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Contenção supralegal do acesso aos juizados especiais cíveis.

Um óbice à concretização do art. 5º, XXXV, da Constituição Federal

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06/01/2012 às 09:36
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7. CONCLUSÃO

Segundo o que fora aqui explorado, entende-se que o direito ao acesso à Jurisdição – inegavelmente incrementado pelos Juizados Especiais – não deve ser restringido pelas razões estudadas, principalmente porque não se encontra em contradição com qualquer outro direito fundamental, única hipótese em que a redução de sua incidência seria justificável.

Qualquer dificuldade de ordem prática porventura alegada pode ser superada, se considerada a grande contribuição prestada pelos Juizados Especiais à economia processual e à celeridade (seja pelo seu rito, seja pela redução de processos nos Juízos ordinários), e deve ceder lugar aos direitos fundamentais, em vez de se fazer o contrário, conforme hodiernamente acontece no cenário em comento.

De mais a mais, em que pese a existência das vias ordinárias para a solução das demandas excluídas da competência dos Juizados, é imperioso reconhecer que o procedimento comum é mais dispendioso e moroso para o jurisdicionado, o que, embora não represente a fulminação do inciso XXXV do art. 5º da Constituição, já é um meio de redução de seu alcance, prática essa repudiada pela mesma Lei Máxima, que veda qualquer medida "tendente a abolir" direitos e garantias fundamentais, o que é vedado ao Legislador e, obviamente, ao intérprete, dado o efeito irradiante dos direitos dessa natureza.

Todavia, conquanto o assunto tenha contornos tão relevantes, sua discussão não assumiu circunferência correspondente, pois a dificuldade de acesso ao Poder Judiciário afeta com ascendente crueldade, tradicionalmente, os indivíduos de menor poder aquisitivo, sem grande influência social e, portanto, com muito pouca capacidade de movimentar provocar debates sócio-jurídicos com resultados efetivos em seu socorro.

Justamente por isso, não se espera o fácil reconhecimento da posição ora sustentada, mas se roga veementemente pelo aperfeiçoamento do debate à luz dos postulados fundamentais da norma constitucional, de modo a moldar a atuação jurisdicional à vontade daquela em vez de tentar distorcê-la para validar os interesses do intérprete.


NOTAS

01. CRFB/88, art. 5º, §2º - Os direitos e garantias expressos nesta Constituição não excluem outros decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados, ou dos tratados internacionais em que a República Federativa do Brasil seja parte.

02. "Quero dizer, sentando praça desse princípio regente do ingresso em Juízo, porque o fato é que a Constituição diz que a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário. É um comando constitucional raríssimo, porque implica bloqueio à função legislativa, ou seja, a Constituição proíbe o exercício da função legislativa, que não pode impedir o acesso das partes ao Poder Judiciário." (Voto do Ministro Carlos Aires de Britto. ADI 2139-MC/DF)

03. CRFB/88, art. 60, § 4º - Não será objeto de deliberação a proposta de emenda tendente a abolir:

IV - os direitos e garantias individuais.

04. Redação atual, alterada pela Lei 12.126/2009.

05. O art. 74 da Lei Complementar 123/2006 permite às microempresas e empresas de pequeno porte a utilização do procedimento. Conferir também a Lei 12.153/2009, que determina a aplicação subsidiária da Lei 9.099/95 aos Juizados da Fazenda Pública.

06. Verba cum eefectu, sunt accipienda.

07. Pode-se comparar a redação do artigo em comento com róis exemplificativos encontrados na Lei 8.666/93, cujo art. 25 contém a expressão "em especial", exprimindo a possibilidade de outras hipóteses; bem como o art. 11 da Lei 8.429/92, que encerra o caput com "e notadamente", deixando clara a abertura para a subsunção de outras situações à regra da cabeça do artigo.

08. Não se pode olvidar que fazem parte da mesma carreira e, mesmo quando há atuação de juízes leigos e conciliadores, esta está sempre sujeita à supervisão e homologação do Juiz togado.

09. Trata-se da razoável duração do processo, incluída no rol de direitos fundamentais na forma do inciso LXXVIII.

10. O Ministério Público opinou neste sentido.

11. Recurso Extraordinário 537.427/SP.

12. Conferir AI 655684 AgR/RJ, julgado em 28/06/2011 e RE 637701 AgR/MG, julgado em 16/08/2011.

13. No mesmo sentido, conferir RMS 17.524/BA.

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Lei nº 9.099, de 26 de setembro de 1995. Dispõe sobre os Juizados Especiais Cíveis e Criminais e dá outras providências. Diário Oficial [da] República Federativa do Brasil, Brasília, DF. 27 set. 1995.

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Sobre o autor
José Daniel de Jesus Santana

Bacharel em Direito pela Universidade Tiradentes (SE), Especialista pós-graduado em Direito Público pela mesma Instituição, Assessor de Juiz do Poder Judiciário do Estado de Sergipe.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

SANTANA, José Daniel Jesus. Contenção supralegal do acesso aos juizados especiais cíveis.: Um óbice à concretização do art. 5º, XXXV, da Constituição Federal. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 17, n. 3110, 6 jan. 2012. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/20804. Acesso em: 25 abr. 2024.

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