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A terceirização no Brasil e a Súmula 331 do TST

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30/10/2011 às 09:29
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O Poder Judiciário deve ser provocado pelos empregados para que se possa coibir o abuso da ausência de regulamentação para utilizar a terceirização na forma ilícita.

RESUMO

Monografia destinada ao estudo do fenômeno da terceirização de mão-de-obra, mormente no que se refere às atividades do setor privado. Para o estudo, pontuou-se acerca das evoluções do Direito do Trabalho, bem como flexibilização das normas trabalhistas que impulsionaram o aumento da utilização do trabalho terceirizado. A busca incessante pelo lucro máximo com o gasto mínimo propulsiona a contratação de empresas terceirizadas para realizar as tarefas principais das empresas, abusando da lacuna da lei para esquivar-se dos encargos trabalhistas. A ausência de regulamentação legislativa acerca dos serviços que podem ser terceirizados aumenta a prática da terceirização na forma ilícita, contrariando o entendimento consolidado pela jurisprudência através do enunciado 331 do Tribunal Superior do Trabalho, que pode ser considerada como a única ferramenta do empregado para garantia dos seus direitos. Foram analisados os projetos de lei que hoje tramitam no Congresso Nacional que pretendem por um fim à utilização da terceirização na sua forma ilícita. Ponderou-se que não se trata de proibir a prática da terceirização, mas sim de instituir regras com base em critérios práticos, a fim de destacar a sua finalidade de redução de custos e especialização de serviços das empresas submetidas à concorrência nos dias atuais, sem, contudo, infringir os princípios básicos do Direito do Trabalho.

Palavras-chave: Direito do Trabalho. Terceirização. Princípios. Precarização.

ABSTRACT

Monographic paper destined to study of manpower outsourcing phenomenon, particulary related to private sector activities. For the study it was pointed out the evolution of Labor Law, as well as relaxations of labor regulamentations have spurred the increased use of outsourced work. The incessant search for maximum profit with minimum spending drives the hiring of subcontractors to perform the company’s main tasks, abusing of the law lack to avoid labor charges. The absence of legislative regulation on the services that can be outsourced increases the practice of illegally outsourcing, contrary to the agreement of jurisprudence bounded by enunciated 331 of the Superior Labor Court, which can be considered as the only employee tool used to guarantee their rights. It was analyzed the bills in course in National Congress that intend to end the use of outsourcing in a unlawful manner. It was pondered that it is not about banishing the practice of outsourcing, but to establish rules based on practical criteria in order to highlight its purpose of cost reduction and service specialization for firms submitted to competition today, without, however, violate the basic principles of labor law.

Keywords:

Labor Law. Outsourcing. Principles. Precariousness.

SIGLAS E ABREVIATURAS

Art. – Artigo

CEF – Caixa Econômica Federal

CF – Constituição Federal

CLT – Consolidação das Leis Trabalhistas

CNI – Confederação Nacional da Indústria

CUT – Central Única dos Trabalhadores

DJ – Diário de Justiça

FGTS – Fundo de Garantia do Tempo de Serviço

n. – número

OIT – Organização Internacional do Trabalho

OJ – Orientação Jurisprudencial

PMDB/PA – Partido do Movimento Democrático Brasileiro do Pará

PT/CE – Partido dos Trabalhadores do Ceará

PT/MG – Partido dos Trabalhadores de Minas Gerais

Rel. – Relator

SBDI – Secretaria de Dissídios Individuais

TRT – Tribunal Regional do Trabalho

TST – Tribunal Superior do Trabalho

SUMÁRIO: 1 INTRODUÇÃO . 2 EVOLUÇÃO DO DIREITO DO TRABALHO E A FLEXIBILIZAÇÃO . 3 TERCEIRIZAÇÃO .3.1 Conceito . 3.2 Princípios do direito do trabalho e a terceirização . 3.2.1 Princípio da proteção . 3.2.2 Princípio da primazia da realidade .3.2.3 Princípio da irrenunciabilidade . 3.2.4 Princípios da boa-fé e dignidade da pessoa humana . 4 A TERCEIRIZAÇÃO NO BRASIL . 4.1 A súmula 331 do TST . 4.2 Atividade-fim e atividade-meio . 5 PROPOSIÇÕES LEGISLATIVAS . 5.1 Projeto 5.439/2005 . 5.2 Projetos 1.621/2007 e 6.832/2010 . 6 CONSIDERAÇÕES FINAIS . REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS


1 INTRODUÇÃO

Atualmente verifica-se a necessidade das empresas em criar alternativas que sejam capazes de amenizar as dificuldades de manutenção dos negócios no país. É necessário criar e sustentar vantagens competitivas entre as empresas, a fim de reduzir os custos da produção para alcançar o lucro e se manter no mercado.

Os esforços estão cada vez mais focados na realização da atividade principal da empresa, sendo necessário que toda a capacidade produtiva seja redirecionada para acumular valores à produção. No final, não restam energias a serem direcionadas nas atividades que, embora necessárias ao produto final, não estejam necessariamente ligadas a este.

Estas atividades são denominadas atividades-meio, ou seja, são dispensáveis na realização do produto principal da empresa, na atividade-fim. É perfeitamente possível o repasse destas tarefas a outras empresas, o que significa reduzir imediatamente o custo com mão-de-obra. Assim, a empresa pode focar-se apenas no indispensável, aumentando a competitividade e a especialização e, por conseqüência, os lucros.

Surge, então, a terceirização em meio a este contexto, com o fim principal de reduzir custos e acelerar a economia. A terceirização pode e deve ser defendida como um meio de desverticalização, fixação de esforços gerenciais no produto principal, busca de melhoria contínua da qualidade, produtividade e competitividade, que, é claro, considerada a redução de custos.

Porém, não se pode ficar alheio e inerte quanto aos efeitos maléficos que este processo pode causar aos trabalhadores, tais como desemprego, redução salarial, perda de benefícios, sonegação de encargos sociais, entre outros. Assim, a repercussão toma forma contundente no Direito do Trabalho, posto promover grande alteração na definição bilateral típica da relação de emprego, podendo resultar em grave precarização das condições de trabalho no Brasil.

Alerta-se ainda para o grande impasse que é gerado pela omissão legal acerca do assunto, visto que a legislação não estabelece quais as atividades podem ser alvo do processo, nem quais procedimentos devem ser observados pelas empresas que fazem uso do instituto. Ante a omissão legislativa, os trabalhadores podem contar apenas com o enunciado 331 do Tribunal Superior do Trabalho como apoio na hora de reclamar os direitos trabalhistas.

Diante de todo o exposto, indaga-se a respeito da legalidade da utilização da terceirização trabalhista e quais seriam estas situações, acreditando-se na hipótese de que é possível o uso do instituto, porém, apenas em sua forma lícita.

Este trabalho foi desenvolvido com base na pouca legislação existente sobre o tema, jurisprudências e doutrinas, e tem o objetivo de estudar a terceirização da mão de obra laboral, que será investigada mais a fundo, principalmente no tocante à atividade-fim das pessoas jurídicas, quando é considerada ilegal. Para tanto, será necessário pontuar sobre as evoluções do direito do trabalho, bem como a flexibilização das normas trabalhistas, além de ser fundamental a análise dos projetos de lei que hoje tramitam no Congresso Nacional com o objetivo de regular o assunto.


2 EVOLUÇÃO DO DIREITO DO TRABALHO E A FLEXIBILIZAÇÃO

A Relação de trabalho, influenciada pelas transformações sociais, passou por várias mudanças ao longo da história. A escravidão, a servidão e as corporações de ofício foram algumas das formas de trabalho adotadas antigamente. Porém, o marco principal para a evolução do Direito do Trabalho está intimamente ligado à Revolução Industrial do século XVIII, que impôs uma nova relação entre trabalho e capital. (FERRAZ, S/D, on line).

Com o nascimento das grandes indústrias e o advento das máquinas, as formas e condições de trabalho foram intensamente modificadas, passando os trabalhadores das fábricas a vender sua força de trabalho em troca de um salário. Devido ao rápido crescimento econômico, a população foi atraída para os grandes centros em busca de trabalho nas fábricas. Esse deslocamento de camponeses e artesãos contribuiu para o grande aumento da população nas cidades, gerando o desemprego. (FERRAZ, S/D, on line).

O desemprego avassalador, juntamente com o Liberalismo Econômico da época, foi determinante para que os trabalhadores se sujeitassem a um regime desumano de trabalho. Como se pregava uma intervenção mínima do Estado na economia e nas relações sociais, os trabalhadores ficaram sujeitos à lei da oferta e da procura, ou seja, à mercê da vontade dos empregadores que eram o pólo mais forte da relação de trabalho. Surge então a figura do proletariado. O proletário é o trabalhador que enfrenta jornadas de até 16 horas por dia em troca de baixíssimos salários e condições vexatórias de trabalho.

A precariedade da situação despertou a reação dos trabalhadores, que impulsionados por idéias socialistas de combate ao capitalismo e ao liberalismo, passaram a se associar em classes de operários em prol da defesa de seus interesses, originando, assim, os sindicatos. (FERRAZ, S/D, on line).

A sociedade como um todo passou a cobrar do Estado uma ação firme de regulamentação das relações de trabalho. Esse, por sua vez, começou a intervir e proporcionar proteção jurídica e econômica ao trabalhador por meio de leis que regulamentassem minimamente as condições do trabalho e melhorias sociais.

Exemplos marcantes de conquistas para o direito trabalhista foram a Constituição do México, em 1917, denominada de Constituição Social; A declaração Russa dos Direitos do Povo Trabalhador e Explorado, em 1918; A Constituição de Weimar, em 1919; A criação da OIT (Organização Internacional do Trabalho) após a primeira guerra; a "Carta Del Lavoro", de 1927, documento italiano fundamental para o direito do trabalho, dentre outros. O Direito do Trabalho, portanto, representa uma conquista da classe trabalhadora e estas positivações significaram um grande avanço na esfera social. (FERRAZ, S/D, on line).

Porém, ao final do século XX surgem os fenômenos da globalização e do neoliberalismo, representando um novo e grande impacto no Direito do Trabalho e nos Direitos Sociais.

A globalização da economia, fruto do capitalismo, implantou uma nova concepção entre o capital e o trabalho, pois as questões econômicas se tornaram o ápice dos interesses globais. O desenvolvimento econômico, tecnológico, principalmente das telecomunicações, transformaram algumas empresas em grandes potências, expandindo seus mercados na busca de acumulação de capital, aproveitando principalmente a mão-de-obra barata dos países subdesenvolvidos e o baixo custo para a produção. Essa nova dinâmica de internacionalização dos mercados gerou também uma internacionalização de bens e serviços, possibilitando uma livre circulação de trabalhadores. O mundo se tornou refém dos interesses econômicos e as tentativas de frear o capitalismo, para preservar o equilíbrio social, fracassaram. (SANTOS, 2005, on line).

Nos países desenvolvidos, os trabalhadores perderam postos de trabalho devido à informatização do mercado e à migração das empresas para países subdesenvolvidos. Os países subdesenvolvidos, por sua vez, ficaram ‘nas mãos’ dos interesses das grandes empresas, pois dependiam delas para se desenvolver. Assim, o poder estatal começou a perder força para a economia de mercado cedendo às pressões do capitalismo e recuando nas conquistas sociais alcançadas ao longo de muitas décadas.

A crise econômica da década de 70 agravou ainda mais a situação dos trabalhadores, fazendo com que as idéias neoliberais tomassem força. O capitalismo passou a ser a justificativa para o crescimento, cortando-se gastos para a recuperação das empresas, afastando o Estado das questões trabalhistas e aumentando a produção. O argumento neoliberal pregava que o recuo do Estado nas questões sociais e trabalhistas aumentaria a demanda de emprego e ajudaria as empresas a diminuir os custos com os respectivos encargos trabalhistas. (SANTOS, 2005, on line).

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Nasce assim, uma política flexibilizadora das normas trabalhistas, que se deu para atender às determinações de um processo globalizador que prometeu prosperidade econômica e a abertura de diversos postos de trabalho com diminuição dos encargos trabalhistas. Portanto, o neoliberalismo promoveu um enxugamento do Estado, nascendo a doutrina da desregulamentação e da flexibilização dos direitos trabalhistas; relaxando as normas trabalhistas para que haja uma adequação capaz de atender a dinâmica do mercado, enquadrando a relação de trabalho ao novo cenário mundial de concorrência. (SANTOS, 2005, on line).

A complexidade do tema e a falta de uma regulamentação do mesmo vêm gerando impactos nas relações de trabalho e debates extremistas sobre seus benefícios ou prejuízos.

Alguns autores acreditam que a flexibilização da legislação trabalhista representa um retrocesso, uma supressão nos direitos conquistados a duras penas ao longo da história. Entendem ser a lei capaz de solucionar todos os problemas sociais e que a flexibilização viria agravar as condições dos hipossuficientes. Acreditam que os argumentos a favor da flexibilização são apenas uma justificativa empresarial para precarizar as relações de trabalho e desonerar os custos. Busca-se, assim, a redução dos direitos e garantias dos trabalhadores, com o argumento de que a interferência estatal rígida prejudica as empresas, agravando a situação de desemprego.

Para outros, essa flexibilização vem como uma mudança necessária, trazendo progresso e criando novos postos de trabalho. Defendem que as normas trabalhistas estiveram, por muito tempo, sobre uma forte intervenção estatal, e que esta só faz frear o crescimento mundial. Como hoje os problemas são diferentes, o modo de combatê-los também é diferente. Não pode o Direito do Trabalho desempenhar o mesmo papel que desempenhou, com sucesso, antigamente. O Direito deve acompanhar o progresso os usos e costumes, sofrendo mutações e adequações aos novos tempos.

Os debates sobre o tema são acalorados e as opiniões sobre ele, bem divergentes. Cada setor quer defender seus próprios interesses e a base de argumentação deles é muito consistente. Apesar do esforço protecionista, a prática da flexibilização das normas trabalhistas é uma realidade que, querendo ou não, vem sendo utilizada.

Amauri Mascaro do Nascimento acredita que a flexibilização pode ser conveniente para alguns fins, sem perda do sentido do direito do trabalho, mas devem ser respeitadas rigidamente algumas normas a fim de evitar a perda do ponto de equilíbrio das relações jurídicas do trabalho. (NASCIMENTO, 2004, p. 153).

O professorMário Antônio Lobato de Paiva ensina:

[...] Na importante questão que envolve a definição do papel do Estado nas relações trabalhistas da sociedade contemporânea, parece fundamental admitir que a redução do tamanho do Estado não pode torná-lo incapaz de mediar os conflitos, sob pena de deixar a grande maioria dos trabalhadores sem qualquer defesa, completamente dominados pelos grandes grupos econômicos e financeiros, que têm no lucro o único objetivo de suas ações.

Esses fenômenos (desregulamentação e flexibilização) correspondem apenas, a um novo espírito do Estado menos centralizado, mais aberto aos grupos naturais e mais preocupado com a eficácia e bem estar da comunidade como um todo e não apenas de um parcela de privilegiados.

Temos, assim, a firme convicção de que a flexibilização e a desregulamentação apresentam-se como mecanismos úteis de desenvolvimentos das relações laborais e que precisam ser bem utilizados e compreendido por todos os atores sociais. Estes referidos mecanismos deverão assim, ter de prioridade política, associada a opção por executar um conjunto de políticas e ações capazes de aliar a estabilidade com crescimento e inclusão social. (PAIVA, 2001, on line).

Interessante o que diz, a respeito do tema, o professor Antônio Álvares da Silva:

[...] o debate sobre a flexibilização foi travado com muita emoção e conteúdo ideológico, sindicatos e governo perderam-se em troca de acusações recíprocas, que se distanciaram da realidade e se transpuseram para o campo político. [...] o esforço a de ser na direção de se construir um Direito Flexível, que se adapte às necessidades dos novos tempos, mas que também, por outro lado, não prejudique o trabalhador. (SILVA, 2002, p. 85 -6).

No Brasil, é possível observar a aplicação destes institutos, tanto em caráter constitucional, quanto em caráter infraconstitucional.

A Advogada Rosalba Maria Barros Perez em seu trabalho: "A Flexibilização das normas trabalhistas no Brasil à Luz da Globalização" cita como formas de flexibilização da constituição: a redução do salário, art. 7º VII; a redução da jornada de 8 horas diárias, art. 7º XIII e a redução da jornada de 6 horas para o trabalho realizado em turnos ininterruptos de revezamento, art. 7º XIV, cabendo às partes determinar as normas que passarão a reger suas relações de acordo com seus interesses, mediante acordo ou convenção coletiva de trabalho. (PEREZ, S/D, on line).

No plano infraconstitucional as formas de flexibilização são muitas, mas as que chamam mais a atenção é a súmula 331 do Tribunal Superior do Trabalho, que regulou o instituto da terceirização, que é uma contratação de trabalhadores através de uma empresa interposta e a lei 6.019, de 1974, que tratou do Trabalho Temporário, (uma forma de terceirização), que consiste em colocar trabalhadores à disposição de outras empresas, temporariamente, objetivando atender a necessidade transitória de substituição de seu pessoal.

Como visto, a rigidez das normas trabalhistas vêm sendo minimizadas. A maior parte da doutrina, no entanto, alerta para que, ao se flexibilizar as normas, sejam respeitados os direitos mínimos do trabalhador e que as negociações coletivas se façam mais presentes.


3 TERCEIRIZAÇÃO

3.1 Conceito

Conforme já mencionado, a terceirização hoje é uma realidade nas relações de trabalho, originada das mudanças no sistema econômico e da flexibilização das normas.

No entanto, não existe legislação que defina a terceirização, cabendo apenas à doutrina a tarefa da conceituação. O autor Paulo Douglas Almeida de Moraes enumera vários conceitos acerca do fenômeno da terceirização, retirados de doutrinas administrativas e jurídicas. Vejamos alguns conceitos de doutrinas administrativas.

Segundo Lívio Giosa, terceirização é

[...] um processo de gestão pelo qual se repassam algumas atividades para terceiros, com os quais se estabelece uma relação de parceria, ficando a empresa concentrada apenas em tarefas essencialmente ligadas ao negócio em que atua. (GIOSA apud MORAES, 2003, p.64).

Para Ciro Pereira da Silva, o fenômeno da terceirização pode ser definido como:

[...] a transferência de atividades para fornecedores especializados, detentores de tecnologia própria e moderna, que tenham esta atividade terceirizada como sua atividade-fim, liberando a tomadora para concentrar seus esforços gerenciais em seu negócio principal, preservando e evoluindo em qualidade e produtividade, reduzindo custos e ganhando competitividade. (SILVA apud MORAES, 2003, p. 65).

Já os juristas evidenciam o fenômeno a partir de outro ponto de vista. Segundo Paulo Moraes, enquanto os administradores estudam a terceirização com o fim da eficácia empresarial, a comunidade jurídica analisa o instituto a partir da dinâmica instalada nas relações entre as pessoas jurídicas terceirizantes e terceirizadas. (MORAES, 2003, p. 66).

Patrícia Catharino ainda observa que existe grande polêmica acerca das atividades que podem ou não ser terceirizadas, sendo que grande parte concebe o processo de terceirização apenas quando relacionado à atividade-meio ou complementares. (CATHARINO, 2005, p. 39).

Para Alice Monteiro de Barros, terceirização é um fenômeno "que consiste em transferir para outrem atividades consideradas secundárias, ou de suporte, mais propriamente denominadas de atividades-meio, dedicando-se a empresa à sua atividade principal, isto é, à sua atividade-fim." (BARROS apud MORAES, 2003, p. 67).

Já Sergio Pinto Martins ensina que é a "possibilidade de contratação de terceiros para realização de atividade-meio da empresa, isto é, aquelas atividades que não constituam seu objeto principal, sua atividade essencial." Segundo o autor, existem terceirizações de atividades-fim, como por exemplo, na indústria automobilística, por aquela empresa que reúne as peças fornecidas por diversos fornecedores e monta uma parte do veículo. (MARTINS apud MORAES, 2003, p. 67)

Em outras palavras, a terceirização significa repassar uma atividade que não esteja relacionada com o objetivo principal da empresa a uma outra empresa, para que esta contrate seus próprios funcionários, mantendo com eles o vínculo empregatício. A empresa terceirizada figura como intermediária na relação, que se torna trilateral, conforme nos ensina Maurício Godinho Delgado:

Por tal fenômeno insere-se o trabalhador no processo produtivo do tomador de serviços sem que se estendam a este os laços justrabalhistas, que se preservam fixados com uma entidade interveniente. A Terceirização provoca uma relação trilateral em face da contratação de força de trabalho no mercado capitalista: o obreiro, prestador de serviços, que realiza suas atividades materiais e intelectuais junto à empresa tomadora de serviços; a empresa terceirizante, que contrata este obreiro, firmando com ele os vínculos jurídicos trabalhistas pertinentes; a empresa tomadora de serviços, que recebe a prestação de labor, mas não assume a posição clássica de empregadora desse trabalhador envolvido. (DELGADO, 2002, p. 417).

Segundo Mariangela Leal Cherchglia, as principais formas de aplicação da técnica de terceirização são (CHERCHGLI, 2002, on line):

- Desverticalização: consiste em repassar funções a um fornecedor especializado, que atua em suas próprias instalações, fabrica partes e componentes solicitadas pelo tomador de serviços;

- Prestação de serviços: a mais utilizada das formas, ocorre quando um terceiro pratica atividade-meio do tomador, executando-a nas instalações deste ou em local determinado;

- Franquia: ocorre quando determinada empresa concede a terceiro o uso de sua marca ou comercializa seus produtos em condições preestabelecidas;

- Compra de serviços: acontece quando uma empresa de capacidade saturada necessita aumentar suas atividades e buscam parceiros para que estes complementem a capacidade produtiva;

- Nomeação de representantes: incide quando uma empresa contrata outras para a representação nas vendas em geral;

- Concessão: ocorre quando uma empresa atua em nome de outra, que condiciona o uso da sua marca e comercialização dos seus produtos;

- Permissão: utilizada tipicamente na terceirização de serviços públicos, a permissão ocorre quando a exploração de um serviço público é repassada a uma permissionária para que esta, exclusivamente, explore o serviço;

- Alocação de mão-de-obra: compra ou aluguel de horas de trabalho, podendo se desenvolver como o trabalho temporário ou o sindicalizado;

Ainda segundo a autora, demais formas de aplicação da técnica, como desintegração, facção, corporação, descentralização integrada, são específicas de determinado ramo da economia ou ainda incipientes. (CHERCHGLI, 2002, on line).

Conclui-se que a empresa tomadora pode focar-se apenas na produção do objeto principal, aumentando a qualidade e a produtividade, aliada à redução dos custos de produção. Ou seja, enquanto no modelo tradicional o empregado presta serviços diretamente ao empregador, com o qual possui vínculo empregatício (art. 2º, caput, CLT), na terceirização a relação é trilateral, onde o empregado presta serviços ao tomador, embora não seja seu empregado efetivo. A relação de emprego é estabelecida com outro sujeito, a empresa interveniente ou fornecedora.

3.2 Princípios do direito do trabalho e a terceirização

O art. 4º da Lei de Introdução ao Código Civil diz que "quando a lei for omissa, o juiz decidirá o caso de acordo com a analogia, os costumes e os princípios gerais de direito". Deste artigo, depreende-se que, aos magistrados, cabe o desenvolvimento do direito no caso de haver lacuna na legislação, na tentativa de alcançar a decisão mais favorável ao caso concreto.

Diante da falta de legislação que tutele o assunto em tela, procuramos solução com a interpretação sistemática do nosso ordenamento jurídico, principalmente nos princípios contidos em nossa Constituição e na CTL.

Os princípios são considerados como estrutura jurídica, que tem como finalidade viabilizar a aplicação das normas nos casos concretos. Os mesmos possuem grande relevância no ordenamento jurídico por serem considerados como norteadores do direito e possuírem características informadoras, interpretativas e normativas no direito.

No direito do trabalho, o artigo 8º da CLT traz uma função essencial aos princípios, dispondo que os mesmo deverão ser aplicados em caso de omissão legal ou contratual, in verbis:

Art. 8º - As autoridades administrativas e a Justiça do Trabalho, na falta de disposições legais ou contratuais, decidirão, conforme o caso, pela jurisprudência, por analogia, por eqüidade e outros princípios e normas gerais de direito, principalmente do direito do trabalho, e, ainda, de acordo com os usos e costumes, o direito comparado, mas sempre de maneira que nenhum interesse de classe ou particular prevaleça sobre o interesse público.

Parágrafo único. O direito comum será fonte subsidiaria do direito do trabalho, naquilo em que não for incompatível com os princípios fundamentais deste.

Sendo assim, o direito do trabalho, como direito autônomo que é, possui princípios próprios que constituem fundamentos específicos do ordenamento jurídico trabalhista, não se confundindo com outros ramos do direito.

Nesta esteira, Américo Plá Rodriguez ressalta a importância dos princípios desse ramo do Direito, afirmando que eles constituem o fundamento do ordenamento jurídico trabalhista, e, conseqüentemente, entre os mesmos e os preceitos legais não pode haver contradição. Ademais, é certo afirmar que tais princípios estão acima do direito positivo, na medida em que servem como elemento inspirador, não podendo, porém, tornar-se independentes do sistema, visto que se influenciam mutuamente. (PLA RODRIGUEZ apud JOHNSTON, 2002, on line).

Passemos à análise dos princípios basilares do Direito do Trabalho que possuem pertinência temática com o presente trabalho monográfico.

3.2.1 Princípio da proteção

Este princípio se desdobra em três outros princípios que visam garantias de condições mais benéficas aos trabalhadores, bem como, aplicação das normas mais favoráveis, com o propósito de corrigir desigualdades diante da posição de hipossuficiência do empregado.

O fundamento do princípio da proteção decorre do propósito de equilibrar as relações havidas entre o capital e a força de trabalho, eis que são flagrantemente desiguais. A desigualdade entre os homens já se manifesta logo na origem da humanidade, onde o mais forte, apesar de igual ao mais fraco, sempre se manteve em posição privilegiada quando da ocupação das terras, do aproveitamento da propriedade e no prenúncio da manifestação do trabalho subordinado.

Porém, acerca do alcance deste princípio, extrai-se a seguinte lição de Plá Rodrigues:

[...] este princípio não dá direito de fazer qualquer coisa em nome da proteção do trabalhador, e muito menos a substituir-se ao criador das normas. Tem um campo de aplicação limitado e, mantendo-se dentro dele, não conspira contra a segurança, porém assegura a eficaz e adequada aplicação da norma. (AMÉRICO, 2004, p. 39).

O princípio do "In dúbio pro operário" visa proteger a parte mais fraca da relação de trabalho, qual seja, o trabalhador. O princípio reza que havendo dúvida quanto a interpretação da norma, deverá ser aplicada aquela que for mais benéfica ao trabalhador. Por óbvio, este princípio deve ser aplicado com razoabilidade evitando afrontar a verdadeira vontade do legislador.

A natureza deste princípio é considerada como hermenêutica, pois havendo um dispositivo de lei ou de um contrato que enseje interpretação em sentido dúbio, a regra é que será adotada a interpretação mais benéfica ao trabalhador.

O princípio da "Aplicação da norma mais favorável" será aplicado sempre que houver uma pluralidade de normas, devendo-se optar por aquela mais favorável ao trabalhador.

É sabido que existem diversas normas que regulam as relações laborais, como por exemplo, acordos coletivos, sentenças normativas, convenções, regulamentos internos empresariais, entre outros. Ressalta-se que, diante da aplicação deste princípio não haverá hierarquia de normas, mas sim, a aplicação daquela que for mais benéfica ao trabalhador.

Já, com relação ao princípio da "condição mais benéfica", sua essência está intimamente ligada ao princípio da norma mais favorável. No entanto, neste caso, a finalidade do princípio é manter os direitos e privilégios alcançados pelo trabalhador no decorrer do contrato de trabalho.

Reza o art. 10 da CLT: "Qualquer alteração na estrutura jurídica da empresa não afetará os direitos adquiridos por seus empregados".

No mesmo raciocínio tem-se o art. 468 da CLT que dispõe:

Art. 468. Nos contratos individuais de trabalho só é lícita a alteração das respectivas condições por mútuo consentimento, e ainda assim desde que não resultem, direta ou indiretamente, prejuízos ao empregado, sob pena de nulidade da cláusula infringente desta garantia.

Nesta esteira, já se encontra pacificada a aplicação deste princípio, de acordo com a súmula 51 do TST, in verbis:

I- As cláusulas regulamentares, que revoguem ou alterem vantagens deferidas anteriormente, só atingirão os trabalhadores admitidos após a revogação ou alteração do regulamento.

II - Havendo a coexistência de dois regulamentos da empresa, a opção do empregado por um deles tem efeito jurídico de renúncia às regras do sistema do outro. (ex-OJ nº 163 da SBDI-1 - inserida em 26.03.1999).

Portanto, o que se pode extrair da simples leitura da súmula supracitada é que não poderá ser feita qualquer alteração no contrato de trabalho que importe em prejuízos ao obreiro. Havendo alteração que acarrete em diminuição de benefícios, a mesma só atingirá os trabalhadores contratados posteriormente.

Sendo assim, ficam garantidos ao trabalhador os benefícios e garantias previstos no contrato de trabalho, não podendo o empregador revogar ou abster essas garantias de forma unilateral e em detrimento do obreiro.

3.2.2 Princípio da primazia da realidade

Este princípio é também conhecido como primazia sobre a forma, que prevê no caso de dissonância entre a realidade fática e os documentos ou contratos existentes, prevalece o primeiro, com base na verdade real, pois a realidade dos fatos é insuscetível de adulteração pela vontade humana e os documentos podem exprimir sem exatidão a vontade das partes, além de poderem revestir-se de vícios de formação que prejudicam a sua validade.

Nas palavras do autor Aldem Johnston: "a relação objetiva evidenciada pelos fatos define a verdadeira relação jurídica estipulada pelos contratantes, ainda que sob capa simulada, não correspondente à realidade". (JOHNSTON, 2002, on line).

Primazia da Realidade surge, por exemplo, da regra do art. 9º, da CLT: "Serão nulos de pleno direito os atos praticados com o objetivo de desvirtuar, impedir ou fraudar a aplicação dos preceitos contidos na presente Consolidação".

O que se pode extrair a partir deste princípio é que no direito do trabalho sempre prevalecerá o "contrato realidade" como denomina parte da doutrina, ou seja, independente de qualquer contrato ou documentos que dê aparência de regularidade, sendo o fato controvertido, prevalecerá a realidade. Inclusive, a CLT prevê a possibilidade de haver contratação de empregados até mesmo de forma tácita, ou seja, independente de contrato.

3.2.3 Princípio da irrenunciabilidade

A prevalência da autonomia da vontade nos contratos em geral não se aplica aos contratos de trabalho em face da vigência do princípio da irrenunciabilidade dos direitos trabalhistas, impedindo, portanto, que o empregado renuncie a direitos decorrentes da relação de emprego que lhe foram conferidos pelo Estado. Por este motivo, em regra, o silêncio ou a concordância do empregado com a supressão de algum direito seu decorrente da relação de emprego não produzirão qualquer efeito, pois o Estado não lhe concede a faculdade de abdicar dos mesmos.

Se a regra é a irrenunciabilidade, a exceção somente ocorre quando a norma jurídica expressamente conceda ao empregado a faculdade de praticar o ato. Plá Rodrigues conceitua este princípio como sendo "a impossibilidade jurídica de privar-se voluntariamente de uma ou mais vantagens concedidas pelo Direito Trabalhista em benefício próprio". (AMÉRICO, 2004, p. 66). E acrescenta que a "renúncia equivale a um ato voluntário pelo qual uma pessoa se desliga de um direito reconhecido a seu favor e o abandona." (AMÉRICO, 2004, p. 67).

3.2.4 Princípios da boa-fé e dignidade da pessoa humana

A boa-fé não é uma norma, mas um princípio jurídico fundamental. Pode ser crença, que é uma conduta legítima sem prejudicar terceiras pessoas, ou lealdade, no sentido de honestidade, que é o vigorante no Direito do Trabalho, apresentando-se por dois ângulos: subjetivo, que é a estima, e jurídico, que é a sua conduta exteriorizada. Deve existir entre ambas as partes e representa o valor ético do trabalho.

A nossa Constituição traz como um de seus fundamentos o princípio base de todo o ordenamento jurídico: a dignidade da pessoa humana:

Art.1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos:

[...]

III – a dignidade da pessoa humana.

Sobre a importância deste principio, ensina Alexandre de Morais:

[...] concede unidade aos direitos e garantias fundamentais, sendo inerente às personalidades humanas. Esse fundamento afasta a idéia de predomínio das concepções transpessoalistas de Estado e Nação, em detrimento da liberdade individual. A dignidade da pessoa humana é um valor espiritual e moral inerente a pessoa, que se manifesta singularmente na autodeterminação consciente e responsável da própria vida e que traz a pretensão ao respeito por parte das demais pessoas, constituindo-se em um mínimo invulnerável que todo estatuto jurídico deve assegurar, de modo que apenas excepcionalmente possam ser feitas limitações ao exercício dos direitos fundamentais, mas sempre sem menosprezar a necessária estima que merecem todas as pessoas enquanto seres humanos. (MORAES, 2007, p. 16).

Também é conhecido como o princípio do valor humano, que consiste na humanização do trabalho, em considerar o trabalhador como um ser humano e não como mercadoria ou elemento de produção.

O homem trabalhador deve ser visto como sujeito-fim e não o objeto-meio do desenvolvimento. Não é necessário que se crie mais direitos, mas sim, dar garantias para a eficácia dos que já existem, pois o problema fundamental em relação aos direitos do homem, não são o de justificá-los, mas o de protegê-los. Não se trata de saber quais e quantos são esses direitos, qual a sua natureza e seu fundamento, se são absolutos ou relativos, mas sim qual é o modo mais seguro de garanti-los para impedir que, apesar das solenes declarações, eles sejam continuamente violados.

Afinal, os direitos sociais, não podem simplesmente ser atribuídos aos cidadãos. Eles requerem do Estado um amplo e complexo rol de programas de ação e de políticas públicas dirigidas a segmentos específicos da sociedade, políticas essas com o objetivo de fundamentar esses direitos e atender às expectativas por eles geradas com sua positivação. E não só do Estado, mas de todos os operadores do Direito.

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Sobre o autor
Rogério Geraldo da Silva

Advogado. Bacharel em Direito pela Faculdade Pitagoras de Administração Superior. Pós-graduado em Direito do Trabalho e Direito Processual do Trabalho pela escola Verbo Jurídico em parceria com o Centro Universitário Leonardo da Vinci-UNIASSELVI.<br>Pós-graduando em Gestão Pública pela Universidade do Estado de Minas Gerais - UEMG-UAB

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

SILVA, Rogério Geraldo. A terceirização no Brasil e a Súmula 331 do TST. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 16, n. 3042, 30 out. 2011. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/20331. Acesso em: 24 abr. 2024.

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Orientador: Prof. Luiz Felipe Rodrigues

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