caso típico de aplicação de direitos fundamentais às relações privadas - um assunto que, necessariamente, deve ser apreciado sob a perspectiva de uma jurisdição de perfil constitucional.
O tema versado nos presentes autos tem dado ensejo a uma relevante discussão doutrinária e jurisprudencial na Europa e nos Estados Unidos.Valho-me aqui de estudo por mim realizado constante da obra "Direitos Fundamentais e Controle de Constitucionalidade - Estudos de Direito Constitucional", sob o titulo "Direitos Fundamentais: Eficácia das garantias constitucionais nas relações privadas - análise da jurisprudência da Corte Constitucional Alemã", desenvolvido com base em conferências proferidas no curso de Pós- Graduação da Faculdade de Direito da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, em 20/10/1994, e no 5º Encontro Nacional de Direito Constitucional (Instituto Pimenta Bueno) - Tema: "Direitos Humanos Fundamentais", em 20/09/1996, USP/SP.
No aludido ensaio, teço as seguintes considerações sobre o tema:
"A questão relativa à eficácia dos direitos fundamentais no âmbito das relações entre particulares marcou o debate doutrinário dos anos 50 e do início dos anos 60 na Alemanha. Também nos Estados Unidos, sob o rótulo da 'state action', tem se discutido intensamente a aplicação dos direitos fundamentais às relações privadas.
É fácil ver que a doutrina tradicional dominante do Século XIX e mesmo ao tempo da República de Weimar sustenta orientação segundo a qual os direitos fundamentais destinam-se a proteger o indivíduo contra eventuais ações do Estado, não assumindo maior relevância para as relações de caráter privado. Dos dois direitos fundamentais com notória eficácia para os entes privados (art. 118, 1, 1. período liberdade de opinião; arte 159, 2. período liberdade de coalizão) extraiu-se um argumentum e contrario. Um entendimento segundo o qual os direitos fundamentais atuam de forma unilateral na relação entre o cidadão e o Estado acaba por legitimar a idéia de que haveria para o cidadão sempre um espaço livre de qualquer ingerência estatal. A adoção dessa orientação suscitaria problemas de difícil solução tanto no plano teórico, como no plano prático. O próprio campo do Direito civil está prenhe de conflitos de interesses com repercussão no âmbito dos direitos fundamentais. O benefício concedido a um cidadão configura, não raras vezes, a imposição de restrição a outrem.
Por essa razão, destaca Rüfner que quase todos os direitos privados são referenciáveis a um direito fundamental:
(...)
Não se pode olvidar, por outro lado, que as controvérsias entre particulares com base no direito privado hão de ser decididas pelo Judiciário.
Estando a jurisdição vinculada aos direitos fundamentais, parece inevitável que o tema constitucional assuma relevo tanto na decisão dos tribunais ordinários, como no caso de eventual pronunciamento da Corte Constitucional.
Com base nas raras ocasiões em que a Corte se debruçou sobre o tema, é possível delinear os contornos que a aplicação dos direitos fundamentais nas relações privadas pode assumir (cf. SARMENTO, Daniel..Direitos Fundamentais e Relações Privadas. Rio de Janeiro: Lumen Xuris, 2004; SOMBRA, Thiago. A eficácia dos direitos fundamentais nas relações j uridico-privadas: A identificação do contrato como ponto de encontro dos direitos fundamentais. Porto Alegre: Sérgio Antonio Fabris, 2004; VALE, André Rufino do. Eficácia dos direitos fundamentais nas relações privadas. Porto Alegre: Sérgio Antônio Fabris, 2004; KAUFMANN, Rodrigo. Dimensões e Perspectivas da Eficácia Horizontal dos Direitos Fundamentais. Possibilidades e limites de aplicação no Direito Constitucional Brasileiro. Tese para a obtenção do título de Mestre em Direito apresentada em 2004 e orientada pelo Professor José Carlos Moreira Alves; BRANCO, Paulo Gustavo Gonet. Associações, Expulsão de Sócios e Direitos Fundamentais, Direito Público v. 1, n° 2 (out. /dez. 2003). Porto Alegre: Síntese; Brasília: Instituto Brasiliense de Direito Público, 2003, pp. 170-174; e SARLET, Ingo Wolfgang. A Eficácia dos Direitos Fundamentais. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 1998).
Muitos desses estudos desenvolveram-se também a partir dos positivos impulsos decorrentes das decisões proferidas por esta Corte.
(...)
Logo, as penalidades impostas pela recorrente ao recorrido, extrapolam, em muito, a liberdade do direito de associação e, sobretudo, o de defesa. Conclusivamente, é imperiosa a observância das garantias constitucionais do devido processo legal, do contraditório e da ampla defesa (art. 5º, LXV e LV, da CF).
Tem-se, pois, caso singular, que transcende a simples liberdade de associar ou de permanecer associado. Em certa medida, a integração a essas entidades configura, para um número elevado de pessoas, quase que um imperativo decorrente do exercício de atividade profissional.
Por outro lado havendo existência de processo legal, a questão de cerceamento de defesa por má aplicação das leis de processo é considerada ofensa reflexa à constituição. Neste sentido é suficiente um excerto da ementa de julgado recente.
RE 552031 AgR / BA - BAHIA
AG.REG. NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO
Relator(a): Min. ELLEN GRACIE
Julgamento: 03/05/2011
(...)
O Supremo Tribunal Federal entende que, em regra, as alegações de desrespeito aos postulados do devido processo legal, do contraditório e da ampla defesa, podem configurar, quando muito, situações de ofensa meramente reflexa ao texto da Constituição, circunstância essa que impede a utilização do recurso extraordinário (...)
No caminho, desprovido de facilidades, de formulação de um apelo pela via do recurso extraordinário, dimensionada a questão da ofensa direta à Constituição, o segundo passo a ser objeto de análise meticulosa, sopesadas as questões de direito e as razões de recurso, vem ser a repercussão geral.
Além de ter de fundamentar o seu recurso em uma das hipóteses do artigo 102, III, da CF/88, é também ônus do recorrente demonstrar o preenchimento do disposto no § 3º do art. 102 da CF/88 e no art. 543-A do CPC. É ônus do recorrente, pois do seu não cumprimento fatidicamente resultará o não conhecimento do recurso, apresentar em preliminar do recurso fundamentada demonstração de que há repercussão geral, ou seja, o objeto da lide ultrapassa o simples limite dos interesses das partes envolvidas e tem reflexos em âmbito da coletividade, em outros casos de similar natureza que possam se suceder. Oportuno, e de vital importância observar o disposto no § 2º do art. 543 do CPC, no que se vê a garantia da manutenção da autoridade da Suprema Corte. Observações muito adequadas são apresentadas por Didier Jr & Cunha [41]. Ponto fundamental vem a ser a questão da competência exclusiva do STF a apreciação sobre a existência, ou não, de repercussão geral.
Interposto recurso extraordinário contendo preliminar demonstrando repercussão geral, a pressuposição é pela existência desta. Somente o Plenário do STF, por votos de 2/3 de seus integrantes, pode deixar de reconhecer do recurso por falta de repercussão geral. Destarte fica evidente que está fora da competência do Presidente ou Vice-Presidente de qualquer tribunal a quo efetuar esta análise, configurando, se acontecendo, usurpação da competência do STF. É possível que a turma julgadora do STF conheça do recurso por reconhecer a repercussão geral pelo voto de no mínimo quatro dos seus integrantes, dispensada, dessa forma excepcional a remessa da questão ao plenário da Corte.
Cabe ao relator, nos termos do art. 323 do Regimento Interno do STF, analisar a admissibilidade do recurso na análise de todos os requisitos, inclusive da repercussão geral. Analisando a matéria objeto do recurso extraordinário, não identificado nenhum óbice ao conhecimento do recurso, como intempestividade, falta de preparo, ausência de prequestionamento, o que conduz à inadmissibilidade do recurso, analisando o teor deste, não se tratando de recurso com fundamento em súmula ou jurisprudência dominante do próprio STF, casos de pressuposição absoluta de repercussão geral, analisa-se a questão subseqüente. Em não sendo idêntico a outro cuja repercussão geral já tenha sido analisada antes, caso em que poderá haver pressuposição sumária de ausência ou de existência de repercussão geral, não sendo este o caso, o relator submeterá a questão aos demais ministros por meio eletrônico, que terão vinte dias para pronunciar-se, o fazendo por meio de plenário virtual. Esgotado tal prazo sem que chegue ao relator número suficiente de manifestações pela rejeição da repercussão geral, dá-se como cumprido o requisito. Se, de modo contrário, chegarem ao relator número de manifestações suficientes para quorum negando a repercussão geral, o recurso não será admitido por falta de tal requisito, e a matéria passará a instruir futuras decisões sobre casos idênticos. Por meio da emenda regimental nº. 31 de 2009, foi acrescido o § 2º ao art. 324 do RISTF, estabelecendo a partir de então a regra de que se o relator considerar que a matéria tem natureza infraconstitucional, a eventual ausência dos demais ministros será considerada como reconhecimento de não existência de repercussão geral, autorizando a parir de então, de plano, a aplicação do §5º do art. 543-A do CPC. O julgamento sobre a repercussão geral se dá com publicidade, e cada ministro fundamentando seu ponto de vista, registrados os debates, desta forma, embora o meio eletrônico, o plenário virtual, inexiste ofensa aos princípios constitucionais de processo.
O procedimento de admissibilidade, semelhante ao antes exposto, em capítulo anterior, é bipartido, objeto de dúplice juízo de admissibilidade, tal qual o recurso especial. Apresentado o recurso extraordinário, este será submetido à análise do presidente ou vice-presidente do tribunal de origem, a quem incumbe verificar questões de ordem formal, como preliminar de repercussão geral, sem adentrar no mérito, prequestionamento, preparo. Inadmitido na origem, incumbe à parte o ônus de agravar da decisão na forma do art. 544 do CPC, devendo enfrentar todas as razões da decisão impugnada, ou seja, todos os fundamentos da decisão que negou seguimento ao recurso.
O preparo é questão que exige cuidados. Salvo os casos cobertos pelo benefício da gratuidade de justiça, há duas guias de recolhimento a serem preenchidas, a do tribunal local e a GRU em favor da União. Útil observar o que dispõe a Lei 8.038/90 na forma dada pela Lei 9.756/98.
Art. 41-B - As despesas do porte de remessa e retorno dos autos serão recolhidas mediante documento de arrecadação, de conformidade com instruções e tabela expedidas pelo Supremo Tribunal Federal e pelo Superior Tribunal de Justiça. (Incluído pela Lei nº 9.756, de 1998).
A tabela de custas do Supremo Tribunal Federal está disponível no site da Corte, na Internet [42], e as dos tribunais locais em geral são disponibilizadas em suas próprias páginas na Internet, quanto disponibilizadas em quadro de avisos nos locais onde deve ser protocolada a petição de recurso no tribunal de origem.
Interposto a petição de recurso, conforme o artigo 542, caput, do CPC, a secretaria do tribunal deverá abrir vista ao(s) recorrido(s), de modo a permitir a apresentação de contrarrazões. A resposta do recorrido em contrarrazões é momento oportuno para que este indique quaisquer falhas que identifiquem, como erro no preparo do recurso, cabendo alegar deserção, irregularidade de representação do patrono da parte adversa, podendo alegar, se for o caso, intempestividade do recurso, e tudo mais que lhe aproveite. O despacho para apresentação de contrarrazões tem natureza de simples ato ordinatório, no entanto sua supressão é causa geradora de nulidade do procedimento por cerceamento de defesa e violação das regras de processo. O prazo para sua apresentação é de quinze dias, contados pela data de publicação da intimação pela imprensa oficial, e assim como acontece com o recurso, deve ser endereçada ao Presidente ou Vice-Presidente do tribunal de origem.
Um erro não tão incomum acontece quando o recorrido, diante de um recurso excepcional beneficiado pela gratuidade de justiça, tenta se valer das contrarrazões como instrumento de tentativa de impugnação da gratuidade de justiça concedida. Tal erro gera fatalmente o efeito da preclusão do direito à impugnação pretendida, por uso da via imprópria, preclusão consumativa, bem como prejudica bastante, em evidente sinal de atecnia, os efeitos de convencimento de suas contrarrazões.
Sendo o Recurso Extraordinário essencialmente recurso de fundamentação vinculada, dirigido a um tribunal de sobreposição que vem a ocupar o ápice da jurisdição nacional, o rigor formal da fundamentação do recurso em caso de inobservância não será suprido por alegações posteriores de excessivo formalismo da corte superior, nem pela aplicação do princípio da instrumentalidade. Ao se manejar petição de recurso extraordinário é ônus exclusivo da parte indicar claramente qual a matéria constitucional se encontra vulnerada, alvo de maltrato direto que persista como vício após o esgotamento das instâncias ordinárias.
A hipótese mais comum de fundamentação do recurso extraordinário se dá por força do previsto na alínea "a" do inciso III do art. 102 da CRFB-88. A Constituição Federal não pode ter múltiplas interpretações por parte dos diferentes tribunais locais da Federação. É de bom alvitre do recorrente demonstrar de forma inequívoca que houve maltrato direto à norma constitucional, e não apenas vulneração da norma infraconstitucional, o que caracterizaria ofensa oblíqua ou reflexa à Constituição, sendo caso de recurso especial e não de extraordinário. Neste aspecto, é claríssima a dicção da súmula 636 do STF.
Não cabe recurso extraordinário por contrariedade ao princípio constitucional da legalidade, quando a sua verificação pressuponha rever a interpretação dada a normas infraconstitucionais pela decisão recorrida.
A questão de recurso extraordinário pela alínea "b" do inciso III do art. 103 requer uma razoável dose de cuidado. Qualquer declaração de inconstitucionalidade capaz de dar origem a recurso extraordinário deve obedecer à cláusula de reserva de plenário. Em tese cabe recurso extraordinário, no que transcrevemos a seguinte ementa.
Rcl 596 AgR / MA - MARANHAO
AG.REG.NA RECLAMAÇÃO
Relator(a): Min. NÉRI DA SILVEIRA
Julgamento: 30/05/1996 Órgão Julgador: Tribunal Pleno
EMENTA: - Reclamação. Competência. 2. Ação direta de inconstitucionalidade de lei estadual em face de norma da Constituição do Estado, que constitui mera repetição de dispositivo da Constituição Federal. 3. Competência do Tribunal de Justiça do Estado e não do STF, para processar e julgar originariamente a ação, na hipótese referida, cabendo, entretanto, da decisão definitiva da Corte local, recurso extraordinário ao Supremo Tribunal Federal, se a interpretação da norma constitucional estadual, que reproduz a norma constitucional federal, de observância obrigatória pelo Estado-membro, contrariar o sentido e o alcance desta. 4. Precedentes do STF. 5. Indeferida cautelar pleiteada na reclamação, interpôs-se agravo regimental. 6. O agravo regimental não afastou os fundamentos do despacho agravado, examinando, entretanto, o mérito da controvérsia posta na ação. 7. Agravo regimental desprovido.
No entanto, em que se considere a jurisprudência do próprio STF, hão de ser sopesados todos os pré-requisitos quanto ao rigor técnico no manejo do recurso extraordinário, no que a ausência de requisitos pode conduzir ao não provimento do apelo. Neste sentido demonstra o teor de ementa recente.
RE 382944 AgR / RJ - RIO DE JANEIRO
AG.REG. NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO
Relator(a): Min. ELLEN GRACIE
Julgamento: 01/02/2011 Órgão Julgador: Segunda Turma
EMENTA
DIREITO ADMINISTRATIVO. AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO EXTRAORDINÁRIO. INCONSTITUCIONALIDADE DE LEI MUNICIPAL EM FACE DA CONSTITUIÇÃO ESTADUAL. OFENSA AO ART. 97 DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL: INEXISTÊNCIA. ART. 61, §1º, D, DA CF/88. AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO. REEXAME DA LEGISLAÇÃO LOCAL: IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA STF 280. 1. A norma municipal foi declarada inconstitucional pelo órgão especial do TJ/RJ, o que afasta a alegação de ofensa ao princípio da reserva de plenário prevista no art. 97 da CF/88. 2. É inadmissível recurso extraordinário no qual, a pretexto de ofensa a princípios constitucionais, pretende-se o reexame de legislação local, dado o óbice da Súmula STF 280. 3. O art. 61, § 1º, d, da Constituição Federal tido como violado não foi prequestionado, porque não abordado pelo acórdão recorrido, nem nos embargos de declaração a ele opostos. Incidem, na espécie, os óbices das Súmulas STF 282 e 356. 4. Agravo regimental a que se nega provimento.
De suma importância ter em mente que ao contrário do Superior Tribunal de Justiça, que admite o prequestionamento implícito, e inadmite o prequestionamento ficto, o Supremo Tribunal Federal não admite o prequestionamento implícito.
AI 732104 AgR / BA – BAHIA
AG.REG. NO AGRAVO DE INSTRUMENTO
Relator(a): Min. ELLEN GRACIE
Julgamento: 03/05/2011
EMENTA
ADMINISTRATIVO E PROCESSO CIVIL. AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO. IMPOSSIBILIDADE, NO CASO, DE PREQUESTIONAMENTO IMPLÍCITO. 1. Os dispositivos constitucionais tidos como violados não foram prequestionados pelo acórdão recorrido, ao qual não foram opostos embargos de declaração. Incidência das Súmulas STF 282 e 356. 2. O Supremo Tribunal não admite, em princípio, o prequestionamento implícito da questão constitucional. Precedentes. 3. Agravo regimental a que se nega provimento
Igualmente importante é ter em vista que os embargos de declaração não são o momento adequado para suscitar violação da questão constitucional, uma vez que impende à parte, em querendo ter como prequestionada a questão, apresentar todos os prequestioanamentos explícitos e numéricos sobre a matéria constitucional que considera alvo de possível vulneração já em sede de razões de apelação. Neste sentido claríssima ementa recente do STF.
RE 566756 AgR / PR – PARANÁ
AG.REG. NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO
Relator(a): Min. ELLEN GRACIE
Julgamento: 29/03/2011
EMENTA
CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO EXTRAORDINÁRIO. PUBLICIDADE AO AR LIVRE. FAIXA DE DOMÍNIO NO PERÍMETRO URBANO DE CURITIBA. INTERESSE MUNICIPAL E INTERESSE COMERCIAL DA CONCESSIONÁRIA. ART. 22, IX e XI, da CF. AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO. SÚMULAS STF 282 E 356. 1. Ausência de prequestionamento dos dispositivos constitucionais tidos como violados, porque não abordados pelo acórdão recorrido, e, embora suscitados nos embargos de declaração a ele opostos, não foram apontados oportunamente na ocasião em que foram apresentadas as razões de apelação. Súmulas STF 282 e 356. Precedentes. 2. Agravo regimental a que se nega provimento
A questão exposta de declaração de inconstitucionalidade de dispositivo normativo de ordem nacional ganha outro contorno de complexidade quando se dá por órgão fracionário do tribunal a quo. Temos violação de súmula vinculante.
Viola a cláusula de reserva de plenário (cf, artigo 97) a decisão de órgão fracionário de tribunal que, embora não declare expressamente a inconstitucionalidade de lei ou ato normativo do poder público, afasta sua incidência, no todo ou em parte.
Se a causa de violação a dispositivo constitucional for unicamente de natureza de órgão fracionário afastar a incidência de lei federal, declarando explicitamente, ou não, a inconstitucionalidade de lei nacional, o recurso a ser manejado é o da Reclamação, conforme o artigo 102, I, l, da Constituição Federal.
Por fim especial zelo técnico deve se ter em caso de interposição de recurso extraordinário com fulcro na alínea "c" do inciso III do art. 102 da Constituição Federal, visto as grandes possibilidades de sobreposição com o disposto na alínea "d" do mesmo dispositivo.
Esta questão foi particularmente bem observada por Didier Jr. e Cunha [43], a hipótese de recurso extraordinário contra decisão recorrida que julgar válida lei ou ato de governo local contestado em face da Constituição Federal, analisando a questão sobre o prisma dos atos administrativos, da inexistência de ato administrativo totalmente discricionário, havendo sempre algum elemento de vinculação, inerente à decisão de validade do ato subjaz a validação de norma local elevada pelo acórdão recorrido a posição superior à da norma constitucional tida como afrontada. Quanto ao caso de fulcro somente pela alínea "d" do inciso III do artigo 102 da CRFB-88, importante observar o disposto nos artigos 22 e 24 da Constituição Federal, no que pode sempre acontecer usurpação de competências. Embora de âmbito genérico, a ementa a seguir traz aspectos bastante ilustrativos sobre a questão.
RE 421256 / SP - SÃO PAULO
RECURSO EXTRAORDINÁRIO
Relator(a): Min. RICARDO LEWANDOWSKI
Julgamento: 26/09/2006
EMENTA: CONSTITUCIONAL. PENAL. CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE DE LEIS OU ATOS NORMATIVOS MUNICIPAIS. TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO. VALIDADE DA NORMA EM FACE DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. IMPOSSIBILIDADE. HIPÓTESE DE USURPAÇÃO DACOMPETÊNCIA DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. I - Os Tribunais de Justiça dos Estados, ao realizarem o controle abstrato de constitucionalidade, somente podem utilizar, como parâmetro, a Constituição do Estado. II - Em ação direta de inconstitucionalidade, aos Tribunais de Justiça, e até mesmo ao Supremo Tribunal Federal, é defeso analisar leis ou atos normativos municipais em face da Constituição Federal. III - Os arts. 74, I, e 144 da Constituição do Estado de São Paulo não constituem regra de repetição do art. 22 da Constituição Federal. Não há, portanto, que se admitir o controle de constitucionalidade por parte do Tribunal de Justiça local, com base nas referidas normas, sob a alegação de se constituírem normas de reprodução obrigatória da Constituição Federal. IV - Recurso extraordinário conhecido e provido, para anular o acórdão, devendo outro ser proferido, se for o caso, limitando-se a aferir a constitucionalidade das leis e atos normativos municipais em face da Constituição Estadual.
A Lei Federal 11.418/2006 ao inserir no Código de Processo Civil os arts. 543-A e 543-B passou a instituir o incidente de análise de repercussão geral por amostragem. O procedimento deve obedecer ao Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal, cabendo ao tribunal local selecionar um ou mais recursos representando o paradigma questão controversa, devendo todos os demais permanecer sobrestados no tribunal de origem até que o Supremo Tribunal Federal se pronuncie sobre a questão. Os §§ 2º, 3º e 4º determinam o desenrolar da questão após o STF se pronunciar sobre a questão. Os recursos sobrestados que forem considerados subsumidos, completamente, a uma tese sobre a qual o STF tenha decidido não caber repercussão geral serão automaticamente tidos como inadmitidos. Julgada a repercussão geral, os recursos sobrestados são reenviados aos órgãos julgados fracionários do tribunal de origem, os quais podem modificar os julgados ou considerá-los prejudicados. Mantido o julgamento, os recursos poderão subir ao Supremo Tribunal Federal, em estando contrários à orientação firmada pelo Pretório Excelso, onde poderão ser ou reformados ou cassados os arestos que mantenham orientação oposta à firmada pela superior instância.
Bastante oportuno neste ponto explanarmos uma questão em nada desimportante. Não apenas cabe recurso extraordinário contra decisão de juizado especial cível, quanto os recursos estão sujeitos à mesma sistemática da repercussão geral. Neste sentido temos do próprio STF o incidente de repercussão geral do qual transcrevemos excertos:
REPERCUSSÃO GERAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO 631.389-CEARÁ
RELATOR: MINISTRO MARCO AURÉLIO MELLO
PRONUNCIAMENTO
(...)
2. O conflito de interesses envolve o princípio isonômico, de matriz constitucional, no tocante a servidores ativos e inativos. A matéria repercute sobremodo no campo social e econômico, porquanto a parcela remuneratória é observada no âmbito do Poder Executivo. Cumpre ao Supremo, presentes os ditames constitucionais, elucidar o tema, mormente em se tratando de decisão judicial formalizada por Juizados Especiais, no caso, os Federais. Ante o disposto no artigo 105, inciso III, da Carta Federal, não se dá o acesso ao Superior Tribunal de Justiça, porque as Turmas Recursais não integram o Tribunal da Região. Daí a necessidade de, em prol da unicidade do Direito, não se adotar postura rígida quanto ao acesso ao Supremo mediante o extraordinário, sob pena de as Turmas Recursais terem a última palavra sobre o alcance de texto constitucional.
3. Admito a existência de repercussão geral.
4. Insiram o incidente no sistema do Plenário Virtual, disponível na intranet.
5. À Assessoria, para o acompanhamento cabível.
6. Procedam ao sobrestamento dos demais processos que envolvem a matéria. Sendo admitida a repercussão geral, há de determinar-se a baixa à origem, para aguardar-se o crivo deste Tribunal.
7. Publiquem.
Brasília residência, 6 de novembro de 2010, às l2h.
A propósito foi decisão do Supremo Tribunal Federal, zelando pela necessidade de nomofilaquia na interpretação das leis nacionais, que determinou caber ao Superior Tribunal de Justiça o instrumento de Reclamação contra decisões dos juizados especiais que derem interpretação à norma nacional diversa da firmada pelo STJ. Considerando a decisão do Pleno do Supremo Tribunal Federal nos EDcl no RE n. 571.572-8/BA, o Superior Tribunal de Justiça baixou a Resolução nº 12 de 2009, disciplinando prazos e procedimentos para ajuizamento de reclamação. Em que se tenha discutido o aspecto de cortes políticas dos tribunais de sobreposição, o Supremo Tribunal Federal demonstra ciência desta função, procurando zelar por uma interpretação uniforme da norma nacional, quer de ordem constitucional, quer de ordem infraconstitucional.
Uma questão que surge e se mantém até a presente data em aberto, no que diz respeito a pronunciamento definitivo de mérito por parte do Supremo Tribunal Federal, vem a ser de eventuais aplicações indevidas do instituto da repercussão geral. Qual instrumento manejar em acontecendo tal situação? Temos a posição do STF em relação a um primeiro procedimento qual deve anteceder o manejo da Reclamação. A devolução da questão ao Tribunal, ou ao Órgão Especial ou Corte Especial do tribunal a quo. A questão de como proceder fica didaticamente expressa nas próprias decisões do Plenário do STF.
AG.REG. NA RECLAMAÇÃO 9.155 SÃO PAULO
Relator: MIN. AYRES BRITTO
Julgamento: 25/11/2010 Órgão Julgador: Tribunal Pleno
1. Não se conhece de reclamação constitucional em que se impugna decisão do Presidente de Tribunal de origem que, aplicando a sistemática da repercussão geral, julga prejudicado agravo de instrumento em recurso extraordinário. A questão da identidade de matéria entre o recurso sobrestado e o paradigma se resolve no âmbito da própria instância de origem, via agravo interno. Precedentes: Rcls 7.547 e 7.569, da relatoria da ministra Ellen Gracie. (g.n)
Então como primeiro precedente temos:
RECLAMACÃO 7.569 SÃO PAULO
RELATORA: MIN. ELLEN GRACIE
Julgamento: 19/11/2009 Órgão Julgador: Tribunal Pleno
Todavia, as partes não podem ficar à mercê de indevidas aplicações do salutar instituto da repercussão geral. É preciso que o Tribunal, desde já, sinalize ao sistema judiciário a fórmula para solução desses impasses.
- Afigura-se claro que o manejo da reclamação é incabível porque não configurada nem a usurpação de competência, nem o desrespeito a decisão deste Tribunal, além de provocar manifestação do STF antes que sua jurisdição seja inaugurada. Além disso, traria o indesejável efeito colateral de ordem prática de abrir as portas do Tribunal a cada decisão nos Tribunais de origem que aplique nossa classificação positiva ou negativa de existência de repercussão geral.
Tendo em vista a ausência de outro meio eficaz para a correção da aplicação da jurisprudência firmada neste Plenário, concluo que o agravo interno a ser interposto no Tribunal de origem contra o ato da presidência que haja erroneamente classificado o caso concreto há de ser o instrumento adequado a ser utilizado. Este instrumento recursal possibilitará a correção, na via do juízo de retratação, ou por decisão colegiada. (g.n.)
Há uma lógica neste posicionamento da Suprema Corte, numa tendência que se firma de objetivação do Recurso Extraordinário. Ao invés de recurso contra uma decisão do Vice-Presidente ou Presidente do Tribunal, provoca-se a decisão do Tribunal a quo, unívoca. Então, só após o tribunal a quo assumir uma posição final, inaugura-se a competência do Supremo Tribunal Federal. Nem sempre a realidade opera num espectro de expectativas da Corte Superior. A Corte Especial do Tribunal Superior do Trabalho aplicou multa de 10% por considerar infundados e procrastinatórios os agravos internos A-AIRE-40270-39.2006.5.03.0134, A-AIRE-184270-52.2003.5.01.0051, A-AIRE-4170-36.2006.5.03.0021, A-AIRE-57770-29.2005.5.22.0101 e A-RE-ED-AIRR-87000-14.2001.5.09.0071. Por óbvio que este posicionamento gerou uma reação, o ajuizamento por parte do Metrô de São Paulo de Reclamação no STF, Rcl 11526. Distribuída ao Ministro Joaquim Barbosa, o último movimento relevante até a presente data da conclusão deste trabalho foi a certificação, em 12/05/2011, de ter decorrido o prazo para que a Vice-Presidência do TST prestasse informações solicitadas pelo STF, sem que estas tenham sido prestadas, seguindo o processo para a Procuradoria Geral da República para o devido parecer. Em que se sopesem meticulosamente todas as incertezas, as diferenças de opiniões dos Ministros do Supremo Tribunal Federal, no entanto esta Reclamação poderá definir como o Supremo Tribunal Federal irá equacionar a questão de permitir ou não que os tribunais a quo usurpem sua competência para dar a última palavra sobre repercussão geral. Isto poderia transformar a repercussão geral em verdadeira falácia de "leito de Procusto", facultando aos tribunais locais reduzirem todas as razões de recurso a uma única tese de inadmissibilidade julgada em repercussão geral pelo STF, passando a ter poderes de usurpar do Pretório Excelso mesmo o conhecimento dos agravos do art. 544.
Devemos ter uma visão pragmática. É pacífico, entre os estudiosos dos Recursos Constitucionais, que uma decisão das Instâncias Ordinárias pode se fundamentar, inclusive implicitamente, em um ou mais fundamentos infraconstitucionais, e, simultaneamente, em um ou mais fundamentos constitucionais. Diante deste quadro, a parte vencida que não apresenta recurso enfrentando todas as questões incorre em situação de preclusão lógica, por desistência tácita de seus recursos excepcionais [44]. Isto se considerando as súmulas 283 do STF e 126 do STJ. Teríamos mais que uma simples aplicação equivocada da repercussão geral, e sim verdadeiro cerceamento de defesa, em dimensão de retirar das cortes superiores para as instâncias ordinárias a última palavra sobre o julgamento de qualquer questão. Há de ponderar, no entanto, que esta questão demandará alguns julgamentos do Supremo Tribunal Federal para que se pacifique.
Quanto ao caso de retenção obrigatória do recurso extraordinário contra decisão interlocutória, cabem, a exemplo do recurso especial, as vias do agravo do art. 544 do CPC, ou medida cautelar inominada ao STF.
O Recurso Extraordinário tem como regra ser recebido no efeito apenas devolutivo, permitindo execução provisória do julgado. Com a regra da repercussão geral por amostragem vários recursos que permanecem retidos não sendo julgados em admissibilidade pelo STF, estão sujeitos ao mandamento da Súmula 635 do STF, verbis: "Cabe ao Presidente do Tribunal de origem decidir o pedido de medida cautelar em recurso extraordinário ainda pendente do seu juízo de admissibilidade". Negada a cautelar no tribunal de origem, não há impedimento formal de se buscar efeito suspensivo diretamente no próprio STF.
Bastante exemplificativo do poder geral de cautela conferido ao Pretório Excelso, e como este é exercido visando garantir a autoridade da Suprema Corte e a efetividade dos seus provimentos jurisdicionais, podemos citar o caso da Medida Cautelar Em Recurso Extraordinário 432.106 - Rio De Janeiro. Em breves linhas, embora pacificado o posicionamento no Superior Tribunal de Justiça de não cabimento de obrigações compulsórias à associação de moradores, o Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro mantém sumulado esta obrigatoriedade. Interposto Recurso Extraordinário, a associação de moradores iniciou a execução provisória, com o juízo a quo responsável pela execução da sentença abrindo processo de penhora do imóvel do recorrente, como por obrigação propter rem. A medida cautelar em questão suspendeu a execução do aresto até o julgamento final do recurso extraordinário.
Considerando que o Recurso Extraordinário tem admissibilidade bifásica, quer admitido na origem, quer manejado o agravo do art. 544 do CPC, na forma do RISTF, é sorteado o Relator para qual o recurso ou agravo é distribuído. O Relator poderá aplicar sumariamente o parágrafo 1-A do artigo 557, provendo o recurso monocraticamente, como poderá negar o prosseguimento do recurso com fulcro no caput do art. 557 do CPC. Da decisão do relator cabe agravo regimental à turma.
O agravo regimental pode, se for considerada matéria afeta ao Plenário, ser julgada pelo Pleno do Tribunal, na forma do artigo 6º, inciso II, alínea "d" do RISTF, ou pela turma, conforme art. 8, inciso I do mesmo Regimento Interno. A decisão do Relator que julgar deserto o recurso permite o manejo do agravo regimental na forma do art. 65, parágrafo único, do RISTF.
Os artigos 330 a 336 do RISTF disciplinam os embargos de divergência, cabíveis quando a decisão de uma turma divergir do julgado de outra turma, considerando que o STF é composto por duas turmas, ou de julgamento do Plenário.
Importante suscitar neste ponto o artigo 176 do Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal.
Art. 176. Argüida a inconstitucionalidade de lei ou ato normativo federal, estadual ou municipal, em qualquer outro processo submetido ao Plenário, será ela julgada em conformidade com o disposto nos arts. 172 a 174, depois de ouvido o Procurador-Geral.
Como última etapa desta breve análise sobre o Recurso Extraordinário, pode ser observada uma hodierna tendência à objetivação desta via recursal, procurando, no que se retira de apreciação em julgamento pelo STF questões de interesse apenas entre as partes, permitindo que se julguem questões que afetam à coletividade, a valorização do Recurso Extraordinário como um efetivo meio de controle difuso de constitucionalidade. O que seria racionalmente esperado é que as decisões dos Tribunais de Sobreposição refletissem nos julgamentos das instâncias ordinárias. Podemos apresentar como exemplo de como tal opção acontece a partir de um modelo de controle constitucional que se faz pela via do controle difuso, no que podemos transcrever um excerto de um julgamento da Suprema Corte dos EUA, qual, se algo de teor parecido for exarado do Supremo Tribunal Federal, causaria espécie aos tribunais locais.
U.S. Supreme Court
HUTTO v. DAVIS, 454 U.S. 370 (1982) [45]
Court decision after our decision in Rummel, the Court of Appeals sanctioned an intrusion into the basic line-drawing process that is "properly within the province of legislatures, not courts." Id., at 27 5-27 6. More importantly, however, the Court of Appeals could be viewed as having ignored, [454 U.S. 37 0, 37 5] consciously or unconsciously, the hierarchy of the federal court system created by the Constitution and Congress. Admittedly, the Members of this Court decide cases "by virtue of their commissions, not their competence." And arguments may be made one way or the other whether the present case is distinguishable, except as to its facts, from Rummel. But unless we wish anarchy to prevail within the federal judicial system, a precedent of this Court must be followed by the lower federal courts no matter how misguided the judges of those courts may think it to be.