Artigo Destaque dos editores

Novas tecnologias e a sustentabilidade do sistema tributário

Exibindo página 3 de 6
24/12/2011 às 07:59
Leia nesta página:

4 SISTEMA TRIBUTÁRIO FRENTE ÀS NOVAS TECNOLOGIAS

Como já visto, a cobrança moderada de tributos sustenta a sociedade civilizada. Essa política fiscal, desde que devidamente manejada, encoraja determinadas atividades, penaliza comportamentos sociais indesejados, promove inversões básicas diretas em diversos setores e redistribui os recursos nacionais e as riquezas.

A tributação é um importante instrumento de equilíbrio social e de homogeneização das estruturas econômicas. Por isso, a manutenção deste sistema é primordial para garantir a evolução do bem-estar social, objetivo este tão almejado pela Constituição da República.

Mesmo que de maneira lenta, burocrática e tímida, a história mostra que o Fisco vem se adaptando as novas tecnologias. Melhor dizendo, o sistema vem lentamente evoluindo. Ocorre que a dinâmica do mercado não pode esperar esta morosidade, sob pena de brecar o seu desenvolvimento. Nas palavras de Lanari (2005, p. 144), o "novo século reclama uma abordagem tributária diferenciada, capaz de acolher as novas tendências empresariais e de promover os direitos humanos, para que não se interrompa a marcha desenvolvimentista".

É certo que a vontade política pode acelerar esta adaptação ao novo. Tal interação com as novas tecnologias é questão de sobrevivência do atual sistema tributário, pois a cada dia os números comprovam que o Estado possui mais e mais despesas, principalmente com a previdência.

Porém, exemplos históricos mostram como o legislador conseguiu inserir novos produtos à hipótese de incidência, podendo então cobrar tributos sobre eles. Tal adequação demandou, muitas vezes, grandes manobras legislativas, que culminaram até mesma com emendas constitucionais.

Estas adequações podem servir de exemplo de como prosseguir com as inovações trazidas pela internet e, por isso, é essencial fazer um breve retrospecto sobre como o sistema tributário foi adaptado em face das recentes ondas tecnológicas.

4.1 PRECEDENTES HISTÓRICOS

Sempre que o Direito percebe uma mudança social, mesmo que lentamente, este procura adequar-se a nova realidade. Assim, as normas conseguem manter a ordem interna e absorver novas tendências, anseios sociais e tecnologias.

Mesmo com um sistema burocrático, a história comprova que sempre foi possível evoluir no campo jurídico, atualizando-o e mantendo-o hígido. Esta adequação que ocorreu ao longo dos tempos foi auxiliada pela lentidão com que a sociedade evoluía. Uma invenção tecnológica aparentemente revolucionária, como a televisão, rádio, computador, etc., demoravam anos e anos para serem implantados definitivamente à população.

A televisão, por exemplo, após ser massificada nos EUA durante a década de 50, demorou quase 10 anos para cair no gosto dos brasileiros. Desta forma, o legislador já possuía modelos internacionais, teorias sólidas, preparando-se pela absorção pelo mercado interno. Essa "demora" proporcionava tempo mais que suficiente para um planejamento em longo prazo, deixando certo conforto ao trabalho de regulamentar tais tecnologias.

Porém, atualmente, as mudanças ocorrem a nível global em questão de dias, e o tempo virou o maior inimigo do ser humano, inclusive do legislador. As pessoas vivem sob pressão. A internet possui um papel fundamental nesse aspecto e, por isso, ao legislador cabe o papel de analisar o passado para que, com base nos resultados, possa aplicar novas regras às novas tendências sociais, sem cometer vícios e omissões anteriormente percebidas.

4.1.1 Iluminação Pública

Até o advento da Constituição de 1988, a iluminação pública, no Brasil, era custeada pelo extinto Fundo Nacional de Energia, controlado pela União por intermédio das concessionárias de energia. Desta forma, o pagamento das contas de energia elétrica destinada à iluminação pública não constituía problema de gestão financeira aos municípios brasileiros.

Com a extinção deste Fundo em 1988, todas as despesas com o custeio da iluminação pública foram repassadas para o Município. Este, por sua, vez, onerado por uma nova despesa e sem a prévia e necessária definição das fontes de receita necessárias ao adimplemento de tal encargo, sofreu sérios problemas de ordem financeira.

Visando então repassar estes gastos para o contribuinte, o legislador municipal, em seus lapsos criativos, não demorou para instituir a Taxa de Iluminação Pública – TIP –, com base no art. 145, inc. II da Constituição Federal e no artigo 77 do Código Tributário Nacional.

Porém, uma vez revestido da denominação de taxa, este deveria possuir como característica a especificidade e a divisibilidade. Por motivos óbvios, o serviço de iluminação pública não tem estas peculiaridades.

Portanto, com o objetivo de corrigir a flagrante inconstitucionalidade cometida pelos municípios, foi apresentado um Projeto de Emenda à Constituição Federal (PEC), em 2002, que ganhou o n.º 39, instituindo a Contribuição para o Custeio do Serviço de Iluminação Pública – COSIP –, que foi aprovada, introduzindo, assim, o art. 149-A da Magna Carta, que disciplinou a instituição da referida contribuição no ordenamento jurídico pátrio, que vigora até os dias atuais

O legislador, vendo-se acuado pelos conceitos tradicionais do sistema tributário, fundamentados nos aspectos físicos das relações sociais, teve que alterar a Lei Maior para poder tributar a iluminação pública.

Agora constitucionalmente prevista, não há que se discutir sua validade. Porém, são severas as críticas formuladas pela doutrina acerca de tal contribuição, pois, segundo Machado (2007, p. 441), o corte do fornecimento face o não pagamento "exclui o devido processo legal e atropela o direito de defesa do contribuinte contra eventual cobrança indevida".

Harada (2007, p. 347), por sua vez, afirma que "falta o pressuposto básico da contribuição, que é exatamente o benefício diferenciado dos demais (não contribuinte)". A idéia do autor resume-se no fato de que a iluminação pública, quando implantada em determinado local, pode constituir-se em fato gerador da contribuição de melhoria, jamais de contribuição social.

O que define o tributo não é sua nomeclatura, mas sim sua hipótese de incidência. Sendo assim, apesar das incorreções técnicas, o importante para este trabalho é perceber que a iluminação pública, logo que fora passada ao poder municipal, não demorou em ser tributada. Será que com o comércio eletrônico também será assim?

4.1.2 Telecomunicações

O Brasil pratica a maior tributação sobre os serviços de telecomunicações do mundo. Além das altas alíquotas do ICMS, de competência estadual, a União cobra contribuições sociais, contribuições de intervenção no domínio econômico e taxas. As telecomunicações são um exemplo claro de como o Fisco logo percebeu o potencial de arrecadação do meio.

As comunicações foram percebidas pelo legislador logo que surgiu no mercado brasileiro, recebendo uma menção específica no ICMS, sendo instituído logo na entrada em vigor do atual Código Tributário Nacional, na década de 60. Ainda, tal imposto foi repassado à competência dos Estados, que se aproveitaram da situação em passaram a impor alíquotas de até 25%.

O serviço de comunicação não foi de difícil introdução no sistema tributário, pois sua característica peculiar, a transmissão de mensagens à distância, não deixou dúvidas da incidência ao fato concreto. Isso facilitou a fiscalização, bem como a adequação ao modelo tradicional.

Ocorre que não bastou um só tributo incidir sobre o meio. Uma vez que as empresas do setor já estavam estabelecidas no mercado, com bases sólidas e lucros exorbitantes, o legislador percebeu que o potencial de arrecadação poderia ser ainda maior. A União criou então, no ano 2000, o Fundo de Universalização dos Serviços de Telecomunicações (Fust), o Fundo de Fiscalização das Telecomunicações (Fistel) e o Fundo para o Desenvolvimento Tecnológico das Telecomunicações (Funttel). Isso sem falar nos tributos não específicos para o meio, como o PIS (Programa de Integração Social) e o COFINS (Contribuição sobre Remuneração dos Empregados Contribuintes Individuais).

A pesada carga tributária sobre estas empresas são repassadas ao consumidor, obviamente. Em um exemplo prático, se a conta telefônica soma um total de R$ 788,29, verifica-se que, deste montante, R$ 566,15 são pagos pelos serviços efetivamente prestados. Todo o restante é reservado ao Fisco, sendo: R$ 197,06 de ICMS, com uma alíquota de 25% calculada, e mais PIS e Cofins, no valor R$ 25,08. Total de tributos repassados diretamente ao consumidor chega a 39,24%. Afora estes números, a concessionária deve recolher valores para os Fundos acima citados (Fust, Fistel e Funtell).

Não é a toa que a conta telefônica seja tão elevada. Essa carga tributária pode ilidir o desenvolvimento do meio, e somente não é rechaçada pela população por ser um artigo de grande utilidade no dia-a-dia.

4.1.3 Softwares

O software foi desde logo abarcado pelo Direito Industrial e pelos Direitos Autorais, deixando a questão da tributação de lado. Desta forma, está situado entre os bens intelectuais, mais especificamente, os bens informáticos, sendo tutelado pelo Direito Autoral outorgando proteção jurídica ao seu criador.

A grande divergência sobre seu enquadramento jurídico está na sua intangibilidade, pois o que se está comercializando não é o suporte físico, mas sim os dados, ou melhor, o conjunto de bits que estão nele inseridos. Conforme afirma Wachowicz (2004, p. 255), "o programa de computador não está adstrito a um meio físico determinado, mas resguarda sua utilidade e funcionabilidade para além das corporificações várias que podem revestir".

Em face do modo de desenvolvimento do software, existem duas situações de interesse para o Direito Tributário. A primeira delas diz respeito àquele profissional autônomo que presta um serviço a uma empresa e desenvolve um programa, mas continua a receber seus "royalties" pela criação intelectual. A segunda refere-se à produção em massa de softwares e que são vendidos em lojas como mercadorias, no qual o autor cede sua criação e não permite que determinada empresa explore o conteúdo do software (exemplar de prateleira).

O legislador não criou, tampouco adequou, o modelo tributário atual para enquadrar estas situações, que vieram a se massificar ao longo dos anos 90. Desta forma, coube a doutrina e a jurisprudência [04] classificar e imputar o tributo cabível a cada um dos casos, lembrando-se que ainda existem outras teorias sobre o tema. Na primeira situação, a doutrina dominante tem entendido que há a ocorrência de uma prestação de serviços, sendo então tributada pelo imposto denominado de ISS, de competência municipal.

Fique sempre informado com o Jus! Receba gratuitamente as atualizações jurídicas em sua caixa de entrada. Inscreva-se agora e não perca as novidades diárias essenciais!
Os boletins são gratuitos. Não enviamos spam. Privacidade Publique seus artigos

No segundo caso, quando o elemento caracterizador dessa cessão é o pagamento pelo direito de reproduzir a obra, nas palavras de Cezaroti (2005, p. 119), "estaremos diante de uma transferência jurídica da titularidade de uma mercadoria, tributável pelo ICMS". Ressalta-se que estas operações independem do formato em que são transmitidas. Seja com um suporte físico, seja via download, teoricamente ambas deveriam ser tributadas.

Há também os defensores do livre comércio, que afirmam e inventam teorias que justificariam a não incidência de qualquer tributo sobre o comércio de softwares. Porém, uma vez que são de pouca relevância, é válido apenas mencionar que elas existem.

4.1.4 Provedores de Internet

A questão acerca de qual tributo deveria incidir sobre os provedores de internet era acirrada ao longo dos anos 90. De um lado, os empresários, alegando que estes não prestavam serviços de comunicação, mas sim um serviço de valor adicionado. Do outro, de forma ferrenha, o Fisco argumentava e redigia portarias e pareceres concluindo que se tratava sim de um serviço de comunicação, sendo então tributado pelo ICMS.

Em face da omissão do legislador, essa calorosa discussão teve que ser pacificada pelo Superior Tribunal de Justiça conforme decisão no Recurso Especial nº 456.650/PR, da Rel. Min. Eliana Calmom, que assim determinou:

a)o provedor de serviço de rede internacional de computadores é tão usuário dos serviços de comunicação quanto aqueles que a ele recorrem para obter a conexão à rede maior;

b)o provedor de serviço de internet propõe-se a estabelecer a comunicação entre o usuário e a rede, em processo de comunicação, segundo a Lei 9.472/97 (art. 60, §1º);

c)o serviço prestado pelos provedores de comunicação enquadra-se, segundo as regras da lei específica (art. 61), no chamado serviço de valor adicionado;

d)o referido serviço é desclassificado como sendo serviço de telecomunicações (art. 61, §1º da Lei 9.472/97);

e)se a lei específica retira da rubrica serviço de telecomunicação, o serviço de valor adicionado, não poderá o intérprete alterar sua natureza jurídica para enquadra-lo na Lei Complementar 87, de 13/9/96, em cujo art. 2º está explicitado que o ICMS incidirá sobre (...).

A decisão da Min. Eliana Calmom deu um ponto final a esta batalha. Com respaldo na melhor doutrina, conclui-se que não incidem quaisquer tributos sobre os provedores de internet puros, isto é, sobre as empresas que prestam unicamente este serviço. Oliveira (2001, p. 146) enuncia que "resta evidenciado que os Estados e o Distrito Federal não detêm competência tributária para instituir imposto sobre prestação de serviço de comunicação que incida sobre a prestação de serviço de acesso à internet.

Tal entendimento é corroborado por vários autores, como Sacha Calmom Navarro Coelho, Newton de Lucca, Francisco de Assis Alves, Kiyoshi Harada, entre outros (al in MARTINS, 2001, p. 104, 141, 174, 222). Sendo assim, pacificada a idéia de não-incidência, o Fisco sofre uma grande derrota em sua intenção sedenta de arrecadação.

4.2 MODELOS INTERNACIONAIS

Analisando-se as tendências e modelos internacionais é possível extrair uma base capaz de definir prováveis rumos que a política nacional irá adotar sobre o tema "tributação na internet". É notório que as economias mundiais estão interligadas, os números de dada economia são capazes de afetar todo um continente de nações.

A influência externa é cada vez maior. As adequações às exigências internacionais se tornaram a essência para o crescimento e o desenvolvimento sustentável. Não é mais possível crescer isoladamente. Tudo dependerá de um conjunto de fatores equilibrados.

De acordo com Finkelstein (2004, p. 128), "é notório que divergências entre as legislações podem constituir verdadeiro óbice ao desenvolvimento do comércio", por isso existem as organizações internacionais, que tentam uniformizar esses conflitos sem ofender suas soberanias.

Assim, se faz necessário estudar e implantar métodos e modelos internacionais, sob pena de cair-se no isolamento e, conseqüentemente, na estagnação tecnológica, política e econômica. E, desta maneira, também se encaixa a legislação tributária, principalmente em um meio que inexistem barreiras físicas. Internet pressupõe a quebra de barreiras e a expansão do mercado para além dos limites físicos.

Porém, por ser interesse comum de todos os mercados mundiais, há uma peculiaridade sobre o assunto. Definições e modelos apresentados por organizações internacionais sobrepõem-se às propostas apresentadas pelos países, pois geralmente tais propostas não possuem uma visão universal do tema, privilegiando-se sempre aquele que a elabora.

Portanto, conforme enuncia Barros (2003, p. 77), "as organizações internacionais de ação direta são organismos que buscam o consenso em matérias políticas e econômicas em torno da globalização", possuindo um interesse além do país de sua origem, por isso a grande força de influência de tais entidades.

Em âmbito global, as mais influentes são a Organização para a Cooperação Econômica e o Desenvolvimento (OECD), vinculado a Organização Mundial do Comércio, e a United Nations Comissions on Internacional Trade Law (Uncitral), cujas propostas serão melhores analisadas abaixo.

Existem outras de menor expressão, que atuam em níveis regionais, mas que merecem ser destacadas: World Wide Web Consortium (W3C), Internacional Engineering Task Force (IETF) e a Internet Corporation for Assigned Names and Numbers (Icann).

De comum entre todos eles, resultam cinco princípios básicos que todas as nações devem aplicar na tributação sobre o comércio eletrônico e, segundo Portella (2007, p. 117), são assim delineados:

a)Neutralidade: os negócios teleinformáticos que sejam substancialmente similares àqueles que se realizam de forma comercial tradicional devem ser tributados de maneira igualmente similar. A função deste princípio é garantir a máxima paridade entre os custos indiretos que recaem sobre os agentes que atuam no âmbito do comércio tradicional e os custos que pesam sobre aqueles que desempenham suas atividades mercantis pela internet;

b)Simplicidade: devem ser aplicados às novas formas de relações jurídicas os mesmos princípios de fiscalidade internacional. A criação de novos princípios deve se dar apenas em casos extremos. Segundo posicionamento oficial da OECD e da União Européia, o legislador deve regular o controle tributário de modo a não prejudicar o desenvolvimento do comércio eletrônico, devendo garantir que os deveres tributários formais não minorem as perspectivas que oferece a Internet para o desenvolvimento de seus negócios;

c)Flexibilidade: a legislação implementada deve ser flexível e geral, propiciando o pleno desenvolvimento do meio. As regras que determinam a sujeição de ditas operações não devem ser aplicáveis somente sobre situações pontuais, e sim abarcar o maior número possível de supostos que possam surgir;

d)Eficiência: as medidas propostas para o controle tributário da internet necessitam possuir meios técnicos de fazê-lo. A qualidade dos procedimentos dependerá da eficiência que os mesmos possuem, ou possam vir a possuir, com respeito aos ingressos tributários, o que se traduz em uma busca constante de otimização do sistema de arrecadação e minoração da fraude e evasão fiscal;

e)Coordenação e cooperação: devido a facilidade de troca de informação, o comércio eletrônico opera-se entre pessoas de lugares distintos e remotos. Diante disso, dados tributários relevantes encontram-se em poder de autoridades localizadas fora do âmbito geográfico de atuação dos entres competentes para tributar. Por isso, necessário se faz estreitar os vínculos e compartilhar as tarefas de busca e tratamento das informações tanto em nível nacional como internacional.

Disto resulta que a política internacional dominante no tema da tributação do comércio eletrônico privilegia a adequação das formas tradicionais, mas sempre permitindo que a carga tributária não acarrete em um obstáculo à evolução da internet.

4.2.1 UNCITRAL

A Comissão das Nações Unidas para o Direito Comercial Internacional (Uncitral) foi uma das primeiras organizações internacionais a tratar do tema comércio eletrônico, tendo adotado, em 1996, um modelo de lei sobre as alternativas de intercâmbio e informações digitais.

Muito embora a referida Lei Modelo tenha seu foco voltado para as relações de consumo e a segurança jurídica do meio, buscando a adaptação da legislação interna de vários países, visando regular e fiscalizar as operações, ela também apresenta um esboço sobre a tributação na internet.

Os principais pontos da Lei Modelo da Uncitral sobre o comércio eletrônico são: a) a definição de vários conceitos, incluindo o de mensagem eletrônica, b) a regulação das formalidades legais para as mensagens eletrônicas e c) a regulamentação da comunicação via mensagens eletrônicas.

O maior avanço da entidade no direito tributário refere-se a estipulação de princípios que norteiam o legislador a regular as transações virtuais. Os principais podem ser abaixo descritos:

a)facilitar o comércio;

b)convalidar as operações realizadas por meio de novas tecnologias;

c)incentivar a aplicação dos novos meios de comunicação;

d)promover a uniformidade do direito aplicável à matéria e;

e)apoiar novas práticas comerciais

Importante ressaltar que a Uncitral, a todo momento, preza pela boa-fé e também pela uniformização das leis sobre a matéria, evidenciando que a internet é um meio global, sem pertencer a nenhuma nação ou grupo econômico, e por isso é preciso um esforço conjunto de cooperação para o seu desenvolvimento sustentável.

4.2.2 OECD

O modelo proposto pela OECD tem sido a base sobre a qual a maioria dos países está consolidando sua base tributária. Na convenção de Ottawa, em 1998, chegou-se a conclusão de que não é necessária a criação de um novo sistema tributário, devendo ser aplicado ao comércio eletrônico os mesmos princípios convencionais de tributação.

Segundo a Organização, devem ser aplicados os princípios usuais da tributação ótima. O Imposto ótimo seria aquele que permite ao governo alcançar seus objetivos ao menor custo possível em termos de eficiência. Seus atributos podem ser resumidos em eficiência, equidade, simplicidade, flexibilidade e efetividade.

Tais considerações são primordiais e de fácil aplicação no comércio de bens tangíveis. Porém ainda existem inúmeros debates sobre como se dará esta tributação sobre os bens intangíveis. Segundo Barros (2003, p .80) a discussão na entidade ainda perdura, mas já foram dados alguns passos a respeito. "O primeiro deles foi definir o consumo de serviços intangíveis como aquele realizado no local em que o consumidor efetivamente utiliza o serviço", afirma o autor.

Para piorar, além da dificuldade de definição do tributo, outro problema enfrentado pela OECD refere-se à forma de coleta dos impostos sobre bens intangíveis. Existem, até o momento, vagas recomendações sobre como o Fisco deve proceder, mas não há um consenso sobre o assunto, comprovando a necessidade de discussão e elaboração de soluções para os referidos problemas.

4.2.3 União Européia

Percebendo o surgimento da Sociedade da Informação e prevendo que a inclusão digital é fundamental para o sucesso no futuro, a União Européia optou por não criar tributos específicos para as relações realizadas pela internet. Apenas adaptou o IVA (Imposto sobre Valor Agregado) para algumas situações envolvendo o novo meio.

O raciocínio é bastante lógico. A tributação das relações virtuais poderia afugentar investimentos e novos consumidores, atravancando a evolução e desenvolvimento. Tal cenário poderia comprometer a inserção da sociedade na era da Informação, causando um atraso histórico na evolução social e econômica do bloco.

Sendo assim, a Comissão Européia, e com o apoio da Organização Mundial do Comércio, lançou, em 1999, as diretrizes básicas para os países do bloco organizarem as relações virtuais. Dentre outros, ficou estabelecido que as normas sobre o comércio digital deveriam ser claras, coerentes, neutras e não-discriminatórias.

Com relação aos tributos, ficou estabelecido a norma da mínima intervenção, objetivando sempre o crescimento deste mercado. Olivo (2001, p. 26) afirma que o objetivo da Comissão foi o de "garantir que este tipo de comércio possa desenvolver-se num ambiente fiscal com um mínimo de encargos", isto é, caso seja necessário proceder alterações legislativas, estas não deverão beneficiar ou prejudicar o comércio eletrônico relativamente às outras formas de comércio.

A União Européia decidiu tributar o comércio eletrônico de bens da mesma maneira que os tradicionais, utilizando-se a sistemática do valor agregado, que permite alíquotas nominais mais baixas e redução dos efeitos da evasão. Nesse sistema, o número de transações a serem fiscalizadas é menor, o que permite uma economia administrativa no monitoramento.

4.2.4 Estados Unidos da América

Nos Estados Unidos criou-se a noção de não criação de novos impostos para a internet, sempre objetivando incentivar a evolução do meio. Esse princípio de não tributar surgiu por meio de uma lei que vigorou de 1998 até 2006, criada pelo Congresso americano, visando alavancar os investimentos no setor.

Essa Lei de Liberdade Tributária na Internet ajudou o país a manter-se como o líder mundial em investimento e utilização do meio. Conforme afirma Barros (2003, p. 64), como as vendas pelo comércio eletrônico são amparadas pela não tributação, os Estados atacaram então no acesso à internet, aumentando taxas para provedores e para compras interestaduais baseadas nas vendas por catálogo.

Afora isso, foi definido pela Suprema Corte que os Estados em que se faz a compra não podem exigir de outros Estados a coleta de impostos sobre vendas, a não ser que haja representação da empresa nesse Estado, desonerando ainda mais o contribuinte.

No entanto, essa lei de "não tributar" teve vigência somente até 2006 e, com sua extinção, já surgem várias propostas ao Congresso americano buscando uma solução para a tributação do comércio eletrônico. Porém, tendo em vista que os legisladores americanos são adeptos dos princípios da neutralidade, aplicação e flexibilidade, conforme afirma Emerenciano (2003, p. 71), é possível prever que o futuro daquele país está na adequação dos meios tradicionais para as novas realidades.

Assuntos relacionados
Sobre o autor
Kristian Rodrigo Pscheidt

Professor em Direito. Mestre em Direito Político e Econômico pela Universidade Presbiteriana Mackenzie (2014). Especialista em Teoria Geral da Norma e Interpretação pelo Instituto Brasileiro de Estudos Tributários (IBET/SP). L.L.M em Direito de Negócios pela FMU (2014). Especialista em Direito Tributário pelo Centro Universitário Curitiba (2010) . Graduação em Direito pela Pontifícia Universidade Católica do Paraná (2008). Graduação em Jornalismo pela Pontifícia Universidade Católica do Paraná (2004). Advogado no S. B. Lewis Advogados & Consultores (www.lewis.adv.br)

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

PSCHEIDT, Kristian Rodrigo. Novas tecnologias e a sustentabilidade do sistema tributário. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 16, n. 3097, 24 dez. 2011. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/20699. Acesso em: 10 mai. 2024.

Publique seus artigos Compartilhe conhecimento e ganhe reconhecimento. É fácil e rápido!
Publique seus artigos