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O recurso especial e o recurso extraordinário cíveis à luz da jurisprudência

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21/09/2011 às 16:19
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CONCLUSÃO

O presente trabalho buscou apresentar uma revisão dos Recursos Constitucionais Especial e Extraordinário através das lentes da jurisprudência das Cortes Superiores, sem olvidar a doutrina. Por um lado não podemos dizer que fomos tentados a cair no aforismo, qual tem seus adeptos, de que o Direito é pragmaticamente aquilo que decidem os Tribunais Superiores. A doutrina e a história do direito são conhecimentos importantes. Por outro lado se pretendemos estudar os Recursos Especial e Extraordinário, buscamos abordar questões pragmáticas e não puramente teóricas.

Pareceu-nos pragmático, bem quanto didático, diante de cada questão controvertida das etapas procedimentais de formulação e interposição dos recursos excepcionais, onde costumam acontecer falhas por parte dos que manejam tal via recursal levando a preclusão desta via recursal, não apenas apontar os possíveis equívocos em abstrato, como trazer excertos da jurisprudência demonstrando seus efeitos nos julgamentos destes recursos que não admitem atecnia. A jurisprudência demonstra casos concretos.

Uma questão que permeou todo desenvolvimento desta presente revisão foi o imenso número de recursos, seja extraordinário, seja especial, embora todos os novos filtros de admissibilidade, que chegam em número crescente aos Tribunais Superiores. A racionalidade do sistema recursal aos Tribunais de Cúpula e Sobreposição exige que haja rigorosa seleção das questões que serão levadas a julgamento nas cortes superiores. No entanto parece haver uma cada vez mais inútil jurisprudência defensiva reativa das Cortes Superiores, onde por vezes as partes e seus advogados são tidos como os vilões pelo sempre crescente risco de colapso, do risco dos Tribunais Superiores soçobrarem diante de um volume de processos do qual não poderão dar respostas.

Talvez seja momento de se pensar em uma jurisprudência defensiva proativa por parte das Cortes Superiores, principalmente do Supremo Tribunal Federal. A criação de mecanismos legais que valorizem os precedentes dos Tribunais Superiores.

A eficácia da valorização dos precedentes das cortes superiores, principalmente da Suprema Corte pode ser vista em julgamentos, transcritos neste presente trabalho, da Suprema Corte dos EUA, ponderando sobre se algo de teor parecido for exarado do Supremo Tribunal Federal, causaria reações que iriam além de espécie aos tribunais locais.

Analisando os julgados transcritos neste trabalho do modelo de controle de constitucionalidade e nomofilaquia dos Estados Unidos da América, do qual demonstramos o quanto influenciou nosso modelo de tribunais de sobreposição, em linhas gerais o que a Suprema Corte dos EUA afirma, reiteradamente, é quanto vem a ser desimportante o que pensam os membros das cortes inferiores a respeito de suas posições na magistratura e quais sejam as suas convicções. Deixa bem claro que a menos que se deseje que a anarquia prevaleça em todo sistema judicial dos EUA, um precedente da Suprema Corte deve ser seguido, independente do que pense os Magistrados dos tribunais a quo sobre a matéria. Pragmaticamente, as decisões da Suprema Corte dos EUA não são tidas como objeto de desafio, de solipsismos travestidos de "heroísmos" por parte das instâncias ordinárias. Evidencia-se, a partir do sistema do Common Law dos EUA, um conceito pragmático de segurança jurídica, de previsibilidade de julgamentos, e um caminho de evolução segura da jurisprudência. Importamos o modelo de Corte Suprema, no entanto o nosso sistema ainda se mostra deficiente na valorização dos precedentes do Superior Tribunal de Justiça e do Supremo Tribunal Federal.

Como uma conclusão nossa, a partir do todo antes analisado, defendemos que o Recurso Especial e o Recurso Extraordinário não podem ser vistos como simples insubordinação do jurisdicionado, como uma teratologia que retarda a conclusão da prestação jurisdicional, e sim como uma necessidade, disponível para aqueles que saibam enfrentar a verdadeira corrida de obstáculos que é conseguir o conhecimento e o julgamento, quiçá o provimento de um recurso excepcional, o único meio que há ao jurisdicionado de alcançar uma prestação jurisdicional menos lotérica, o derradeiro caminho a se valer da proteção da segurança jurídica. Os caminhos de criação de obstáculos ao direito de recorrer tem se mostrado ineficaz, sem que tenha se tentado ao menos modificações, que podem ser mesmo de ordem jurisprudencial, quais obriguem os tribunais locais em julgando por bem divergirem da orientação jurisprudencial das cortes superiores, o façam fundamentadamente.

Por fim, por ocasião da conclusão deste trabalho, tramita no Congresso uma Proposta de Emenda Constitucional que pretende restringir à simples impugnação de caráter rescisório os Recursos Especial e Extraordinário. Mesmo que seja tido como uma dose de ousadia, parece simplesmente a política de "mais do mesmo". Se com o atual sistema de tantos filtros os recursos excepcionais são a única via de se escapar de uma prestação jurisdicional lotérica, sem esta uniformização difícil imaginar o que virá.

Uma reflexão pode ser trazida à discussão. Será uma realidade de um abismo intransponível alguns aspectos dos sistemas jurídicos de Common Law em relação ao sistema jurídico brasileiro, de origem latino-germânica, comumente tido como do gênero do Civil Law? Não parece haver nenhum impedimento lógico, salvo cultural, o de aplicação fundamentada dos precedentes. A aplicação dos precedentes como parte essencial da fundamentação das decisões é algo trabalhoso para as instâncias ordinárias, exige um detalhamento dos fundamentos do precedente ao que se encontre em analogia no caso julgado. Algo muito diferente da aplicação de modelos pré-formatados, sobre o que faremos suscitar em apêndice aplicação de elementos de lógica formal quanto a impropriedades de certos métodos, talvez usados para fundamentar inadmissão de recursos aos Tribunais Superiores. A aplicação dos fundamentos dos precedentes das cortes superiores a cada caso que seja apresentado nas instâncias ordinárias pode ser um mecanismo eficiente de inibição dos recursos puramente protelatórios, no que as deficiências de julgamentos deixariam de dar azo, e por que não aceitar a realidade de darem sólidos fundamentos a recursos não protelatórios, como também teriam o poder dissuasivo de levarem inúmeras demandas a simplesmente nem surgirem.


REFERÊNCIAS

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APÊNDICE

Possíveis Paradoxos na Aplicação da Repercussão Geral

Neste apêndice buscaremos abordar questões pragmáticas sobre os questões metodológicas inerentes a aplicação da Repercussão Geral pelas instâncias ordinárias e pelos próprios Tribunais de Sobreposição.

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Parece-nos oportuno trazer uma explanação lógica para questão da impossibilidade de esgotar qualquer matéria em Direito. Não pretendemos reduzir o Direito à Lógica, no entanto inexiste a Ciência Jurídica sem a lógica.

Suponhamos um conjunto P = conjunto de todas as soluções possíveis de serem tidas como cabíveis aos paradigmas de repercussão geral já julgados pelo Supremo Tribunal Federal. P por natureza é um conjunto, cujos elementos são paradigmas em modelos.

Tomemos da Teoria dos Conjuntos o conceito de Conjunto Normal. Um conjunto é normal se não pertence a si mesmo. Ou seja, X é normal se X Ï X. (1)

Seja N o conjunto dos conjuntos normais, então N = {X ; X normal} = {X ; X Ï X}. Assim definido, N é um conjunto tal que cada elemento seu é um conjunto normal.

Uma questão exsurge. N é um conjunto normal?

Se N é normal, então, teríamos que N Î N, conduzindo à condição de N não ser normal. Contradição.

Se N não é normal, logo não pertence ao conjunto dos conjuntos normais, o que conduz a situação de N Ï N, conduzindo a condição de N ser normal! Contradição.

Temos um paradoxo. Mais especificamente o Paradoxo de Russell [46].

Tomemos a seguinte tese. Seja R = {R1,...Rn} um conjunto de modelos de paradigmas de repercussão geral aplicáveis em prévia análise de admissibilidade dos Recursos Extraordinários, onde cada Ri, 1≤ i ≤ n é um subconjunto de R, visto serem os paradigmas compostos de conjuntos de pressupostos.

Se R contém todos os conjuntos de paradigmas, R Ï R, por que assim sendo, R seria apenas mais um paradigma de repercussão geral e não o conjunto de todos os paradigmas.

Suponhamos rx um recurso extraordinário apresentado para análise, tido como assemelhado, com suficientes elementos comuns, a um dos paradigmas de repercussão geral. Se rx é passível de escorreita subsunção a um dos paradigmas Ri, 1≤ i ≤ Rn em qualquer situação, de forma inconteste, da condição de rxÎ Ri , então rx Î R, o que conduz à inevitável situação de R Î R, verdadeiro paradoxo.

Reduzindo à dimensão pragmática, não existe, dentro da perspectiva da lógica, como se estruturar um conjunto de modelos de soluções para todos os recursos assemelhados. Não há possibilidade lógica de se ter um conjunto de modelos de repercussão geral qual possa abranger todas as possibilidades de casos concretos. Por maior que seja o repertório de soluções dos Tribunais, quer de teses de bloqueio de subida de recursos, quer versando sobre recursos repetitivos, sempre haverão casos que, por mais assemelhados que sejam, estarão não abarcados por tal estoque de soluções previamente prontas, salvo impropriedades na aplicação dos paradigmas, ao estilo "leito de Procusto", através de estiramentos ou amputações dos argumentos recursais para que caibam à tese de impedimento de conhecimento do recurso. Talvez frustrante para quem pense num Direito prêt-à-porter.

Os Tribunais a quo negarem conhecer de agravos contra decisões que inadmitem recursos extraordinários mediante o argumento da aplicação da repercussão geral, e depois tentarem bloquear a revisão da tese, seja pela negativa de julgamento dos agravos internos, como vem até a presente data se definindo a jurisprudência do STF, traz como inevitável último recurso a Reclamação Constitucional do artigo 102, I, ‘l", da Constituição Federal.

A negativa da existência deste fato seria, pragmaticamente, o Supremo Tribunal Federal transigir com a usurpação de suas competências privativas e exclusivas por parte das Instâncias Ordinárias e Tribunais a quo em geral.


Notas

  1. Lições de Direito Processual Civil, Vol. II. Pags. 54 e 55
  2. , Clara Moreira Azzoni. Recurso Especial e Extraordinário (Aspectos Gerais e Efeitos). Atlas, 2010 – pag. 7
  3. Rodolfo de Camargo Mancuso. Ação Rescisória e Recursos para os Tribunais Superiores, Editora Revista dos Tribunais, 2010 – pags. 170 e 171
  4. Mancuso, op. cit., pág. 66.
  5. http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/1851-1899/D848.htm. Ver também Mancuso, acima.
  6. Mancuso, op. cit., pags. 66 e 67
  7. Rodrigo Barione. Ação Rescisória e Recursos Para os Tribunais Superiores. Pags. 167-179
  8. Eficácia das Normas Constitucionais e Direitos Sociais, 1ª ed., 2ª tiragem, 2010, pags. 44 e 45
  9. Paulo Dourado de Gusmão. Introdução ao Estudo do Direito.. Pags. 310 e 311
  10. Op. cit., pags 163-169
  11. Leonardo Greco - Princípios De Uma Teoria Geral Dos Recursos - Revista Eletrônica de Direito Processual – REDP. Volume V
  12. Ibdem.
  13. Lawrence Brawn. A Suprema Corte Americana. Forense Universitária. 1985. Pags. 11-30
  14. Mancuso, op. cit., pag. 66.
  15. Op. Cit., Pags. 147-175.
  16. http://caselaw.lp.findlaw.com/scripts/getcase.pl?court=US&vol=000&invol=8-10914, baixado em maio de 2011.
  17. Mendes, Mártires Coelho e Branco. Curso de Direito Constitucional, 5ª Edição. Pags. 45-81.
  18. Op. Cit, pag. 51.
  19. Carlo Penco. Introdução à Filosofia da Linguagem,
  20. http://www.supremecourt.gov/ctrules/2010RulesoftheCourt.pdf, baixado em 9 de abril de 2011
  21. Op. cit. pag. 66 a 110.
  22. Mancuso, Op. cit. pags. 98 -99 e Barione, Op. cit., pag 228.
  23. http://www.senado.gov.br/publicacoes/anais/constituinte/AfonsoArinos.pdf, baixado em 10 de abril de 2011
  24. http://www.stf.jus.br/arquivo/cms/legislacaoRegimentoInterno/anexo/RISTF_Dezembro_2010.pdf, baixado em 10/04/2011
  25. Op. Cit., pags. 695-702.
  26. Op. cit., pags. 810-813
  27. Op. Cit. pags. 275 e 276.
  28. Luiz Carlos Forghieri Guimarães. O Prequestionamento Nos Recursos Extraordinário e Especial. Editora Letras Jurídicas, 2010.
  29. Curso Avançado de Processo Civil. Vol. 1. Editora Revista dos Tribunais, 2010.
  30. Curso de Direito Processual Civil. Vol. 3. Editora JUSPODIVM, 2011. Pags. 261 – 266.
  31. Op. Cit. Pags. 587-646.
  32. http://www.stf.jus.br//arquivo/informativo/documento/informativo126.htm#RE: Prequestionamento , baixado em maio de 2011.
  33. Op. cit. pags. 66-69.
  34. Op. cit. pags. 263-266
  35. Op. cit. pag. 95
  36. Op. cit. pags. 177-180
  37. Princípios Do Processo Na Constituição Federal, 10ª Edição. Editora Revista dos Tribunais.
  38. Op. cit. pags. 815-816
  39. Op. cit. pags. 829-855.
  40. Op. cit. pags. 157-271.
  41. Op. cit. pags. 322-354.
  42. http://www.stf.jus.br/portal/cms/verTexto.asp?servico=processoTabelaCusta, baixado em 03 de junho de 2011.
  43. Op. cit. pags. 326-329.
  44. Interposição Conjunta De Recurso Extraordinário e De Recurso Especial. Nelson Rodrigues Neto. Editora Dialética.
  45. http://caselaw.lp.findlaw.com/scripts/getcase.pl?navby=case&court=us&vol=454&invol=370
  46. Cássio Neri e Marco Cabral. Curso de Análise Real. Disponível em http://www.labma.ufrj.br/~cassio/f-analise1.html, baixado em 21 de julho de 2011
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Sobre o autor
Ramiro Carlos Rocha Rebouças

Advogado, Especialista em Direito Penal e Processual Penal pela Universidade Estácio de Sá, Mestre em Fisiologia pela FMRP-USP.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

REBOUÇAS, Ramiro Carlos Rocha. O recurso especial e o recurso extraordinário cíveis à luz da jurisprudência. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 16, n. 3003, 21 set. 2011. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/20037. Acesso em: 24 abr. 2024.

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