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A auditoria governamental na avaliação do controle primário

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Analisa-se a auditoria governamental como instrumento de avaliação do controle interno dos órgãos e entidades da administração pública, e em que medida essa avaliação pode contribuir para a melhoria desse controle.

INTRODUÇÃO:

A presente monografia tem como objetivo analisar a auditoria governamental como instrumento de avaliação do controle primário dos órgãos e entidades da administração pública, e em que medida essa avaliação pode contribuir para a melhoria desse controle, no contexto brasileiro, na vigência da Constituição Federaç de 1988.

O tema do controle primário, também chamado de controle interno administrativo ou controles internos, não é um tema recente. O próprio marco normativo sobre esse assunto, o COSO [01], e que fornece subsídios para os diversos estudos nessa área, completa em 2012 vinte anos, tendo sofrido uma reformulação no fortalecimento do gerenciamento de riscos nesse interregno, mas mantendo a sua ideia principal.

Ainda sim, carece-se de literatura no país que trate a questão do controle primário, levando em consideração, principalmente, as peculiaridades da administração pública no cenário do Brasil, com características que afetam diretamente as questões cotidianas relacionadas ao controle e a gerência de riscos.

Longe de pretender esgotar o assunto, a monografia procura, sim, iniciar uma estrada a ser trilhada no campo do controle governamental, com o fim de melhorar a gestão pública, induzindo o fortalecimento de processos que visam a garantia da efetivação das políticas públicas junto aos seus beneficiários, no plano concreto.

De modo a atender os objetivos propostos, a monografia organiza-se em um primeiro capítulo que discute a questão do controle, sua gênese e como este se situa no contexto da administração pública pós Constituição Federal de 1988.

O capítulo 2 trata do conceito de controle primário, suas peculiaridades e de como ele pode ser dividido em componentes que permitirão uma melhor avaliação de suas práticas efetivadas pelos gestores.

Por fim, o capítulo 3 apresenta a auditoria governamental como um instrumento de excelência para a avaliação do controle primário, na busca de induzir a melhoria desse controle, e consequentemente, dos processos da gestão pública.

A pesquisa efetua uma abordagem predominantemente qualitativa. O estudo proposto busca analisar o contexto do controle primário em um viés dinâmico, em que o pesquisador não se encontre isolado, como em um laboratório, mas situado em um contexto social e histórico, de modo que para isso, valoriza-se a relação sujeito-objeto no desenvolvimento da pesquisa.

Assim, dentre as diversas correntes metodológicas, a utilizada nesse estudo privilegia o movimento e as contradições, por acreditar que o método envolve uma questão teórica, uma visão de mundo que guia o pesquisador na escolha de seus caminhos, de suas técnicas e de seus instrumentos de pesquisa.

Nesse sentido, como técnica, se fundamentará na pesquisa documental, entendido esta por Gil (2008) como pesquisa em fontes capazes de proporcionar ao pesquisador dados em quantidade e qualidade suficiente que dispensem a coleta de informações com as pessoas, o que se fez possível pelo material já publicado sobre o assunto e pelo caráter abrangente do tema.

As principais categorias de análise da pesquisa são o controle e o controle primário, a partir de elaborações de autores diversos sobre esse assunto, em especial as asserções de Lunkes (2010), Castro (2009), Braga (2010) e Olivieri (2010).

Assim, a discussão do controle está posta, de forma a mergulhar nas contradições dessa função da administração pública, o que permite a discussão dos mecanismos de mitigação de risco e formas de assegurar-se que os objetivos das políticas públicas serão alcançados, com uma segurança razoável, proporcionando, assim, uma gestão pública de qualidade e mais efetiva.


1.O CONTROLE COMO ELEMENTO DA GESTÃO

O presente capítulo objetiva discutir o conceito de controle e seus desdobramentos na administração pública nacional, no contexto da Constituição Federal de 1988, apresentando o controle como um valor essencial à gestão pública eficiente.

1.1.Controle: Definições e tipos

Controle é uma palavra que, apesar de não ser polissêmica, traz em si arraigada toda uma acepção negativa, ligada à ideia de castração, de domínio, de oposição à liberdade.

No campo da administração dos assuntos estatais, o controle é um conceito que historicamente foi ligado a questões financeiras e contábeis, indicando a relação de contribuintes que teriam seus impostos cobrados (CASTRO, 2009), pela eterna necessidade de vigilância dos voláteis meios circulantes.

A semântica do termo controle varia bastante, significando o termo "controle" na literatura alemã uma comparação, enquanto no contexto britânico, surge forte o viés da dominação associada a esse verbete (LUNKES,2010), tendo nesses tempos de rompimento de paradigmas e de relativização de regras, assumido um significado rechaçado pelo senso comum, sequioso de dar vazão às suas vontades.

A administração incorporou o controle como uma de suas funções, à luz da obra de Fayol (1964), que apresenta o ato de controlar como sendo "[...] velar para que tudo ocorra de acordo com as regras estabelecidas e as ordens dadas (FAYOL, 1964, p. 13)", descrevendo esse mesmo autor que o controle tem aspectos administrativos, comerciais, técnicos, financeiros, contábeis e de vigilância; já antevendo as múltiplas facetas do controle e a sua adesão como uma função administrativa cotidiana, ainda que necessite, em conjunturas específicas, segregação e especialização, apartada da gestão, em órgãos especializados.

Os estudos de Lunkes (2010) identificam que diversos autores associam a ideia de controle à comparação das ações ocorridas com um padrão previamente estabelecido, ainda que afirme também o autor que:

[...] encontramos com freqüência a afirmação de que os controles têm como base "uma análise comparativa entre o ideal e o real". Esta definição tem um caráter restritivo, por que os controles não pressupõem, em todos os casos, de um planejamento, de um valor ideal derivado dele, ou seja, também podem ser verificadas outras medidas, como por exemplo, medidas reais. Entretanto, eles se referem sempre a uma análise comparativa. Uma das duas medidas de comparação é considerada então como medida de referência. Esta pode ser, por exemplo, um valor ideal, um valor estimado, ou um valor real. A escolha da medida de avaliação é incumbência do responsável pela tomada de decisão (LUNKES, 2010, p.3).

De forma a libertar o controle do conceito de um tipo ideal construído no pensamento e sim vinculando-o à ciência da comparação, acrescendo também a visão da mensuração dos desvios e a identificação das causas destas, com fins corretivos, de modo a ressaltar o seu aspecto gerencial, de forma dinâmica.

Assim, no campo da gestão, o controle se apresenta como uma função cotidiana, que cuida de comparar a gestão de um processo no mundo concreto com parâmetros, apontando os desvios e as suas causas.

A sua relação intrínseca com o poder, com a definição de padrões impostos a serem seguidos, faz do controle, por vezes, um valor rejeitado pela população, dada a influência de alternados períodos autoritários vividos na história brasileira (CASTRO, 2009), e ainda, o medo da dominação pelos aparatos burocráticos e seus tentáculos normativos, inibidores da democracia (NAVES FILHO, 2011), em uma visão que aparta o controle da garantia de atingimento de objetivos.

Por seu turno, o conceito de controle está intimamente ligado ao de planejar (CRUZ; GLOCK, 2008), pois de um modo geral, o planejamento é que fornece os parâmetros a serem acompanhados por ocasião do ato de controlar, ato esse que permite o feedback para o planejamento, dentro do conceito do ciclo de gestão, herdado do PDCA [02] da GQT. A forma de se controlar já deve ser algo pensado na fase de planejamento, da gestação de uma política e suas normas correspondentes.

Ilustração 1- O controle integrado à gestão das políticas

Elaborado pelo autor

A ilustração apresenta essa ideia. O controle, como valor que denota a preocupação com a gerência de riscos e a garantia razoável de atingimento de objetivos, deve estar presente em todos os estágios de construção de uma política pública - formação da agenda, formulação, implementação, monitoramento, avaliação. Se assim não for, se não existir uma preocupação prévia com o controle, a implementação carecerá de bons frutos na tarefa de monitoramento e as recomendações do controle terão dificuldade de serem adotadas.

A presente monografia apresenta o controle em um viés necessário, ou melhor, indispensável no contexto democrático, como ferramenta do governante na garantia da materialização das políticas públicas (BRAGA, 2011a), diante dos riscos à gestão, que envolvem desde questões operacionais, até a prática da corrupção pelos agentes públicos e pelos corruptores.

No campo jurídico, a visão do controle não foge à ótica garantista e corretiva aqui apresentada, onde para Pietro, a finalidade do controle "[...] é a de assegurar que a administração atue em consonância com os princípios que lhe são impostos pelo ordenamento jurídico (2006, p. 693)" e para Carvalho Filho, o conceito se apresenta como :

O conjunto de mecanismos jurídicos e administrativos por meio dos quais se exerce o poder de fiscalização e de revisão da atividade administrativa em qualquer das esferas de poder (2007, p.808).

Odete Medauar, no seu clássico livro sobre o assunto, sintetiza o estudo de diversos autores sobre o tema com a definição:

Controle da Administração Pública é a verificação da conformidade da atuação desta a um cânone, possibilitando ao agente controlador a adoção de medida ou proposta em decorrência do juízo formado (1993, p.22).

A visão dos doutrinadores jurídicos sobre a questão do controle reforça o aspecto do padrão a ser seguido - no caso a norma - como já seria esperado. Contudo, todas essas definições e entendimentos surgem da necessidade de se confrontar o aspecto positivista dos padrões pensados e estatuídos em relação às contradições do mundo concreto, dialético e em movimento.

Essa ruptura epistemológica do estatuído, inerte, e o mundo em movimento, demanda uma atuação específica, diria até uma certa ciência de acompanhar, nas diversas matizes de atividades humanas, o realizado em relação ao parâmetro, como uma garantia razoável, diante da incerteza dos riscos, de que as coisas acontecerão como devem.

No modelo pátrio vigente, a função controle se apresenta em dois polos bem definidos. Aquele executado por órgãos da estrutura do Estado e aquele exercido por instâncias de representação popular. Os atinentes aos órgãos do Estado, se apresentam em duas linhas de atuação: o controle interno e o externo.

No contexto do equilíbrio entre os poderes, herdado das idéias de Montesquieu (2006), surge o controle externo, como uma atuação fiscalizadora situada em administração ou poder diverso do fiscalizado [03], exercido, no caso brasileiro, pelo Congresso Nacional, com o apoio do Tribunal de Contas da União, no mandamento do :

Art. 70. A fiscalização contábil, financeira, orçamentária, operacional e patrimonial da União e das entidades da administração direta e indireta, quanto à legalidade, legitimidade, economicidade, aplicação das subvenções e renúncia de receitas, será exercida pelo Congresso Nacional, mediante controle externo, e pelo sistema de controle interno de cada Poder (BRASIL, 1988).

Este modelo se replica para os outros entes federados, em um sistema distinto dos países de origem anglo-saxã, que dispõe de uma controladoria eminentemente técnica subordinada ao Poder Legislativo, e o órgão cameral desse poder é que concentra as tarefas judicantes no campo administrativo (CHAVES, 2009). O sistema adotado no Brasil, de tribunais de contas, atribui a esse órgão competências exclusivas, em especial no campo do julgamento das contas dos administradores, contando para essa tarefa com um colegiado e um corpo técnico próprio.

O outro controle vinculado ao aparato estatal e que se robusteceu no âmbito da Carta Magna vigente, é o controle interno [04]. Executado no governo militar de forma descentralizada, seguiu uma linha de centralização que culminou, na esfera federal, com a criação da CGU, em 2003 [05], em um modelo que integra a correição-ouvidoria-auditoria-prevenção a corrupção, e que prevê a concentração da normatização e execução, de forma a flexibilizar os recursos humanos e materiais disponíveis, favorecendo a integração e a atuação sistêmica (NAVES FILHO, 2011).

Assim, com fulcro no Art. 74 [06] da Constituição Federal vigente e na legislação decorrente [07], o controle interno é organizado de forma sistêmica, integrado no âmbito de cada poder e fazendo parte do chamado ciclo de gestão, em um modelo que vem sendo adotado como paradigma por diversos estados e municípios. O modelo brasileiro de controle interno centralizado, na execução e normatização, atende as demandas de nosso federalismo, focado na União, com uma gama de recursos lastreados para a execução por meio de parcerias com estados e municípios.

O caso estadunidense, somente tomando como exemplo, apresenta escritórios de controle interno em cada departamento de estado e agências governamentais, como núcleos descentralizados dessa espécie de controle, ainda que em outubro de 2008, esse país tenha adotado uma instância central, mas que somente concentra a função de consolidação de informações e articulação de operações conjuntas (SPINELLI, 2009).

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O Brasil já adotou um modelo descentralizado, por ocasião das inspetorias gerais de finanças e das antigas CiSET [08] (CASTRO, 2009), e apesar da pouca literatura científica sobre esse fenômeno recente, pode-se verificar, de forma empírica, que a experiência da centralização propiciou ganhos na integração com outros órgãos - Ministério Público Federal, Tribunais de Contas, Polícia Federal - , na articulação entre pastas ministeriais e ainda, na projeção no cenário nacional e internacional das atividades de controle interno e, consequentemente, da questão do controle dos recursos.

Ainda que exista a visão de um controle interno restrito a ser um braço operacional do controle externo, em uma interpretação equivocada do dispositivo constitucional que prevê o apoio ao controle externo como uma das funções do controle interno (CRUZ; GLOCK, 2004), no contexto da sociedade democratizada, a função do controle interno é muito mais ampla e abrangente [09], demandando especialização, capilaridade e coordenação, o que tem se obtido pelo modelo atual.

Assim, de forma a sintetizar o papel dessa estrutura de controle interno no aparelho estatal, tem-se que:

Como se vê, esse Sistema de controle interno, cotidianamente tratado por controle interno, é uma estrutura interna ao poder fiscalizado, mas alheia ao gestor, com atribuições específicas e previstas nas normas vigentes. Possui atribuições fiscalizatórias similares ao Controle Externo, embora não tenha poder sancionador e cogente. Constituem uma ferramenta institucional do governante para garantir, com razoável certeza, que a estrutura do poder irá atingir as suas finalidades, regidas pelas políticas e pelas Leis. Além disso, permite avaliações na busca de correções de rumo, como fonte de informação da alta administração e apoia o controle externo na sua missão institucional, servindo de interlocutor nas questões comuns, junto aos Tribunais de Contas.

[...]

Pode-se acrescentar que o Controle Interno é aquele que se faz presente, no acompanhamento cotidiano, por vezes repetitivo e insistente, formado de um corpo técnico que permita ao dirigente avaliar a sua gestão e fiscalizá-la. A atividade pública é crescentemente complexa e o seu controle demanda pessoal preparado, para opinar sobre as questões que se apresentam, assim como para permitir a devida apuração de situações cominadas, para fornecer à sociedade a transparência adequada (BRAGA, 2010, p. 1115-1116).

Apresentado como uma necessidade desse Estado de funções complexas, na busca de atender às nuanças do contexto político, a demanda por prestação de serviços públicos e a ação dos movimentos sociais, diante das contradições da realidade. O controle interno é um mecanismo de atuação próxima, mas com autonomia, que permite ao governante contar com um corpo técnico com expertise para apurar denúncias, promover a transparência, propiciar respostas ao risco e promover a cultura do controle.

Por seu turno, o contexto democrático incentivou formas organizadas de participação popular na gestão pública, inclusive em aspectos financeiros e orçamentários, exigindo a população mobilizada em instâncias formais e semi-formais, para a interveniência nos processos de elaboração e implementação das políticas públicas, em um cenário de incremento da comunicação social.

Esse conceito de participação e acompanhamento da gestão pública passou a ser denominado de Controle social [10]. Os conceitos existentes na literatura

[...] referem-se a formas participativas de ação da sociedade, organizada ou não, no controle e no acompanhamento das políticas públicas, desde a sua formulação até a sua implementação. Essa prática ganhou força com o fim do governo militar e redemocratização da sociedade, sendo materializada principalmente pela estrutura colegiada dos conselhos, como instância de participação popular na vida pública mais vulgarizada. (BRAGA, 2010, p. 1114).

Esse controle social se faz pela atuação popular por meio de denúncias, manifestações públicas, ações judiciais, ou ainda por instâncias organizadas, como os conselhos em suas diversas matizes [11], tem um caráter complementar em relação ao controle exercido pelos órgãos governamentais (BRAGA, 2011a) - controle interno e externo - pois as instâncias de representação popular dependem do controle institucional, que dispõe de servidores e recursos governamentais, naturalmente escassos, e um corpo técnico apto a converter as situações apontadas em processos que permitiram a punição dos envolvidos e o ressarcimento do Erário, entre outras finalidades.

Por seu turno, o controle social, de caráter menos técnico, mas com um viés político-formativo mais acentuado (BRAGA, 2011a), permite, pela sua capilaridade e presença cotidiana, aliado à representatividade, desempenhar o papel de um grande gerador de informações sobre a gestão, de forma a alimentar os órgãos de controle institucional, orientando sobre o risco e otimizando a sua atuação, demonstrando a profunda complementaridade entre os aspectos político-formativo dos conselhos e a dimensão técnico-contábil dos órgãos de controle.

Entretanto, a visão aqui apresentada de controle não é hegemônica, tendo sofrido a interferência de discussões diversas, como será visto no tópico seguinte.

1.2.O mito do aspecto absoluto do controle por resultados

A discussão do controle na administração pública não se faz apartada das discussões sobre a visão do Estado que permearam a vida pública e a literatura especializada, mormente pelo fato desses debates, em sua maioria polarizadores, terem feito parte do processo de formação profissional de toda uma geração de servidores, onde a questão específica do controle fez parte da pauta.

O cerne de toda a discussão inaugurada com o fim do regime militar, atingindo a sua culminância no período do governo Fernando Henrique Cardoso (1995-2002), foi a pretensa reforma do Estado, que teve como um dos baluartes ideológicos o Plano Diretor da Reforma do Estado, de Bresser Pereira (1995), que pretendia, influenciado pelas teorias neoliberais reinantes na Europa e nos Estados Unidos e pelos organismos internacionais, aproximar a gestão pública da gestão privada, na chamada administração gerencial, focada em resultados e nos cidadãos.

Não é a pretensão dessa monografia mergulhar na conjuntura geopolítica que influenciou a adoção desse discurso na administração pública brasileira, e sim apontar de que forma esse assunto se relacionou com a discussão do controle, em especial a questão do controle primário, objeto desse estudo.

O movimento neoliberal no Brasil foi a base de um acordo entre forças políticas, na tentativa de formação de um novo consenso, passada a transição democrática e os períodos turbulentos dos primeiros governos sob a égide da Constituição Federal de 1988. E nessa luta hegemônica pela ocupação de posições, o ideário reformista-neoliberal elegeu inimigos públicos, como causadores das mazelas que amargavam a sociedade brasileira, no catastrófico cenário econômico do início da década de 1990.

A culpa da crise, no seu aspecto fiscal, coube ao Estado de bem estar social [12] e ao tamanho do seu aparelho, burocrático, paquidérmico, populista e desenvolvimentista. Necessitava-se, nessa nova orientação, de um:

[...] Estado pequeno e forte, com as seguintes tarefas: garantir a propriedade e os contratos, promover o bem estar e os direitos sociais e realizar uma política industrial e de promoção das exportações (BHERING, 2003, p. 175).

Como um coordenador suplementar dos processos, evitando as falhas de mercado e executando o mínimo, como fiscal e formulador da implementação de políticas pelo setor público não-estatal, no fenômeno publicização [13] (BRASIL, 1995).

A administração pública e seus servidores receberam toda gama de adjetivos, que os caracterizou como causa primária da ineficiência do Estado, pelo seu caráter burocrático e ensimesmado, e que este deveria ser substituído por um sistema flexível e voltado para os resultados, como é o mercado, exemplo de eficiência no ideário de Bresser. Considera o autor que a superação do patrimonialismo [14] e da burocracia se dariam pela via gerencial (BHERING, 2003), e que o controle ideal seria realizado a posteriori, focado em resultados, dada a autonomia e flexibilidade desse setor público não estatal, aproximando o conceito de controle da regulação, no viés privatista da execução das políticas públicas, como fica evidente no trecho:

Deste modo o Estado reduz seu papel de executor ou prestador direto de serviços, mantendo-se, entretanto, no papel de regulador e provedor ou promotor destes, principalmente dos serviços sociais como educação e saúde, que são essenciais para o desenvolvimento, na medida em que envolvem investimento em capital humano; para a democracia, na medida em que promovem cidadãos; e para uma distribuição de renda mais justa, que o mercado é incapaz de garantir, dada a oferta muito superior à demanda de mão-de-obra não-especializada. Como promotor desses serviços o Estado continuará a subsidiá-los, buscando, ao mesmo tempo, o controle social direto e a participação da sociedade (BRASIL, 1995, p. 13).

Os idealizadores do Plano Diretor da Reforma do Estado acreditavam que o patrimonialismo estava extinto da sociedade e que o controle social monitoraria as políticas (BHERING, 2003), e mitificavam o setor privado como eficiente, julgando que a causa desta pretensa eficiência fossem suas técnicas e a sua flexibilização (PAULA, 2008), adaptando ao Brasil iniciativas de outros países e setores sem considerar as peculiaridades do nosso federalismo e a história da formação do povo brasileiro, em uma reedição do bordão da década de 1960, onde o que era bom para os EUA era bom para o Brasil [15].

As especificidades de cada setor são ignoradas, em uma demonização do segmento público, que demanda pela sua natureza a operacionalização de políticas governamentais que atendam a objetivos políticos, em oposição ao setor privado, cuja orientação é a sobrevivência no mercado e o lucro. Lógicas distintas, que demandam mecanismos diferentes, o que foi ignorado nessa visão reformista, por execrar a burocracia, surgida no ideal weberiano como uma contraposição ao patrimonialismo.

A desvalorização da capacidade da gestão pública de atingir suas finalidades, associada ao princípio da eficiência focada em resultados, como se os meios para atingí-los não os influenciassem, afetam distintamente a visão de controle, em uma sociedade recém-saída de um regime de exceção, apresentando o modelo gerencial como substituto absoluto do modelo burocrático, em uma polarização que apresenta um erro de diagnóstico de Bresser, pois ignora o "movimento dialético em que há, simultaneamente, incorporação de aspectos do modelo weberiano e criação de novos instrumentos de gestão (ABRÚCIO, 2010, p.543)."

O discurso da captura do Estado pela burocracia, ainda que o Plano Diretor da Reforma do Estado tenha colocado os órgãos de controle no núcleo estratégico do Estado, afetou negativamente o tema do controle, dada sua contraposição à visão privatista de eficiência, onde o papel do Estado seguia para uma diminuição, ainda que houvesse um discurso de preocupação do controle da burocracia.

Essa preocupação com os controles sobre a burocracia, que Gaetani atribui a influência da escola da escolha pública, não implicou uma preocupação com o sistema de controle interno, considerado pelos reformadores como um sistema retrógrado, baseado no controle da legalidade e da formalidade. Essa visão refletia a realidade do controle interno, pois em 1995, ainda não eram sentidos os efeitos da reforma do controle interno, que reverteram essas características e promoveram o surgimento de um controle gerencial, voltado para a execução de programas (OLIVIERI, 2010, p. 107).

Assim, a visão de Estado e das suas funções incide diretamente na concepção do papel dos órgãos de controle e no próprio conceito de controle como função da administração. O foco nos resultados e os avanços na estruturação do orçamento-programa, dão ao controle interno, em especial, um papel de monitoramento de políticas públicas, relegando o papel fiscalizatório a um segundo plano em relação a sua dimensão gerencial, pois:

Na nova concepção, o controle interno se transforma em um elo de ligação entre a execução e o planejamento das políticas públicas, pois as ações de controle são desenhadas com base nos parâmetros definidos pela programação orçamentária e visam produzir informações gerenciais que contribuam para a avaliação de resultados da implementação das políticas. O controle interno fiscaliza a execução das ações de governo, analisando como essas se estruturam (quais os programas em execução) e quais são os seus parâmetros reais (quais as metas do programa, seu público-alvo, seu desenho organizacional, o volume de recursos), e esse não se esgota em si mesmo, pois ele não conclui com a verificação da legalidade, da eficiência e da eficácia da execução dos programas, mas deve ter continuidade no processo de contínuo planejamento das ações de governo (OLIVIERI, 2010, p. 123-124).

O papel do controle de comparação com vias a correção incorpora a lógica de mercado de investimentos, avaliando a execução e dando uma opinião, ao final, sobre o que corrigir ou sobre a sobrevivência do programa de governo. Essa lógica segrega o controle à fase de execução a posteriori, limitando-o a apontar falhas de situações que ele não participou da formulação, o que impacta a visão do controle dentro da gestão, no papel do professor que aplica a prova ao final do semestre, no intuito de aprovar ou reprovar, selecionando mais que preparando.

Com a chegada do governo Luís Inácio Lula da Silva, em 2003, o foco privatizador deu espaço à ideia desenvolvimentista do Estado, como indutor da economia, principalmente por medidas de infraestrutura e na área social, ideias que continuam em evidência no governo Dilma Rousseff (2011) e que pelo caráter executivo do Estado, com a injeção de grandes somas orçamentárias em projetos com o apoio dos estados e municípios, demandou mecanismos do próprio governo para controlar seus braços operacionais, pois:

Para colocar em prática as políticas de saúde e de educação, entretanto, não basta a construção de escolas e de hospitais; é necessário construir a estrutura administrativa dos respectivos ministérios, pois são eles que implementam as políticas de universalização, ou seja, que dão direção e sentido comuns para a atuação das diversas escolas e hospitais. Mas os ministérios também não são suficientes; são necessários, ainda,órgãos de monitoramento sobre a execução das políticas públicas, cuja função é garantir ao presidente que seus ministros estão executando, de fato, as políticas definidas na Constituição e no seu programa de governo (OLIVIERI, 2010, p.12).

Essas medidas governamentais de distribuição de renda e de inclusão social, com o uso do fundo público, bem como as ações de universalização das políticas sociais (MERCADANTE, 2010), apresentam um Estado de presença mais marcante, o que demanda a ação de mecanismos especializados para garantir os objetivos a serem atingidos, o que aduz ao controle um outro papel nesse ideário, deixando de regular o privado (ou o público não estatal), para fiscalizar o setor público.

O fato é que inaugurou-se um período que se "[...] preserva a função do Estado, de guardião do marco macroeconômico e de orientação e planejamento do desenvolvimento econômico e social (MERCADANTE, 2010, p. 177)", que permitiu a reformulação da visão do Estado e do seu papel, aliado a uma onda de concursos e de investimentos públicos, que aumentaram a profissionalização da máquina e o volume da sua atuação no cotidiano da população, com expansões do número de universidades, escolas técnicas, obras de infraestrutura, agências da previdência e um sem número de estruturas que tem relação direta com o cidadão. Apesar das lacunas, demonstrou-se que "[...] a simples ação das forças de mercado não é o suficiente para promover o crescimento acelerado do PIB (MAGALHÃES, 2010, p. 22)", lição que poderia ter sido aprendida com o II Plano Nacional de Desenvolvimento do Governo Geisel (1975-1979), de clara inspiração keynesiana, onde o Estado mais uma vez socorreu os capitalistas quebrados.

As visões do Estado não se sobrepõe de forma absoluta e nesse contexto histórico, de visões antagônicas sobre o papel do Estado, que se revezam e coexistem em luta pela hegemonia, se refletem em discussões ideológicas que ainda afetam a questão do controle, em especial na casuística da construção do projeto de Lei Orgânica sobre a Administração Federal, que gerou um documento base elaborado por juristas a pedido do Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão – MPOG, com destaque para o item que trata da questão do controle:

Art. 50. O controle das atividades dos órgãos e entidades estatais deve obedecer ao disposto na Constituição, nesta Lei e na legislação especial e observar as seguintes diretrizes:

I - supressão de controles meramente formais ou cujo custo seja evidentemente superior ao risco;

II - controle a posteriori, constituindo exceção o controle prévio ou concomitante;

III - predomínio da verificação de resultados;

IV - simplificação dos procedimentos;

V - eliminação de sobreposição de competências e de instrumentos de controle;

VI - dever, para os órgãos ou entes de controle, de verificação da existência de alternativas compatíveis com as finalidades de interesse público (BRASIL, 2009b, p. 52).

De forma que o mitificado controle por resultados, oriundo de um paradigma privatista e de publicização, retorna a baila, mais uma vez sendo dissociado o controle do processo de gestão, ignorando o seu papel como promotor da eficiência.

Nesse contexto, outras visões se apresentam na questão do controle por resultados, pois:

O controle só de resultados é um ideal que pressupõe aprimoramento ainda não alcançado por nossa administração. Não podemos negligenciar o controle da legalidade e de procedimentos, porque não temos, ainda, uma burocracia profissionalizada na maioria dos órgãos.

No atual governo é que se começou a restaurar a burocracia estável, que em grande parte foi substituída por terceirizações (de todos os tipos) nas últimas décadas. Isso na esfera federal. Pior ainda nas demais.

Por isso mesmo, as licitações nem sempre são baseadas em bons projetos, pois não havia capacidade nos órgãos para elaborá-los. Os editais eram (ainda são, as vezes) influenciados pelas próprias empresas licitantes. Não temos bons referenciais de preços, nem de especificações. E por aí vai.

Assim, não dá para "facilitar" no controle da conformidade. O que se há de fazer, e estamos fazendo, é racionalizar ao máximo esse controle e combiná-lo com o de resultados. Procurando orientar o gestor antes que os problemas se tornem irreversíveis (controle preventivo) (HAGE, 2010, p.76-77).

Cabe ressaltar que o fenômeno do patrimonialismo existe de forma concreta na administração pública brasileira e que o controle, como valor organizacional, continua como elemento fundamental de garantia de materialização dos direitos sociais, principalmente no contexto de um Estado indutor e promotor do desenvolvimento, com grande parte dessas ações pela estratégia de descentralização na parceria com outros entes federados [16].

Curiosamente, ideias ligadas aos movimentos gerencialistas da década de 1990, como a Gestão da Qualidade Total - GQT, baseada em uma filosofia herdada de japoneses, prezam fazer certo pela primeira vez, com interações de acompanhamento durante o processo, e não no paradigma de olhar apenas os resultados, como descrito por:

A GQT concentra-se na melhoria dos processos de criação de bens e serviços, a tal ponto que eles possam ser isentos de defeitos, sem criar resíduos ou desperdícios. Essa abordagem elimina a necessidade de inspecionar os defeitos a posteriori [...] (CARR, LITTMAN, 1998, p.19).

Em uma visão de que a eficiência dos produtos não pode ser apartada da qualidade dos insumos, onde o controle desempenha um papel fundamental. O clássico de Hammer e Champy (1994), dentro dessa mesma época de inovações administrativas, apresenta a reengenharia como uma ação voltada fundamentalmente para os processos, não havendo nessa visão uma preocupação exclusiva com resultados, como entes desvinculados de seus processos geradores. No setor público, assim como no privado, a preocupação com os resultados deve perpassar os processos, no controle prévio e concomitante.

No campo do público, pela falta de possibilidade de um objetivamento dos resultados, em muitos caos, essa preocupação com o aspecto processual é maior, pois como dizia Peter Drucker:

O governo está devidamente consciente de que administra fundos públicos e deve prestar contas de cada centavo. Ele não tem outra escolha exceto ser burocrático [...] Um governo que não seja um governo de formulários degenera rapidamente numa sociedade de pilhagem generalizada (BEATTY, 1998, p. 162).

A lógica privada aplicada indistintamente ao setor público é falaciosa e priva o cidadão de seus direitos. Ainda que essa lógica seja suportada por um discurso de foco no cidadão, ela comete a omissão de desconsiderar os caminhos para o atingimento desses objetivos, e apresenta-se calcada em um modelo de descredenciamento, que não supre as demandas dos serviços públicos, em um Estado presente e indutor.

1.3.O controle como valor organizacional e a prevenção da corrupção

Essa visão do papel do controle em um Estado indutor converte aquele em um valor organizacional, como ponto a ser defendido no processo de gestão, e não como algo negativo e produtor de ineficiência, no ideário da reforma do Estado.

Para isso, a mudança cultural das organizações se faz necessária, rompendo a idéia de que o controle é a "turma do não pode", para uma visão de gerenciamento de riscos na garantia do atingimento de objetivos, como um processo integrado à gestão ou ainda, realizado por instâncias especializadas, dada a necessidade de expertise e integração na área de controle em uma sociedade complexa e de um Estado com múltiplas funções.

Assim, na compreensão desse ambiente a se promover o controle, temos que:

O conceito de cultura compreende três níveis: o dos artefatos e criações, que inclui a arquitetura da organização; o nível dos valores, que focaliza a maneira como as situações são tratadas e os problemas são enfrentados na organização; e o nível dos pressupostos, que considera as crenças do grupo sobre a realidade que estão inseridos. A cultura não existe fora de um grupo que a possua, e nem poderá ser formada a não ser em um grupo com uma história em comum (REIS et al., 2006, p. 122).

De forma que a ideia do controle deve se fazer presente nas normas e na estrutura física; nos discursos e na crença de que a incerteza e as contradições existem e que mecanismos devem ser elaborados para atuar contra estes, na busca de se atingir os objetivos.

A cultura se faz mais presente nos aspectos informais, invisíveis, que orientam os membros da organização; mas também se faz presente nos aspectos objetivados (CHIAVENATO, 2006), e a medida da aderência de uma organização aos princípios do controle se faz pela análise desses fatores, perceptíveis de forma direta ou não.

A cultura tem profundas relações com a questão ética, pois apesar de ser esta de foro íntimo, sofre profundas influências do grupo, que apresenta uma ética coletiva, subproduto dessa cultura organizacional. Não é por outro motivo que as regras do IIA estabelecem que:

This Pratice Advisory underscores the importance of organizational culture in establishing the ethical climate of an enterprise and suggests the role that internal auditors could play in improving that ethical climate. Specifically, the Practice Advisory:

-Describes the nature of the governance process;

-Links it to the ethical culture of organizations;

-States that all people associated with the organization, and specifically internal auditors, should assume the role of ethics advocates, and;

-Lists the characteristics of an enhanced ethical culture" (IIA, 2004, p. 252).

Onde existe um forte componente cultural na construção da idéia de controle e que isso afeta diretamente a gestão, em especial em relação a corrupção, que tem ligação com os valores locais, mas também com a percepção da impunidade, pois o agente público se corrompe pela lógica "[...] de que seus prováveis benefícios líquidos por esse ato superam os custos líquidos (KLITGAARD, 1994, p.39)", e isso tem um profundo reflexo na questão da cultura organizacional, pois se o controle não for um valor, o agente não se perceberá fiscalizado pelo sistema e pelos seus pares, o que poderá ensejar uma prática reprovável.

Não é negar a dimensão ética da gestão ou achar que os valores e a conduta dos servidores não são importantes. O que não se quer é reduzir a corrupção e os problemas gerenciais apenas à questão da honestidade. Existe uma questão de ambiente, dos valores coletivos da organização e de como isso influencia a conduta individualizada. Existe uma questão de ethos...Se é um valor organizacional o respeito pelo patrimônio, o apreço pelas regras, a ideia de que existem riscos e devemos estar atentos a eles, os desvios se fazem menos prováveis. O controle valorizado conduz a estruturação de mecanismos de fiscalização, o que incide sobre a corrupção, pois:

As nações com menor índice de corrupção são as que têm o maior número de auditores e fiscais formados e treinados. A Dinamarca e a Holanda possuem 100 auditores por 100.000 habitantes. Nos países efetivamente auditados, a corrupção é detectada no nascedouro ou quando ainda é pequena. O Brasil, país com um dos mais elevados índices de corrupção, segundo o World Economic Forum, tem somente oito auditores por 100.000 habitantes, 12.800 auditores no total. Se quisermos os mesmos níveis de lisura da Dinamarca e da Holanda precisaremos formar e treinar 160.000 auditores (KANITZ, 2000, p.1).

O controle deve ser um valor percebido, avaliado, recomendado e promovido na gestão. A palavra controle, por questões históricas, se apresentou como antítese dos ideais democráticos, relegando-se a um segundo plano o seu papel de verificação do real diante do planejado, na gerência de riscos.

A questão da fiscalização, a existência de mecanismos internos e externos de controle, institucionalizados, ou seja, inseridos na cultura organizacional, é fator fundamental de disuassão de práticas reprováveis e para isso, o controle não pode ser enxergado como uma prática burocrática e inibidora da eficiência e sim como um grande aliado na garantia do atingimento das finalidades da organização, pois os meios acarretam consequencias aos fins, sempre tendo o cuidado com o extremo já previsto por Max Weber (1999) do burocratismo virtuoso, na inversão da importância dos fins com os meios.

Não tem fundamentação uma visão maniqueísta, de que existe um bom gestor, que deve ser orientado; contraposto a um mau gestor, que deve ser punido e fiscalizado. O gestor é um profissional, um ser humano, que tenta acertar diante das dificuldades da vida administrativa, e que pode sim, ser arrolado em situações de benefício pessoal que o levem a se locupletar em detrimento da coisa pública.

Nessa linha, cabe ao controle orientar e fiscalizar, rompendo a polarização parceiro-algoz, transcendendo o papel do órgão de controle para uma organização com uma função clara e definida, de promoção de mecanismos de gerência de riscos e de garantia razoável de atingimento de objetivos, pela via da capacitação e da avaliação com recomendações gerenciais.

Da mesma forma, a corrupção é contraditória. Está presente no Estado, mas precisa deste para combatê-la. Os mecanismos técnicos, a expertise do profissional de controle, permitem se avançar nessa luta [17] intrínseca à gestão, sem perder de vista a lógica do movimento da luta incessante, pois:

[...] o que para alguns pode ser compreendido como corrupção, para o meio político é prática usual. A corrupção parece ser inerente à humanidade, porém, o que tem de ser controlado é a sua intensidade (GALLO, 2007, p. 82).

Em uma batalha que deve ser travada com as melhores armas, de modo que, além de mecanismos especializados de controle interno e externo, e a participação do cidadão em instâncias de controle e acompanhamento, o controle necessita estar presente em um aspecto primeiro, ligado de forma cotidiana a atividade do gestor, pairando imaterial na organização, em normas e atitudes, intrínsecos e cotidianos.

Desse modo, o capítulo 1 procurou contextualizar o controle como uma função da administração e um valor organizacional, essencial para uma gestão pública eficiente, e que o caminho da excelência não deve se prender apenas à questão dos resultados, principalmente em um viés de um Estado indutor, onde as políticas públicas se materializam pela intervenção estatal. A discussão do controle se encaminhará, no próximo capítulo, para esse como função administrativa, imbricada ao cotidiano do gestor.

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Sobre o autor
Marcus Vinicius de Azevedo Braga

Analista de Finanças e Controle (CGU-PR). Mestre em Educação pela Universidade de Brasília (UnB). Bacharel em Pedagogia pela Universidade Federal Fluminense (UFF). Bacharel em Ciências Navais com Habilitação em Administração (Escola Naval).

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

BRAGA, Marcus Vinicius Azevedo. A auditoria governamental na avaliação do controle primário. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 16, n. 3022, 10 out. 2011. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/20173. Acesso em: 13 dez. 2024.

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